1 Luiz Fernandes de Oliveira



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Aprendendo com jogos



Half-Life 2 (Valve Corporation, 2004)

CADA CABEÇA, UMA SENTENÇA. SÓ QUE NÃO.



FONTE: Divulgação/ Valvesoftware

A ideologia cria estratégias para que as pessoas sejam aprisionadas não apenas pela coerção, mas também pela sua própria vontade, fundada em crenças, em uma "ideologia-valor", em representações com valor de verdade. Neste game, a raça humana foi escravizada por uma raça alienígena chamada Combine. Ela desenvolveu um sofisticado sistema que utiliza tecnologia terrestre e controla mentalmente os humanos. Você é Gordon Freeman e lidera um grupo de rebeldes e com ajuda de outros alienígenas terá de libertar a raça humana do controle mental dos Combine. Não será fácil!

Como jogar:



1. Baixe a versão demo do jogo (clicando em "transferir demonstração") em http://goo.gl/90UoMT

2. Mergulhe no game logo após ter lido o livro 1984 do escritor inglês George Orwell. Esse livro vai te surpreender! (faça uma pesquisa na biblioteca de sua escola para saber se há alguma cópia do livro ou busque na internet para saber como ter acesso a ele)

3. Explore o game Half Life 2 e analise as semelhanças entre as estratégias de dominação ideológica dos Combine com a estratégias de dominação da ideologia hegemônica em nossa sociedade.

4. Assista o filme Eles Vivem (They Live, 1988), com um enredo semelhante, onde o protagonista é o único indivíduo ciente de uma dominação alienígena que controla as mentes das pessoas com mensagens escondidas. Você pode baixar gratuitamente o filme aqui: http://goo.gl/Z38Blv

5. Assista o filme Gattaca (Andrew Niccol, 1997). Trailer que você acessa em https://goo. gl/T6AJ7E que aborda as preocupações sobre as tecnologias reprodutivas que facilitam a eugenia, cuja trama se passa num futuro no qual os seres humanos são criados geneticamente em laboratórios e as pessoas concebidas biologicamente, consideradas "inválidas".

6. Reflita junto aos seus colegas sobre que tipo de sociedade o controle sobre o que pensamos e sobre o nosso corpo pode gerar.

7. Você também pode ler o livro, ver os filmes e jogar o game no mesmo período para realizar uma comparação entre esses produtos culturais.

8. Não seria legal ler o livro, assistir os filmes e discutir em sala a ideologia a partir de cenas do game? Pesquise outros livros e filmes com temática similar e prepare uma exposição de cinco minutos para a sua turma, na qual você indicará quais aspectos que você considera mais fortemente relacionados entre o jogo, o livro e os filmes (você deve narrar passagens, trechos, cenas e eventos relacionados).

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Capítulo 8 - "Ganhava a vida com muito suor e mesmo assim não podia ser pior." O trabalho e as desigualdades sociais na História das sociedades

LEGENDA: Trabalhadores rurais alvos de operação da Polícia Federal que investiga denúncias de trabalho escravo, em Tucuruí, PA.

FONTE: Bernardo Gutiérrez/Folhapress

Escravidão no Século XXI?

Uma reportagem publicada pelo jornal Folha de São Paulo, em 06 de outubro de 2002, assinada por Fátima Fernandes e Claudia Rolli, apresentou um dado surpreendente e assustador: a Comissão Especial para o Combate ao Trabalho Escravo, vinculada ao Ministério da Justiça, anunciou que, somente neste século XXI, o número de trabalhadores descobertos em condição de escravidão chegara a 10 mil, concentrados no Norte e no Nordeste. A matéria apontava para a ocorrência de inúmeras denúncias de trabalho escravo, quase a totalidade em fazendas. Somente no Pará, foram registrados 75 casos em 2002, envolvendo mais de 3.000 trabalhadores, segundo dados da Comissão Pastoral da Terra - CPT, ligada à Igreja Católica.

As práticas de manutenção do "trabalho forçado", ou de trabalhadores reduzidos à condição de escravidão, são "justificadas", segundo a reportagem, pelo desemprego elevado, pela falta de punição para quem escraviza

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(que, na maioria das vezes, mantém relações bem próximas com políticos locais e influentes - quando não são os próprios), e pelas péssimas condições de trabalho das equipes de fiscalização do Ministério do Trabalho, com pouco pessoal, falta de verba, ausência de apoio policial, atuando sob forte pressão política e ameaças de morte, feitas por grandes pecuaristas.

No caso citado do estado do Pará, grande parte dos trabalhadores escravos é utilizada na derrubada de florestas, para posterior criação de pastos para o gado.

