1 Luiz Fernandes de Oliveira



Yüklə 2,47 Mb.
səhifə37/46
tarix18.01.2019
ölçüsü2,47 Mb.
#100587
1   ...   33   34   35   36   37   38   39   40   ...   46

As religiões no Brasil

O Brasil é considerado um dos países mais religiosos do mundo. Entretanto, é necessário perceber que nossa formação nacional se caracteriza pela influência de vários matizes religiosos, como o catolicismo oficial e o popular, as religiões de matrizes africanas - como o candomblé e a umbanda -, o protestantismo, os pentecostais, os espíritas kardecistas, a teologia da libertação e os católicos carismáticos. Segundo os dados do censo do IBGE em 2000, os católicos representavam 73,8%, os evangélicos 15,4%, outras religiões 3,5% e os sem religião 7,3%. Já o último censo, realizado em 2010, revelou uma mudança bastante significativa: os católicos passaram a representar 64,6% e os evangélicos cresceram para um percentual de 22,2%. Além desse universo cristão que abrange 86,8% da população, aqueles que declararam pertencer a outras religiões correspondem a um total de 5,2%, enquanto os sem religião passaram para 8%.

308

LEGENDA: Segundo o Censo de 2010, do IBGE, houve queda no percentual de católicos, no Brasil, em comparação com o censo anterior. Por que será que isto vem acontecendo nos últimos anos? A eleição de um latino-americano, o Papa Francisco, em 2013, reverterá essa tendência de queda percentual no número de fiéis católicos, que atinge todo o continente?

FONTE: Luiz Fernandes

"Amai-vos uns aos outros" - catolicismo oficial e popular

O chamado catolicismo oficial é facilmente identificado pela instituição da Igreja, vinculado ao Vaticano e com sua hierarquia interna. Até a Proclamação da República, o catolicismo era a religião oficial do Estado Imperial brasileiro. A partir da República, apesar de não constar nas constituições como religião oficial, era e é, até os dias atuais, a religião que mais tem adeptos no Brasil. Segundo dados do último censo IBGE, o Brasil é, ainda hoje, a maior nação católica do mundo com cerca de 126 milhões de adeptos. O catolicismo oficial tem como característica se organizar enquanto instituição denominada Igreja Católica Apostólica Romana.

Na linguagem sociológica, Igreja é uma organização burocrática religiosa que se adapta à sociedade profana ou secular. Ela não desafia a autoridade do Estado, tem uma organização de treinamento de seus líderes, tem hierarquia forte e regulamentos bem definidos. Essas características fazem esse tipo de instituição ter uma longa durabilidade. Por conta disso, também, o catolicismo oficial sempre esteve ao lado dos poderes constituídos, legitimando e justificando, muitas vezes, a situação política e social do país.

O chamado catolicismo popular, no Brasil, tem características devocionais de culto aos santos, diferentemente da prática oficial da Igreja, quando só quem está autorizado a dirigir um culto são os padres, bispos ou o Papa. Nos centros urbanos, foi constituído pelas irmandades. No campo, através do culto aos beatos, aos monges e da crença nas "rezadeiras". Estas últimas também eram encontradas há décadas atrás no meio urbano, em razão da grande migração campo-cidade que ocorreu a partir da metade do século XX. Elas se caracterizavam como católicas, mas suas rezas, envolvidas com práticas de cura de doenças com a utilização de ervas, envolviam elementos sincréticos das tradições religiosas de origem indígena e das religiões afro-brasileiras.

Irmandades são grupos de devotos leigos, reunidos em associações privadas que têm como objetivo a manutenção do culto ou devoção. Têm autonomia jurídica e econômica. Os beatos e os monges são os penitentes, ermitões encontrados nos sertões e que, em alguns casos, se tornaram santos populares e passaram a atrair romeiros e penitentes.

LEGENDA: Imagem peregrina de Nossa Senhora de Nazaré, durante a festa do Círio de Nazaré, Belém (PA). Apesar de pertencer ao calendário oficial da Igreja Católica, essa procissão pode ser um exemplo de manifestação do catolicismo popular no Brasil.

