A dama do tempo a wife in Time Cathie Linz desejo 77 como num passe de mágica, eles viveram uma inacreditável paixãO!



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CAPÍTULO DEZ

Não vou ver mais ninguém? — repetiu Suzana, confusa. — Porque a neblina está muito forte?

— Não, quero dizer que a senhora não vai mais ver ninguém porque tem se intrometido em as­suntos que não são da sua conta.

O coração de Suzana deu um salto, e os cabelos em sua nuca se eriçaram, como sempre acontecia diante de um perigo.

— De que está falando?

— Não me faça de bobo. Isso foi o que ela fez.

— Quem?

— Elsbeth. Mas a senhora já sabe disso. Sabia que eu tinha que empurrá-la para baixo da escada.



— Você!

— Ela riu de mim, sabe? Eu a amava e ela riu de mim. A senhora compreende por que eu tive que fazer o que fiz.

Suzana rapidamente concordou com ele.

— Oh, eu compreendo.

O que ela compreendeu foi que tinha que fugir dali, e rápido.

Afastou-se Gordon, mas ele esticou um braço e segurou-a com um doloroso aperto.

— Não estava pensando em ir para algum lugar, não é, sra. Wilder? — perguntou ele com uma voz cordial. — Porque eu não poderia permitir isso. A senhora sabe demais.

— Não, eu não sei. Não sabia que tinha sido você...

— Não? Mas que pena. Porque agora a senhora sabe, e isso a torna perigosa. — Agarrando-lhe o braço, começou a arrastá-la em direção ao parapeito.

— Pelo menos me diga por que fez aquilo — disse Suzana, tentando ganhar tempo. Usando a mão livre, enfiou-a dentro da bolsa, procurando alguma coisa para bater nele ou para distraí-lo.

— Ela não me amava. Não quis me amar.

— Então você a matou?

Os dedos dela se fecharam à volta de suas cha­ves. Lembrou-se do curso de autodefesa que fizera na Associação Cristã de Moças, onde lhe ensina­ram a usá-las para acertar os olhos de seu ata­cante. Mas primeiro tinha que tirá-las de dentro da bolsa sem que ele visse.

— É isso aí. Se eu não podia tê-la, então nin­guém a teria.

Estavam quase no parapeito da ponte.

— E o que vai fazer agora? — perguntou ela, o medo em sua voz.

— O que é que a senhora acha, sra. Wilder? Se é que esse é o seu verdadeiro nome.

— O que quer dizer?

— Quero dizer que o sr. Whitaker me fez tele-grafar para sua suposta amiga Althea Hall, de Nova York, e ela respondeu esta manhã dizendo que nunca ouvira falar de nenhum dos dois. Tam­bém telegrafamos para o joalheiro que a senhora disse ter feito uma cópia do colar. E ele também afirmou jamais ter conhecido nenhum dos dois. Por isso, seria melhor que me dissesse agora: quem é a senhora?

— Uma amiga de Elsbeth. — Suzana sentiu a presença dela à sua volta no meio da neblina. — Ela me trouxe aqui para descobrir o mistério de sua morte.

— Do que está falando?

— Eu não sou amiga de Althea Hall. Sou sua bisneta.

— Impossível!

— Não com a ajuda de um fantasma. O fan­tasma de Elsbeth. Ela está aqui agora.

Espantado, Gordon soltou-lhe o braço sem que­rer. Vendo aí sua chance, Suzana agarrou o cha­veiro, ligando inadvertidamente o alarme. O som agudo percorreu a noite.

Kane ouviu o barulho e o reconheceu.

— Suzana! — gritou na escuridão. — Onde está você?

A neblina deslocou o barulho, dando-lhe uma falsa direção.

Ele gritou o nome dela outra vez.

— Aqui! Kane, estou aqui! Socorro!

A luta de Suzana com Gordon foi atrapalhada pelo fato de ele ter ouvido o alarme silenciar. A princípio ele saiu da sua frente para cobrir os ouvidos. Solta, Suzana se virará para correr, mas tropeçou na barra do vestido de veludo.

Gordon segurou-a novamente e isso impediu-a de cair, mas agora o aperto estava cada vez mais forte em seu braço enquanto ele a arrastava para o balaústre mais uma vez, pisando sobre o alarme ao fazer isso. Quando este não parou de fazer barulho, Stevens chutou-o para fora da ponte. O som estancou repentinamente quando o aparelho alcançou a água. Ele arrancou a bolsa do ombro de Suzana e a atirou no rio.

— Você é a próxima — disse ele.

— Kane! — gritou Suzana, resistindo.

