Sarah só parou de correr ao chegar ao seu quarto e, atirando-se na cama, chorou até já não ter mais lágrimas. Nunca em sua vida se sentira tão sozinha, tão perdida. Daria tudo para refugiar-se entre os braços fortes de Wade naquele momento, porém sabia que tamanha felicidade jamais estaria ao seu alcance.
Disposto a impedir a partida de Sarah a qualquer custo, ele voltou para casa e, evitando fazer qualquer barulho, ligou para Rich.
— Alô — resmungou uma voz sonolenta.
— Rich. É Wade.
— Wade?! Você tem ideia de que horas são, rapaz?
— "Sexta-feira, zero hora e vinte e cinco minutos" — anunciou a voz metálica.
— É claro que sei que horas são. Afinal, tenho um relógio falante, lembra-se?
— O que você está querendo a esta hora pavorosa? Não creio que esteja bêbado ou ferido.
— Quero saber tudo sobre Sarah Jane Morrison. Onde nasceu, quando, quem são os pais, o tipo de educação recebida, onde mora, por que escolheu essa profissão, se já foi casada, se teve filhos, etc, etc. Tudo mesmo, entendido?
— É só isso o que deseja saber? — Rich indagou com uma ponta de ironia. — Precisarei apresentar o relatório antes do café da manhã ou posso esperar até a hora do almoço?
— Esqueça o sarcasmo, Rich. Ponha quantas pessoas forem necessárias trabalhando no caso e me passe as informações tão logo seja possível. É claro que se trata de um assunto altamente confidencial.
— Embora tenha a impressão de que você não esteja pretendendo me contar o porquê de tudo isso, acho que mereço uma explicação por ter sido acordado no meio da noite com um pedido tão absurdo. — Seguiu-se um silêncio absoluto. — Wade, você ainda está aí?
— Ela vai embora, Rich — ele murmurou desesperado. — Sarah diz que não pode continuar aqui, que o seu trabalho não está sendo feito da maneira correta porque ela violou as regras do profissionalismo e da ética. Não posso deixá-la sair da minha vida!
— Parece-me que as coisas extrapolaram o campo profissional. Será que ela não está simplesmente fugindo dos seus avanços amorosos?
— Não, não é isso! Acho que Sarah está fugindo dos próprios sentimentos. Nunca conheci alguém como ela, alguém tão verdadeira, honesta, doce...
— Ah, entendo. Não se parece em nada com aquela turma de desmioladas com quem você costumava sair. O que estou falando não é nenhuma novidade, pois sempre deixei clara minha opinião sobre Traci Sinclair e companhia.
— Traci pertence ao passado, assim como todas as outras.
— E quando está planejando contar a mudança de planos à sua namoradinha loura?
— Já contei. Traci está definitivamente fora da minha vida.
— Você rompeu o namoro de verdade? — Pela primeira vez, desde o início da conversa, Rich estava começando a levar o amigo a sério. — Falaram-se pelo telefone ou pessoalmente? Como foi que ela reagiu?
— Falamos pessoalmente e ela se comportou sem a menor dignidade. Gritou um bocado e ainda teve o desplante de dizer coisas horríveis para Sarah.
— Não se preocupe, amanhã de manhã tomarei todas as iniciativas quanto ao seu pedido. Wade... Você está OK?
— Sim, estou bem... a menos que ela vá embora. Então não saberei o que será de mim.
Edith Haggarty tocou a campainha duas vezes e, como ninguém respondesse, resolveu entrar. Todas as luzes da casa estavam acesas, o que era estranho, pois o sol já ia alto. Não havia ninguém à vista, porém o barulho do chuveiro ligado, vindo do quarto de Sarah, logo a tranquilizou.
Sentado na varanda inferior, uma xícara de café nas mãos, Wade prestava atenção ao serviço de meteorologia transmitido pelo rádio, prevendo fortes chuvas ao anoitecer.
— Sr. Danforth, finalmente o encontrei! Estava começando a pensar que não havia ninguém aqui.
