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ABUSO DE DIREITO PROCESSUAL

2.4 A verdade no senso comum dos processualistas

Segundo João Mendes Jr., para fazer justiça é preciso aplicar a lei ao fato. A verdade do fato e o conhecimento da lei são, pois, os elementos primordiais da administração da Justiça.22 O Código de Processo Civil faz menção à verdade em diversos de seus dispositivos. Além daqueles já vistos por ocasião do exame das dificuldades do subjetivismo psicológico, poderiam ser citados os artigos 129, 1 3 1, 273, caput, 282, VI, 302 e incisos, 3 19, 320 e incisos, 332, 334, IV, 339, 343, § 1.°, 348, 357, 359 e incisos, 368 e parágrafo único, 372 e parágrafo único, 404 e inciso I, 415, 469, 485, 111, e 672, § 3•0•123

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dinâmico e finalista. À vista de tais circunstâncias, o jurista dogmático opera uma ciência consistente na descrição objetiva das normas jurídicas. A dogmática tem-no, pois, como transmissor de um corpo de regras onde não é dado inovar; a lei é a fonte última do direito, pelo que tudo deve se subsumir a ela. Assim, a tarefa do jurista, na apreensão do significado da Iei, deve limitar-se a um processo lógico-formal; nem à jurisprudência nem aos juristas se reconhece uma função criadora do direito; o aplicador da norma é, como consequência do princípio da racionalidade do legislador, politicamente neutro, não expressando as suas opiniões pessoais, no ato de decidir (Carlos Santiago Nino, Consideraciones sobre Ia Dogmática Jurídica — com referência particular a la dogmática penal, México, UNAM — Instituto de lnvestigaciones Jurídicas, 1 974, p. 86 e 87). A respeito das regras do jogo dogmático, ver também Alberto Calsamiglia, Sobre Ia dogmática jurídica: presupuestos y funciones del saber jurídico, in Anales de la Cátedra Francisco Suarez, ed. 22-23, Granada, Universidade de Granada, Departamento de Filosofía, 1983.

(122) João Mendes de Almeida Jr., Direito Judiciário Brasileiro, 4. ed., Rio de Janeiro, Livraria Editora Freitas Bastos, 1954, p. 155.

(123) Artigo 129. Convencendo-se, pelas circunstâncias da causa, de que autor e réu se serviram do processo para praticar ato simulado ou conseguir fim proibido por Iei, o juiz proferirá sentença que obste aos objetivos das partes; Artigo 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe for- maram o convencimento; Artigo 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença

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O ABUSO DO DIREITO DAS PARTES

O Código de Processo Penal também se ocupa da questão da verdade, em diversas passagens (artigos 66,147, 148, 186 e parágrafo

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da verossimilhança da alegação; Artigo 282. A petição inicial indicará: inciso VI — as provas com que o autor pretender demonstrar a verdade dos fatos alegados; Artigo 302. Cabe também ao réu manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na petição inicial. Presumem-se verdadeiros os fatos não impugnados, salvo: inciso I — se não for admissível, a seu respeito, a confissão; inciso 11 — se a petição inicial não estiver acompanhada do instrumento público que a Iei considerar da substância do ato; inciso 111 — se estiverem em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto. Parágrafo único. Esta regra, quanto ao ônus da impugnação especificada dos fatos, não se aplica ao advogado dativo, ao curador especial e ao órgão do Ministério Público; Artigo 319. Se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor (no mesmo sentido, art. 803). Artigo 320. A revelia não induz, contudo, o efeito mencionado no artigo antecedente: inciso I — se, havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação; inciso 11 — se o Iitígio versar sobre direitos indisponíveis; inciso 111 — se a petição inicial não estiver acompanhada do instrumento público, que a Iei considere indispensável à prova do ato; Artigo 332. Todos 05 meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa; Artigo 334. Não dependem de prova os fatos: inciso IV — em cujo favor milita presunção de veracidade; Artigo 339. Ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobri- mento da verdade; Artigo 342. O juiz pode, de ofício, em qualquer estado do processo, determinar o comparecimento pessoal das partes, a fim de interrogá-las sobre os fatos da causa (no mesmo sentido, art. 599, I); Artigo 343. Quando o juiz não o determinar de ofício, compete a cada parte requerer o depoimento pessoal da outra, a fim de interrogá-la na audiência de instrução e julgamento. § 1 .° A parte será intimada pessoalmente, constando do mandado que se presumirão confessados os fatos contra ela afirmados, caso não compareça ou, comparecendo, se recuse a depor; Artigo 357. O requerido dará sua resposta nos cinco dias subsequentes à sua intimação. Se afirmar que não possui o documento ou a coisa, o juiz permitirá que o requerente prove, por qualquer meio, que a declaração não corresponde à verdade; Artigo 359. Ao decidir o pedido, o iuiz admitirá como verdadeiros os fatos que, por meio do documento ou da coisa, a parte pretendia provar: inciso I — se o requerido não efetuar a exibição, nem fizer qualquer declaração no prazo do

