Apoio à Pesquisa e Extensão na Universidade Federal de Campina Grande



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Associação técnico-científica
Ernesto Luiz de Oliveira Junior - atecel

Apoio à Pesquisa e Extensão na Universidade Federal de Campina Grande


DESERTIFICAÇÃO

NO ESTADO DA PARAÍBA:

UMA VISÃO PANORÂMICA

Campina grande 2005

1. ASPECTOS GERAIS
O presente trabalho é uma contribuição da ATECEL através do contrato com a Fundação Grupo Esquel Brasil, tendo como apoio à execução do trabalho a Área de Sensoriamento Remoto e SIG da Unidade Acadêmica de Engenharia Agrícola, do Centro de Tecnologia e Recursos Naturais da Universidade Federal de Campina Grande, com o objetivo de fazer uma análise panorâmica da desertificação no Estado da Paraíba.
O saldo de mais de três séculos de incorporação do bioma Caatinga ao sistema econômico nacional e global pode ser resumido em extermínio de diversas tribos da nação Cariri; perda significativa de biodiversidade com a extinção de espécies animais e vegetais; perturbação do ciclo hidrológico; agravamento da questão social e econômica pela perda e diminuição da fertilidade das terras agrícolas acelerando o processo de degradação/desertificação, que induz a uma crescente pauperização da população, principalmente da população rural; poluição dos sistemas hídricos; aumento de pragas e doenças nas lavouras e na criação; agravamento do êxodo rural que resulta na favelização dos núcleos urbanos da bio-região1.
O conhecimento do meio-ambiente onde se realiza um estudo é fundamental para compreensão dos processos que nele se realizam, pois os fatores ecológicos bióticos e abióticos, bem como a infra-estrutura de uma área, interagem com as atividades humanas de forma a influenciar no sucesso dos empreendimentos.
No semi-árido o homem tem interagido com o clima e com a vegetação de forma negativa, com ações que desconsideram as características intrínsecas da região. A razão deste conflito é cultural. O homem do Nordeste originário dos antigos colonizadores, que vindos das terras do além mar, a mais de 300 anos, adentraram a caatinga, até então um bioma em total equilíbrio. Estes desbravadores encontraram terras férteis, promissoras, apesar do clima semi-árido. Naquela época, mesmo durante as secas, havia uma certa oferta de água. A primeira atividade desse colonizador foi à bovinocultura, pois a caatinga tinha uma quantidade excepcional de biomassa a ser ofertada aos animais. Os rebanhos viviam soltos, não existiam cercas divisórias das propriedades, e o gado era recolhido uma vez por ano, e contado e dividido, dando origem a chamada pecuária extensiva. Esta época ficou conhecida como o ciclo do couro. Este fato mostra o quão diferente era aquele Nordeste do Nordeste de hoje. O ciclo do couro foi substituído por outros ciclos econômicos, como o do algodão e o do sisal, os mais importantes.
Este curto espaço de tempo não foi suficiente para este homem desenvolver uma cultura de convivência com o Semi-árido e, sem entender este novo lar, ele começou a construir o Desastre Seca – um desastre de mais de 400 anos – ao desmatar indiscriminadamente para a agricultura e pecuária, ele começou a degradar/desertificar estas terras.
Na avaliação do meio ambiente, em áreas áridas, semi-áridas e sub-úmidas secas, os processos mentais relativos à percepção ambiental é um fator importante a ser estudado, pois percepção ambiental é fundamental para compreender melhor a inter-relação do ser humano com o meio ambiente, seja individual ou comunitariamente, em suas expectativas, julgamentos e condutas. O indivíduo ou grupo enxerga, interpreta e age em relação ao meio ambiente de acordo com interesses, necessidades e desejos, recebendo influências, sobretudo, dos conhecimentos anteriormente adquiridos, dos valores, das normas grupais e da ética, enfim, de um conjunto de elementos que compõe sua herança cultural2. Nos processos de planejamento e educação ambiental os estudos de percepção e da ética ambiental são fundamentais porque permitem conhecer as particularidades de cada relação sociedade/indivíduo-meio ambiente, propiciando, assim, o desenvolvimento de políticas públicas que realmente promovam a participação com vista ao desenvolvimento sustentável.
As políticas de governo, desde o império até hoje, praticamente, sempre tiveram um caráter emergencial, e nenhuma delas conseguiu resolver as questões do conflito homem X semi-árido.
A questão cultural também nunca permitiu que nem a sociedade civil e nem os governos se interessassem pela construção de políticas públicas de desenvolvimento e de convivência com o semi-árido. E assim, todas as ações sempre estiveram voltadas a combater à seca, através de soluções ímpares, como a irrigação, o reflorestamento com algaroba, etc. Há necessidade de que a sociedade tenha a percepção de que “as políticas públicas têm a sua origem em alguma demanda (necessidade) apresentada pelos atores políticos e/ou sociais, direta ou indiretamente interessados, que transitam e interagem no meio ambiente e no sistema político. As políticas públicas se destinam a solucionar problemas políticos, que são as demandas incluídas na agenda governamental. Enquanto não ocorrem, o que se tem são ”estados de coisas”: situações mais ou menos prolongadas, incômodas e injustas, que geram insatisfação ou perigo uma vez que atingem grupos mais ou menos amplos da sociedade, sem, todavia, compor a agenda governamental, ou mobilizar as autoridades políticas”3.

