A dama do tempo a wife in Time Cathie Linz desejo 77 como num passe de mágica, eles viveram uma inacreditável paixãO!



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CAPÍTULO SETE

Oh, Deus! E agora? Resfolegando, Suzana arrancou os fones de ouvido com uma mão enquanto desligava o toca-fitas com a outra. Escondeu-os na bolsa e colocou um vestido, às pressas.

Voou escada a baixo, rezando para que as rou­pas que vestia fossem adequadas para usar fora do quarto. Com certeza não desejava que estra­nhassem ainda mais seu comportamento. Encon­trou Gerta e a sra. Broadstreet na sala de refei­ções. Como a senhora não piscasse um olho sequer diante de sua aparição, Suzana imaginou que es­tivesse tudo bem nesse departamento.

Gerta, no entanto, tinha problemas. Mantendo-se atrás da sra. Broadstreet como que para pro­teger-se, a empregada tremia e chorava.

— Gerta disse que você estava possuída pelo demônio, com estranhos ruídos saindo de sua ca­beça, mas não de sua boca. — relatou a sra. Broadstreet.

Bem feito por sua dublagem, pensou Suzana.

— Posso explicar — assegurou ela, rapidamente.

— Espero que desta vez não use como desculpa o fato de ter sido educada no estrangeiro — disse a sra. Broadstreet com um olhar desaprovador.

— Estou certa de que, mesmo nos lugares mais remotos da França, esse comportamento seria con­siderado estranho, para dizer pouco.

— Posso explicar — repetiu ela. — Meu marido, Kane, é um... inventor. Eu estava apenas testando uma de suas mais novas criações.

— Um inventor? Você quer dizer, como aquele sr. Edison, lá do norte, sobre quem li nos jornais?

— Exatamente.

— Seu marido está inventando uma máquina de som?

— É uma maneira de dizer, claro.

— Pronto, Gerta. — A sra. Broadstreet deu uns tapinhas no trêmulo ombro da empregada. — Eu lhe disse que não havia nada para ter medo, me­nina boba. O sr. Wilder é um inventor. Ele está fazendo uma máquina de som. Foi esse o barulho que você ouviu. — Para Suzana, ela disse: — Gos­taria muitíssimo de ver essa máquina de som.

— Oh, meu marido não deixa ninguém ver seus brinquedos até que ele os tenha terminado — ex­plicou rapidamente Suzana.

— Brinquedos? — repetiu a sra. Broadstreet, confusa.

— É assim que eu chamo suas invenções — respondeu.

— Entre outras coisas — interrompeu Kane, tende acabado de ouvir a conversa. — O que aconteceu?

— Nada, querido — declarou Suzana, rápida

— Gerta entrou no quarto quando eu estava es­cutando a sua... máquina de som.

— Minha máquina de som, é? — disse ele, ten­tando ganhar tempo.

— Isso. Naturalmente ela se amedrontou me ven­do dançar à volta do quarto, meio despida como...

— Meio despida? — repetiu Kane. Raios. Ele devia ter voltado antes para casa. Dava para ver que perdera um grande show.

— Depois eu lhe conto — Suzana estava dizen­do. — Já está tudo explicado agora.

Gerta não parecia muito tranqüila, enquanto a sra. Broadstreet continuava tentando explicar o sig­nificado da palavra "invenção" para a empregada.

— Não posso deixá-la sozinha cinco minutos sem que você arranje algum problema, não é? — declarou Kane quando chegaram ao quarto.

— Pois saiba que esteve fora por muito mais do que cinco minutos — começou ela, quando Kane a interrompeu.

— Sentiu minha falta?

— Não seja ridículo — devolveu ela. — E você, o que descobriu na taverna?

— Que os times de beisebol de Nova York não jogam muito melhor neste século do que no nosso.

— E levou quatro horas para descobrir isso? — perguntou, irônica.

— Tomando conta do meu tempo, é?

— Ao contrário. Tive uma tarde bem ocupada também.

— Aterrorizando a empregada.

— E o assistente do sr. Whitaker.

— Do que você está falando?

— Oh, nada, a não ser que encontrei o misterioso sr. Gordon Stevens, o assistente que carrega uma foto de Elsbeth na carteira. O homem estava muito nervoso. Definitivamente escondia alguma coisa.

E Suzana também. Tinha planos para aquela noite e não pretendia contar a Kane.

— Talvez ele soubesse que o seu patrão estava tendo um caso — disse Kane.

— Só porque o pegamos agarrado àquela moça não quer dizer que tenham um caso.

— Concordo. Aí está por que conversei com al­gumas pessoas na taverna. Foi assim que ouvi sobre o caso deles.

— E dizem que as mulheres fofocam! — excla­mou Suzana. — Estava pensando que se Hayward Whitaker estava traindo a mulher, teria um mo­tivo perfeito para matá-la: ficar com a amante.

— Ele? — repetiu Kane. — E ela? Talvez qui­sesse tornar-se a próxima sra. Whitaker, mas ti­nha que livrar-se da mulher dele antes.

— Você não tem uma faísca de evidência para fazer essa espécie de acusação.

— Nem você — retrucou ele. — No entanto, está bem para você acusar o sr. Hayward Whita­ker de assassinato.

— As mulheres não são tão violentas quanto os homens.

— E você me acusa de ser preconceituoso!

— As estatísticas me dão razão — disse Suzana. — Você a está acusando por causa do que aconteceu com seu irmão! Acha que sou a malvada "outra" mulher, culpada como o pecado. E está repetindo a mesma coisa com essa moça, fazendo acusações in­fundadas que não têm nem um grama de verdade.

— Estamos falando sobre aquela moça ou sobre você aí? — perguntou, devagar.

Ela levantou os olhos e ficou presa no olhar dele, desejando o impossível: que ele acreditasse nela, que confiasse nela. Queria isso tanto que quase não podia respirar. Tentou ler a expressão dele, pensando ter visto uma esperança igual ali. Esperança de quê?

Foram interrompidos simultaneamente pelo som do gongo anunciando o jantar e pelo barulho que fez o estômago de Kane, roncando, o que que­brou a tensão que estava se erguendo entre eles.

Suzana e Kane começaram a rir juntos.

— E melhor descermos — disse Suzana. Kane concordou.

— Gostaria de saber quantos pratos Gerta vai quebrar hoje.

A resposta foi três. A empregada agia como se tivesse vários pés esquerdos. Suzana sentiu pena dela. Ela também sentia-se insegura.

Apesar de tudo, a refeição estava deliciosa: car­ne fria e salada de batatas, com a promessa de uma fruta para sobremesa.