E então Kane chegou. Vindo do meio da neblina como um herói legendário, seu grito de fúria era como o antigo brado de guerra dos vikings. Foi direto para cima de Gordon, atingindo-o nas costas com seus ombros, exatamente sobre os rins.

Por um perigoso segundo Suzana bateu com os dentes sobre a borda do parapeito. Sentiu-se cain­do, seu olhar horrorizado dirigido para a escuridão lá embaixo, antes que uma mão a agarrasse e a puxasse de volta para a segurança.

Era Kane. Ela o agarrou enquanto ele rapida­mente a abraçava. Olhando por sobre os ombros, ela gritou:

— Cuidado, Gordon tem uma faca! Empurrando-a para um lado, Kane rodopiou e

abaixou-se, enquanto Gordon cortava o ar em vez de sua carne.

— Qual é o problema, Gordo? — Kane brincou, as mãos erguidas. — Sentindo calor? Começando a se apavorar, hein?

Gordon atacou de novo, desta vez chegando mais perto do que Kane gostaria. Raios, onde es­tava Oliver?!

— Então, por que fez aquilo, Gordo? Por que empurrou a pobre Elsbeth da escada?

— Já lhe disse.

— Para mim, não. Você não me disse nada. Deve ter falado para outra pessoa. Já está ficando confuso, Gordo. Isso tem acontecido muitas vezes, ultimamente? Aposto que sim. Porque você real­mente está perto do fim, ouviu, Gordo?

— Pare de me chamar assim! — berrou Gordon, o rosto rubro. Ele novamente atacou com a faca, dessa vez errando de longe.

— Você já mostra como está exausto. Talvez eles não sejam tão ruins para você. Afinal, não está bom da cabeça. Foi por esse motivo que fez aquilo?

— Eu matei Elsbeth porque a amava! — gritou Gordon. — E não vou para a cadeia por isso.

— Ouviu isso, Oliver? — gritou Kane para a neblina, rezando para que o detetive tivesse che­gado àquela altura.

Suzana estava logo atrás, ele podia vê-la tremendo.

— Não vou cair nesse velho truque — caçoou Gordon.

— Eu ouvi — confirmou Oliver de dentro da ne­blina. — Faria melhor se entregando, sr. Stevens — disse o detetive, a voz se aproximando a cada segundo. — As autoridades serão mais favoráveis se fizer isso. O senhor conhece a lei, sr. Stevens.

Virando-se para Suzana, Gordon gritou:

— Isso é tudo culpa sua! E por culpa sua que estou nessa confusão.

Rápido como um raio, correu para ela, a faca levantada.

Kane arrancou a faca da mão do jovem advogado, mas não conseguiu impedi-lo de agarrar Suzana.

— Solte a moça! — grunhiu Kane.

Gordon tinha um brilho diabólico no olhar quan­do berrou com voz aguda: . — Eu não vou para a prisão!

— Você não tem muita escolha — disse Oliver, aproximando-se de Kane.

O coração dele estava na garganta. Não podia forçar Gordon agora; o homem estava acuado no topo do parapeito, e agarrava o braço de Suzana. Se caísse ou pulasse, a levaria com ele.

— Eu tenho uma escolha! — Gordon gritou para eles. — E vou usá-la. Não vou para a prisão. Pre­firo acabar com minha vida no rio.

— Para mim está bem — disse Kane, tranqüi­lamente. — Mas não vai levar Suzana com você.

— Não pode me impedir. — Olhando para a ne­blina, Gordon repentinamente engasgou. — Elsbeth!

Kane viu aí sua chance. Saltando para a frente, agarrou o outro braço de Suzana, soltando-a do aperto de Gordon justo quando o jovem advogado escorregava e despencava dentro do rio Savannah.

— Está tudo bem — murmurou Kane suave­mente, balançando Suzana em seus braços.

— Ele ia me matar — ela disse, a voz tremendo tanto quanto ela.

Os ecos da violência e do medo pelos quais aca­bara de passar ainda ressoavam dentro dela en­quanto sua mente repassava tudo o que sucedera havia pouco.

A distância, ela estava vagamente consciente de que via Oliver falando com oficiais uniformizados. A polícia. Mas preferiu manter sua atenção em Kane, no calor de seus lábios roçando sua têmpora enquanto ele murmurava palavras tranqüilizadoras. Quando finalmente ergueu a cabeça dos ombros dele, a primeira coisa que viu foi que a forte ne­blina estava se dissolvendo com rapidez misterio­sa e sobrenatural, o que levou-a a pensar se tudo não fora obra de Elsbeth.

— A neblina está se esvaindo — disse ela.

— Tem certeza de que está bem? — Kane per­guntou outra vez.