2. INTRODUÇÃO
A região do semi-árido brasileiro é caracterizada por condições sociais e ambientais bastante vulneráveis. A intervenção das atividades humanas nesse cenário tem propiciado a degradação acentuada dos recursos naturais, originando em algumas áreas os denominados “núcleos de desertificação” associados com o nível muito grave de degradação das terras.
Embora os Governos tenham investido na realização de obras na região, principalmente na construção de barragens, estradas e na implantação de perímetros irrigados e vários tenham sido os decretos, programas e planos criados, os problemas sociais e ambientais não têm sido resolvidos. Há grande ênfase nos pacotes tecnológicos apontados como solução para o Nordeste, contudo, pouca atenção vem sendo dada às comunidades como protagonistas de seu espaço geográfico e responsável por diversos aspectos do mesmo, inclusive da degradação. Rodrigues (1998) adverte que a sociedade não aparece na fórmula, seja como objeto de estudo ou como objeto de ação e mudança, no que diz respeito a seus padrões de comportamento e de incidência na configuração da questão ambiental no semi-árido brasileiro.
Sabe-se que os problemas ambientais causados pela sociedade, em seu processo de construção e reconstrução de espaços geográficos, decorrem, sobretudo do modo como as sociedades se apropriam da natureza, usam, destinam e transformam os recursos naturais. Consiste numa questão de ordem política, econômica e cultural, pois a sociedade age na natureza segundo os padrões ou costumes – políticos, econômicos e culturais – criados por ela mesma. Adas & Adas (1998) afirmam que a degradação do meio-ambiente está intimamente relacionada ao modelo de desenvolvimento econômico adotado. Portanto, este também pode ser considerado um fator causal de desastres, pois contribui na formação de situações vulneráveis.
A desarticulação das economias rurais, caracterizada pela perda da capacidade produtiva do solo e pela descapitalização dos produtores, consiste num fator causal de desastres (Maskrey, 1989). Os desastres devem ser entendidos como fenômenos de caráter eminentemente social, não apenas em termos do impacto que os caracteriza, mas também em termos de suas origens (Lavell, 1993). Observa-se ainda, que o desmatamento e a degradação do solo pelas atividades humanas são as principais causas de processos de degradação/desertificação em regiões semi-áridas do planeta (FAO, 2002).
As ameaças naturais, como seca, inundações, erupções vulcânicas, terremotos, entre outras, não são sinônimos de desastres naturais (Cardona, 1993). Acosta (1996) e Medina (1992) esclarecem que os desastres somente ocorrem quando uma ameaça surge em condições vulneráveis, salientando ainda que as ameaças ocorridas em áreas desabitadas ou onde as atividades econômicas padrões não são vulneráveis, não causam desastres.
Na redução das vulnerabilidades, o desenvolvimento precisa assumir uma postura multidimensional, que abranja o aspecto ético, pela preocupação com a equidade, e que seja capaz de incluir variáveis dificilmente quantificáveis, mas qualitativamente indispensáveis à configuração de novos padrões de vida para as atuais e futuras gerações.
O uso do geoprocessamento no estudo da degradação das terras, bem com no dos riscos a desastre resultante da interação ambiente semi-árido - sociedade, permite uma maior dinâmica do processo de geração de informações, possibilitando maior produtividade, atualizações em tempo real e versatilidade no manuseio dos dados obtidos, conforme constatado em alguns trabalhos, como os de Bender e Bello (1993), Medina (1994), Silva Neto e Barbosa (1996), Maskrey (1998), Barbosa e Santos (1998), Barbosa et al. (1999), Cândido (2000), Silva (2002) e Araújo (2003). Contudo, o primeiro passo deve ser a formação de uma equipe multi-interdisciplinar, que seja capaz de trabalhar em sintonia (Barbosa, 1997).
Maskrey (1998), também observou que os diversos enfoques de diversas ciências têm contribuído e influenciado o desenvolvimento de SIG’s apropriados à análise de desastres. Pode-se citar o exemplo da Rede de Estudos Sociais em Prevenções de Desastres na América Latina (LARED, 2001), que com uma estrutura multidisciplinar, tem contribuído com a geração de inúmeras informações utilizando o SIG DesInventar em países das Américas.
Barbosa et ali (2003) desenvolveram o software Sistema de Cálculo de Vulnerabilidade (SISCAV) que calcula as vulnerabilidades de indivíduos, famílias, grupos ou comunidades, como suporte a mitigação e ao desenvolvimento de políticas públicas para o desenvolvimento sustentável.
O trabalho foi desenvolvido em 3 etapas: a) processamento digital das imagens Landsat-5, que através da classificação de padrões foi gerado um mapa digital dos níveis de degradação das terras do estado da Paraíba; b) avaliação de ações de governo (Federal, Estadual e Municipal) e da sociedade civil organizada, voltadas à mitigação dos efeitos da seca e ao desenvolvimento; c) confecção cartográfica e do relatório.
O resultado da classificação de padrões das imagens aponta para a predominância dos níveis de degradação das terras moderado, grave e baixo. O nível muito grave, com o qual se associam núcleos de desertificação e o muito baixo, áreas onde o meio ambiente encontra-se preservado, apresentaram os menores valores. Se por um lado estes valores para o nível muito baixo são preocupantes, pelas poucas áreas do estado onde o meio ambiente parece ainda estar preservado, por outro lado eles indicam que as áreas desertificadas representam uma pequena parcela do território paraibano, principalmente na zona semi-árida. No entanto isso não pode ser considerado um fato alentador, pois os níveis moderado e grave são muito preocupantes, pois indicam diferentes estágios do processo de desertificação. O processamento digital das imagens mostrou que as áreas mais preocupantes são a depressão sertaneja, na porção centro-oeste do estado e a região do Cariri-Seridó, onde predomina o nível grave de degradação das terras, com o qual se associa o nível muito grave. Na região do Agreste/Litoral e nas regiões mais elevadas no Sudoeste e Noroeste do Estado predominam os níveis moderado, baixo e muito baixo, sendo que este último associa-se principalmente as áreas de serras. Cabe salientar que não houve avaliação no campo do processamento digital das imagens.