FONTE: Andre Vicente/Fotoarena/Folhapress

309


Quais são as características desse tipo de catolicismo? Ele tem uma origem laica, um caráter penitencial, com devoção às imagens, em que o invisível se torna palpável possibilitando uma comunicação entre vivos e mortos, que dispensa uma mediação de autoridades religiosas. Por fim, há a relação pessoal entre santos e fiéis.

"Laroiê Exu!" - candomblé e umbanda

Durante o cativeiro, uma das únicas coisas que não se pôde roubar ao africano escravizado foi a fé religiosa. E essa fé foi sempre um fator de reconstrução de suas culturas. Assim, a religião impregnou todas as atividades negras brasileiras influenciando até a sua vida profana. Recriando, então, aqui, nas comunidades-terreiro, o candomblé - o espaço da África e sua herança cultural -, foi justamente através da religião que o africano escravizado conservou um profundo sentido de comunidade e transmitiu de geração a geração as raízes de sua cultura.



LEGENDA: Ritual das religiões de matriz africana, como o candomblé e a umbanda, no Rio de Janeiro. Fiéis fazem caminhada, no Centro da cidade, em 02 de fevereiro de 2012, para a entrega do presente de Yemanjá.

FONTE: Luiz Fernandes

Além dos orixás, entidades divinas, poderes e patronos de forças da natureza, Exu, Yemanjá, Oxum, Oxossi, Xangô, Iansã, Oxumaré e outros, os africanos e seus descendentes sempre cultuaram também os antepassados, os eguns - aqueles espíritos de indivíduos que depois se converteram em ancestrais, em "pais" (Baba Egun). O culto aos antepassados, entretanto, não pode, em hipótese alguma, se confundir com o culto aos orixás, já que cada um deles tem doutrina e liturgias próprias.

O culto aos eguns se realiza em terreiros específicos. O espaço onde se reverencia a memória dos antepassados é o Ilê Igbalé - representação de uma antiga clareira existente no âmago da floresta africana e consagrada aos eguns. Nestes terreiros, a invocação dos ancestrais é a própria essência e a razão maior do culto.

Enquanto o candomblé cultua as forças da natureza, chamadas de orixás, a umbanda pratica o culto de diversos espíritos ancestrais, chamadas de entidades, como pretos-velhos, caboclos, exus e crianças. Esses espíritos incorporam em seus fiéis - adeptos iniciados ritualmente na umbanda - para dar consultas de ajuda e prestar caridade à comunidade. A umbanda é uma criação essencialmente brasileira, surgida na primeira década do século XX, no Rio de Janeiro. É um culto chamado de sincrético, pois há uma certa mistura de cultos africanos aos ancestrais, cultos aos ancestrais indígenas e há também alguns símbolos católicos. A pessoa que recorre à umbanda espera obter proteção dos espíritos ancestrais.



"Ele vai voltar" - protestantes e pentecostais

No século XVI, na Europa, apareceram várias igrejas cristãs, que não obedeciam às ordens do Papa e discordavam dos católicos em várias questões e por estes foram chamados de protestantes. Devido à corrupção e ao excesso de impostos pagos para a Igreja, iniciou-se, através de padres e fiéis, uma grande contestação aos poderes desta. Essa contestação culminou na chamada Reforma Protestante. A principal crítica religiosa dessa reforma - dirigida aos católicos e impulsionada por Martinho Lutero, Thomas Münzer e João Calvino, era a de que os cristãos não deveriam mais se submeter às autoridades religiosas, mas somente às próprias escrituras, ou seja, à Bíblia.

No final do século XIX, os imigrantes alemães trouxeram o luteranismo ao Brasil.

310


Já no século XX, diversos missionários americanos fundaram várias igrejas cristãs não católicas, como a Batista e a Metodista. Sua característica principal é tentar converter os indivíduos aos princípios da Bíblia e conduzir suas vidas rigidamente a partir desses princípios.

Os pentecostais são grupos que partilham da espera de uma segunda vinda de Cristo e acreditam ter acesso, no dia a dia, à ação do Espírito Santo, a quem atribuem curas dos males do corpo e da alma.