— Sra. Haggarty! Não a ouvi entrar. Sarah Jane Morrison não está em casa?
— Chamei-a, mas ninguém respondeu. Creio que está tomando banho.
— Então ela não saiu? Continua aqui em casa?
— Claro que sim! Onde mais poderia estar? A propósito, está tudo bem, sr. Danforth?
Wade levantou-se de súbito, animado por uma ideia repentina. Se Sarah estava no banho, não poderia saber que Edith já havia chegado, portanto ele ainda tinha tempo de mudar a programação para aquele dia.
— Creio que seria uma boa ideia se a senhora fosse fazer as compras de supermercado agora de manhã e não após o almoço conforme o planejado. Como Sarah Jane Morrison e eu teremos de ir ao hospital à tarde, a casa ficará vazia, portanto a limpeza poderá ser feita mais depressa. Presumo que Rich tenha lhe dado as instruções sobre como lançar o débito das compras na minha conta.
— Sim, não se preocupe, já conversamos sobre esse assunto. Estarei de volta dentro de uma hora e meia. Há algo de especial que o senhor deseje e que não conste na lista? Talvez eu devesse esperar Sarah sair do banho para...
— Não é preciso — ele a cortou um tanto afobado demais. — Já chequei a lista com ela e não temos necessidade de mais nada.
— Então, estou de saída. Até logo, sr. Danforth.
— Até logo, sra. Haggarty.
Minutos depois, Wade ouvia passos na varanda.
— É você, Sarah Jane Morrison?
— Sim. Bom dia.
— Eu estava começando a pensar que você pretendia dormir o dia inteiro. Estou acordado há horas!
Na verdade, ele passara a noite praticamente em claro, tentando entender os sentimentos que o ligavam àquela mulher cujo encanto não podia enxergar, mas apenas sentir de uma maneira total e avassaladora.
— Acho que perdi a hora — ela falou meio sem jeito. — São nove e meia agora. Edith já não deveria estar aqui?
— Oh, sim. Ela foi ao supermercado.
— Ao supermercado? Mas por que você deixou, quando sabia muito bem que havíamos planejado fazer as compras juntos, hoje de manhã?
— Eu me esqueci — respondeu ele sem se dar por achado.
Sarah fitou-o por um longo tempo, incerta quanto ao que dizer.
Resignada, decidiu entregar os pontos:
— Creio que nada disso tem mais importância, pois o meu substituto certamente terá seus próprios métodos e prioridades.
— Você ainda quer ir embora?
— Não é que eu queira, eu preciso ir embora. A situação já está fora do meu controle.
— O que quer dizer "fora do seu controle?" Por acaso você conversou com a dra. Cameron?
— Ainda não, porém...
— Ótimo. Então terei algumas horas para fazê-la mudar de ideia. Não vou deixá-la abandonar-me quando enfrento momentos tão difíceis.
— Não é justo tentar fazer-me sentir culpada.
— Estou tendo sucesso? — Wade perguntou com um sorriso luminoso.
— Não, e nem precisa continuar tentando. Sou imune a táticas desleais.
— OK. Então que tal essa tática direta e sincera: por favor, não me abandone — ele pediu com emoção. — Não quero que me deixe. Durante todo o tempo em que estive no hospital, tudo o que eu queria era vir para casa, pois pensava que tão logo estivesse no meu lar, as coisas voltariam ao normal. Bem, nada mudou e provavelmente jamais mudará. Uma única pessoa toma minha vida suportável e me dá uma razão para continuar lutando: você.
— Eu não posso... — Sarah murmurou, engolindo as lágrimas.
— Deixe-me terminar. Eu não tinha o direito de assustá-la, de sobrecarregá-la com mais um problema como fiz ontem à noite. Desculpe-me e creia-me que não acontecerá de novo. Por favor... não vá embora.
O toque do telefone rompeu a tensão do momento. Grata pela interrupção, Sarah levantou-se para atender, deixando Wade só. Momentos depois estava de volta.
— Era uma ligação do consultório do dr. McKendrick.
— Confirmando a consulta?