3. O ESTADO DA PARAÍBA4
O Estado da Paraíba abrange uma superfície territorial de 56.584 km2, 70% da qual localizada no polígono das secas. Segundo o Censo de 2000, sua população é de 3.443.825 habitantes, e encontra-se desuniformemente distribuída em 4 mesorregiões (3 no SA), 23 microrregiões (19 no SA) e 223 municípios (170 na RSA – Anexo 1; 29 na RSU – Anexo 2 e 10 na RDE – Anexo 3) e representa 7,21% da população regional e 2,19% da população nacional. Nas últimas décadas o estado sofreu uma rápida urbanização devido à alta migração da zona rural para a urbana, e hoje 71% de sua população ocupa os espaços urbanos e 29% a zona rural. Um fato alarmante, que poderá ter impactos imensuráveis no futuro do Estado, é que segundo o último relatório da UNICEF de 2005, 70% das crianças paraibanas são de famílias que recebem por mês no máximo R$150,00, quantia esta muito baixa que dá o indicativo de que estas crianças estão crescendo desnutridas, o que afeta o desenvolvimento físico e mental pela deficiência da ingestão de vitaminas e proteínas.
O PIB da Paraíba no ano de 2000 era de R$9,23 bilhões e o PIB per capta de R$ 2.682,00. No entanto no período 1996-2000, o desempenho do Estado apresentou resultados desfavoráveis: a participação relativa do PIB PB/NE se manteve inalterada nas duas datas com uma participação de 6,40% e a do PIB PB/BR teve um incremento desprezível de 0,82% para 0,83%. Com relação ao PIB per capita, em 1966 a Paraíba ocupava o 22º lugar chegando no ano 2000 no 23º lugar. A agropecuária ainda é o setor que mais contribui para o incremento do PIB estadual. Dos 223 municípios do Estado, 144 recebem um dos menores FPM, e para estes municípios esta é praticamente a única fonte de renda. Este fato mostra a fragilidades dos sistemas organizacionais destes municípios, que praticamente vivem em estado de imergência. Com a maioria destes municípios estão associados os piores índices de IDH.
Na área social, os problemas de saúde (mortalidade infantil, endemias), fome, educação (analfabetismo, decréscimo na escolaridade) e desemprego ainda continuam agudos. A mortalidade infantil ainda é alta – 38/1000 em 20035. Segundo o Censo de 2000, 22% da população acima de 10 anos da zona urbana eram analfabetos e na zona rural este número era de 41%. Da parcela considerada alfabetizada, em 1999, 33% dos residentes na zona urbana apresentavam taxa de escolaridade com menos de 3 anos de estudos (19% com menos de 1 ano). Na zona rural, esse índice eleva-se para 67% (39% com menos de 1 ano de estudos).
A cobertura do esgotamento sanitário é muito baixa, devendo passar no final de 2006 de 26% para 52%. O saneamento básico existe somente em 13 municípios, sendo de 36 a meta para o final de 2006. O abastecimento de água em 2000 abrangia 67% da população e a coleta de lixo doméstico 64%². O atendimento pelo SUS ainda é precário e a maioria dos municípios ainda transportam os seus doentes a centros maiores para o atendimento médico. O PSF tem contribuído para a diminuição da mortalidade infantil, distribuição de medicamentos e marcação de consultas, porém ainda persistem as doenças relacionadas às condições de vida e higiene, como a dengue, verminose, diarréias infantis, desnutrição, esquistossomose, etc. Os maiores índices de doenças infecto-contagiosas estão relacionados com rubéola, diarréia, chagas, hepatite e meningite. Em 2003 64% dos óbitos (menor índice do NE) e 77% dos nascidos vivos foram informados².
É de se destacar o contraste com o cenário acima o potencial de pessoal qualificado de nível superior, com uma expressiva população de cientistas e pesquisadores em várias áreas do conhecimento, infra-estrutura de pesquisa e desenvolvimento e a produção científica, relativamente à população e ao tamanho e volume das atividades produtivas da Paraíba. Neste contexto a Paraíba é um grande exportador de “célebros”, e infelizmente não tem havido um aproveitamento eficaz desse seu potencial.

4. VULNERABILIDADE
Os desastres são determinados pelos riscos e pelas vulnerabilidades (Fórmula 1) não se podendo falar em vulnerabilidades, sem entendermos o que são riscos e desastres.

DESASTRE = RISCO X VULNERABILIDADE (1)


Desastre é qualquer perda de vidas humanas, bens materiais e/ou ambientais causada por um evento perigoso, de origem natural ou humana, que pode ter uma escala pessoal, familiar, comunal, regional, nacional ou internacional e, por sua vez, tem a ver com alteração ou interrupção da vida cotidiana de uma comunidade, devido à incapacidade de recuperação, por meios próprios, pois os impactos destrutivos excedem a capacidade de adaptação e ajustamento, em termos de resposta para absorver o efeito produzido (Cardona, 1993; González et al., 2002).
Na análise dos desastres podem ser adotados dois enfoques: o fisicialista e o social. O primeiro, mais difundido, tomou como ponto de partida a idéia de que os desastres são característicos de fenômenos naturais perigosos que ocorrem irremediavelmente sobre o homem e suas atividades. Assim, a magnitude de um desastre é considerada como função da severidade, magnitude e intensidade do evento ou fenômeno físico (Lavell, 1996) e, ainda, são categorizados como ‘imprevisíveis’, ‘não-manejáveis’, ‘inevitáveis, ‘atos de Deus’ ou, se não, como produtos inevitáveis de forças naturais extremas (Maskrey, 1998). Já o enfoque social considera que o elemento ativo é a vulnerabilidade e os processos e estruturas socioeconômicas, políticas e culturais que a moldam, ou seja, é a vulnerabilidade que determina o caráter dos desastres.
Sob essa ótica, o desastre não é o fenômeno natural, mas a relação deste fenômeno com um contexto social que apresente condições de vulnerabilidade a ele, já que, somente ocorrerá um desastre quando o fenômeno natural superar a capacidade material da população para absorver, amortecer ou evitar seus efeitos negativos. Em face disso, há um alto risco de desastre ser um ou mais fenômenos naturais perigosos ocorrerem em situações vulneráveis (Maskrey, 1998).
Fenômenos naturais como terremotos, secas, inundações, ciclones tropicais, incêndios florestais, erupções vulcânicas e etc têm provocado perdas elevadas em vidas humanas, a destruição do sustento de muitos e da infra-estrutura econômica e social, assim como danos ambientais (EIRD, 2002).