Note-se que, nos últimos anos, ocorreu um crescimento vertiginoso dessas religiões. Ao longo da História, os pentecostais sempre foram minoria. É somente a partir do final da década de 1970 que começam a crescer em número de adeptos, pois introduzem a concorrência religiosa explícita que significa a exigência de conversão e exclusividade.

LEGENDA: Com visibilidade através dos meios de comunicação de massa, as igrejas neopentecostais também promovem grandes cultos e manifestações em lugares públicos, mobilizando fiéis de igrejas localizadas em regiões diferentes. Na foto, a 18ª edição da Marcha para Jesus, realizada pela Igreja Renascer em Cristo, em São Paulo, 2010, SP.

FONTE: Rodrigo Coca/Fotoarena/Folhapress

Esse crescimento ocorreu principalmente entre os grupos intitulados neopentecostais. Estes se tornaram mais "populares" em razão de apresentarem duas diferenças fundamentais, em relação aos pentecostais: o fato de assumirem uma postura mais liberal em relação aos costumes vigentes na sociedade e a adoção da "teologia da prosperidade". Ou seja, a crença de que a fé e a devoção "verdadeiras" são as responsáveis pela obtenção de ganhos materiais e pela garantia de cura para todos os males da vida.

Ser pentecostal ou neopentecostal no Brasil passou a significar: oposição a ser católico, romper com a religião da família, abandonar a devoção aos santos, interromper ciclos de promessas, em contrapartida, sentir-se escolhido por Deus. A visibilidade dos neopentecostais é devida, principalmente, à sua inserção nos meios de comunicação de massa.

"Fora da caridade não há salvação" - o Espiritismo Kardecista

A Doutrina Espírita ou o Espiritismo, conhecida no Brasil, de uma forma geral, como Kardecismo, é também conhecido por parte da população, em algumas regiões, como o "Espiritismo de Mesa Branca". Isso se dá por referência à toalha branca que sempre cobre a mesa onde se sentam aqueles que presidem as sessões nos centros espíritas, acompanhados pelos "médiuns", ou seja, as pessoas que têm o dom de se comunicar com "os espíritos daqueles que já se foram da vida terrena", fazendo parte do "além", ou seja, de outro "plano espiritual". Outra justificativa para o uso do termo "mesa branca" diz respeito a uma forma de diferenciação e oposição aos centros das religiões afro-brasileiras, inclusive pelo fato da sua teologia - diferentemente destas últimas - ter como base de sustentação o Cristianismo.

O Espiritismo se autodefine como, ao mesmo tempo, uma doutrina, uma filosofia e uma ciência, criada na França, no século XIX, por Allan Kardec, pseudônimo do pedagogo francês Hippolyte Léon Denizad Rivail. Kardec é reconhecido pelos espíritas como o codificador da doutrina, ou seja, ele não teria "inventado" nada, mas apenas sido o instrumento da organização teórica que traduziu os "fenômenos espirituais" presentes no cotidiano e que já eram identificados e percebidos por centenas de pessoas. Suas leituras desses fenômenos foram sistematizadas em diversas obras que até hoje servem de referência para todos os praticantes e adeptos do Espiritismo - uma delas, inclusive, relê os textos dos Evangelhos cristãos à luz da doutrina, interpretando teologicamente, sob o ponto de vista espírita, a vida e as palavras proferidas por Jesus Cristo.

311


LEGENDA: Cortejo acompanha caixão do líder espírita Francisco Cândido Xavier, o Chico Xavier, em Uberaba (MG), em 2002. Ele era o "médium" mais popular do país, tendo publicado mais de 450 livros, com cerca de 25 milhões de exemplares vendidos - faleceu aos 92 anos.