Ela acenou que sim.

— Ele jogou minha bolsa no rio — reclamou, com tristeza.

— Eu sei. Não tem importância — murmurou Kane, calmamente, passando a mão por sua face.

Vendo Oliver aproximar-se, Kane deu-lhe um gentil apertão no ombro para alertá-la.

— Boas novas. Antes de tudo, deixe-me dizer que estou muitíssimo aliviado por ver que a se­nhora está bem, sra. Wilder — disse Oliver.

— Acho que, depois de tudo o que passamos, você pode me chamar de Suzana — replicou ela.

— Claro, bem... Um dos oficiais da polícia en­controu sua bolsa enroscada em um dos suportes da ponte, e nós conseguimos recuperá-la.

— Graças a Deus! — Ela pegou a bolsa e a apertou contra o corpo. Olhando para baixo e vendo a man­cha suja que ela fizera em sua roupa, suspirou. — Este vestido não vai se recuperar nunca mais.

— Consegui uma carruagem que pode levá-los de volta à hospedaria — disse Oliver. — Vou ape­nas avisar a polícia que já vão.

Depois que ele os deixou, Suzana deu alguns passos e tropeçou em alguma coisa.

— O que é isso?

Olhando para o chão, viu o brilho de suas cha­ves. Rapidamente abaixou-se para apanhá-las. O alarme devia ter escapado do chaveiro quando Gordon pisou sobre ele. Ela agarrou o molho, o metal machucando-lhe a palma da mão.

Kane gentilmente colocou um braço à volta de seus ombros.

— Vamos. Você conseguiu sua bolsa e suas cha­ves. E o mais importante, sua vida. Vou levá-la de volta à hospedaria.

— Não — Suzana levantou a cabeça como se es­cutasse algo. — Não, temos que ir à casa de Whitaker.

— A essa hora da noite? — perguntou Oliver, que acabara de chegar e a ouvira. — Para que? Posso lhe assegurar que o sr. Whitaker não sabia nada das atividades de seu assistente, tanto aqui esta noite, como na noite da morte de Elsbeth.

— Você descobriu quem ia encontrar-se com Whitaker no cemitério, aquela noite?

Oliver acenou que sim.

— Descobri, sim. Um detetive particular. Parece que o sr. Whitaker estava tendo algumas dúvidas sobre a sra. Hilton. Como você, ele também pensou que ela poderia ter cometido aquele crime.

— Nunca acreditei que ela tivesse feito aquilo — negou Suzana. — Tive o pressentimento.

— O mesmo que está tendo agora, sobre irmos à casa de Whitaker? — perguntou Kane.

Ela concordou. Sentia a presença de Elsbeth muito forte. E com ela vinha uma certeza de que tinha que ser agora ou nunca, se desejassem voltar para casa outra vez.

— Aprendi a acreditar na sua intuição — disse-lhe Kane.

Isso foi novidade para Suzana.

— Verdade?

Ele confirmou. Virando-se para Oliver, disse:

— Vamos precisar de seu auxílio. Acha que pode nos ajudar a entrar hoje na casa de Whitaker?

— Acredito que ele esteja ainda na estação de polícia fazendo seu depoimento.

— Não precisamos falar com ele.

— Então para que precisam entrar em sua casa?

— E uma longa história. Vamos contá-la na carruagem indo para lá.

Uma vez seguros dentro da carruagem, Oliver perguntou:

— Isso tem alguma coisa a ver com vocês terem vindo da... França?

— Não somos da França. Somos do futuro. O fantasma de Elsbeth Whitaker nos trouxe de volta no tempo para descobrirmos o mistério de sua morte — desfiou Kane, abruptamente.

Oliver recebeu a notícia com tranqüilidade.

— Preciso dizer-lhe que está reagindo a tudo isso com muita calma — notou Kane.

— Eu tinha minhas suspeitas de que mais do que um oceano separavam vocês dois de todo o resto de nós — respondeu Oliver, secamente. — E aquele seu relógio, Kane. Se aquilo não veio do futuro, então não sei o que viria.

— Eu lhe disse para não usar o relógio — lembrou Suzana. — Estava na cara que ia nos causar problemas, mais cedo ou mais tarde.

— Ele nos pôs em sérias dificuldades esta noite. Parece que um dos amigos de pôquer de seu ma­rido resolveu querer o relógio para si. Contratou um capanga para acompanhá-lo em uma tocaia, enquanto Kane e eu tentávamos arranjar uma carruagem para irmos à sua procura.

— Você se machucou? — Suzana perguntou a Kane imediatamente.

— Não. Foi apenas um aborrecimento.