É comum confundir o uso dos termos “fenômeno natural” e “desastre natural”. Ainda que fenômenos naturais sejam, como os terremotos, altamente destrutivos, não necessariamente causam desastres. No entanto, esses fenômenos extremos somente poderão provocar desastres quando as mudanças produzidas afetarem uma fonte de vida com a qual o homem contava, ou um modo de vida realizado em função de uma determinada geografia (Romero e Maskrey, 1993).



É importante diferenciar o fenômeno natural da ameaça. A ameaça é definida como a probabilidade de ocorrência de um fenômeno físico, potencialmente desastroso, de origem natural, tecnológica ou provocada pelo homem, que pode manifestar-se em um local e durante um determinado tempo, frente ao qual uma comunidade particular está exposta e é vulnerável. Por sua vez, o fenômeno natural é caracterizado por sua dimensão e situação geográfica (Cardona, 1996).
A presença de um fenômeno natural ou antrópico, essencial para a ocorrência de um desastre, não oferece uma explicação suficiente para entender a maioria dos desastres que se sucedem. A transformação de uma ameaça em um desastre requer necessariamente que ocorra impacto negativo numa matriz humana vulnerável (Lavell, 1994).
Os riscos a desastres são socialmente construídos e a gente contribui a exacerbá-los e modificá-los (Cutter, 2001). Da combinação das ameaças e de como a população lhes enfrenta é que surge o risco a desastre e, eventualmente, ocorre o desastre (Umaña, 2002).
O risco a desastre - destruição ou perda esperada - corresponde ao potencial de perdas que podem ocorrer ao sujeito ou sistema exposto, resultado da convolução da probabilidade de ocorrência de ameaças e da vulnerabilidade dos elementos expostos a tais ameaças (Risco a desastre = Ameaça*Vulnerabilidade). Matematicamente risco a desastre é a probabilidade de que ocorra um desastre ou, é a probabilidade de que um evento ou fenômeno ameaçador, natural ou antrópico atue sobre um sistema socioeconômico com certo nível de vulnerabilidade, resultando num desastre (Maskrey, 1994).
Para estimar o risco a desastre é necessário, de acordo com sua definição, ter em conta, desde o ponto de vista multidisciplinar, não somente o dano físico esperado, as vítimas ou perdas econômicas equivalentes, mas também fatores sociais, organizacionais e institucionais, relacionados com o desenvolvimento das comunidades.
A deficiente informação, comunicação e conhecimento entre os atores sociais, a ausência de organização institucional e comunitária, as debilidades na preparação para a atenção de emergências, a instabilidade política e a falta de saúde econômica contribuem, em uma área geográfica, a ter um maior risco (Cardona, 2001).
A acumulação de riscos a desastres está relacionada à falta de políticas públicas, ou de estratégias orientadas a sua gestão e, ainda, à inexistência de estruturas administrativas e sistemas legislativos adequados, tanto em nível local, como nacional e regional (PNUD, 2002).
A vulnerabilidade é essencialmente uma condição humana, uma característica da estrutura social e um produto de processos sociais históricos (Lavell, 1994). Implica uma combinação de fatores que determinam o grau até o qual a vida e a sobrevivência de alguém ficam em risco por um evento distinto e identificável da natureza ou da sociedade (Blaikie et al., 1996). Podemos afirmar então, que vulnerabilidade é o mesmo que insegurança. Quando alguém está em uma situação de vulnerabilidade, este alguém está inseguro.
A vulnerabilidade dos elementos expostos às ameaças está intimamente relacionada às características dos membros da sociedade, em termos de sua capacidade para antecipar, enfrentar, resistir e se recuperar do impacto negativo (Haque e Branco, 1998) ou à incapacidade de uma comunidade para absorver, mediante o auto-ajuste, os efeitos de uma determinada mudança em seu meio ambiente (Wilches-Chaux, 1993).
A vulnerabilidade não se determina por fenômenos perigosos, mas por certos processos sociais, econômicos e políticos; daí que os mais vulneráveis são os países mais pobres e dependentes, as regiões mais desfavorecidas e a população com menos recursos (Gareis et al., 1997). De forma geral, o pobre sofre mais com os desastres que o rico, se bem que pobreza e vulnerabilidade não são sinônimas, ainda que às vezes estejam estreitamente relacionadas (Blaikie et al., 1996).
Os desastres naturais aceleram o processo de degradação e limitam ainda mais o uso dos recursos naturais6, muitos deles já gravemente deteriorados (Cutter, 2001). Os pobres para sobreviver se vêm obrigados a explorar os recursos ambientais, aumentando assim, tanto o risco como a exposição aos desastres, especialmente aqueles provocados por inundações, secas e deslizamentos (EIRD, 2002).
O pobre tem em grande parte de sua vida normal uma evidente luta contínua, na qual suas condições podem assimilar-se a um desastre (Blaikie et al., 1996). As principais inquietudes dos habitantes pobres não estão relacionadas com os problemas ambientais, mas com as questões do campo social e econômico. As condições de vida são muito penosas e monopolizam o interesse da população (Chardon, 1997).
A maior vulnerabilidade dos segmentos pobres da população também está associada a sua escassa possibilidade de participar nas políticas públicas (CEPAL e BID, 2003). A falta de poder e de voz também influi no aumento da sensação de vulnerabilidade e na incapacidade da população pobre para se proteger das comoções (Narayan et al, 2003).
Muito se fala na pobreza, no seu combate, mas dificilmente alguém traz os representantes desta pobreza para a discussão de problemas de seu interesse. A sociedade paternalista que se instalou no Nordeste vê o pobre não como um ser igual, mas como um seu servidor, seu dependente, através das ações de caridade, tendo como troco à subserviência. Esta dependência forçada não tem somente um caráter social ou de caridade, mas um forte caráter político, traduzido no âmbito da sociedade pelos chamados currais eleitorais, que são amplamente aceitos por suas classes mais altas e dominantes.
O assistencialismo e o compensatório aprofundam a condição vulnerável dos cidadãos, pois debilitam as estratégias de auto-ajuda e enfrentamento da adversidade que a população tem desenvolvido. Além disso, sobre a base da diferenciação social, o assistencialismo e o compensatório vão consolidando a cultura de: dependência; desigualdades; inferiorização; subalternização; sujeição; e exclusão (Romero, 2002).
É necessário ressaltar que a vulnerabilidade em si mesma constitui um sistema dinâmico, isto é, surge como conseqüência da interação de uma série de fatores e características - internas e externas - que convergem em uma comunidade particular. O resultado dessa interação é a incapacidade da comunidade para responder adequadamente ante a presença de uma ameaça determinada. Wilches-Chaux (1993) denominou Vulnerabilidade Global, a essa interação de fatores e características.
Dentro deste contexto é que se instalou o Desastre Seca no semi-árido nordestino. Um desastre de mais de 300 anos, extremo, lento e complexo. Em conflito com o meio ambiente – clima e o bioma caatinga – o homem ao longo deste tempo vem construindo os riscos, através do não emprego de técnicas de manejo das terras e da caatinga (erosão; desmatamentos; degradação/desertificação das terras); por falta de assistência e orientação técnica; pela estrutura agrária (predomina os minifúndios); pela falta de infra-estruturas adequadas para a convivência com o semi-árido; por falta de políticas pública para um desenvolvimento sustentável, o que acarreta o empobrecimento da grande maioria da população rural. Este empobrecimento aumenta a insegurança desta população, ou seja, a sua vulnerabilidade, frente a todo o contexto. E assim, temos um ciclo vicioso: aumenta a vulnerabilidade, aumenta o risco e a cada período de seca climática, seja ele normal ou prolongado, o desastre seca avança.
4.1. A Vulnerabilidade Rural na Paraíba: Exemplos
Estudando os processos de degradação/desertificação nos municípios de Picuí (Seridó), Sumé (Cariri) e Sousa (Sertão), que possuem desenvolvimento econômico diferenciado, Silva (2002), Araújo (2003) e Moura (2002) analisaram as vulnerabilidades das famílias rurais desses municípios, e chegaram aos seguintes dados (Tabela 4.1.):
Tabela 4.1. Vulnerabilidades nas zonas rurais dos municípios de Picuí, Sousa e Sumé.