— Não exatamente. O dr. McKendrick foi chamado para atender a uma emergência e transferiu sua consulta para a próxima terça-feira. Também ficou adiada para terça-feira a sessão com a dra. Cameron.
Wade ficou de pé, esforçando-se para conter a onda de entusiasmo e esperança que ameaçava engolfá-lo.
— Isso significa que nenhum de nós dois irá encontrar-se com a dra. Cameron hoje?
— Não é bem assim. Acabei de falar com ela agora.
— E?
— Ela acredita que os seus progressos demonstram um desenvolvimento adequado da situação e achou melhor discutir o assunto comigo pessoalmente na próxima terça-feira.
A expressão da mais absoluta felicidade estampada no rosto de Wade foi como um bálsamo para a alma angustiada de Sarah. Ela sabia que continuava agindo de forma pouco profissional, mas não conseguia refrear os impulsos do próprio coração.
— É o destino, Sarah Jane Morrison. É o destino que se nega a deixá-la partir.
Quando naquela mesma manhã bem cedo ele telefonara para a dra. Cameron e lhe pedira que adiasse a consulta e não permitisse que Sarah abandonasse o caso, a psicóloga não lhe dera nenhuma resposta definitiva, prometendo apenas pensar no assunto. Agora tinha de agradecer aos céus pelo tempo adicional que lhe fora cedido.
O telefone tocou de novo. Era Rich, querendo falar com o amigo.
Sarah continuou na varanda, pensando nas últimas palavras de Wade.
Talvez fosse mesmo obra do destino aquela súbita alteração de planos. Entretanto, não podia deixar de achar o telefonema do hospital um tanto estranho demais.
CAPÍTULO VIII
— Sarah Jane Morrison, onde está você? — Wade chamou-a, descendo a escada.
— Estou aqui fora.
— Era Rich ao telefone. Queria nos convidar para jantarmos com ele e Margie hoje à noite. Está bem para você, Sarah Jane Morrison?
— Claro que sim. Por que iria incomodar-me com o fato de você sair para jantar com amigos? Rich virá apanhá-lo?
— O quê? — Wade parecia confuso. — Você não está entendendo: nós vamos jantar na casa de Rich e Margie! O convite é para nós dois! Deveremos estar lá às dezenove horas; portanto, esteja pronta às dezoito e trinta.
— Mas... mas eu não trouxe roupas adequadas. Eu não vim preparada para ocasiões especiais.
O que ela não disse era que não possuía roupas especiais porque nunca frequentava lugares especiais.
— Não se trata de um acontecimento social, Sarah. Vamos apenas jantar na casa de amigos íntimos. Use suas roupas comuns.
— Wade, eu não posso...
— Não há nada mais a discutir sobre o assunto. Nós iremos. A propósito, acho melhor usarmos o meu carro. Você sabe guiar automóvel sem câmbio automático?
— Sim, sei — respondeu ela, resignando-se com a ideia do jantar. — Morei numa fazenda durante algum tempo e aprendi a dirigir qualquer coisa que tivesse rodas.
— Você morava numa fazenda? — Wade indagou, ansioso para obter alguma informação pessoal a respeito daquela mulher tão fechada. — Quando? Onde?
— Foi há muito tempo... Não tem importância alguma agora. Em que parte da cidade moram Rich e Margie?
— Você é ótima para mudar de assunto quando lhe convém.
— Achei que você tinha me prometido não fazer nada que...
— Prometi-lhe não fazer nada que pudesse amedrontá-la. Por que uma simples pergunta sobre uma temporada passada na fazenda poderia assustá-la?
— Por que eu deveria me sentir ameaçada?
— Aí está você outra vez, respondendo a uma pergunta com outra. Seria capaz de me contar o que a assustou tanto?
— Não — Sarah murmurou com a voz trêmula.
Um silêncio pesado envolveu-os durante vários minutos. Wade queria poder abraçá-la, protegê-la de tudo e de todos, mas se manteve firme à promessa de não tocá-la.