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ABUSO DE DIREITO PROCESSUAL

único, 187, § 2.0,I,203,206,211,386,I,523,593,IIJ,alíflead, 621, I e JJ).124 Nestas referências não estão incluídos os dispositivos que

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artigo 357; inciso 11 — se a recusa for havida por ilegítima; Artigo 368. As declarações constantes do documento particular, escrito e assinado, ou somente assinado, presumem-se verdadeiras em relação ao signatário. Parágrafo único. Quando, todavia, contiver declaração de ciência, relativa a determinado fato, o documento particular prova a declaração, mas não o fato declarado, competindo ao interessado em sua veracidade o ônus de provar o fato; Artigo 372. Compete à parte, contra quem foi produzido documento particular, alegar, no prazo estabelecido no art. 390, se lhe admite ou não a autenticidade da assinatura e a veracidade do contexto; presumindo-se, com o silêncio, que o tem por verdadeiro. Parágrafo único. Cessa, todavia, a eficácia da admissão, expressa ou tácita, se o documento houver sido admitido por erro, dolo ou coação. Artigo 404. E lícito à parte inocente provar com testemunhas: inciso I — nos contratos simulados, a divergência entre a vontade real e a vontade declarada; Artigo 415. Ao início da inquirição, a testemunha prestará o compromisso de dizer a verdade do que souber e Ihe for perguntado (vide exceções no artigo 405 e parágrafos); Artigo 469. Não fazem coisa julgada: inciso 11 — a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença. Artigo 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: inciso 111 — resultar de dolo da parte vencedora em detrimento da vencida, ou de colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei. Artigo 672. A penhora de crédito, representada por letra de câmbio, nota promissória, duplicata, cheque ou outros títulos, far-se-á pela apreensão do documento, esteja ou não em poder do devedor. § 3.° Se o terceiro negar o débito em conluio com o devedor, a quitação, se este lhe der, considerar-se-á em fraude de execução.

(124) Artigo 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato; Artigo 147. O juiz poderá, de ofício, proceder à verificação da falsidade; Artigo 148. Qualquer que seja a decisão, não fará coisa julgada em prejuízo de ulterior processo penal ou civil; Artigo 186. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que Ihe forem formuladas. Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa (observe-se que o artigo 5.°, inciso LXIII, da Constituição Federal de 1 .988 garante ao réu o direito de permanecer calado);

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O ABUSO DO DIREITO DAS PARTES

disciplinam a autenticidade material dos documentos, questão alheia ao campo de investigação do presente trabalho.