Um outro prato esparramou-se no chão. Com um balançar de cabeça a sra. Broadstreet teve que substituir Gerta e mandou-a para a cozinha.

Logo após o jantar, Suzana e Kane retiraram-se para o quarto. Lembrando o livro que a senhora lhe emprestara, Suzana o apanhou de sobre a la­reira, sentou-se na cadeira de balanço perto da janela e começou a lê-lo.

Kane murmurou algo sobre fazer uma lista dos suspeitos e se ocupou, escrevendo em um bloco.

— Não deixe ninguém ver essa caneta esferográ­fica — alertou-o Suzana, antes de virar a página.

Em vez de responder, ele perguntou:

— O que você está lendo?

— E sobre etiqueta. Um livro incrível. Eu não tinha a menor idéia... Veja... O que você acha que significa isso? — Pegou seu leque e o passou pela testa.

— Que você está com calor. Com febre, talvez.

— Errado. Passar o leque pela testa desse jeito significa "Estamos sendo observados".

— Por quem?

— Ninguém. Pelo menos, nesse momento. Eu estava apenas lhe dando um exemplo. Há uma linguagem silenciosa inteira usada com o leque. Abanar-se significa "Estou comprometida". Aba­nar-se bem devagar quer dizer "Sou casada".

— Já reparei que você tem se abanado devagar desde que chegamos aqui.

Saltando da cama, ele tomou-lhe o livro, arrancando-o de suas mãos antes que ela pudesse pro­testar. Olhando para a página, disse:

— Deixe-me ver... Ah, aqui está. Diz que deixar cair a sombrinha quer dizer "Eu te amo".

O coração dela parou ao ouvi-lo pronunciar es­sas três palavras. Como seria ouvi-lo dizê-las para si? Esses pensamentos ansiosos ainda acabariam por deixá-la em apuros, mas não conseguiu resis­tir e pôs-se a imaginar como seria se Kane a amas­se. Não apenas ser relutantemente atraído, mas gostando dela, confiando nela, amando-a, beijan-do-a, abraçando-a, levando-a para lugares em que nunca estivera antes...

"Ele já a levou a um lugar onde nunca esteve antes", lembrou uma voz dentro dela. "Savannah, século dezenove."

Isso não era nada. Ele a levara a um plano de prazer sensual, simplesmente beijando-a. Imagi­nar-se fazendo amor com ele foi o suficiente para elevar sua temperatura uns dez graus e forçá-la a apanhar o leque outra vez.

— Você está abanando o leque rapidamente — notou Kane. — Então, está comprometida.

— Estou com calor — declarou ela, abanando-se ainda mais rápido.

— Como é que os rapazes podem ficar sabendo de todos esses significados ocultos? — Kane per­guntou-se em voz alta enquanto lia as quase duas dúzias de variações para os abanos. Havia mais outras tantas para lenços, luvas e sombrinhas.

— Eles não tinham televisão ou rádio para distraí-los.

— E os homens de nosso tempo se queixam de que a vida é dura para eles... — Kane gemeu.

Estava morrendo de vontade de beijá-la. Queria atirar o livro através do quarto e tomá-la em seus braços, levá-la até a cama e tirar cada camada de sua roupa, acariciando cada pedacinho de sua pele cremosa. E queria fazê-la desejá-lo tanto quanto ele a desejava, olhar seus olhos castanhos derreterem-se enquanto ele a fazia sua.

— Hum... como está ficando a lista de suspeitos? — Suzana perguntou, nervosa.

Tinha razão para sentir-se assim. Parecia ha­ver uma onda de atração crescendo entre eles, afogando-os e arrastando-os nessa corrente pe­rigosa. Ou será que ela imaginara tudo isso?

Talvez Kane estivesse apenas pensando sobre como resolver o caso.

— A lista de suspeitos? — repetiu Kane. — Certo. — Voltando para a cama, pegou o bloco. — Bem, já temos um motivo para a morte de Elsbeth. Agora precisamos ver quem teve a oportunidade. Para isso precisamos determinar exatamente onde estavam os dois suspeitos naquela noite.

— Há três suspeitos — lembrou Suzana. — Não esqueça o retrato de Elsbeth que encontramos na carteira de Gordon Stevens.

— Um retrato não faz dele um suspeito. O que teria a ganhar com a morte dela? — per­guntou Kane.

— Ele poderia ter tido uma perigosa obsessão por ela. Acontece. Homens quietos, aparentemen­te normais, criam uma vida de fantasia para eles próprios que nada tem a ver com a realidade — disse ela, calmamente.

— É essa a sua maneira de dizer que meu o irmão está vivendo em um mundo de fantasia?

— Não consigo ver nenhuma outra razão para ele mentir — respondeu ela.

— Tudo bem, seja como quiser.

O coração dela deu um salto. Será que isso sig­nificava que finalmente Kane acreditava no que ela dizia?

— Temos então três suspeitos. Mas estou certo de que a tal moça é a culpada. — Ele continuou a discutir o caso, agindo como se o nome do irmão não tivesse sido mencionado, mas Suzana não es­cutava mais.

Quando ela iria aprender? Não tinha jeito de convencer Kane de que seu bem-amado irmão mentia, e que ela era a parte inocente.

Enquanto ele se preparava para dormir, Suzana continuou na cadeira de balanço, lendo o livro, ou pelo menos fingindo que lia.

— Você não vem dormir? Ela sacudiu a cabeça.

— Vá em frente. Quero ler um pouco mais.

— Como quiser — disse Kane, sacudindo os om­bros enquanto se deitava na cama e prendia o cortinado de todos os lados.

A bruxuleante luz sobre a cômoda deixava cla­ridade suficiente para Suzana ler enquanto espe­rava que Kane dormisse. Quando ouviu-o ressonando, levantou-se e, cuidadosamente, soprou a chama do lampião.

O luar que passava através da janela iluminava enquanto rapidamente vestia a calça preta de homem e o casaco que encontrara no baú da sra. Broadstreet. Colocou o boné preto sobre os cabelos, escondendo-os dentro dele antes de abrir a porta e sair para descobrir o paradeiro do sr. Hayward Whitaker.

— Siga aquele carro! — grunhiu Suzana. Nunca imaginara que diria essas palavras a um sono-lento cocheiro de uma carruagem. Mas, assim que chegara à casa de Whitaker, ela o vira saindo furtivamente e tomando uma carruagem.

— O que foi que disse, senhora? — perguntou o cocheiro, hesitante.

— Você me ouviu — voltou Suzana, mantendo a voz baixa e grave. — Siga aquele carro, ah... a carruagem. Não os perca, de jeito nenhum. Aqui estão cinco dólares extras para você — acrescen­tou, após o que a carruagem partiu como um rojão.