— Se você tivesse chegado um segundo mais tarde... — A voz de Suzana desapareceu com um súbito arrepio correndo por seu corpo.

Dirigindo um olhar impaciente a Oliver, Kane abraçou-a com carinho.

— Mas nós chegamos em tempo. E vamos che­gar à casa de Whitaker em tempo, também.

— Em tempo para quê? — perguntou Oliver.

— Para voltarmos para o tempo de onde viemos

— retrucou Kane.

— Isso é realmente espantoso. Então as pessoas da sua época viajam pelos séculos como se esti­vessem visitando uma cidade vizinha?

— Não, eu não diria isso — afirmou Kane.

— Então ainda é uma pesquisa? Talvez vocês sejam cientistas.

— Não, nós absolutamente não somos cientistas

— respondeu Suzana. — Meu nome é Suzana Hall e sou parente de uma amiga de Elsbeth.

— Althea Hall. Sim, soube que o sr. Whitaker mandou telegrafar para ela, que nunca ouviu falar de vocês. Agora tudo faz sentido, é claro. Mas na hora eu não pude entender como você podia ter obtido uma réplica tão exata do famoso colar.

— Eu o herdei — explicou Suzana.

Oliver acenou, como se tivesse colocado outra peça em um complicado quebra-cabeça.

— Ainda precisamos de um plano para entrar na casa de Whitaker — lembrou Kane. — Al­guma idéia?

Oliver concordou, sua atenção voltando ao as­sunto do momento.

— Seria melhor se fôssemos pela porta dos fundos. Acabei conhecendo a cozinheira muito bem durante minhas investigações. Vou tentar distraí-la enquan­to vocês dois tratam de entrar na casa. Se bem me lembro, a porta de trás abre para fora, o que vai facilitar para se esconderem atrás dela.

— Para mim parece um bom plano.

— Ótimo.

— Então acho que agora é adeus — disse Kane quando a carruagem parou ao lado da casa.

— Não poderemos nunca retribuir toda a sua aju­da -— disse Suzana, dando um abraço no detetive.

— Ela está certa. Nós lhe devemos muito. — Kane sacudiu a mão de Oliver, colocando nela todo o dinheiro do século dezenove que ainda lhe restava. — Isso não é suficiente, eu sei. Mas não consigo pensar em alguma maneira de lhe retri­buir... Espere um minuto! Claro, posso, sim! Se você estiver interessado em fazer alguns investi­mentos, eu lhe recomendo prestar atenção nas in­venções de Thomas Edison e Henry Ford.

— E não esqueça de Alexander Graham Bell — informou Suzana ao ser ajudada por Kane a descer da carruagem.

— Quer dizer que aquela idéia de telefone vai funcionar de verdade? — perguntou Oliver.

— E como!

— Eu me pergunto o que mais está guardado para os próximos cem anos — murmurou o detetive.

Suzana ficou junto a Kane atrás da porta en­quanto Oliver calmamente levava a cozinheira para fora para ver uma suposta pegada perto do jardim. O luar iluminava o caminho para Kane e Suzana quando passaram escondidos pela porta e entraram na cozinha. Não haviam estado nessa parte da casa ainda, que lhes era totalmente estranha.

Kane abriu uma porta apenas para descobrir que levava ao pátio.

— Vamos — murmurou, pegando a mão dela e puxando-a atrás de si. — Temos que subir, antes que nos encontrem aqui.

— Espere — disse ela. — Acho que esta outra porta leva do pátio para a sala de jantar, e então para o salão. Uma vez ali, sabemos onde a escada está, lembra-se?

Kane foi na frente enquanto eles se apressavam pelas salas vazias e subiam a escada. Quanto mais se aproximavam do terceiro andar, mais tomava conta de Suzana aquele mágico pressentimento.

Como da primeira vez, sentiu-se puxada para a frente. Desde que chegaram ao terceiro andar, ela pôde ver a luz que piscava no candelabro.

— Vamos — disse Suzana.

Quando ela e Kane entraram na sala, o candelabro estava coberto com uma etérea luz azul. No meio do brilho, ela pôde ver claramente uma mu­lher parada em pé.

Elsbeth! Ela não tinha mais aqueles olhos tris­tes retratados pelo pintor; sorria gentilmente, e sua expressão era de quem finalmente estava em paz. Moveu os lábios e emitiu a mensagem: "Muito obrigada", e estendeu a mão.

Como antes, Suzana foi atraída para a visão, chegando mais perto, mais perto... quase tocando a mão esticada de Elsbeth, ao passo que o brilho aumentava, quase cegando-a.

Então, abruptamente, o quarto ficou totalmente escuro, e o silêncio foi quebrado por um ruído de algo caindo e por um grito de mulher.