A relação entre as noções de justiça e verdade, que já se encontra nas civilizações antigas, tem importantes repercussões no campo processual, como visto com Michel Foucault, na seção anterior.25 A finalidade das práticas judiciárias era a descoberta da verdade. Disto não difere o processo da Idade Moderna, como afirmam Kant 126

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Artigo 187. O interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos. § 2.° Na segunda parte será perguntado sobre: I- ser verdadeira a acusação que lhe é feita; Artigo 203. A testemunha fará, sob palavra de honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e Ihe for perguntado, ... explicando sempre as razões de sua ciência ou as circunstâncias pelas quais possa avaliar-se de sua credibilidade; Artigo 206. A testemunha não poderá eximir-se da obrigação de depor. Poderão, entretanto, recusar-se a fazê-lo o ascendente ou descendente, o afim em Iinha reta, o cônjuge, ainda que desquitado, o irmão e o pai, a mãe, ou o filho adotivo do acusado, salvo quando não for possível, por outro modo, obter-se ou integrar-se a prova do fato e de suas circunstâncias; Art. 211. Se o juiz, ao pronunciar sentença final, reconhecer que alguma testemunha fez afirmação falsa, calou ou negou a verdade, remeterá cópia do depoimento à autoridade policial para a instauração de inquérito; Artigo 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: inciso I — estar provada a inexistência do fato; Artigo 523. Quando for oferecida a exceção da verdade ou da notoriedade do fato imputado, o querelado poderá contestar a exceção no prazo de dois dias, podendo ser inquiridas as testemunhas arroladas na queixa, ou outras indicadas naquele prazo, em substituição às primeiras, ou para completar o máximo legal; Artigo 593. Caberá apelação, no prazo de cinco dias: inciso 111 — das decisões do tribunal do júri, quando: alínea d: for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos; Artigo 621. A revisão dos processos findos será admitida: inciso I — quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos; inciso 11 — quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos.

(125) A propósito da influência da noção de verdade no processo civil grego e no processo civil romano, ver, igualmente, Kaethe Grossmann, op. cit., p. 379-281.

(126) Kant, Metaphysische Anfangsgruende der Rechtslehre, in Obras de Kant, t. 111, § 40, Knaur Nachf, apud Kaethe Grossmann, op. cit., p. 287.

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ABUSO DE DIREITO PROCESSUAL

e Kohler.127 É certo que o processo tem por objetivo a manutenção da paz legal. Mas isto só pode ser garantido quando o Estado-jurisdição fortalece a confiança dos jurisdicionados na vitória da causa. o Judiciário, portanto, deve ter em conta não só a necessidade de colocar fim ao litígio, mas também a necessidade de uma solução justa,128 que depende do descobrimento da verdade.129

Como reconhece Kaethe Grossmann, os códigos, via de regra, não incluem, dentre as finalidades do processo, a persecução da verdade.3° Todavia, não há como negar que, em numerosos institutos processuais, a preocupação com a verdade surge na própria letra da regra legal, a confirmar que a racionalidade do processo moderno está impregnada dessa noção. E o que se pode ver — diz a au- tora — na possibilidade de o juiz determinar produção de provas de ofício (art. 130 do CPC), na importância atribuída pelo legislador ao interrogatório das partes (artigo 342 do CPC) e ao depoimento pessoal (artigo 343 e parágrafos do CPC). Observe-se, ainda, que a testemunha depõe sob compromisso (arts. 415 do CPC e 203 do CPP) e que todo o sistema de prova está orientado ao conhecimento da verdade dos fatos (arts. 282, VI, e 332, ambos do CPC). A preocupação com a verdade também se reflete na possibilidade de recurso fundado em error injudicando, a exemplo das hipóteses de julgamento manifestamente contrário à prova dos autos (art. 593, 111, d, do CPP). Aliás, trata-se de curiosa situação em que a sentença é anulada não por error in procedendo (como se passa ordinariamente), mas por erro no exame do mérito.131

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(127) Kohler, Lehrbuch der Rechtsphilosophie, 3. ed, 1923, § 164, 1, p. 245, apud Kaethe Grossmann, op. cit., p. 287.