Sem alternativas de emprego, os trabalhadores são recrutados nas cidades mais pobres do interior, principalmente do Nordeste, através de um carro de som comandado por "gatos" - como são chamados os empreiteiros que trabalham para os fazendeiros. Segundo a reportagem, os empreiteiros "oferecem R$ 400,00 de abono e, como os trabalhadores estão na miséria, acabam aceitando a oferta sem entender que já saem de lá com dívidas de passagem", além de outras dívidas que vão contraindo no trabalho, por consumir os produtos colocados à venda pelos fazendeiros.

Após 2002, as notícias são de que houve aumento na fiscalização que é feita através do GERTRAF - Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado, que reúne sete ministérios, sob a coordenação do Ministério do Trabalho. Este fato - o aumento na fiscalização - é que teria provocado um aumento alarmante do número de casos que são divulgados a cada ano, segundo afirmam os estudiosos. Só para se ter uma ideia, a OIT - Organização Internacional do Trabalho - estimava que, apesar das ações do GERTRAF, ainda existiam no Brasil, em 2008, entre 25 mil e 40 mil trabalhadores escravos.

O diretor de cinema suíço Stéphane Brasey, que filmou o documentário-denúncia A Lenda da Terra Dourada, sobre a prática do trabalho escravo no Pará, recolheu depoimentos de trabalhadores e fazendeiros. Estes últimos, contra todas as leis trabalhistas e contra os direitos humanos, reclamavam por serem obrigados a pagar direitos trabalhistas e dizendo que isso é que fazia com que o Brasil fosse ainda um país de Terceiro Mundo.

FONTE: @ Angeli - Folha de S. Paulo 10.04.2007

Segundo outra reportagem, a agricultura canavieira, produtora de açúcar e álcool, liderou em 2008 o ranking de denúncias de trabalho escravo, segundo a CPT, com 36% do total das denúncias apuradas, o que significava, nesse ano, um total recorde de 280 casos registrados (Folha Online, 29/04/2009). No caso desse setor da economia, as denúncias não atingem somente o Norte e o Nordeste do Brasil, onde persiste a maior incidência de trabalho escravo, mas também a região Sudeste, com essa prática podendo ser encontrada nas usinas do interior de São Paulo e de Campos dos Goytacazes, no norte do estado do Rio de Janeiro. Estas "recrutavam" trabalhadores no Vale do Jequitinhonha, a região mais pobre do estado de Minas Gerais.

Como você pode observar, a história relatada acima, infelizmente, ainda faz parte da realidade atual do nosso país. Você sabia? Tinha essa informação? Seria possível imaginar que, ainda hoje, trabalhadores estão sendo submetidos a trabalhos forçados, como se ainda vivêssemos na época da escravidão? Por que será que isso acontece?

Esse tipo de violência que nos causa indignação, no entanto, já foi um dia considerada como "natural"... Por quê?

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Nem sempre tivemos fábricas, salários, Facebook, futebol e...

Desde as eras mais remotas - aquelas que aprendemos nos livros didáticos a identificar como "pré-história" -, os seres humanos precisaram enfrentar os diferentes meios físicos da natureza na sua luta pela própria sobrevivência. Esse conflito entre o homem e a natureza, através dos tempos, deu origem a diversas e distintas formas de organização e cultura dos seres humanos entre si.

O contato entre os homens estabeleceu regras de convívio e fez surgir diferentes agrupamentos, identificados por características comuns entre os membros do grupo, tais como, por exemplo, uma determinada crença sobrenatural ou a solidariedade necessária à caça de um animal selvagem de grande porte. São esses pequenos grupos que vão estabelecer o surgimento, mais tarde, de coletividades maiores e mais complexas que podemos chamar de sociedades humanas.

Ao longo da História, diversos tipos de sociedades se formaram e também desapareceram. As diferentes sociedades humanas, entretanto, podem ser classificadas de acordo com a presença de algumas características comuns. Estas podem ser sintetizadas através do conceito teórico de modo de produção, ou seja, a maneira como a sociedade é organizada como um todo para garantir a sua própria sobrevivência e a sua continuidade (= a sua reprodução).



LEGENDA: Como as sociedades se organizam para produzir os seus bens materiais? Na foto, trabalhadores no mercado Ver-o-Peso, Belém, PA.

FONTE: Tarso Sarraf/Folhapress

O conceito de modo de produção engloba três níveis diferentes:

Boxe complementar:

O nível econômico: a forma pela qual a sociedade se organiza para produzir os seus bens materiais.