FONTE: Joel Silva/Folhapress

Apesar do Espiritismo não se definir especificamente como uma religião, podese dizer que ele assumiu esse formato no Brasil, sendo praticado por cerca de quatro milhões de pessoas. Uma curiosidade é que seus praticantes contabilizam dezoito milhões de "simpatizantes" no país, ou seja, quase 10% de toda a população brasileira, segundo o Censo de 2010 - um percentual não detectado pelas pesquisas censitárias do IBGE. Esses simpatizantes seriam adeptos de outras religiões (principalmente católicos) ou pessoas sem religião oficial definida, mas que creem na doutrina ou "na vida após a morte", atestada pela existência dos espíritos. Um exemplo disso seria a grande acolhida popular de diversas novelas de TV, assim como filmes de temática especificamente espírita que foram campeões de bilheteria.

A FEB - Federação Espírita Brasileira - relaciona a existência de cerca de 10 mil instituições espíritas em todo o país. Além dos centros espíritas, centenas delas são voltadas para a prática da caridade, como hospitais, escolas, creches, orfanatos e asilos.

"Libertar os pobres da opressão" - a Teologia da Libertação

A partir da identificação da grave crise social na América Latina, nos anos 1960, proliferou um vasto movimento social de católicos preocupados em melhorar as condições de vida dos povos latino-americanos. Surgiram vários movimentos como a Ação Católica, Juventude Universitária Cristã, Juventude Operária Cristã e as Comunidades Eclesiais de Base. Na preparação da Conferência de Medelín (1968), bispos progressistas orientaram os católicos a uma opção preferencial pelos pobres.



LEGENDA: Bispo Pedro Casaldáliga discursa durante o terceiro congresso do Movimentos dos Sem-Terra, no Parque da Cidade, São Paulo (SP), em 26/07/1995.

FONTE: Sérgio Lima/Folhapress

A partir de 1970, teólogos como Leonardo Boff, Clodovis Boff, Frei Betto, e bispos como Dom Hélder Câmara e Dom Pedro Casaldáliga, entre tantos outros, denunciaram as condições de miséria do povo trabalhador, defendendo alguns princípios:

- Luta contra a idolatria do mercado, da força militar, da riqueza - identificados como inimigos principais da religião.

- Uma nova leitura da Bíblia, do momento do êxodo, como modelo de luta do povo escravizado pela sua libertação.

- Uso das teorias socialistas para entender as causas da pobreza, das contradições do capitalismo e a luta de classes.

- Opção pelos pobres e solidariedade com sua luta pela autolibertação.

312

- Criação de Comunidades Eclesiais de Base para organizar o povo em suas lutas, com o seu método político de Ver-JulgarAgir-Rever. Este movimento foi muito importante na resistência à ditadura militar e contribuiu na formação do PT, da CUT e do MST.



"Intimidade com a Santíssima Trindade" - os carismáticos

A Renovação Carismática Católica (RCC) é originária dos Estados Unidos e chega ao Brasil em 1972. Nasce do movimento de leigos no interior da Igreja Católica e tem por base os grupos de oração com encontros semanais. Não desejam substituir a vida sacramental, mas complementá-la, ao trazer os participantes para a vida no espírito.

Os encontros se baseiam em: louvor, ação de graça, cânticos, testemunhos e partilhas; encontros nos quais as pessoas cantam, pulam, extravasam as tensões e trocam calor. Também fazem grandes encontros em locais públicos. Para os carismáticos, "ser cristão é viver em relacionamento íntimo com a Santíssima Trindade".

LEGENDA: Um exemplo de manifestação dos carismáticos: "Carnaval de Jesus" promovido pelo padre Marcelo Rossi, em Jurubatuba (SP), em 1999.

FONTE: Evelson de Freitas/Folhapress

O movimento carismático na década de 1990 serviu, no Brasil, como alternativa religiosa diante da diminuição da influência do catolicismo. Começa então, uma disputa pelo " mercado religioso" no Brasil. É a partir daí que podemos entender o grande sucesso de figuras como o padre Marcelo Rossi.



Coisas de brasileiro! O fenômeno do sincretismo no Brasil e no mundo

Um fenômeno social bastante interessante no Brasil é o chamado sincretismo religioso. Este é o resultado do contato social entre povos e grupos, resultando em uma espécie de "fusão" ou "amálgama" de determinadas características distintas desses grupos, referentes a elementos religiosos e culturais. É, portanto, a existência comum de traços culturais e religiosos, originalmente diferentes, que poderiam ser interpretados até como incompatíveis ou antagônicos, mas que acabam se apresentando como um só elemento novo e único.