(128) Esta — como visto — também é a posição de Chiovenda (Instituições de Direito Processual Civil, vol. 1, São Paulo, Saraiva, 1965, p. 37-46).

(129) Segundo Jorge A. Clariá Olmedo, todo processo judicial persegue como finalidade específica imediata a fixação dos fatos fundamentais das pretensões das partes, mediante a busca e aquisição da verdade (Derecho Procesal, vol. 2, Buenos Aires, Ediciones Depalma, 1983, p. 48).

(130) Kaethe Grossmann, op. cit., p. 287.

(131) O exame partiu das elaborações da jurista alemã (op. cit., p. 287-289), mas a referência à legislação brasileira, como exemplo das categorias

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O ABUSO DO DIREITO DAS PARTES

Há, nas mencionadas disposições legais, uma preocupação com a racionalidade do jogo processual, com a garantia da solução da disputa, sem que a qualquer das partes, com o seu silêncio, por exemplo, seja dado decidir sobre a sorte do processo. Ao mesmo tempo, revela-se também um senso comum de justiça, orientado pela expectativa da descoberta da verdade e do direito que nela se funda (artigo 339 do CPC). A presunção que decorre da revelia, por exemplo (arts. 302 e 3 19 do CPC), inspira-se numa regra de prudência segundo a qual quem cala não necessariamente admite, mas pelo menos não nega.32 Este é o espírito prudencial que orienta também as regras relativas ao interrogatório das partes (art. 342 e 599, I, do CPC), ao depoimento pessoal (art. 343, § 1.0 e 2.°, do CPC), sujeito ao ônus da confissão (art. 348 do CPC)33 e a todos os casos de presunção Iegal de veracidade (art. 334, IV, do CPC), na base do silêncio ou da omissão da parte (arts. 357, 359, I, e 372, do CPC).

Essa tensão dialética entre a verdade como ideal de justiça e a verdade como imperativo de ordem prática (necessidade de colocar termo à disputa judicial, evitando que a parte, com sua omissão, impeça a prestação jurisdicional) sugere, à primeira vista, uma cor- respondente distinção entre verdade material e verdade formal. Entretanto, como reconhecem os modernos processualistas, o problema da prova, no direito processual civil, não se apresenta sob o prisma teórico de indagação exaustiva da verdade, colocando-se como problema prático, conducente a se conseguir o que, dentro da teoria da prova, seja definido e havido juridicamente como verdade...

processuais mencionadas por Kaethe Grossmann, foi feita apenas para que se pudesse melhor avaliar a pertinência das suas considerações naquilo que diz respeito ao senso comum teórico dos processualistas.

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(132) Qui tacet non utiquefatetur sed tamen verum est non negare (Paulo, D. reg. iuris, XVII, L. 1 42, apud Roberto Rosas, Abuso de direito e dano processual, in Revista Brasileira de Direito Processual, Uberaba, 3.° trimestre de 1983, vol. 39, p. 126).

(133) A propósito do instituto da confissão, v. o ensaio de Moacyr Lobo da Costa, Confissão e Reconhecimento do Pedido, in Separata da Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, Ano LXII, fasc. 11, p.l67-212.

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A inteligência, quando não comprometida com interesses ou apetites, tende sempre a considerar a verdade como um fim em si. No entanto, não é esta a posição que sempre convém ao direito processual, que é, antes de tudo, uma ciência eminentemente prática.134 Admite-se que a ordem jurídica procura a solução dos conflitos dentro da justiça e da verdade. Mas, pelas contingências da falibilidade humana, é possível que a solução judicial não corresponda, na realidade, nem à justiça e nem à verdade... A sentença injusta é uma fatalidade na vida processual, mas que, mesmo assim, surte efeitos, não permitindo nem mesmo a ação rescisória, que é restrita à sentença ilegal.135