O forte pressentimento de que algo muito im­portante ia ocorrer aquela noite não a deixava. E seria onde Whitaker estivesse.

E esse lugar era o cemitério Bonaventura. O cocheiro advertiu-a de que não era lugar para se visitar no escuro, pois era mal-assombrado.

Sabendo que tinha um fantasma do seu lado; ela não sentiu medo. Saiu da carruagem e des­pediu-a. Cuidadosamente seguiu por entre a fo­lhagem, aproveitando as sombras das lápides, em direção à carruagem de Whitaker. Podia ser que fantasmas não fossem ameaça, mas Whitaker po­deria ser. Ele não estava mais na carruagem, mas ela podia vê-lo a distância.

O ar estava pesado e mesclado com o perfume de flores velhas e folhas molhadas. Sombras es­tranhas provocadas pelas plantas e folhagens for­mavam figuras fantasmagóricas no chão.

Suzana estava mesmo pensando que era muito bom não se amedrontar com facilidade quando foi subitamente agarrada por trás, e uma mão rude tapou-lhe a boca, impedindo-a de gritar.
CAPÍTULO OITO

Suzana entrou em pânico. Ela estava atrás de uma lápide no cemitério. Qualquer pessoa teria um ataque cardíaco se fosse agarrada no escuro daquela maneira, pensou. Lu­tou para soltar-se, o que fez com que o boné caísse, deixando seus cabelos despencar à sua volta; mas seu atacante segurou-a ainda mais apertado, não deixando-a escapar.

— Que diabos pensa que está fazendo? — grunhiu uma voz masculina em seu ouvido.

Era Kane. Ele afastou-se enquanto ela relaxava, com alívio.

— Não ouse desmaiar agora! — ameaçou ele. A impaciência de Kane foi como um copo de água fria.

Suzana soltou um pequeno gemido. Ele não sabia se era seguro largá-la ou não. Seu braço estava à volta da cintura dela, sua mão segurando-a sob seu seio esquerdo. Ele sabia que era o esquerdo porque podia sentir o coração de Suzana batendo sob sua palma.

Ao sentir os dentes dela tentando morder-lhe a mão que ainda cobria sua boca, rapidamente voltou a concentrar-se no que fazia.

— Nem ouse me morder — avisou, ameaçador, antes de puxar a mão. — E não faça nenhum barulho também.

Ela lhe dirigiu um olhar que teria estilhaçado qualquer estátua de mármore. Então, procurou por Hayward Whitaker. Ele desaparecera. E a car­ruagem também.

— Para onde foi ele? — murmurou ela.

— Quem?

—Whitaker! Por que mais você acha que eu estaria aqui me escondendo atrás do raio desse túmulo?



— Boa pergunta.

— Gostaria de lhe dar uma surra. Que droga! Para que você tinha que vir aqui e estragar tudo?

— Espere um minuto aí. Deixe-me pôr as coisas no lugar. Você seguiu Hayward Whitaker até este cemitério deserto? Perdeu a cabeça?

— O lugar do encontro foi idéia dele, não minha.

— E com quem ele ia se encontrar?

— Não faço idéia. Você me agarrou antes que eu pudesse ver.

Kane não se desculpou por sua ação. Em vez disso, olhou para ela enquanto ambos ainda continuavam agachados atrás da lápide daquele túmulo.

— Achei que foi para isso que contratamos aque­le detetive, para ele fazer esse trabalho sujo.

— Não teria sido tão sujo se você não tivesse caído em cima de mim! — exclamou Suzana.

— O que você estava fazendo era perigoso — disse Kane, a voz ainda rouca e baixa. — O que aconteceria se a tivessem visto aqui? E eles tives­sem caído sobre você? Duvido que a deixassem sair daqui viva.

Ela estava viva, e muito. Com ondas de eletri­cidade percorrendo-lhe o corpo, especialmente onde o dele a tocava. Apesar de Kane ter tirado a mão que cobria-lhe a boca, o outro braço ainda a rodeava. Ela podia sentir o calor de sua mão exatamente sob seu seio.

— Como foi que você chegou aqui? — perguntou ela, desejando que seu coração parasse de bater tão forte.

— Vi você sair da hospedaria. Estava muito estranha a noite toda, por isso resolvi segui-la em uma carruagem de aluguel.

— E onde está essa carruagem?

— No portão do cemitério.

— Ótimo! Aposto que Whitaker a viu quando saiu daqui.

— Normalmente os portões do cemitério ficam fechados durante a noite. O cocheiro me disse isso. E não paramos do outro lado para que ninguém pudesse ver.

— Muito bem. Vamos interrogar o cocheiro. Tal­vez ele tenha visto para onde Hayward se dirigiu.

Apanhando seu boné, ela afastou-se dele e di­rigiu-se em direção ao portão principal. Kane correu atrás de Suzana.

— Não posso acreditar que você tenha sido idio­ta o bastante para entrar por aí...

— Não sou idiota. Você é que é! Eu estava seguindo...

— Você estava se colocando em perigo — con­tinuou ele, sem se interromper. — Como posso achar meu caminho de volta para casa se alguma coisa acontecer a você?

— Ah, ótimo! Então agora eu sou sua passagem de volta para o século vinte? Muito obrigada por se preocupar comigo.

— Não foi isso o que eu quis dizer, e você sabe.

— Não sei coisa alguma — disse ela, tentando subir na carruagem, esquecendo que queria in­terrogar o cocheiro.

Kane pegou-a pela cintura e levantou-a, prati­camente atirando-a para dentro da carruagem. Subindo também, ele bateu a porta e fez sinal para o cocheiro colocar-se em movimento.

Suzana ignorou-o deliberadamente, olhando atra­vés da janela para a paisagem sob o luar. A áspera estrada branca que os levava de volta à cidade pa­recia uma corda esticada entre os campos.

— Vamos esclarecer tudo agora mesmo — co­meçou Kane.

Ela o interrompeu, olhando-o de um modo tão orgulhoso quanto o sol de Savannah.

— Já lhe disse que sei exatamente o que você quer dizer.

— Então fique sabendo disso... — murmurou ele, rouco, antes de puxá-la para seus braços e começar a beijá-la.

Estava tão zangado que não pensava direito. Beijar Suzana poderia ter aliviado sua zanga, mas nada fez para ajudá-lo a pensar melhor. Tudo bem, pensou. Estando com ela em seus braços, com sua boca macia sob a sua, nada mais poderia detê-lo, exceto a resistência dela.

Mas ela não resistiu.