Ao ouvir sons de passos vindos da cozinha, Sarah aproveitou a oportunidade para afastar-se, alegando que talvez Edith pudesse estar precisando de ajuda para guardar as compras.
Depois do almoço, correu a refugiar-se em seu quarto e, pela primeira vez em muitos anos, estudou as próprias roupas com um olhar crítico. Camisões e calças baggy compunham seu guarda-roupa, não havendo uma única peça mais feminina ou insinuante.
Como poderia sair com um homem do tipo de Wade metida em trajes tão simplórios? Ainda que ele não pudesse vê-la, devia-lhe a cortesia de apresentar-se bem vestida na visita aos amigos. Talvez Edith pudesse fazer companhia a Wade durante algumas horas...
— Não se preocupe — a empregada falou, cheia de boa vontade. — O sr. Danforth e eu não teremos qualquer problema. Vá fazer suas compras tranquila.
— Onde você esteve? — Wade perguntou, ansioso.
— Tinha algumas coisas a fazer — Sarah respondeu, colocando os embrulhos sobre a cama e descalçando os sapatos.
— Você demorou muito, quase quatro horas. O que a prendeu tanto na rua?
— Fui tratar de assuntos pessoais. Alguma objeção?
— Não, claro que não. É que você demorou demais e fiquei preocupado.
— Oh! Preocupado com o quê?
— Bem, acidentes de carro acontecem — ele tentou consertar, esforçando-se para não deixar transparecer que seu verdadeiro medo fora de que Sarah tivesse ido conversar com a dra. Cameron.
— Nada aconteceu. Estou ótima e gostaria de tomar um banho agora e me preparar para o jantar.
— Oh, sim... claro. Vou deixá-la à vontade.
Tão logo Wade saiu do quarto, Sarah abriu os embrulhos e espalhou o conteúdo sobre a cama. Excitada, acariciou o tecido macio das roupas novas. Nunca em sua vida possuíra coisas tão bonitas ou de cores tão vibrantes.
Depois de percorrer uma dezena de lojas, decidira-se por dois conjuntos: um, de calça comprida e blusa azuis e outro composto de saia e suéter cor-de-rosa. Sapatos bege de salto médio davam o toque final de simplicidade e elegância. Como enfeite, usaria apenas uma correntinha de ouro no pescoço.
Certas palavras de Wade continuavam ecoando em sua mente. Ele a julgava uma mulher bonita, de feições delicadas. Embora jamais tivesse se considerado atraente, era bom ouvir elogios vindos de um homem tão especial.
Sarah olhou para o relógio. Era quase dezoito e trinta. Nos últimos trinta minutos, tomada de indecisão, havia trocado de roupa pelo menos uma meia dúzia de vezes. Por último, decidira-se pelo conjunto azul. Hesitante e temerosa, resolvera maquilar-se um pouquinho, nada muito chamativo, apenas blush, batom e um leve toque de sombra nos olhos.
Um sorriso tímido veio-lhe aos lábios ao olhar-se no espelho. Pela primeira vez em sua vida julgava-se interessante, quem sabe até mesmo atraente.
— Você está pronta, Sarah Jane Morrison? — Wade chamou-a do corredor.
— Estou indo — respondeu ela, esforçando-se para manter-se calma enquanto caminhava na direção do homem alto e másculo.
— Então vamos, pois não quero chegar atrasado. Rich é o tipo que aprecia pontualidade. — Ao senti-la perto de si, ele não conteve o ar de surpresa. — Que perfume delicioso você está usando. E perturbador também.
— Obrigada — Sarah murmurou, corando da cabeça aos pés.
— Tem certeza de que sabe dirigir um Porsche?
— Se tem rodas...
— Já sei, basta ter rodas para você guiar. A propósito, a previsão do tempo é de chuvas para essa noite. Deveríamos levar guarda-chuvas?
— Talvez fosse melhor, pois o céu está coberto de nuvens negras.
— Sr. Danforth, será que eu poderia... — Edith parou no meio da frase ao ver Sarah. — Oh, Sarah, como você está linda!
— Linda, hein? Então minha acompanhante é mesmo uma mulher encantadora?