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(134) Arruda Alvim, Curso de Direito Processual Civil, vol. 2, RT, São Paulo, 1972, p. 205; no mesmo sentido, Carlo Furno, Teoria de la Prueba Legal, I 954, p. 42 (Série B — Monografias de Derecho Privado y Publico, Madrid Editorial Revista de Derecho Privado), apud Gian Antonio Micheli, La carga de Ia prueba, Buenos Aires, 1 96 1 (Colección Ciencia del Proceso, p. 39), nota 50, p. l 93. Quanto ao caráter prático da ciência jurídica, v. Theodor Viehweg, Tópica y filosofia del derecho, Barcelona, Gedisa, 1 997, Colección Estudios Alemanes, pfll -85, e Rodolfo Sohm, op. cit., p. 13 e 14; Cândido Rangel Dinamarco, citando Calamandrei (Veritá e verosimiglianza nel processo civile, in Rivista di Diritto Pro- cessuale, ed. 3, p. 1 67), observa que o processualista moderno sabe que a verdade não constitui escopo processual... O processualista moderno sabe também que a coisa julgada... não se define como ficção ou presunção da verdade, mas somente cria a irrevocabilidade jurídica do comando, sem se preocupar em estabelecer se as premissas psicológicas das quais esse comando nasceu são premissas de verdade ou de verossimilhança (Cândido R. Dinamarco, A instrumentalidade doprocesso, 2. ed., São Paulo, 1 990, p. 326 e 327). Igualmente, sustenta Tercio Sampaio Ferraz Jr. que a decidibilidade dos conflitos é o problema cen- tral da ciência dogmática do direito (Introdução ao Estudo do Direito — Técnica, Decisão, Dominação, São Paulo, Atlas, 1988, p. 88-91; A ciência do Direito, São Paulo, Atlas, 1980, p. 42-47; Prefácio à tradução brasileira da obra de Theodor Viehweg, Tópica e jurisprudência, Brasília, Ministério da Justiça, 1 979 (Coleção Pensamento Jurídico Contemporôneo);

(135) Celso Agrícola Barbi, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. l, Rio de Janeiro, Forense, 1 973, p.174 e 1 75. Como registra João Carlos Pestana de Aguiar, citando Carnelutti (La Prueba Civil, Buenos Aires,

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Com efeito, o instituto da coisa julgada não interfere necessariamente com a questão da verdade fática, a despeito daquilo que consta do art. 485, incisos III, VI, VII e IX, do Código de Processo Civil e do artigo 62 1, I, 11 e 111, primeira parte, do Código de Processo Penal.136 E que o exercício da ação rescisória está condicionado

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1955, p. 25), quando a busca da verdade material está limitada de tal modo que esta não possa ser conhecida em todo caso e com qualquer meio, o resultado, seja mais ou menos rigoroso o limite, é sempre o de que não se trata já de uma busca da verdade material, senão de um processo de fixação formal dos fatos (João Carlos Pestana de Aguiar, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. 4, São Paulo, RT, 1974, p. 51).