Suzana pretendia responder à zanga dele com a sua própria ^fúria. Em vez disso, o que apareceu foi paixão. A língua de Kane entrou por seus lábios entreabertos e começou a enroscar-se na sua. O desejo dele estava ali, sua fome abertamente ex­pressa enquanto murmurava o nome dela antes de puxá-la mais para perto.

Suzana enfiou seus dedos nos cabelos dele, maravilhando-se com sua textura sedosa. Suas unhas enterraram-se nos ombros másculos quando ele mordiscou-lhe o lóbulo da orelha, encaminhando-se para sua garganta. Os ágeis dedos de Kane rapidamente principiaram a desabotoar-lhe a blusa e a desamar­rar-lhe os laços, e sua mão esgueirou-se para dentro dela, envolvendo o seio nu com sua palma.

Atordoada, Suzana agradeceu aos céus por não estar usando sutiã nessa noite. Não queria nada atrapalhando o caminho de seu toque. Ele ia tocá-la assim, e ela sentia como se tivesse esperado a vida toda para que aquilo acontecesse. Agora que chegara o momento, o prazer era ainda mais in­tenso do que ela jamais pudera antecipar.

Esfregando um dedo sobre o mamilo do seio direito, ele baixou a cabeça para fazer o mesmo no outro, com a língua, fazendo eróticos desenhos com toques sedutores. Estremecendo de prazer, ela o trouxe ainda mais perto, seus dedos enterrando-se nos ombros dele enquanto Kane brincava com os lábios até que en­volveu o mamilo todo em sua a boca.

A cabeça de Suzana recostou-se contra o assento de couro enquanto êxtase puro percorria-lhe o cor­po. Ela não percebeu que Kane abrira a calça que estava usando até que sentiu a mão dele contra sua coxa. O fino náilon da calcinha pouco fez para bloquear-lhe o toque, amplificando-o ainda mais enquanto ele vagarosamente esfregava a mão por sua pele macia.

A carruagem deu um tranco ao passar sobre algum buraco da estrada, fazendo-o momentanea­mente parar com as carícias. O murmúrio de pro­testo que Suzana soltou perdeu-se nos lábios de Kane, pois uma vez mais suas bocas se encontra­ram com paixão avassaladora.

Um beijo se mesclava com outro enquanto eles experimentavam saltos e solavancos. Suzana não percebeu que estava deitada no assento até que sen­tiu o couro macio contra suas costas. Mesmo então, apenas reparou em sua nova posição com uma parte distante de sua mente. O resto de sua atenção se dirigia ao calor pulsante que tomava conta dela.

Kane a acariciava desde o pescoço até o umbigo, sua mão deixando um rastro de prazer quando passavam. E a cada vez, ele ia um pouco mais abaixo até que seus dedos entraram sob o elástico da calcinha.

A carruagem deu outro solavanco e balançou, mu­dando seus dedos e empurrando-os mais para baixo, de encontro ao centro da feminilidade de Suzana.

Ela gritou quando a súbita antecipação tomou conta de si, e ondas de prazer pulsaram através de seu corpo. As mãos dele dirigiam-se para a abertura da calça quando a carruagem parou abruptamente, atirando-o do banco para o chão.

A súbita parada trouxe-o de volta à realidade num instante. Pondo-se de joelhos, repreendeu-se por sua falta de controle. O que pensava ele, ten­tando seduzir Suzana em uma carruagem? Sua raiva o levara além dos limites, e a paixão dela ainda apressara sua queda.

O enormes olhos de Suzana, entorpecidos e as­sustados, não ajudavam também.

— Feche seu casaco — grunhiu Kane ao ouvir o cocheiro saltar da bolei a e ir abrir-lhes a porta da carruagem. ,

Essas poucas palavras queimaram a alma de Suzana. A humilhação cobriu-a, destruindo os úl­timos vestígios de prazer que permaneciam em seu corpo. Como pudera deixá-lo tocá-la daquela forma? Por que não tinha lutado com ele? Em vez disso, escorregara de costas, praticamente se ofe­recendo a ele. Isso certamente iria reafirmar ainda mais a idéia de que ela era uma mulher perdida.

Como explicar a ele que fazia anos que não tinha um encontro amoroso? E que não haviam sido muitos os homens em sua vida. Na verdade, ape­nas dois. Abstinência e celibato ainda existiam, será que ele sabia?

Abotoando-se de qualquer maneira, Suzana deu um jeito de arrumar o casaco, justo no momento em que o cocheiro abriu a porta. Voando para fora da carruagem, apressou-se para os degraus da hos­pedaria, deixando Kane sozinho com o cocheiro.

Escondeu-se no pequeno banheiro até recobrar algum controle. Não tinha o lampião consigo. A escuridão escondia suas lágrimas, que desciam pe­las faces. Como iria deparar-se com ele depois do que acabara de acontecer?

Fechando os olhos, rezou para Elsbeth mandá-la de volta ao seu próprio tempo. Mas não surgiu nenhuma luz azul mágica. Em vez disso, sentiu como se Elsbeth estivesse tentando confortá-la.

De algum modo, isso funcionou. As lágrimas pararam de rolar, e sua mente começou a traba­lhar, tentando descobrir algo para dizer que pu­desse disfarçar sua humilhação e fazer as coisas voltarem ao normal.

Não teve que se preocupar. Kane pouco falou quando ela finalmente voltou ao quarto.

— O que sucedeu na carruagem foi um erro — declarou ele, direto. — Não vai acontecer mais.

Suzana acenou com a cabeça antes de escon­der-se atrás do biombo e rapidamente arrancar as roupas. Apanhou uma esponja de banho, mas sabia que havia pouca chance de lavar a lembran­ça do toque de Kane. Enfiando a camisola, foi rapidamente para a cama, tratando de enfiar o cortinado sob o colchão e desejando que pudesse transformar-se em uma bolinha e desaparecer, en­quanto Kane dizia qualquer coisa sobre sair para um longo passeio.

Suzana não dormiu bem. Até as três horas da madrugada não conseguiu pregar o olho, e foi quando Kane voltou.

Na manhã seguinte eleja estava de pé e vestido quando ela abriu os olhos. Ao descer, encontrou-o sentado à grande mesa de jantar, junto com os três novos hóspedes.

— Ah, aí está você — saudou a sra. Broadstreet. — Esse conjunto lhe fica muito bem, querida.

Suzana olhou para a blusa branca que usava.

As mangas bufantes faziam o mesmo efeito das ombreiras em seu século, alargavam os ombros e tornavam a cintura mais estreita.

Não teve a sorte de evitar os olhos de Kane quando entrou na sala de refeições com a sra. Broadstreet. Um olhar bastou para perceber a raiva e o desejo em seus olhos azuis, E a rígida determinação.