— Por favor, vocês dois estão me deixando embaraçada. Será que poderíamos ir agora?
— Leve os guarda-chuvas — a empregada recomendou, entregando dois a Sarah. — Está armando um temporal.
O trajeto até a casa dos Butler não levou mais do que quinze minutos e logo Rich os estava recebendo à porta, sem esconder uma ponta de admiração diante da aparência de Sarah.
— Boa noite, é bom vê-los de novo! Vamos entrar antes que o aguaceiro desabe.
Wade parecia um pouco inseguro a princípio, pois embora já estivesse estado na casa de seu advogado várias vezes, sentia-se um tanto perdido, rodeado de coisas novas e estranhas. Delicadamente Sarah guiou-o até a sala de estar.
— Sarah, você está linda esta noite. Fico feliz que Wade tenha conseguido convencê-la a acompanhá-lo.
Aquela era a segunda vez, em menos de uma hora, que alguém a chamava de "linda". Além do mais, Wade elogiara seu perfume. Ainda bem que cedera à tentação de comprá-lo.
— Wade, que prazer em vê-lo tão bem! — Margie exclamou vindo da cozinha. — E você deve ser Sarah. Estou feliz em conhecê-la!
— Reparei que vocês vieram no precioso Porsche — Rich falou num tom brincalhão. — Sabe, Sarah, ele nunca me deixou dirigir aquele carrinho. Acho que não me julgava digno de tamanha honraria.
— E é provável que eu vá guiando na volta — Wade interveio sorrindo. — Minha acompanhante me pareceu um tanto descuidada.
Sabendo que tudo não passava de uma brincadeira, Sarah não hesitou em entrar no espírito da coisa:
— Se você for guiando, então eu vou andando.
Os Butler eram anfitriões perfeitos. A noite transcorreu na mais completa harmonia e durante o jantar Sarah quase não conseguia tirar os olhos de Wade, o que não passou despercebido a Rich e Margie.
— "Sexta-feira, vinte e três horas e cinco minutos" — anunciou a voz metálica.
— Engraçadinho este relógio, não? — Wade falou mostrando o pulso. — É um presente de vocês.
— Eu apenas o comprei, pois a ideia foi de Sarah.
— Eu sei — ele murmurou com suavidade. — Meus queridos amigos, acho que está na hora de Sarah Jane Morrison e eu irmos para casa. A chuva está apertando cada vez mais e não quero correr o risco de ficarmos atolados no meio do caminho.
Depois dos agradecimentos e beijinhos de até-logo, os Butler ficaram na varanda, observando o Porsche desaparecer na estrada.
— Margie, meu amor, você viu aquilo? O rosto de Sarah se iluminava a cada vez que ela olhava para Wade e ele falava o nome dela com tanta ternura que parecia um colegial apaixonado. Nunca o vi tão encantado por mulher alguma. E para completar, deixou-a dirigir o Porsche!
— Pensei que você tivesse dito que Sarah era um tipo sem graça, sempre vestida com roupas largas, desajeitadas e pouco femininas.
— Acredite-me, a mulher que apareceu aqui esta noite foi uma completa surpresa para mim também. Ela é perfeita para o nosso amigo: inteligente, com personalidade, bonita. Uma pessoa de verdade e não apenas uma casca.
— Você já conseguiu as informações que Wade lhe solicitou?
— Apenas algumas. Parece-me que Sarah nasceu em Montana. Margie, para falar a verdade não me sinto muito confortável nessa tarefa, pois é como se eu estivesse espionando o passado de alguém. Posso entender o desespero de Wade, sentindo-se incapaz de tomar conta da própria vida. Mas ainda assim, não me parece leal.
Sarah guardou o carro na garagem, pensando nos acontecimentos da noite. Rich e Margie eram simpáticos, divertidos e haviam lhe proporcionado momentos bastante agradáveis, fazendo-a sentir-se aceita e até mesmo... atraente.
— Sarah Jane Morrison, será que vamos ficar sentados aqui a noite inteira?