VULNERABILIDADES

MUNICÍPIOS

Picuí (a)

Sousa (b)

Sumé (c)

Vulnerabilidade Social (%)

46,9

51,8

47,3




Vulnerabilidade Econômica (%)

87,2

84,5

85,8




Vulnerabilidade Tecnológica (%)

75,0

69,3

77,5




Vulnerabilidade à Seca (%)

79,5

66,8

76,8




Vulnerabilidade Global (%)

62,1

60,3

60,0




Fontes: (a) Silva (2002); (b) Araújo (2002); (c) Moura (2002).
Os valores das vulnerabilidades obtidos por Silva (2002), Araújo (2002) e Moura (2002) foram confrontados com os valores das classes de vulnerabilidade, de acordo com Araújo (2002): baixa (0 – 15); moderada (16 – 30); alta (31 – 45); e muito alta (> 45). Assim caracterizadas: i) baixa: maior capacidade de suporte e superação pós-desastre; ii) moderada: apesar do impacto pelo desastre, capacidade de suportar os prejuízos superiores à faixa seguinte; iii) alta: menor capacidade de suporte e superação pós-desastre; iv) muito alta: estado permanente de debilidade sócio-econômica, acentuada, no caso do semi-árido, pelas ocorrências da seca.
A Classe Muito Alta de vulnerabilidade, não está restrita apenas à ocorrência de desastre, mas se constitui num estado permanente de debilidade socioeconômica, agravada quando ocorre o desastre. Esta classe caracteriza estados de vulnerabilidade indesejáveis, configurando uma situação de alto risco a desastres (Moraes Neto, 2003). Os números apresentados no Quadro 4.1. refletem a seguinte realidade da população rural destes municípios:
Quadro 4.1. Dados Globais do Diagnóstico Socioeconômico ambiental dos municípios de Picuí, Sousa e Sumé.

  • 61% das casas não têm energia elétrica;

  • 81% dos agricultores não utilizam práticas de conservação do solo;

  • 43% da população são analfabetos;

  • 93% dos agricultores não recebem assistência técnica;

  • 49% usam lenha para cozinhar;

  • 90% dos agricultores não usam a irrigação para as culturas;

  • 74% dos esgotos domésticos correm à céu aberto;

  • 72% captam água da chuva (cisternas e outros);

  • 66% das famílias tem renda inferior a 1 salário mínimo;

  • 55% se empregam nas frentes de trabalho;

  • 82% dos agricultores não comercializam a produção;

  • 70% não acreditam nas previsões climáticas;

  • 69% dos agricultores não utilizam adubo;

  • 27% acreditam em dados empíricos (previsões).

A Vulnerabilidade Global das famílias rurais naqueles 3 municípios está na classe muito alta evidenciando fragilidade às condições do ambiente semi-árido, em particular às relacionadas com as variações climáticas e indica um risco muito alto e permanente de ocorrência de desastres, o que reflete o quadro de alta degradação sócio-econômica e ambiental existente. Esta situação deve-se ao uso irracional dos recursos naturais e das águas bem como a transformação do seu ecossistema em áreas degradadas.


Os estudos de Araújo (2002), Silva (2002) e Moura (2003) mostraram que nesses municípios a dinâmica da construção social do risco está presente na medida em que os níveis de degradação das terras são muito altos, e eles estão com grande parte de seus territórios altamente comprometidos com a desertificação, e os índices apontam para as seguintes cifras: Picuí – 71,75%; Sousa – 41,50%; Sumé – 44,12%. Estas cifras são altamente alarmantes, e demonstram a incapacidade do homem rural de reverter por si só este quadro, pela sua alta vulnerabilidade.
4.2. Considerações
Os altos valores das vulnerabilidades mostram o grau de pobreza do homem do campo, sua insegurança e sua incapacidade de por si só fazer mudanças significativas, visando um desenvolvimento sustentável com a diminuição dos riscos. Eles mostram a fragilidade do sistema.
Esta alta vulnerabilidade está estampada no dia a dia do homem do campo, que é altamente dependente das estruturas do Governo. A escassez dos recursos hídricos em grande parte da região mostra a fragilidade da população, que devido ao alto grau de pobreza, não consegue minimizar o seu sofrimento diário por um pouco de água potável, quando ela existe.
A água comercializada é muito cara, e nem sempre a maioria consegue comprar. O número de carros-pipa a serviço do governo para a distribuição gratuita de água nem sempre consegue atender a todos e a população se serve das águas de barreiros, altamente vulnerável a infestação por microorganismos e bactérias, aos defensivos agrícolas, e aos dejetos dos animais Figura 4.1.