Suzana endireitou a espinha, e seu queixo ergueu-se como se preparasse para uma batalha. Ela não iria tornar-se uma senhorita afetada. E tampouco daria atenção àquela atitude dele. Fora ele quem a beijara na carruagem na noite passada, começando toda a reação encadeada. A culpa era dele, não sua.

Preferia estar zangada com Kane a sentir a dor que da noite passada. Sua indignação a envolveu com um manto de compostura quando saudou os no­vos hóspedes que a sra. Broadstreet lhe apresentava.

— Aqui estão as senhorita s Abernathys, de Savannah — dizia ela. — Srta. Agnes e srta. Agatha, apresento-lhes a sra. Suzana Wilder, da França.

As duas mulheres pareciam saídas de uma aula de história. Tinham feições que Suzana somente vira em pinturas, e possuíam um ar de realeza que ela admirou, enquanto cortesmente acena­vam-lhe com a cabeça.

— E este senhor é o professor Dudley Hering, de Boston.

— Encantado — disse o professor, tomando a mão de Suzana e curvando-se diante dela. Ele havia se levantado da cadeira no momento em que ela entrara na sala.

Enquanto isso, Kane continuava a comer.

— Seu marido ia exatamente nos contar sobre sua vida na França — disse o professor.

— Não queremos aborrecê-los — replicou Suzana, sem confiar na história que Kane poderia inventar.

Por sorte, nessa manhã ele não falou nada. Pelo menos, não com ela. Se os outros repararam na tensão que havia entre os dois, foram muito bem educados e nada comentaram.

Quanto a ela, descobriu que os novos hóspedes não podiam ter chegado em hora melhor. Suas histórias ajudaram a mitigar o efeito do silêncio de Kane. E qualquer coisa que pudesse manter sua mente longe dele e da cena da carruagem era um presente dos deuses.

— Os últimos dias de novembro vão ser muito agitados por aqui, quando os simpáticos fazendei­ros da vizinhança vêm à cidade — dizia a srta. Agatha. — Vocês ainda estarão por aqui?

Suzana balançou a cabeça.

— Não vamos ficar tanto tempo assim. Lançou um discreto olhar para Kane por sobre a mesa, mas ele continuava silencioso. Suzana iria devolver-lhe na mesma moeda.
CAPÍTULO NOVE

O relâmpago não foi somente no céu no­turno, mas na própria alma de Suzana.

As tentativas de ambos para lutarem contra a crescente e mútua atração que sentiam eram ab­solutamente inúteis, como tentar parar a chuva. Ela caía do céu do mesmo jeito que os beijos dele sobre seu rosto, enquanto Kane acariciava-lhe os olhos, a têmpora, passava a língua por sua orelha antes de retornar para a úmida promessa de seus lábios entreabertos.

Suzana derramou coração e alma em seu beijo, dizendo-lhe com seus lábios e mãos o que não podia dizer em palavras: ela o amava, ele era o único homem em sua vida e ninguém jamais havia feito com que se sentisse assim.

Kane escorregou a mão por suas costas, levan­tando o saiote de renda para tirá-lo do caminho. Fez isso devagar, sem apressar-se, parando para passear seus dedos pela pele sensível, um prazer enorme no simples ato de tocá-la.

Suzana, por seu lado, lutava com os botões da camisa dele. Escorregou os dedos sob o cós da calça para tentar abrir os botões dos suspensórios.

Para sua alegria, Kane deu um dos seus sorrisos marotos, dos quais tanto sentira falta nesses úl­timos dias.

Um trovão ecoou pelo quarto. Um relâmpago riscou o céu novamente, iluminando Kane em todo o seu esplendor, no momento em que ele tirava o short, ficando diante dela completamente nu.

Estendendo os braços para Suzana, murmurou seu nome.

Ela atirou-se feliz em seus braços. Correspondeu ao beijo dele com igual paixão. Ajudou-o com os botões e fitas de sua roupa. O quarto estava escuro quando guiou as grandes mãos de Kane para seus seios. Prendeu a respiração quando ele os circundou, esfregando os dedos sobre seus mamilos rosados.

Então seus lábios desceram para até eles para seduzi-la ainda mais, enquanto suas mãos tenta­vam desamarrar as tiras que seguravam o saiote. Assim que conseguiu, o algodão rendado caiu ao chão, deixando-a apenas de calcinha.

Os dedos de Suzana enterraram-se nos cabelos de Kane quando ondas de prazer percorreram-na, tão agudas quanto os relâmpagos que ziguezagueavam pelo céu, do lado de fora de sua janela.

Não agüentando mais, Suzana caiu de joelhos. Face à face com Kane, juntou seus lábios aos dele, se entregando completamente.

— Espere! — ele pediu, ofegante.

— O que foi?

— Nada. — Envolvendo o rosto dela com as mãos, beijou-a, tranqüilizando-a. — Tenho um preservativo na carteira.

Ele fez uma careta por causa da rudeza da declaração. Suzana sorriu.

— Então vá pegá-la.

Enquanto ele a procurava, Suzana moveu-se do chão para a cama, e aí tirou a calcinha para es­perar por ele. Um momento mais tarde ele voltou, os dedos tremendo enquanto tirava o preservativo do invólucro.

— Não há pressa — ela murmurou, sedutora. — Afinal, só esperamos cento e onze anos por isso...

— Divertindo-se com... meus brinquedos? — perguntou ele, numa voz sensual.

— Eu tenho muitos planos para eles, na verdade...

— E mesmo? E posso saber quais são?

— Não tenha dúvida de que vou mostrá-los to­dos para você.

Suzana tomou-lhe a mão, fazendo-a escorregar à volta de seus quadris até puxá-lo para si, de­vagar, mas sem pausas, até senti-lo dentro de si.

— Você é maravilhosa — murmurou ele em sua orelha.

Ela mordiscou-lhe o ombro a fim de pagar por essa leve brincadeira erótica.

— Pensando melhor, irresistível. — Kane mo­veu seu quadril contra o dela.

Suzana viu o brilho da paixão escurecer os olhos azuis, enquanto se apertava contra ele. Nenhuma palavra mais foi pronunciada, enquanto ela erguia os quadris e começava a roçar-se contra ele em um ritmo tão velho quanto o próprio tempo. Uma fogo crescia dentro dela, levando-a a uma queda de prazer sensual inigualável. Trêmulas e suadas ondas de êxtase atravessaram-na, e então foi enviada deste mundo para um outro.