— Não, claro que não — retrucou ela saindo do carro e acompanhando-o até a porta da casa.
— Será que o passeio de hoje conta como minha excursão ao mundo exterior?
— De jeito nenhum! Ir de carro visitar um amigo e voltar diretamente para casa não pode ser chamado de excursão ao mundo exterior. Para tal precisaríamos sair a pé para fazer compras, passear pela praça, almoçar num restaurante. Talvez amanhã possamos escolher uma dessas alternativas, caso não esteja chovendo.
— Oh. — Havia apreensão naquela única palavra. — Você se divertiu hoje à noite? Rich e Margie são pessoas simpáticas.
— Sim, foram horas muito agradáveis. Obrigada por ter insistido para que eu aceitasse o convite.
— O prazer foi meu — murmurou Wade, tocando-a de leve no rosto, desejando poder tomá-la nos braços e aplacar a fome que o consumia. Entretanto, estava preso à promessa feita e nada faria que pudesse assustá-la.
— Acho melhor eu ir dormir... — ela falou sem mover-se um centímetro.
— Eu também. Sarah Jane Morrison...
— Sim?
— Eu... — Wade estendeu a mão como se fosse tocá-la, mas desistiu. — Boa noite, Sarah Jane Morrison. Tenha bons sonhos.
— Boa noite, Wade.
Desapontada, ela correu para o quarto, trocou de roupa e meteu-se na cama.
Sim, a noite fora agradável. Todos a tinham tratado como uma igual, parecendo interessados nas suas opiniões sobre os vários assuntos conversados. Wade esbanjara charme o tempo inteiro, tratando-a como uma pessoa especial, em quem confiava de verdade.
Estava quase adormecendo quando um barulho súbito despertou-a. Alguém estava andando na sala de estar e havia tropeçado em alguma coisa. O que será que Wade estaria procurando? Era melhor dar uma olhada e oferecer ajuda.
— Wade, há algo errado? Você precisa de mim? — indagou Sarah, acendendo a luz.
Um vulto vestido de preto avançou na sua direção, uma expressão pouco amistosa no rosto vagamente conhecido. Sem dúvida tratava-se do entregador do relógio falante!
— O que está acontecendo aqui embaixo? — indagou Wade do alto da escada. — Sarah Jane Morrison, é você?
O intruso jogou a luz da lanterna no rosto do dono da casa e sorriu relaxado. Sim, era o homem cego para quem trouxera a encomenda. Não havia por que preocupar-se.
— Desça bem devagar, companheiro, e ninguém sairá ferido.
— Sarah Jane Morrison, você está bem?
— Sim, estou OK.
— Já lhe disse para descer — o intruso insistiu sem disfarçar o nervosismo.
— É o que estou fazendo — Wade respondeu calmo e controlado. — Dê-me alguns minutos, pois não posso enxergar. O que está acontecendo aqui?
— Ouvi alguns barulhos e achei que fosse você — Sarah sentia-se tranquila agora, como se a força emanada de Wade a estivesse penetrando.
Ele terminou de descer a escada e colocou-se do lado oposto de Sarah, propositalmente apoiando-se nos móveis para orientar-se.
— Você fique aí parado, companheiro — avisou o intruso, bastante agitado.
De repente o som de pneus derrapando bem próximo à casa pareceu assustar o ladrão e ele correu para a janela, preocupado com o comparsa que o aguardava do lado de fora.
Sarah aproveitou a oportunidade e apagou a luz, enquanto gritava:
— A luz está apagada, Wade, está escuro agora! A vantagem é sua!
O ladrão teve tempo apenas de voltar-se antes de sentir o punho forte de Wade atingir-lhe o queixo, derrubando-o no chão.
Em pânico, o intruso empurrou seu oponente e fugiu pela porta da frente. Wade perdeu o equilíbrio e caiu, batendo a cabeça numa das quinas da lareira.
— Wade... — Sarah murmurou, angustiada, ajoelhando-se ao lado da figura caída e apertando-o de encontro ao peito. — Por favor, fale comigo!
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