Figura 4.1. As altas vulnerabilidades da população rural praticamente anulam a percepção dos riscos, pela resignação.


O lixo e o esgoto doméstico também são fatores formadores deste alto índice de vulnerabilidade, que na maioria dos casos são eliminados a céu aberto. O lixo além de contaminar áreas agrícolas e de pastagem, contribui para a proliferação de insetos e roedores, como moscas, baratas e ratos.
A alimentação do homem do campo também é importante. É no período de 0 a 02 anos que o homem desenvolve sua capacidade de armazenar informação. Mas esta capacidade tem que ser mantida através da ingestão de proteína animal, principalmente a ofertada pela carne vermelha. Na maioria dos casos a carne não faz parte do cotidiano das famílias, e a deficiência no registro e armazenamento da informação é sentida, quando os indivíduos cognominam seus filhos com nomes completamente diferentes daquele com o qual a criança foi registrada, pelo simples fato dos pais terem esquecido o nome de registro ou de batismo. Também se sente este problema quando se indaga a idade, a data de nascimento, o tempo que mora no lugar, a idade dos familiares, etc. Assim as pessoas esquecem facilmente das informações recebidas. Esta é uma das razões, por não se lembrar dos acontecimentos ao longo da vida e da resignação com o status quo. A falta da proteína animal traz a apatia, que muitos a confundem com preguiça. Daí surge o conflito homem x homem, pois os mais bem alimentados têm o pensamento que o menos alimentado não quer nada, é malandro e não quer trabalhar.
Outro fator relevante é o tipo de moradia, que no geral são de taipa e completamente fora dos padrões normais (Figura 4.2). Estas casas são vulneráveis entre outras coisas, às intempéries do clima, como as chuvas fortes, e a proliferação de insetos, dentre eles o barbeiro.
Embora os índices oficiais mostram uma melhoria na condição de vida da população, e até certo ponto isto acontece, pois os valores da vulnerabilidade social são os mais baixos (média para os 3 municípios de 48,66%) dentre as vulnerabilidades analisadas, é bom frisar que este índice é considerável inaceitável para a vida humana.

Figura 4.2. Casas de taipa – vulneráveis à infestação por insetos, à insalubridade e às intempéries do tempo.
Ao basear-se nos valores encontrados das vulnerabilidades das famílias rurais de Picuí, Sumé e Sousa, pode-se de um modo geral, aceitar como verdadeira a hipótese de que a sociedade possui em suas estruturas cognitivas os elementos que a predispõe a um risco muito alto de impactos negativos, mesmo na ocorrência de pequenas ameaças, como os curtos períodos de estiagem. O poder público praticamente está ausente. Não existem políticas públicas que promovam o desenvolvimento e o bem estar social. Algumas coisas ainda funcionam, mesmo que de um modo precário, como o PSF, através dos Agentes Comunitários de Saúde, que com seu trabalho conseguiram diminuir a mortalidade infantil, e ajudam na distribuição de remédios. Mas faltam médicos e um serviço de saúde decente. As emergências são falhas.
Os altos valores das vulnerabilidades também marcam a organização social do campo. As associações rurais não funcionam, pois a população não entende bem o sentido destas. Elas proliferam por todos os cantos, mas somente com o objetivo de conseguir algum tipo de benefício. Praticamente para cada uma das reivindicações, se forma uma associação (por conta das exigências governamentais). E assim, formam uma associação para reivindicar a eletrificação; outra para reivindicar uma cisterna, e etc. Em uma comunidade pode ter várias associações. Por outro lado, os dirigentes destas associações vêm nelas uma oportunidade de melhorar de vida, e muitas vezes assumem compromissos políticos, esperando em troca receber um bom apadrinhamento, almejando um cargo público e até mesmo a vereação. E dessa forma dão início às brigas internas que podem causar a ruptura da estabilidade social de uma determinada comunidade, culminando com o esvaziamento da associação.
Mantendo-se as vulnerabilidades identificadas nas famílias e nas relações sociais no campo e as atuais concepções de exploração agropecuária, ambas propiciando a degradação dos recursos naturais, onde o uso inadequado dos solos, dos recursos hídricos e das tecnologias tem propiciado a perda da capacidade produtiva, a sustentação do meio rural pode, em pouco tempo, constituir-se num empreendimento bastante oneroso e demorado, ou quiçá, impossível de ser realizado, pelos altos custos econômicos.
A existência de situações extremas de degradação das terras pode ser compreendida, quando se estuda o comportamento socioeconômico, como uma característica intrínseca do sistema de produção vivido pela sociedade desde o início de sua colonização que ocasionou a adoção de técnicas impróprias no trato das terras e a exploração desenfreada dos recursos naturais.
A desarticulação e a deterioração da economia rural tradicional, não só do Estado da Paraíba, mas de todo o Nordeste, sem que uma alternativa viável de desenvolvimento tenha tomado lugar, fizeram com que a maioria das comunidades agrícolas se encontre hoje mergulhada em dificuldades econômicas e problemas ambientais.
É mais coerente observar que os problemas de degradação ambiental são decorrentes mais de ordem política, econômica e social, do que de ordem ecológica, embora esta possa ter maior ou menor vulnerabilidade a uma determinada ameaça.
Assim, os empreendimentos econômicos devem estar harmonizados com a sociedade e com o ambiente físico dos locais onde estão ou serão inseridos. São necessárias a criação e adoção de políticas públicas capazes de propiciar uma relação mais equilibrada entre as famílias rurais e o ambiente semi-árido, sob pena da impossibilidade, em curto e médio prazo, de sua permanência no campo, pois quanto mais degradado estiver o meio ambiente, maior serão as vulnerabilidades da sociedade e maiores os riscos a desastres, mesmo que de um modo geral a degradação das terras no Estado, pelos dados das imagens orbitais, a priori, parece estar associada ao nível moderado. Mas, se não forem desenvolvidas políticas adequadas, a tendência é que este nível avance para os mais graves. Cabe aqui lembrar que os diferentes níveis de degradação determinam os diferentes estágios do processo de desertificação.