(136) A propósito, assim escreve Chiovenda: Nem sempre são verdadeiros os fatos que o juiz reputa como tais. A convicção do juiz pode ser efeito de erro, dolo, provas insuficientes; por vezes, a lei pode, sem mais, prescrever ao juiz que considere como existentes determinados fatos (fatos não contestados, confessados, jurados), dispensando-o de pesquisar se são verdadeiros. Nem só: no interesse da paz social, a lei traça limites à pesquisa da verdade; esgotadas algumas reclamações ou decorridos certos termos, a sentença passa em julgado, tornando-se resjudicata, isto é, o bem reconhecido ou negado pela sentença se torna indiscutível, não obstante erro de fato e de direito que viciaram o raciocínio do juiz (Instituições de Direito Processual Civil, 2. ed., vol. 1, São Paulo, Saraiva, 1 965, p. 43). Como adverte Wilson de Souza Campos Batalha, o erro dos que defendem o princípio da coisa julgada com as teorias deficção da verdade ou presunção de verdade, a exemplo de Ugo Rocco (Corso di Teoria e Pratica Del Processo Civile, vol. 1, 1 95 1, p.573 e ss.), está em que a norma individualizada, como toda norma jurídica, não é verdadeira ou falsa, mas é válida ou inválida. Inclusive os juízos referi- dos a fatos e que, portanto, são suscetíveis de ser — sob o ponto de vista da teoria do conhecimento — falsos ou verdadeiros, adverte Maynez (Lógica del Juício, p. 138) adquirem outra significação quando declaram legalmente provados tais fatos, o que permite predicar de tais iuízos a validade ou invalidade em sentido normativo. Assim, a coisa julgada não se estriba numa suposta presunção de verdade, mas na pura e simples validade da sentença, escoadas que sejam todas as possibilidades de sua reforma (Introdução ao Direito — Filosofia, História e Ciência do Direito, vol. 1, São Paulo, RT, 1967, p. 276 e 277). Neste sentido também é a lição de Jorge A. Clariá Olmedo (op. cit., p.152e 153). Daí porque sem razão aqueles que comparam o trabalho do juiz à missão do historiador, a exemplo de Antônio Dellepiane (Nova Teoria

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à inexistência de controvérsia ou de pronunciamento judicial acerca do fato (art. 485, § 2.°, do CPC). Além disto, a ação sujeita-se a prazo decadencial (art. 495). Quanto ao processo crime, embora o reexame do caso julgado não esteja sujeito a prazo, certo é que se mostra inconcebível, de acordo com a jurisprudência, revisão de revisão.37 Também não se cogita da ação revisional (ou recurso, segundo alguns) quando a prova do fato já tiver sido analisada, limitando-se o pedido a novo exame da interpretação do fato.138 Algumas Iegislações admitem a revisão de sentenças absolutórias. No Brasil, entretanto, é vedada a revisão pro societate, circunstância que vem em detrimento da persecução da verdade fática, à qual preferem razões de política criminal.139

Observe-se ainda que a verdade dos fatos, estabelecida como funda- mento da sentença civil, não faz coisa julgada (art. 469, 11, do CPC).140

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da Prova, Livraria jacintho, 1 942, p. 24), citado por ArrudaAlvim (Curso de Direito Processual Civil, vol. 2, São Paulo, RT, 1972, p. 206). A pro- pósito ainda desta comparação, v. notas 159 e 160. A respeito das implicações — do ponto de vista interno e externo do sistema jurídico — do caráter constitutivo da sentença, v. Ricardo A. Guibourg, Derecho, sistema y realidad, Buenos Aires, Astrea, 1986, p. 50-55 e 73-77.

(137) TJSP, 2.° Grupo de Câmaras Criminais, Rev. 1 09.4 1 3-3/0, Santo André, rel. Silva Leme, j. 3/2/92, in RT, São Paulo, Ano 82,junho de 1993, vol. 692, p. 249-253.

(138) TACrim/São Paulo, 1.° Grupo de Câmaras Criminais, Rev. 271.150/3, Santo André, rel. Rulli Jr.,j. 23/3/95, in RT, São Paulo, Ano 84,julho de 1995, vol. 717, p. 401.

(139)Apartam-se aqui as noções de justiça e verdade, a demonstrar o idealismo contido na máxima de Dellepiane, segundo a qual Toda sentença, para ser tida por justa, deve sem expressão fiel da verdade... verdade e justiça se confundem nas sentenças (Antônio Dellepiane, Nova Teoria da Prova, trad. Erico Maciel, Livraria Jacintho, 1942, p. 42, apud José Luiz Vicente de Azevedo Franceschini, Da atuação dos juízes penais, de ambas as instâncias, na pesquisa da verdade real, in RT, São Paulo, Ano 58, novembro de 1969, vol. 409, p. 24).


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