O nível jurídico-político: o estabelecimento de normas e a sua transformação em leis que devem ser obedecidas por todos os seus membros, com a consequente criação de instituições que garantam o seu cumprimento.

O nível ideológico: a invenção de tradições, costumes e ideias que devem ser entendidas como "naturais" e que, por isso, devem ser seguidas por todos aqueles que pertençam a uma determinada coletividade. Representa a forma pela qual aquela sociedade vê e analisa o mundo.

Fim do complemento.

Entre os diversos tipos de sociedades que marcaram a História da humanidade, vamos destacar, neste capítulo, alguns aspectos de quatro distintos modos de produção: o primitivo, o asiático, o escravista e o feudal. Antes, porém, vamos procurar compreender alguns conceitos básicos que ajudam a explicar essas diferentes maneiras que o homem encontrou para se organizar coletivamente.

Neste capítulo, o nosso principal objetivo é o de esclarecer conceitos referentes ao chamado nível econômico dos modos de produção. Os níveis jurídico-político e ideológico, que nos preocupamos apenas em definir, serão tratados com maior profundidade em outros capítulos deste livro.



Mas eu não entendo nada de economia...

Quando se fala em economia, a maioria das pessoas - e principalmente os jovens - geralmente "torce o nariz". E nem poderia ser de outra forma, já que nos habituamos a escutar nos telejornais termos aparentemente incompreensíveis, tais como inflação, juros, déficit, com destaque para notícias importantes, como a " queda do índice da Bolsa de Valores" ou ainda "a mais recente alta do dólar"...

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LEGENDA: Será a economia tão complicada e assustadora como a maioria das pessoas pensa?

FONTE: Image Source/Shannon Fagan

Na verdade, entender economia é muito mais simples do que parece.

Podemos defini-la como a forma pela qual o conjunto de indivíduos existentes em uma sociedade participa da produção, da distribuição e do consumo de seus bens e serviços.

Quando falamos em bens estamos nos referindo a qualquer coisa ou matéria produzida pelo homem: automóveis, roupas, calçados, gêneros alimentícios, cadernos, cadeiras etc.



Serviços referem-se a atividades desenvolvidas pelo homem, tão diversas como uma aula de Sociologia ou de Matemática, uma consulta médica, o atendimento ao público num estabelecimento bancário ou no posto do INSS, e assim por diante.

Bens e serviços são desenvolvidos pelo homem a partir da sua capacidade física e intelectual, a qual chamamos de força de trabalho.

É através do trabalho que o homem transforma e domina a natureza, contribuindo para a melhoria da sua qualidade de vida (a construção de uma hidrelétrica ou de uma ponte sobre um rio) ou até mesmo para a sua destruição (a poluição atmosférica provocada por uma fábrica ou a invenção da bomba atômica).

Todas as vezes em que os elementos da natureza são apropriados economicamente pelo homem, eles se transformam em recursos naturais. Assim podemos chamar as árvores (matéria bruta) que são cortadas em toras de madeira (matéria-prima) para a fabricação de móveis (produto final).



Instrumento de produção é qualquer bem utilizado pelo homem na transformação da matéria-prima e produção de outros bens e serviços. Definimos dessa forma as ferramentas de trabalho, as máquinas e os equipamentos (instrumentos de produção diretos), assim como o local de trabalho e a energia elétrica que utilizamos (instrumentos de produção indiretos).

Como se pode perceber, tanto as matérias-primas como os instrumentos de produção citados acima formam o conjunto de "meios materiais" necessários à produção de qualquer tipo de bens ou de serviços. A esses meios materiais damos o nome de meios de produção.

Uma característica que vai distinguir os diversos tipos de sociedades que se constituíram historicamente é, exatamente, a forma pela qual o homem, através do trabalho, utilizou os meios de produção que lhe estavam, então, disponíveis. A essa associação entre o trabalho humano e os meios de produção damos o nome de forças produtivas. Cada sociedade, portanto, apresenta o seu conjunto de forças produtivas.

Por fim, um último conceito, que define a forma pela qual os diversos homens ou agrupamentos se relacionam entre si em todo o processo de produção material existente na sociedade: as relações de produção.

As relações de produção, como veremos a seguir, é que vão condicionar, juntamente com as forças produtivas, a organização e o funcionamento da sociedade como um todo, estabelecendo as distinções entre os diferentes modos de produção que caracterizaram a humanidade.

O trabalho e as desigualdades sociais através da História da humanidade

É importante ressaltar que, nas diferentes sociedades humanas, ao mesmo tempo em que todos os indivíduos procuravam lutar pela sua própria sobrevivência, alguns grupos sociais conseguiam se destacar e impor a sua vontade e os seus interesses sobre o restante da coletividade.