CAPÍTULO ONZE

Suzana! Gritando o nome dela, Kane apanhou no bolso uma caixa de fósforos. Riscando um e segurando-o aceso, viu que o quarto não estava mais mobiliado. Haviam arrancado o papel das paredes, e agora estava repleto de material de construção.

— Suzana, onde está você?

— Aqui.


Aliviado por vê-la, Kane deixou o fósforo apa­gar-se e tomou-a em seus braços.

— Você está bem?

— Estou, sim. — A voz dela estava trêmula, mas o abraço era apertado. Estavam de volta. Ti­nham conseguido.

— O que aconteceu? — perguntou Kane.

— Pisei em um balde vazio com um pincel dentro.

— Fez barulho bastante para acordar os mortos.

— Você a viu? Elsbeth estava aqui.

Kane não respondeu; em vez disso, soltou-a.

— Vamos, vamos sair daqui.

Acendeu outro fósforo e guiou-a através do amontoado de coisas guardadas no quarto.

Quando atravessou a soleira da porta, Suzana notou:

— Veja, o espelho se foi. — E apontou para a janela do terceiro andar.

Haviam chegado ao topo da escada quando uma guia turística os encontrou.

— Pensei ter ouvido um barulho aqui. Esta área fica fora dos limites para visitantes — disse ela em tom desaprovador. — A maioria das pessoas da festa dos editores já se foi. Estamos fechando.

— Que dia é hoje? — perguntou Kane.

— É a noite de quarta-feira, embora logo será meia-noite; portanto quinta-feira.

Kane e Suzana trocaram um olhar ao percebe­rem ao mesmo tempo que, embora tivessem estado por duas semanas no passado, ali ainda era a mesma noite em que haviam partido, apenas al­gumas horas mais tarde. Mas como podia ser isso?

— Preciso mesmo pedir a vocês que saiam. Es­tamos fechando agora — lembrou a guia.

— Só uma coisa antes de partirmos — pediu Suzana. — A senhora poderia dizer alguma coisa sobre a mulher desse retrato?

A esse pedido, a guia derreteu-se.

— O nome dela era Elsbeth Whitaker e tem uma história trágica. Foi assassinada por um admirador, o assistente de seu marido, que mais tarde matou-se ao ter uma crise de arrependimento. Ele atirou-se de uma ponte e morreu no rio Savannah.

Suzana teve uma estranha e triste sensação de conclusão. Sua missão tivera sucesso. Haviam lim­pado a mácula de suicida do nome de Elsbeth e mudaram um pouco a história.

Vendo seu interesse, a guia continuou:

— O mistério foi resolvido por Oliver Ogilvie, o mais famoso detetive de Savannah. O sr. Ogilvie enriqueceu devido a seus sábios investimentos nas novas tecnologias da época. Seu filho adotivo, Michael, seguiu adiante e tornou-se um famoso ci­dadão. Foi chefe de polícia durante a maior parte de sua vida. Sua família ainda continua firme nas atividades cívicas daqui.

Suzana e Kane entreolharam-se e disseram em uníssono:

— Mickey!

— Perdão? — indagou a guia.

— Nada — respondeu Suzana, rapidamente. — Muito obrigada por contar-nos a história de Elsbeth.

— Infelizmente — continuou a guia —, o período vitoriano não foi muito interessante na história de Savannah. Na verdade, foi um tempo até que bastante aborrecido.

— Oh, eu não diria isso — murmurou Suzana. — Não diria mesmo!

Kane e Suzana saíram da mansão Whitaker e foram imediatamente apanhados pelo calor e pelo barulho. O parque do outro lado da rua era muito mais iluminado do que fora no século passado. E carros passavam em ruas asfaltadas. Aquela hora da noite o tráfego não estava pesado, mas, após tanto tempo longe dos automóveis, repararam imediatamente no cheiro da gasolina.

As poucas lojas que ainda funcionavam tinham grossas barras de segurança nas janelas. Um sem-teto dormia em uma soleira ali perto.

Kane não disse nenhuma palavra, e rapidamen­te pegou um táxi que passava por ali.

— Para onde? — perguntou o motorista quando Kane entrou.

Ele deu o nome do hotel.

— Em que hotel você está? — perguntou a Suzana. O fato de ele nem sequer saber em que hotel ela estava fez Suzana perceber o pouco que Kane sabia sobre si.

— Estou no mesmo hotel que você — replicou, calmamente.

Ela podia senti-lo se afastando mais e mais du­rante o tenso passeio de carro até o hotel, não tocando-a nem falando nada.