No caso do Brasil, o sincretismo se dá com o encontro entre negros africanos, índios nativos e brancos europeus. Porém, antes de examinar o sincretismo na religiosidade brasileira, vamos ver como este foi analisado na História.

O fenômeno do sincretismo não foi inventado no Brasil. Ele se origina na Grécia Antiga: dizem alguns historiadores que os cretenses, sempre dispostos a brigar entre si, se uniam quando eram atacados por um inimigo externo, ou seja: SIM + CRETISMO = união dos cretenses.

Ao longo da História, o termo foi associado aos contatos e fusões religiosas e culturais dos diversos povos. Atualmente, no sul da Itália (na Calábria), por exemplo, acontece na semana de Páscoa um ritual religioso que mistura a Paixão de Cristo com rituais de autoflagelação dos antigos gregos.

No caso do Brasil, o sincretismo se manifestou em vários níveis. O candomblé, por exemplo, é o resultado da reelaboração de diversas culturas africanas. Tanto nessa religião, como na umbanda ocorre a realização de um acerto, de um jogo de contatos, uma troca de influências (SODRÉ, 2002).

313

Essas religiões podem ser entendidas como "espaços de resistência", na medida em que os africanos escravizados e seus descendentes geraram novas formações sincréticas no território americano, todas originais em comparação com as religiões africanas que lhes serviram de origem.



LEGENDA: O jogo dos contatos, a troca de referências, a harmonia entre diferentes culturas.

FONTE: Luiz Fernandes

A prática do catolicismo popular também é sincrético como o culto a Nossa Senhora dos Navegantes e a Iemanjá. A mesma imagem representa rituais na igreja e no mar. A festa do Nosso Senhor do Bonfim também se reza a missa e se faz a lavagem das escadarias pelas mães de santo e filhas de santo.



A sociedade, seus problemas e a religiosidade

Como foi dito no início deste capítulo, o que nos interessa é analisar a importância desses grupos religiosos para a formação da sociedade brasileira e como eles interferem na política, na democracia e no exercício da cidadania.

Em relação ao catolicismo popular, podemos afirmar que as classes dominantes no Brasil, principalmente na área rural, utilizaram-se da boa-fé dos camponeses para exercer uma dominação política e econômica. Na década de 1980, foi exibida uma novela que obteve grande audiência na televisão brasileira, intitulada "Roque Santeiro", escrita pelo dramaturgo Dias Gomes. Nela, o personagem Sinhozinho Malta, um latifundiário (chamado de "coronel"), utilizou-se da crença popular aos santos para justificar sua dominação política no interior da Bahia. Por esse motivo, a novela havia sido censurada durante a ditadura militar. Os chamados "coronéis" diziam que o povo deveria sempre rezar e ser devoto dos santos, pois somente assim alcançaria o paraíso dos céus, pois aqui na Terra há uns que nasceram ricos e outros pobres e não tem como mudar esta situação.

O candomblé e a umbanda, por sua vez, são religiões essencialmente constituídas de negros, apesar de encontrarmos não negros entre seus adeptos. Alguns estudiosos da cultura negra afirmam que, com a necessidade de os africanos e seus descendentes manterem suas culturas no Brasil, houve a reterritorialização de costumes e crenças no espaço dos terreiros de candomblé e umbanda. Era uma espécie de recurso de sobrevivência, pois tratados à base da tortura, do terror da escravidão, não lhes restava outra coisa que não suas crenças, valores, costumes.

Hoje, a sua permanência no território brasileiro, inclusive com expansão, demonstra que, apesar de um mundo globalizado e tecnologizado, essas crenças têm fortes raízes culturais e representam a expressão de resistência e luta contra o racismo ainda presente na sociedade brasileira.