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Assim, dependendo do tipo de organização econômica que se impunha historicamente em cada sociedade, esses grupos sociais dominantes poderiam ser identificados como compostos majoritariamente por donos de terras, por chefes militares ou por sacerdotes. É claro que este tipo de "dominação" entre grupos sociais diferenciados dentro de uma mesma sociedade não acontecia, por exemplo, entre os povos indígenas encontrados pelos portugueses a partir de 1500 no Brasil. Mas, se pensarmos na grande maioria dos diversos tipos de sociedade que encontramos ao longo da História da humanidade, identifica-se essa característica de apropriação do poder por determinados grupos, como estamos destacando.



Uma característica importante é que havia quase sempre uma coincidência de interesses entre o poder político, ou seja, aqueles que governavam a sociedade, determinando as leis que deveriam ser obedecidas por todos, e o poder econômico, isto é, aqueles grupos sociais que acabavam acumulando privilégios do ponto de vista material, em relação ao restante da sociedade.

LEGENDA: Pintura de Cândido Portinari: "Colheita de café", (1951).

FONTE: Acervo Projeto Portinari

Quando falamos em grupos sociais dominantes e os identificamos com aqueles que detinham algum tipo de poder, fosse ele militar, econômico ou religioso, fica subentendida a existência de grupos sociais dominados, ou seja, aqueles que se submetiam ao poder do primeiro grupo. Podemos destacar algumas características importantes, que aconteciam em quase todas as formas assumidas pelos modos de produção na História da humanidade.

Os grupos sociais dominantes são compostos quase sempre por uma parcela minoritária da população, que se destaca exatamente por exercer algum tipo de poder sobre a maioria. Por isso podemos chamá-los de elites. O sociólogo e economista italiano Vilfredo Pareto, no início do século XX, classificou-as como elites governantes, em oposição às massas não governantes (cf. RODRIGUES, 1984).

Outro italiano, Gaetano Mosca, já afirmara um pouco antes que, em todas as sociedades, existiam duas classes de pessoas - uma classe que governa e uma classe que é governada. Mosca e Pareto, juntamente com outros pensadores, como o inglês Robert Michels, são os responsáveis por aquela que ficou conhecida na Sociologia e na Ciência Política como a teoria das elites.

Karl Marx, porém, desde o século XIX, demonstrara que, na origem da divisão das sociedades em classes sociais antagônicas (dominantes X dominados), havia um elemento comum: a propriedade privada dos meios de produção. Ou seja, a existência de uma classe social que se apoderava, em um determinado momento, das terras férteis ou das riquezas minerais existentes.

O poder, a autoridade e a riqueza dessas classes dominantes poderiam ser mantidos através da força - daí a necessidade da constituição de forças policiais ou de poderosos exércitos, responsáveis pela "manutenção da ordem pública" - ou através do convencimento - para o qual foram fundamentais a criação de leis e de uma ideia de justiça, assim como a submissão a uma "vontade divina", determinada por uma religião.

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Dessa forma, as classes dominadas aceitavam e até defendiam a "superioridade" dos seus chefes, entendidos como mais "capazes", mais "fortes", mais "inteligentes" ou simplesmente "escolhidos" ou "ungidos" por um ser sobrenatural, um "deus" criador de tudo e de todos, responsável pelo estabelecimento de uma dada "ordem" (ou o status quo), sem a qual a sociedade não poderia sobreviver... Esse tipo de dominação é que está diretamente relacionado aos níveis jurídico-políticos e ideológicos, característicos dos diversos tipos de sociedades que se constituíram ao longo da História da humanidade.



Segundo um dos principais sociólogos do século XX, o alemão Max Weber, a afirmação do poder e da autoridade em uma determinada sociedade é identificada com uma importante instituição: o Estado. Como o Estado e as suas instituições componentes (governo, polícia, justiça etc.) são reconhecidos por toda a população como responsáveis pela manutenção da "ordem" detêm a legitimidade do monopólio do uso da força, impondo a vontade de um determinado grupo sobre a vontade de todos os outros indivíduos. Entendeu? O que Weber quis dizer quando se referiu à essa ideia de legitimidade e monopólio, por parte do Estado, em relação ao uso da força na sociedade, significa a existência de um reconhecimento geral - ou seja, por parte de todos -, de que este é o papel que o Estado tem que cumprir, em determinadas situações de "crise" ou de "violência". Esse reconhecimento assume um caráter legal, ou melhor, está respaldado nas leis, reconhecidas pela população, já que são elaboradas pelos seus representantes políticos. Todos são obrigados a cumprir as leis - teoricamente, em benefício da "boa convivência" e da "harmonia" entre todos.