Foi somente quando Kane percebeu o clímax de Suzana que se concentrou em sua própria sa­tisfação, gritando o nome dela quando juntaram-se na abençoada queda-livre.

— Valeu a pena esperar cento e onze anos — murmurou Suzana, sonhadora, algum tempo depois.

Vendo que Kane não respondia, ela ergueu-se sobre um cotovelo e estudou-lhe o rosto.

— No que está pensando?

— Nunca encontrei ninguém como você.

— E isso é bom ou mau?

Meigamente ele roçou a mão pelo braço nu. Le­vantando as duas mãos unidas, beijou os nós dos dedos dela com gentileza.

— E bom — murmurou. — Muito, muito bom. Ela sorriu, aliviada.

— Consigo pensar em uma coisa só que pudesse ser melhor.

— E o que seria? — A voz de Kane estava abafada.

— Ter um ar-condicionado. Apesar da tempes­tade, ainda está muito abafado.

E incrivelmente úmido. Um relâmpago ilumi­nou o quarto, distraindo Kane.

— Aí vem outra tempestade — afirmou ele.

— Aposto que sim — murmurou Suzana, con­seguindo finalmente respirar. — E está começan­do aqui mesmo.

Passou a mão sobre o peito de Kane, escorregando-a em volta dos mamilos que imediatamente se endureceram.

Intrigada, ela se perguntou se outras partes da anatomia dele também teriam respondido da mes­ma forma.

— Nem pense nisso — ele a ameaçou, apanhando-a em seus braços e levando-a para a cadeira de balanço perto da janela aberta.

Sentando-se, aninhou-a em seu colo de modo a fazer com que olhasse para ele. Suzana sentiu o desejo de Kane em toda a sua plenitude, muito próximo ao seu corpo.

— Você deixou seu brinquedo fora do lugar outra vez — desafiou-o, ao mesmo tempo que ele a deixava mais confortável, com as pernas nuas envolvendo-o, seus joelhos dobrados contra o espaldar da cadeira.

Outro relâmpago iluminou o caminho enquanto ela o guiava para si, segurando o ar quando ele a penetrou.

Trovões rolavam lá fora. Murmurando seu nome, Kane manteve os pés no chão, e vagarosa­mente começou a balançar a cadeira.

Os olhos de Suzana se encontraram com os dele em estranho prazer.

Atirando a cabeça para trás, ela agarrou-se a ele, os dedos se encurvando enquanto o êxtase interno continuava a crescer. Kane beijava apaixonadamen­te a pele aveludada, e quase ao mesmo tempo passava delicadamente a barba mal feita por seus om­bros, provocando gemidos de intenso prazer. Um novo trovão abafou grande parte do grito, no momento em que ela chegou ao clímax.

Sentindo-a apertar-se à sua volta, Kane ren­deu-se também, abraçando-a fortemente, deixan­do a explosão tomar conta de todo o seu ser.

Enrolando-a em um lençol, pegou-a no colo, a ca­beça de Suzana apoiando-se sobre seu ombro nu, e ficaram olhando a tormenta passar. Ela adormeceu sabendo dentro de seu coração que amava aquele homem e que o amaria para sempre.

— Tenho o pressentimento de que as coisas vão começar a andar muito rápido nesse caso — disse Oliver para Kane e Suzana quando eles foram, alguns dias depois, checar o seu progresso nas investigações.

— Ótimo. Agora temos duas pessoas tomando decisões baseadas em pressentimentos.

— Existem coisas piores — respondeu Suzana. Kane concordou e dirigiu-lhe outro de seus sorrisos.

— É, acho que sim,

Tinha medo de perguntar a Kane se agora acre­ditava nela, não desejando arruinar aquele mágico tempo que tinham juntos. Ele agira como se es­tivesse apaixonado, mostrando-lhe várias manei­ras de fazer amor, deliciando-a com sua meiga criatividade, passando seu tempo com ela e tro­cando confidencias.

Os dias corriam. Ela não queria que eles ter­minassem. Mas suas pílulas para o coração esta­vam acabando, só havia três mais. E eles haviam usado quase todos os preservativos, só restava um. Também o dinheiro estava acabando, disse-lhe Kane. Tinham muito pouco mesmo.

— Este caso acabou sendo o meu maior desafio — disse Oliver.

Kane sabia tudo sobre desafios. Desafio era se apaixonar pela mulher que seu irmão amava.

Suzana tinha evitado o piano por toda a sua estada na hospedaria, mas naquela tarde não con­seguiu mais resistir. A sra. Broadstreet dissera que todos os hóspedes estavam convidados a tocar. E Kane não estava ali. Ele recebera um bilhete havia duas horas, e depois disso disse a ela que tinha de sair. Suzana brincara, perguntando se a carta fora enviada por Polly. Kane a beijara com paixão, convencendo-a de que não tinha nenhuma energia extra para ninguém mais. Suzana começava a tocar uma canção quando o professor Hering entrou e gostou da idéia. Ele l tocava muito bem, e também as irmãs Abernathys se juntaram a eles, cantando as melodias da época. i Quando a sra. Broadstreet juntou sua voz de so­prano ao coro, Suzana sentiu um nó na garganta. Nessa época, a música era um esforço de grupo, sem a solidão dos fones de ouvido que separam as pessoas do resto da sociedade. Quando o pro­fessor iniciou uma robusta versão de Oh, Susanna! em sua homenagem, até Mickey estava pre­sente e resolveu participar.

Kane entrou quando eles terminavam o coral. Suzana pôde ver, pela expressão de seu rosto, que alguma coisa importante havia acontecido. Correndo para ele, perguntou:

— O que houve?

— Precisamos conversar, lá em cima. Concordando, ela se despediu do grupo. Apanhando a saia azul-clara em uma mão, cor­reu para cima.

— O que foi? O que aconteceu? — repetiu ela, no momento em que entraram no quarto.

Fechando a porta, Kane disse:

— Tenho novidades sobre o assassinato de Elsbeth. Nós acertamos na mosca!

— Verdade? Ele concordou.

— Aquele bilhete que recebi era de Oliver. Ele e a polícia foram à casa da sra. Hilton.

— E quem é a sra. Hilton?

— É a moça que vimos abraçada a Whitaker aquele dia. Depois que Oliver começou a investi­gar a morte do marido dela, uma empregada veio dizer que lembrava de um estranho cheiro de amêndoas no remédio que a sra. Hilton pediu que ela desse a ele. O médico declarou enfaticamente que o remédio que prescrevera não tinha esse per­fume, mas que o arsênico teria. Quando confron­tada, a sra. Hilton acabou confessando.

— Que matou Elsbeth?