5. DESERTIFICAÇÃO
5.1. Conceito, Causas e Efeitos

O tema Desertificação vem sendo discutido pela comunidade internacional desde 1977, quando da realização, em Nairobi, da Conferência Internacional das Nações Unidas para Combate à Desertificação. A partir desta conferência, foi criado o Plano de Ação de Combate à Desertificação – PACD, que visava desenvolver ações em âmbito mundial, com adesão voluntária dos países que participaram da conferência.


A desertificação não se refere à expansão dos desertos existentes. Ela sucede porque os ecossistemas das terras áridas, que cobrem um terço do total das terras, é extremamente vulnerável a exploração e ao uso inapropriado da terra. A pobreza, a instabilidade política, o desmatamento e práticas incorretas de irrigação podem minar a fertilidade das terras...”7
A Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação nos países afetados por seca grave e/ou desertificação, particularmente na África (CCD) seguindo os pressupostos da Agenda 21, define a desertificação como sendo “a degradação das terras nas zonas áridas, semi-áridas e subúmidas secas resultante de fatores diversos tais como as variações climáticas e as atividades humanas”, sendo que por degradação da terra se entende: a redução ou a perda da produtividade biológica ou econômica das terras agrícolas de sequeiro, das terras de cultivo irrigado, dos pastos, das florestas e dos bosques em zonas áridas, semi-áridas e subúmidas secas, pelos sistemas de utilização da terra ou por um processo ou uma combinação de processos, incluídos os resultantes de atividades humanas e padrões de povoamento, tais como:
(i) a erosão do solo causada pelo vento ou pela água,

(ii) a deterioração das propriedades físicas, químicas e biológicas ou das propriedades econômicas do solo, e

(iii) a perda duradoura da vegetação natural;”
Por terra se entende o sistema bioprodutivo terrestre que compreende o solo, a vegetação, outros componentes da biota e os processos ecológicos e hidrológicos que se desenvolvem dentro do sistema.
No prólogo do documento final da CCD destaca-se a consideração 6, que diz:
Nota-se também que a desertificação é causada por uma complexa interação entre os fatores físico, biológico, político, social, cultural e econômico”.8
A degradação das terras, como processo da desertificação, é um sério problema global, que afeta 33% das terras superficiais e cerca de 2,6 bilhões de pessoas, particularmente na região sub-saariana, na África, onde vivem mais de 200 milhões de pessoas e de 20 a 50% das terras estão degradadas/desertificadas. Na América Latina e no Caribe, mais de 306 milhões de hectares apresentam sérios problemas de degradação devido à erosão do solo, perda da matéria orgânica, compactação e salinização, cujas causas se devem, principalmente, as ações humanas como sobrepastoreio, superexploração da vegetação e uso inapropriado da irrigação.
Estima-se que, como resultado da desertificação, todos os anos se percam 24 bilhões de toneladas de camada arável do solo, o que afeta negativamente a produção agrícola e o desenvolvimento sustentável.
A severidade da desertificação depende de fatores que podem variar com a região, país, ano. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação – FAO, eles incluem:
(i) a severidade das condições climáticas durante o período considerado particularmente em termos de precipitação anual;

(ii) a pressão populacional e o padrão de vida das pessoas envolvidas;

(iii) o nível de desenvolvimento do país, e a qualidade de medidas preventivas tomadas.
A CCD entende por combate à desertificação as atividades que fazem parte de um aproveitamento integrado da terra das zonas áridas, semi-áridas e subúmidas secas para o desenvolvimento sustentado e que tenham por objetivo:
(i) a prevenção ou a redução da degradação das terras,

(ii) a re-habilitação das terras parcialmente degradadas, e

(iii) a recuperação de terras desertificadas;
O combate à desertificação é uma batalha pela vida e deve estar envolvido de forma integral nas políticas públicas de desenvolvimento sustentável das áreas afetadas, sendo que o aspecto chave é a participação das pessoas diretamente afetadas, na elaboração dessas políticas.
O processo de desertificação se manifesta de duas maneiras diferentes, de acordo com PROJETO BRA/93/036 (1997):


  1. difuso no território, abrangendo diferentes níveis de degradação dos solos, da vegetação e dos recursos hídricos,

  2. concentrado em pequenas porções do território, porem com intensa degradação dos recursos da terra (predomínio dos núcleos de desertificação).

A CCD (1997) definiu os principais impactos provocados pela desertificação, tais como os ambientais, os sociais e os econômicos.


Os impactos ambientais podem ser visualizados através da destruição da biodiversidade (flora e fauna), da diminuição da disponibilidade de recursos hídricos, através do assoreamento de rios e reservatórios, da perda física e química de solos. Todos estes fatores reduzem o potencial biológico da terra, reduzindo a produtividade agrícola e, portanto, impactando as populações.
Os prejuízos sociais podem ser caracterizados pelas importantes mudanças locais que a crescente perda da capacidade produtiva provoca nas unidades familiares. As migrações desestruturam as famílias e impactam as zonas urbanas, que quase sempre não estão em condições de oferecer serviços às massas de migrantes que para lá se deslocam. É importante lembrar que a população afetada caracteriza–se por alta vulnerabilidade, já que está entre os mais pobres da região, com índices de qualidade de vida muito abaixo da média nacional.
As perdas econômicas causadas pela desertificação também são de grande importância. No Brasil, conforme diagnóstico realizado pelo MMA, as perdas econômicas podem chegar a US$ 800 milhões por ano devido à desertificação. Os custos de recuperação das áreas mais afetadas alcançam US$ 2 bilhões para um período de vinte anos.