Isso não era um bom sinal, pensou ela, tentando não entrar em pânico. E não havia previsto essa reação. Normalmente seus instintos eram bons em avisá-la sobre problemas à vista.

Mas com Kane eles pareciam não funcionar.

Tudo o que sabia era que havia um definitivo mal-estar da parte de Kane enquanto voltavam para o hotel. Ao chegarem, Kane pagou o táxi.

Sem olhar para ela, disse, rápido:

— Até amanhã.

Em pé no saguão do belo hotel com ar-condicionado, Suzana viu-o afastar-se e foi envolvida por um terrível sentimento de perda. Dizendo a si mesma que não podia ser tão sensível assim, dirigiu-se para os elevadores. Ele ali estava, es­perando ainda por um. Mas, mais uma vez, não disse nada. O silêncio ameaçava sufocá-la.

— Você está bem? — ela finalmente perguntou.

— Não sei como responder a essa pergunta — replicou ele, sem olhá-la.

Ela quase pôde ouvir o suspiro de alívio dele quando o elevador finalmente chegou. Kane não podia esperar mais para ver-se livre dela. Entrou logo no elevador. Ela não.

Vendo o olhar impaciente que ele lhe dirigiu, ela murmurou, insegura:

— Vá na frente. Eu pego o próximo.

— Olha, foi apenas uma droga de uns poucos dias, ou horas — disse Kane abruptamente. — Acho que ambos precisamos de algum tempo para nos ajustarmos.

Um segundo após, a porta de metal se fechou, mas a fenda em seu coração abriu-se completamente.

"Tempo para nós mesmos. Para nos ajustar­mos." As palavras de Kane ficavam se repetindo sem parar nos ouvidos de Suzana. Ela se sentou na beira da cama no hotel, as lágrimas rolando enquanto se despia. Estivera certa. A roupa não se recobraria das aventuras por que passara. Nem ela, tampouco.

Não imaginara que fosse possível sentir uma dor tão profunda. Limpando as lágrimas com as costas das mãos, perguntava-se se a dor era maior pelo fato de não ter percebido que a desilusão viria e, portanto, não ter se preparado para ela. Quando ambos haviam chegado de volta a seu próprio tempo e Kane a tomara em seus braços, estivera tão certa de que as coisas iriam funcionar bem para eles. Em vez disso, tudo se embaralhara exatamente quando ela pensou que havia encontrado a felicidade. Mas parecia que esta continua­va fora de seu alcance.

Como um autômato, aprontou-se para dormir. Es­tava exausta. Kane estivera certo sobre uma coisa: fora mesmo uma droga de uns poucos dias, ou horas, dependendo do tempo em que estivessem. De qual­quer maneira, ela passara por coisas demais.

Seu corpo estava pronto para dormir, mas sua mente se recusava a fechar-se, tentando ver algum sentido no que acontecera, remoendo as conflitan­tes impressões que recebera de Kane. Lembrava sua meiguice quando fazia amor com ela, o modo como fora atrás dela na ponte aquela noite, ar­riscando a própria vida para salvar a dela. Fe­chando os olhos, sentiu a intensidade do abraço dele quando a carregara no colo, a gentileza com a qual tirava os cabelos de seu rosto. Esses não eram atos de um homem que não se importava. E depois havia sua preocupação com a segurança dela menos de duas horas atrás quando o quarto da mansão dos Whitaker ficara escuro e ele acen­dera um fósforo para enxergá-la.

E ela? Iria ficar ali sentada como uma menina de escola e se queixar da sorte? Ou ergueria a cabeça e faria alguma coisa sobre a situação? Porque al­guma coisa definitivamente não fazia sentido ali.

Acendendo a luz outra vez, sentou-se na cama e disse:

— Oh, céus, o que é que eu tenho a perder?

Kane estava decidido a ignorar a batida em sua porta. Olhando para o relógio, viu que eram quase duas horas da manhã. Não pedira nada ao serviço do hotel e certamente não esperava companhia. Olhar o relógio fê-lo lembrar de Oliver e o resto das pessoas do século passado que conhecera.

"Você chama isso de relógio?", perguntara J. P. no jogo de pôquer.

Tornaram a bater na porta com persistência, o que convenceu Kane que o visitante tardio não iria embora. Espiando pelo olho mágico, viu que era Suzana. Os cabelos dela ainda estavam úmi­dos e presos em cima da cabeça com um elástico. Ela parecia descabelada, desarranjada e total­mente maluca. E linda de cortar o coração.

Kane abriu a porta.

Sem esperar por um convite, Suzana marchou para dentro do quarto e olhou para ele.