— Bem, não. Não ainda. Mas é apenas questão de tempo. Por falar em tempo, precisamos voltar para nosso século. Melhor vestir suas roupas alu­gadas e juntar suas coisas para a viagem de volta — disse ele, enquanto se trocava rapidamente.

Que tristeza deixar aquele lugar mágico onde ha­viam se apaixonado. Ou seria apenas o local onde ela se apaixonara e ele apenas tinha feito sexo?

Pois, apesar de tudo o que haviam partilhado, ele não se declarara.

O sorriso de Suzana tornou-se um tanto agridoce ao perceber que expressara seu pensamento de maneira antiquada. Declarar-se... Aquele era um período em que os homens declaravam seu amor e cortejavam as mulheres.

Ela fizera o que Elsbeth desejara que fizesse: limpara seu nome da acusação de ter cometido suicídio. Se Suzana se apaixonara por Kane du­rante o caminho, não podia culpar ninguém além de si mesma.

Com relação a Eslbeth, Suzana ainda estava tendo dificuldade em aceitar a idéia de que a sra. Hilton fosse a culpada de sua morte. Silenciosa­mente pediu ao fantasma que confirmasse isso, mas teve a distinta impressão de que Elsbeth não sabia quem a empurrara da escada.

— Preciso ir ao escritório de Oliver — Kane estava dizendo — para ver se a sra. Hilton confessou a morte de Elsbeth. Devo voltar em uma hora.

— Vou com você.

— Não. Fique aqui. Vou me sentir melhor sa­bendo que você está em segurança. Além disso, precisa acertar nossa conta com a sra. Broadstreet e contar a ela que vamos embora hoje à noite. Vamos para casa.

Lá de baixo vinham os sons de vozes continuan­do a acompanhar os grandes sucessos de Foster, cantando Old folks at home.

Kane deu um beijo distraído no rosto de Suzana e saiu outra vez, apressado.

Ela afundou na cadeira de balanço, seus pen­samentos em turbilhão. Iam voltar para casa. Ela deveria estar contente. E estava. Mas também sentia-se triste. E apreensiva.

Não era como se estivessem saltando de um avião no aeroporto La Guardiã. E se Elsbeth não tivesse poder para devolvê-los para seu tempo? E se tivessem que ficar presos em Savannah no período vitoriano? E se aterrissassem em algum tem­po errado? Quando se viaja, várias vezes se perde uma conexão. Ou se a bagagem. Mas aterrissar vinte anos mais ou menos fora da base poderia ser desastroso, na situação deles.

Não levou muito tempo para ela apanhar suas coisas. Trocou a saia e a blusa pelo vestido de veludo cor de vinho que usara quando chegaram.

Depois de abotoar o vestido, automaticamente procurou pela sombrinha e pelo chapéu empres­tados, antes de tomar consciência de que, para onde estava indo, não iria necessitar deles. Le­vando-os para baixo, devolveu-os à sra. Broadstreet e deu-lhe a notícia de sua partida iminente.

— Sinto muito por não ter avisado antes — disse Suzana quando se sentavam num banco a um canto distante da sala. — Afinal, acabei não conhecendo sua cozinha, mas tenho a certeza de que é encan­tadora. E, por favor, agradeça à cozinheira por me ter dado a receita do peru cozido com molho de ostras. O modo como o preparou era especial.

— Mas por que vocês estão saindo com tanta pres­sa? E tão tarde... Vai estar escuro antes que per­cebam. O tempo lá fora esteve muito incerto hoje.

— Estamos indo para casa — disse Suzana.

— De volta para a França? Mas não há nenhum barco saindo de Savannah a essa hora.

— Kane fez alguns arranjos especiais. Nós re­cebemos um aviso e precisamos sair agora mesmo.

— Vou sentir sua falta — disse a sra. Broadstreet. Suzana abraçou a senhora antes de lhe devolver a sombrinha e o chapéu.

— Gostaria que a senhora ficasse com minhas botas também. Sei que usamos o mesmo número.

— Mas você acabou de comprá-las... — protes­tou a sra. Broadstreet.

— Eu sei. Mas não posso usá-las em casa. — Na verdade, poderia, sim. Mas tinha medo usar qualquer coisa desse tempo pudesse impedi-los de saltar de volta para o século vinte. — Mas gostaria que a senhora ficasse com elas como um sinal de minha gratidão por tudo o que fez por nós durante nossa estada aqui.

A sra. Broadstreet esticou os braços e, um se­gundo mais tarde, as duas mulheres se abraçavam soluçando.

— O que está acontecendo aqui? — inquiriu o professor Hering.

— A sra. Wilder está nos deixando — disse a sra. Broadstreet, enxugando o canto dos olhos com o avental.

Em seguida Suzana despediu-se das irmãs Abernathys, do professor Hering e, naturalmente, de Mickey.

— Eu nunca vou esquecer de você — disse ele, mostrando um momento de afeição ao dar-lhe um rápido e orgulhoso abraço enquanto murmurava no ouvido de Suzana: — E não vou contar a nin­guém sobre o cartão mágico de seu marido, que eu vi. E também não vou mais roubar carteiras. Sentirei saudade de você — concluiu com a voz embargada, antes de correr para fora da sala.

— Também vou sentir saudade de você, Mickey — murmurou Suzana.

Ia sentir falta de todos eles. Piscou, afastando as lágrimas. Ia sentir saudade da sra. Broadstreet e de Mickey, mais que tudo.

— O que você quer dizer com isso? Que houve uma complicação? — perguntou Kane ao chegar ao escritório de Oliver.

— Não há motivo para gritar, meu rapaz. Ainda não perdi minha audição.

— Perdeu só a memória. A sra. Hilton confessou que matou a sra. Elsbeth — lembrou-o Kane.

— Na verdade, ela confessou que matou o ma­rido, se lembrar bem.

— E o que aconteceu depois que eu saí?

— Bem, você se lembra de como pensávamos que as coisas haviam acontecido. Tínhamos um álibi para o sr. Hayward Whitaker.

Kane concordou, impaciente.

— Ele estava na sala quando Elsbeth morreu, com uma empregada que fora chamada para acen­der a lareira. A criada jura que estava com Whi­taker quando ouviram o som de Elsbeth gritando e caindo pela escada. A sra. Hilton deveria estar ainda na casa, mas não temos nenhuma testemu­nha afirmando onde ela estava naquele momento.

— Correto. E agora, o que aconteceu? A em­pregada contou outra história? Teria sido Whita­ker quem fez aquilo?

— Não, a empregada não mudou sua história. Mas acrescentou algo muito importante.

— O que foi?