Neste sentido, estas expressões de religiosidade colocam para todos nós que, ou viveremos numa sociedade multicultural, em que todos respeitem as diversidades humanas, ou sucumbiremos aos totalitarismos, intolerâncias e racismos.

O crescimento dos pentecostais não é devido simplesmente à dita manipulação promovida nas mentes dos "ignorantes e pobres". A partir da década de 1980, eles se apresentam na sociedade brasileira, que vive uma profunda crise social, como agentes que oferecem uma solução para ausência de cidadania e nos fazem entender como alguns brasileiros enfrentam seus problemas materiais e emocionais imediatos.

Mas quais são os elementos e mecanismos que contribuem para a conversão pentecostal e, por consequência, o seu crescimento numérico? Os principais são: os pentecostais atraem seus futuros fiéis através dos poderosos meios de comunicação que têm em mãos;

314

diferentemente da Igreja Católica, há um acesso direto aos pastores; há uma permanente consolação dos aflitos; eles produzem, de fato, uma dignidade cidadã num espaço de pobreza como as favelas, periferias etc.; eles ocupam espaços onde quase não existem instituições como escolas, assistência social, em suma, o Estado; também tornam-se um recurso de recuperação familiar (contra o alcoolismo, contra as drogas etc.) e, por fim, apresentam-se à população mais carente como a alternativa à falta de cidadania.



LEGENDA: Cerimônia religiosa na igreja evangélica Bola de Neve (também conhecida como Bola de Neve Church), reunindo 5.000 seguidores, em Perdizes (SP).

FONTE: Marlene Bergamo/Folhapress

Outra característica importante do papel dos pentecostais é o fato de retirarem muitos jovens da influência do tráfico de drogas. O interessante é que seu sucesso vem também do fato de que o tráfico perdoa quem entra para a Igreja. Até porque, os pentecostais não querem saber do passado do jovem, eles não representam riscos para o tráfico, pois não vão "dedurar" ninguém.

Por fim, a Teologia da Libertação significou uma nova interpretação do catolicismo na América Latina. O sociólogo Michael Löwy (cf. 1999) descreve que, a partir do Concílio Vaticano II, alguns bispos e religiosos cristãos iniciam um processo de reinterpretação dos preceitos bíblicos em conjunto à adoção de ideias marxistas. O autor afirma que se operou - a partir dos encontros de bispos latino-americanos, em Medelín (Colômbia - 1968) e, depois, em Puebla (México - 1979) - uma preocupação com os destinos dos pobres na América Latina. Este setor da Igreja Católica assume a ideia de que os pobres devem se rebelar contra as injustiças e a exploração capitalista.

No Brasil, a expressão máxima dessa ideia se concretizou nas Comunidades Eclesiais de Base (as CEBs). Tais entidades tiveram um papel importante na defesa dos direitos humanos na época da ditadura militar e no processo de redemocratização.

É interessante notar, nas palavras de Frei Betto, a reinterpretação, em termos políticos, por exemplo, da morte de Jesus Cristo. Segundo ele, Jesus Cristo não morreu doente na cama, triste e amargurado. Ele morreu crucificado. Na época do Império Romano, quem era crucificado, geralmente, eram os presos políticos, aqueles que combatiam os opressores romanos.

Frei Betto, assim como os demais defensores da Teologia da Libertação, deduz, daí, que é tarefa dos cristãos lutar pelo fim da pobreza e das injustiças, seguindo o exemplo de Jesus Cristo na luta contra os opressores.



LEGENDA: A Teologia da Libertação mobilizou leigos e religiosos, tanto católicos como protestantes, em razão do seu caráter ecumênico. Na foto, o sociólogo Michael Löwy, um dos teóricos que procurou analisar a influência das teorias de Karl Marx nesse movimento religioso e político.

FONTE: João Alexandre Peschanski


Yüklə 2,47 Mb.

Dostları ilə paylaş:
1   ...   33   34   35   36   37   38   39   40   ...   46




Verilənlər bazası müəlliflik hüququ ilə müdafiə olunur ©muhaz.org 2024
rəhbərliyinə müraciət

gir | qeydiyyatdan keç
    Ana səhifə


yükləyin