Outro autor, Friedrich Engels (2005), o principal parceiro de Karl Marx em muitas obras, afirmou que o Estado é um produto da sociedade quando esta chega a um determinado grau de desenvolvimento, apesar da sua composição por classes sociais que têm interesses antagônicos e que, portanto, deveriam se apresentar permanentemente em situação de conflito.

Segundo Engels:

Boxe complementar:

...para que esses antagonismos, essas classes com interesses econômicos colidentes não se devorem e não consumam a sociedade numa luta estéril, faz-se necessário um poder colocado aparentemente por cima da sociedade, chamado a amortecer o choque e a mantê-lo dentro dos limites da "ordem". Este poder, nascido da sociedade, mas posto acima dela e se distanciando cada vez mais, é o Estado.

(ENGELS, 2005, p. 191)

Fim do complemento.

LEGENDA: Friedrich Engels (1820-1895), teórico revolucionário alemão, principal colaborador de Karl Marx.

FONTE: AKG-Imagens/LatinStock

Assim, partindo dessas primeiras reflexões, vamos conversar brevemente sobre a forma como distintas sociedades se organizaram através da História da humanidade, procurando perceber e entender algumas características que podemos definir como comuns a uma grande parte delas. Você pode reparar que essa organização dos homens se dá principalmente em torno do trabalho, ou seja, a forma pela qual os homens reproduzem a sua própria existência como um todo.

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A organização dos homens em sociedade através da História

a) Sociedades tribais, "primitivas" ou "sociedades sem Estado"

LEGENDA: Nas comunidades indígenas brasileiras não existe a divisão de classes sociais. Na maioria delas, uns caçam, outros pescam, outros plantam e outros dominam os ritos religiosos. Na foto, índios Kayapó jogam o Ronkrã, tradicional esporte entre eles, onde duas equipes batem com um bastão (Akêt) em um coco usado como bola (Paragominas, PA).

FONTE: Janduari Simões/Folhapress

As primeiras formas de organização social dos seres humanos se caracterizaram quando deixaram de ser nômades e se tornaram sedentários, isto é, fixaram-se em um lugar para cultivar a terra e praticar o pastoreio.

Nesse tipo de sociedade, os homens trabalhavam coletivamente, repartindo entre si o resultado da pesca, da caça e da coleta de frutos e de raízes. Não existia nenhuma forma de propriedade privada e as relações de produção eram caracterizadas pela ajuda mútua entre todos os membros da coletividade.

Não existia o Estado e a sociedade não era dividida em classes sociais, mas nessas comunidades tem origem a especialização de funções: uns caçam, outros plantam, uns fabricam cestos, outros dominam os ritos religiosos...

Apesar da utilização, por diversos autores, do termo "primitivo" em relação a essas sociedades, devemos chamar a atenção para algumas questões importantes:

Boxe complementar:

- Não devemos considerá-las como "atrasadas" em relação a outras formas de organização social. Essa ideia conduziria à adoção de uma "teoria evolucionista", como se um certo tipo de sociedade pudesse suceder a outro tipo através da História - o que não corresponde à realidade, já que, até hoje, esse modo de produção pode ser encontrado em povos ou nações em regiões tão distantes e distintas como a América, a África e a Oceania.

- Trata-se, na verdade, de sociedades extremamente complexas, principalmente do ponto de vista da sua cultura - o que foi demonstrado amplamente por inúmeras pesquisas efetuadas no campo da Antropologia. O antropólogo francês Pierre Clastres (1934-1977), inclusive, popularizou nas Ciências Sociais - em um texto publicado em 1974 - o termo sociedade contra o Estado que ele elaborou a partir das diversas pesquisas que desenvolveu na América Latina, na década de 1960 e início dos anos 1970 (cf. CLASTRES, 2003). Outro antropólogo, o norte-americano Marshall Sahlins, pesquisando em sociedades que habitavam ilhas do Pacífico Ocidental, também formulou outro termo que contribui para entendê-las porque, segundo ele, essas seriam as sociedades de abundância (cf. SAHLINS, 1976).

- Dentro desta forma de classificação que aqui adotamos encontram-se sociedades completamente distintas entre si sob o aspecto cultural, o que se reflete na sua forma de organização social. Assim, queremos registrar que a ideia de "sociedades tribais, primitivas ou sem Estado" está sendo utilizada apenas para destacar principalmente os elementos econômicos comuns que estão presentes nessas diferentes sociedades.

Fim do complemento.

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