— Quando repetimos os fatos, desta vez ela

mencionou, sem perceber, que o assistente do escritório do sr. Whitaker tinha estado ali mais cedo por algum tempo para levar papéis para o patrão.

— Gordon Stevens?

— Isso mesmo.

Kane gelou ao lembrar de Suzana lhe dizendo para não se esquecer que havia três suspeitos. "Ele podia ter uma perigosa obsessão por ela. Isso acontece. Homens que parecem normais, calmos, imaginam uma vida fantasiosa que não tem nada a ver com a realidade."

— E o que diz Gordon Stevens sobre isso? — perguntou Kane.

— Esse é o problema. Ele desapareceu.

— Desapareceu?

— Isso mesmo. E tem mais, o sr. Whitaker disse que os papéis que Gordon Stevens lhe entregou naquele dia não eram tão importantes assim para que o assistente fosse especialmente levá-los até sua casa numa tarde de domingo.

Kane praguejou baixinho.

— E Gordon sabe que estamos atrás dele?

— Perdão?

— Gordon Stevens. Ele sabe alguma coisa de nossas suspeitas? Sabe que estamos procurando por ele?

— Não posso lhe afirmar com certeza, mas deduzo que sim, julgando por seu recente desaparecimento.

— Preciso voltar para a hospedaria.

— Vou com você — disse Oliver. — Talvez sua mulher possa ter alguma premonição sobre essa situação. Ela parece possuir um sexto sentido mui­to aguçado. Nunca acreditou que a sra. Hilton fosse culpada.

— Eu sei. Então vamos, apresse-se. Não me sinto à vontade com Suzana lá e esse biruta à solta.

— Biruta?

— Maníaco, louco. Vamos, vamos embora. Kane quase correu de volta à hospedaria so­mente para descobrir que Suzana saíra.

— Saiu? Mas como? — perguntou Kane à es­pantada sra. Broadstreet. — Para onde foi ela?

— Não me disse. Eu queria que ela levasse Mickey junto, e o professor se ofereceu para acom­panhá-la, mas recusou a companhia de ambos. Saiu logo depois do jantar. Aliás, foi assim que recebeu o bilhete.

Kane saltou diante da pequena informação.

— Bilhete? Que bilhete?

— O que lhe enviaram.

— Quem o mandou?

— Certamente eu não sei.

— Eu sei — disse Mickey, do degrau da escada.

— O que está fazendo aí, fora da cama a essa hora? — admoestou-o a sra. Broadstreet.

— O que o faz pensar que sabe aonde a sra. Wilder foi? — perguntou Oliver ao garoto.

— Eu vi o bilhete, por isso sei.

— Mickey, você sabe ler? — disse a sra. Broads­treet, assombrada.

— Eu o estou ensinando — disse Oliver.

— E o senhor é... — perguntou a sra. Broadstreet.

— Oliver Ogilvie, às suas ordens, senhora.

— Podemos deixar as amabilidades para depois — disse Kane, impaciente. — Aonde foi ela? — perguntou a Mickey.

— Para a ponte.

— Que ponte? — Não sei. Mas acho que ajudaria se eu mostrasse o bilhete, não é? — perguntou o garoto.

Kane tomou-o da mão do menino antes de aper­tar seu ombro num sinal de agradecimento.

— Obrigado, filho. Você ajudou muito.

— Obrigado — disse Mickey, radiante. — Então eu posso ir junto e salvá-la com vocês?

Houve um momento de silêncio enquanto Kane rapidamente lia o bilhete, o qual teria sido su­postamente enviado a seu pedido, e dizia lugar e hora para encontrá-lo.

— Não, você não pode vir conosco — respondeu ele, finalmente. Vendo a expressão desapontada do garoto, acrescentou: — Oliver e eu precisamos que fique aqui para proteger a sra. Broadstreet e para ver se Suzana volta para cá.

— Oh, Deus! — exclamou a sra. Broadstreet. — Você não pensa que estamos em perigo, pensa? Esse bilhete poderia ter vindo dos bandidos que roubaram suas malas? Será?

A expressão de Kane se obscureceu.— Tenho uma suspeita de quem o escreveu, e não pretendo deixá-lo escapar assim.

— Bem, então chame uma carruagem imedia­tamente! — disse Oliver, colocando o chapéu e inclinando-se para a sra. Broadstreet. — Espero encontrá-la novamente em circunstâncias mais auspiciosas. Boa noite, senhora.

Kane já estava lá fora, na esquina, colocando dois dedos na boca e soltando um assobio agudo, que sempre funcionava quando estava em Manhattan. Esperava que também servisse para ar­ranjar uma carruagem ali.

Quando sentiu uma mão em seu ombro, pensou que fosse Oliver se juntando a ele. Em vez disso, viu ser um dos homens com quem estivera jogando pôquer na primeira noite, J. P Bellows.

— Vou tomar esse seu relógio agora — disse J. P.

— Do que é que você está falando?

— Ah, querendo brigar, é? Pensei que você fosse querer, mesmo. Por isso trouxe comigo um pouco de músculos para convencê-lo.

O homem do lado dele parecia ter quase dois metros de altura e quase a mesma largura.

— O que está acontecendo aqui? — perguntou Oliver, chegando, finalmente.

— Vamos pegá-lo — ordenou J. P.

Kane não pôde acreditar no que estava acon­tecendo. Sua raiva contra Gordon Stevens ex­plodiu contra J. P. e seu capanga. Eles estavam no seu caminho. Esperando até o último minuto para sair do caminho do gigante, Kane esticou o braço para o pescoço do homem. Um segundo depois, seu adversário estava dobrado no chão da calçada.

Enquanto isso, Oliver se encontrava no meio de uma antiquada luta de boxe com J. P. Um forte soco de direita no queixo do adversário, e J. P. juntou-se ao capanga, bem na hora em que finalmente uma carruagem se aproximava.

— Vá em frente! — disse Oliver para Kane. — Vou esperar as autoridades chegarem e entregar-lhes esses rufiões. Em seguida me encontro com você na ponte. Vá, antes que seja tarde demais.

Suzana aproximou-se do local deserto com al­guma ansiedade. Não era muito amiga de alturas. A última vez que estivera em uma ponte fora quando um casal de amigos quisera que os fil­masse saltando com um elástico enorme. Ela apontara a câmara para baixo e olhara para o outro lado.

Ouviu um ruído à sua frente. Tentando enxer­gar através da neblina pesada, perguntou:

— Kane, é você?

Um homem materializou-se a apenas meio me­tro dela. Não era Kane. Era Gordon Stevens.

— Seu marido não virá, sra. Wilder — disse ele. ― A senhora não vai vê-lo... nem a mais ninguém.


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