— Veja bem, não vou dar voltas e voltas. Não fingirei polidamente que nada aconteceu entre nós. Irei direto ao ponto: quais são seus sentimentos por mim? — perguntou ela. — Porque acontece que eu fui tola o bastante... Não, tola não, corajosa, para me apaixonar por você. E sou bastante mulher para dizer-lhe isso, mesmo que não tenha dito quais são os seus sentimentos. — Ela respirou fundo antes de continuar. — E já que estamos sendo diretos, quero saber de uma vez por todas se finalmente acreditou em mim quando jurei que não tinha um caso com seu irmão.

— Eu não sei qual é a situação com meu irmão — começou Kane.

Ele não acreditara nela. Suzana estava petri­ficada. Havia arriscado tudo, abrira sua alma para ele, e o grande jogo fora de encontro ao seu rosto. Não quis ouvir mais nada. Queria apenas sair dali. Girando nos calcanhares, cegamente dirigiu-se para a porta e tocou o trinco.

— Espere! — disse Kane, agarrando-lhe o ombro para fazê-la parar. — Não está me ouvindo — repreendeu-a, gentilmente. — Você já fez disso um hábito. O que estava dizendo é que enquanto eu não souber qual é a situação de meu irmão, acredito em você. Não creio mais que tenha tido um caso com ele. Você sempre foi honesta comigo.' Algumas vezes, até dolorosamente honesta.

Suzana engoliu as lágrimas.

— Você acredita em mim? Ele acenou afirmativamente.

— Não sei por que meu irmão disse aquilo, mas não acredito mais nele. Acredito em você. E eu a amo.

— Então por que...

— Afastei-me de você? Porque entrei em pânico — admitiu ele. — Saltar séculos num minuto tor­na difícil colocar as coisas em perspectiva, sabe? Eu lhe disse antes, sempre tive uma apreciação lógica da vida. Uma explicação para cada coisa. E não tive muitas experiências com fé e esperança. Até que você entrou em minha vida.

Estendendo o braço, encostou a palma da mão na face de Suzana com tanta meiguice que ela sentiu as lágrimas voltando a seus olhos, dessa vez, de alívio.

Kane beijou-as para secá-las. Sua boca gentil­mente cobriu suas pálpebras, suas faces, o deli­cado pulsar de sua têmpora. Ela puxou-o para baixo, encontrando os lábios dele com os seus e saudando-os com uma alegria indizível.

Kane puxou-lhe a camiseta por sobre a cabeça e jogou-a longe. Ficou surpreso ao descobrir que sob aquela peça de roupa ela usava uma camisola de cetim vermelho incrivelmente sexy. Deixando surgir um sorriso de desafio, murmurou:

— Sabe, existem certas vantagens em voltar ao século vinte.

Seu olhar quente de apreciação seguiu a Unha do pouco que havia de tecido. A camisola ia até meia altura, e era segura por tiras, as quais ele se deliciou em baixar pelos ombros de Suzana, com os dentes.

O roçar sobre a pele nua de Suzana causou-lhe arrepios espinha abaixo. Quando uma das tiras escorregou por seu braço, ele levantou a cabeça e dirigiu-lhe um olhar quente.

— Solte seus cabelos para mim — sussurrou ele. Ela ergueu o braço para remover o elástico que os prendia. Seu movimento fez com que seu seio se erguesse também. Não resistindo, Kane baixou a cabeça para mordiscar-lhe o mamilo através do tecido de cetim. Suzana soltou um gemido enquan­to desprendia os cabelos, que caíram em ondas sobre seus ombros, e sua mão procurou por ele. Escorregou os dedos pelos sedosos cabelos casta­nhos de Kane e sentiu um calor esparramar-se por seu corpo.

Uma das mãos de Suzana envolveu a nuca de Kane, enquanto a outra deixava cair a mais uma tira de sobre seu ombro. Agora a curva de seus seios e os lábio dele eram a única coisa a manter o tecido no lugar. Assim que Kane percebeu isso, puxou a barra da camisola. A fricção do cetim se movendo contra seus mamilos fez com que Suzana enterrasse as unhas nas costas dele. Não queria nenhuma barreira entre eles.

— Você fica bem com jeans — murmurou com aprovação, soltando o zíper. — Ah, mas fica ainda melhor sem ele.

Kane sorriu, os olhos cheios de promessas, en­quanto tirava os pés de dentro da calça, já no chão. Apanhou Suzana nos braços e carregou-a para a cama, onde descartou imediatamente o res­tante de suas roupas.

Aproximou-se dela e começou a tocá-la com in­timidade, roçando o polegar contra a pele sedosa.

— Faz cento e onze anos que não fazemos amor — ela conseguiu dizer enquanto puxava o quadril dele de encontro ao seu. — Não acho que preci­samos esperar mais.