A carência de conhecimentos apropriados, aliada ao uso inadequado dos fatores produtivos e ao desconhecimento do funcionamento integrado do meio-ambiente, tem sido um dos agravantes da degradação e da perda do potencial produtivo das terras. Essa carência profissional, aliada à própria falta de educação adequada de convívio com o semi-árido, se constitui num fator agravante da agressividade das atividades produtivas, promovendo o irracionalismo da produção e não permitindo o caminhamento em direção da sustentabilidade.


Queimada

A
Queimada



Queimada
adoção de práticas degradantes do meio físico, como o plantio morro abaixo e as queimadas, em detrimento de práticas conservacionistas, está associada à carência de conhecimentos apropriados devido às dificuldades da assistência técnica chegar até ao(à) produtor(a). De forma geral, a agricultura tradicional praticada na região tem baixo rendimento quando comparada a outras áreas do País.
A adoção de modernas tecnologias que permitem maior eficiência, redução de perdas, garantia de produção e ganho de produtividade com a irrigação, uso de fertilizantes, defensivos e biotecnologia, não tem sido suficiente para minimizar a questão alimentar no mundo e, enquanto novas áreas de produção são incorporadas, outras são abandonadas ou se tornam improdutivas, pelo uso inadequado e predatório dos recursos naturais (Paz et al., 2000).
Parte das tecnologias utilizada na região parece não perceber alguma vantagem na semi-aridez, sendo priorizada a modificação do meio, ignorando a flora e a fauna existentes em favor da importação de exemplares exóticos, como ocorreu com a algaroba (Prosopis juliflora) e com a raça caprina Bôer, ambos importados para a região e tidos como superiores aos seus concorrentes nativos.
Nas áreas em que a vegetação nativa foi retirada, para o plantio da algaroba, devido esta ser extremamente alopática9, o crescimento de outros vegetais em seu redor é inibido, prejudicando a alimentação dos animais domésticos nos períodos de entressafra. O consumo excessivo do fruto dessa planta, causa nos bovinos à doença cara-torta, reduzindo o rendimento do rebanho. Raramente é focalizado que a inserção de espécies em novo habitat, sem que tenham sido antes experimentadas, pode trazer prejuízos a toda ecologia local, podendo propiciar a quebra de cadeias, causando o desaparecimento de insetos, pássaros e roedores.
O gado caprino, bastante enfocado no atual contexto agrícola do semi-árido, pode levar a morte centenas de exemplares vegetais, pois, devido ser bastante rústico e possuir um hábito alimentar aéreo, chega a roer até as cascas das árvores, destruindo os vasos liberianos e confeccionando verdadeiros anéis de Malpighi10 nos vegetais, o que leva a interrupção do transporte de seiva e a morte da planta. Os cuidados com os rebanhos de gado devem visar não apenas o bem-estar momentâneo dos animais, como vem acontecendo há séculos. O gado bovino, de peso específico superior até ao de máquinas agrícolas, como de um trator, por exemplo, pode em pouco tempo de pastejo compactar uma determinada área, reduzindo o potencial produtivo da mesma.
Algumas culturas xerófilas11 possuem um enorme potencial comercial, faltando-lhe ainda o amparo da ciência e tecnologia vinculada à comercialização, bem como uma extensão rural sensata e um crédito adequado, como é o caso da carnaúba e da favela (Duque, 1980). O cultivo da carnaúba permite a exploração intercalada de culturas anuais adaptadas, como o algodão e o gergelim, bem como a implantação de pastagens para pecuária. Outra vantagem é que o período da safra ocorre na época das estiagens (agosto a dezembro), período em que a escassez de serviços para a família rural é maior.
A exploração dessa cultura no semi-árido, no geral ainda ocorre de forma extrativista, e os donos dos carnaubais comercializam tanto a cera12 como as vassouras com atravessadores, reduzindo assim a margem de lucro dos produtos. Outras vezes o carnaubal é arrendado a terceiros, que exploram as plantas de uma forma bastante predatória, utilizando fogo e comprometendo a longevidade das mesmas. Vale ressaltar que a carnaúba que cresce no semi-árido é a única no mundo que produz cera.
Pressupondo, que a cobertura vegetal presente numa área, tem grande influência sobre o escoamento superficial e a produção de sedimentos, SANTOS et al. (2000) usaram modelos matemáticos para relacionar o tipo de cobertura vegetal com a erosão do solo em ambiente semi-árido, concluindo que as áreas desmatadas têm grande influência no processo de erosão do solo, enquanto a produção de sedimentos diminui significativamente quando o solo está protegido pela vegetação nativa e/ou pelos restos vegetais.
Freqüentemente são aplicações práticas inadequadas de manejo florestal, com a retirada da cobertura vegetal que protege o solo das chuvas e da radiação solar. É comum se encontrar brocas13 nas serras, onde a declividade é alta, sendo recomendado o reflorestamento e o aproveitamento racional da madeira. As brocas e o desmatamento de forma geral expõe o solo tanto a maior incidência dos raios solares, inibindo a vida microbiana e propiciando a perda da matéria orgânica pela calcinação, bem como a ação desagregadora das gotas de chuva, que aliada à declividade do terreno, acelera o processo de degradação das terras pela erosão.
Ao propiciar maior escoamento superficial, o desmatamento também é responsável pela redução da infiltração de água no solo, ocasionado uma menor quantidade de água para o abastecimento do lençol freático, que aliado ao uso inadequado dessa água, ocasiona o abaixamento do seu nível. O desmatamento aumenta a evaporação, pois o solo sob intensa radiação solar absorve muito infravermelho próximo aumento em muito sua temperatura, e com isso aumenta a evaporação da água nele contida.
Todo esse processo de degradação tem trazido preocupações constantes, tanto aos técnicos do setor, como as populações mais carentes, que dependem da vegetação como forma de sobrevivência, seja na utilização imediata do produto para cozimento ou na venda da lenha ou do carvão vegetal como opção de renda (Lins, 1994).


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