—- Concordo. Nem mais um minuto.

Suzana viu quando Kane se inclinou em direção à mesa de cabeceira procurando alguma coisa.

— O que você quer? — murmurou.

Ele arrancou uma folha do bloco de notas e en­tregou-o a ela.

— O que é isso?

— Um pedido de desculpas. Eu o estava escre­vendo quando você chegou. Lembra-se, quando nos encontramos no Centro de Convenções e você me disse que esperava por um pedido de desculpas por escrito porque eu pensava que tinha tido um caso com meu irmão?

Piscando para espantar as lágrimas diante das palavras que ele escrevera, ela fitou-o.

— Não sei o que dizer — murmurou.

— Tudo bem, porque eu tenho uma coisa para falar: case-se comigo.

Dessa vez ela piscou, totalmente surpresa.

— Casar com você?

— Isso mesmo. O que me diz?

Antes que pudesse responder, o telefone tocou. Suzana esticou o braço e apanhou o fone antes de lembrar-se de que não estava em seu quarto, mas no de Kane. Sem falar nada, imediatamente estendeu-o para ele.

Pôde ver, pela tensão em seu rosto e em seu corpo, que era o irmão que o chamava. Suzana abraçou-se, esperando pelo pior.

Vendo o rosto dela, Kane esticou o braço para tocar sua face como dorso de sua mão, enquanto seus lábios diziam sem som: "Está tudo bem".

— Tenho tentado encontrá-lo, Kane — dizia seu irmão com voz aflita. — Há uma coisa que preciso lhe dizer. Eu... eu andei pensando seriamente, e tenho uma confissão a fazer. Não tinha idéia de que fosse encontrar a srta. Hall aí em Savannah e pensava em se confrontar com ela... Ana me contou. Era mentira, Kane. Eu nunca tive um caso com ela. Não sei o que deu em mim para inventar tudo aquilo... — O riso de Chuck era o de um homem à beira das lágrimas. — Talvez porque... porque eu sempre fiquei intimidado com o seu sucesso. E talvez porque quisesse ser um homem do mundo. Por isso inventei essa fantasia. Não sei se reparou, meu irmão, mas ela é uma mulher muito bonita.

— Reparei, sim.

— Bem... ela nunca pareceu me notar. Eu con­tinuava sempre construindo fantasias em minha cabeça. Não era como se estivesse apaixonado por ela ou coisa assim, era só essa idéia para me fazer sentir mais importante, sabe? De qualquer forma, conversei sobre tudo isso com a Ana, e concorda­mos em fazer uma terapia para ver se podemos salvar nosso casamento.

— Acho isso uma ótima idéia.

— É, bem... mas eu só queria dizer que sinto muito por ter trazido você para dentro dessa con­fusão toda, irmão — disse Chuek. — Quem sabe você e Suzana possam se entender, no final.

— Eu diria que essa é uma aposta certa — replicou Kane antes de despedir-se e desligar o telefone.

— O que é que ele queria? — perguntou Suzana.

— Acertar tudo — disse Kane. — Confessou que inventou a história sobre vocês dois. E disse que concordou em fazer uma terapia para ajudar a salvar seu casamento.

— Que boas notícias!

— Falando nisso, ainda estou esperando. Eu lhe fiz uma pergunta importante, a mais impor­tante de minha vida, e você ainda não respondeu.

Tentando com toda a força parecer racional, Su­zana disse:

— Você deve saber que, neste fuso horário, nós nos conhecemos há apenas vinte e quatro horas.

— Mas passamos duas semanas vivendo juntos em mil, oitocentos e oitenta e quatro — retorquiu Kane. — Quantos outros casais têm essa espécie de passado sobre o qual possam construir uma vida?

— Ainda assim, duas semanas... Não é muito tempo...

— Engraçado como o tempo voa quando estamos nos divertindo — notou Kane com um sorriso per­verso. — E quando se está apaixonado. Podemos arranjar os detalhes mais tarde. Diga apenas "sim", que você quer se casar comigo.



Ela disse, com palavras e ações.

FIM


CATHIE LINZ abandonou a carreira na biblioteca da faculdade de Direito para tornar-se a famosa autora de mais de vinte e cinco roman­ces contemporâneos. Cathie aproveita, como ins­piração para as suas histórias, diversas ocorrên­cias divertidas de suas viagens. Por exemplo, teve a idéia para este romance quando visitava Davenport House, em Savannah. Após uma viagem, Cathie sempre se sente feliz em voltar para casa, na qual seus dois gatos, seu confiável computador e também seu esconderijo de biscoitos a esperam com saudade.




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