Casa dos mortos



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versador, e que at‚ então não dera um pio. E inclinando-se,

segurou com ambas as mãos uma viga grossa, esperando au-

xilio. Ninguern entretanto o ajudou.

- Experimental Não a levantas sozinho, e mesmo que

o urso do teu av" estivesse aqui, pão creio que a levan+assei

rosnou alquem.

- Mas então, minha gente, por onde se come‡a*? ...

continuou em tom lastimoso aquele que iniciara o trabalho.

Largou a viga e se endireitou.

- De qualquer jeito, fu, sozinho, não vais dar conta

do trabalho. Não adianta +e fazeres de esperfo.

- Não - sabe dar milho a Ires galinhas e est aqu¡ se

fazendo de Sabido! Olhem esse anão!

- Ora, ou‡am, eu ia dizendo. . . tentou explicar o

homem.

- Então como ‚? Vou por voces debaixo de uma



redoma, ou mando salgar a todos, durante o inverno? gri-

+ou o sub-c,ficial, olhando com certo mal-,es+ar para aqueles

vinte homens reunidos, que não sabiam o que fazer de si.

Vamos, andem! Toquem com issol

- A gente com pressa não faz nada direifo,.Ivan Mat-

veifch!


- E ‚ por isso que esperas? Anda, Saveliev, ‚ con-

figo que estou f lando, lingua de frapoi est s esperando o

que? Porque arregalas as olhos? Anda com isso!

- Que e que eu posso fazer sozinho?

RECORDA€õES DA CASA DOS MORTOS

123


Marque uma tarefa, Ivan Mai^veitchi

Ja disse que não h tarefa! Desmanchem o barco,

-0

d.ei, IS Voltem! Andem!



Puseram-se afinal a trabalhar, mas sem gos+o, sem je~fo.

Era triste ver homens tão vigorosos aparentemente incapazes #

de dar conta daquele trabalho. Mal tinham come‡ado a

desfacar a primeira e a menor das costelas e ala se quebrou.

"Quebrou-se soiinha", disseram como justificativa ao vigi-

larife. Não se podia pois continuar daquele modo. E se-

guiu-se uma longa discussão enfre os defenfos, acerca da

maneira de frabalhar. Pouco a pouco, foram-se ouvindo

insultos, e a cousa amea‡ava ir mais longe. . . ,

O vigilante tornou a gritar, agitando o bastão, en-,

juanfo outra trinca de novo se quŠbrava.

Verificaram então que falfavam machados, e que era

preciso ainda frazer mais não- sei que utensilio indispensavel.

Imedia+amenfe foram dois for‡ados escoltados ate a for+a-

leza; enquanfo esperavam, os outros sen+aram-se sossega-

damente no barco, tiraram as +abaqueiras e os cachimbos

e recome‡aram a fumar.

O sub-c,ficial cuspiu de raiva.

- Sim, est se vendo que nenhum de voces ha de

morrer de trabalhar! Que gente! que gente! bufou o ho-

mem. Depois, com um, gesto impofente, retomou o cami-

nho da forfaleza agitando o bastão.

O clirigenfe dos trabalhos chegou uma hora ap6s.

Escutou cairmamenfe as queixas dos presos, anunciou que

dava quatro trincas para descavilhar sem quebrar, como

tarefa, e, mais ainda, um bom peda‡o do barco a desfazer;

depois disso, poderiamos voltar. A farefa era pesada, mas

ob, meu Deus! como se atiraram a ela! Ja não havia inercia,

j não havia hesita‡ão: ~ os machados enfraram a dansar.

arrancaram-se as cavilhas. Os que não tinham machados,

punham escoras sob as trincas, e vinte mãos pesando sobre

elas simulfaneamen+e, as frincas saltavam do lugar direi-

tinho, artisticamente, e para surpresa minha, absolutamente #

124


DOSiOIEVSKI

infactas. O trabalho se adiantava rapiclamenfe. Todos,

de chofre, pareciam aptos para a labuta. Ja não se ouviam

pracias, j6 não se ouviam discussões inufeis; cada um sabia

que gesto fazer, que conselho dar. Meia hora antes do

rufar do tambor esfava feita a tarefa e os for‡ados volfa-

ram ao presidio cansados, mas satisfeitos. Aquela meia

hora ganha sobre o tempo de servi‡o os pusera, a todos,

de, bom humor.

Quanto a mim, fiz uma observa‡ão curiosa. Por toda

parfe onde eu me queria meter, para os ajudar, era afasfa-

do; não servia em parfe nenhuma, i,ncomodava em +od4

parte, mandavam-me embora de foclo lugar, quase com in-

sulfos. O pior esfarrapado, o mais rus+ico labrego que não

se atrevia a dizer uma palavra diante dos companheiros

mais desenvoltos, achava-se no dineifo de me atirar desa-

foros se eu parava perto dele, e prefendia que o incomo-

dava. Enfim um dos "O'espachados" me falou bru+alm,eri+e:

- Não fiques parado ai! Para que vens te meter onde

n5o es chamado?

- Engole essa, aprovou logo um outro. -

- Arranja um mealheiro e vai pedir esmola para a

consfri~So da igreja e a clerrubada da taberna! Aqui não

feris nada que fazer! bradou um ferceiro.

 desagradavel ficar de pe, com osbra‡os balan‡ando,

quando fodos trabalham. E, enfrefanfo, quando quis real-

menfe me afastar para o outro exfremo do barco, recome‡a-

ram os gritos.

- Na verdade, bons ajudantes nos digol Mal a genfe

lhes enfrega um servi‡o, caem fora!

Tudo aquilo era feito de prop¢sito. Sentiam prazer

em humilhar o karine que eu era, e aproveitavam a oca-

siso.

Concebe-se agora por que a primeira pergunta que



eu fiz a mim propric, foi para saber como me compgrfaria

com aquela gente. Pressentia que feria com eles frequen-

tes choques claquela especie. Apesar disso resolvi não ai-

+erar nada no plano de conduta que me tra‡ara, e qua sa-

RECORDA€õES DA CASA DOS MORTOS

125


,b¡a correto. Eis no que consistia esse plano: portar-me o

mais simplesmente possivel, man+er-me independente, sriSà

fazer o menor esfor‡o para me aproximar deles, mas +am-

bem não os repelir se ma procurassem; não lhes recear nem

as amea‡as nem o odio, agir como se deles não me aperce- #

besse; não lhes chegar perto em cerfos momentos, nem me

cumpliciar de certos costumes e h bitos seus; em suma,

não procurar esporifaneamenfe a sua camaradagem. Eu

adivinhara ao primeiro olhar que eles ficariam me despre-

zando de inicio se eu agisse de modo diverso. Porque,

na opinião geral, (soube-o mais +arde com certeza) minha

origem nobre me autorizava a arrotar imporiancia a frente

dos outros, - isto ‚, procurar considera‡ões, mostrar-me

susceptiv¡pi e exigente, -e não fazer nada com os meus dez

dedos. Esse pro‡edimento me feria granjeado insultos

abertos, e o ¡nfimo respeito de foclos. Porem era papel

que nao me convinha: nunca assumi para com eles as manei-

ras que eraM consideradas adequadas a um barine, mas em

compensa‡ão jurei a mim propric, nunca rebaixar, por uma

concessão, minha educa‡ão e meus pensamentos infimos. Se

me houvesse misturado com eles, se me houvesse proposto a

granjear as suas boas-gra‡as por maio de familiaridades e

condescendencias, concluiriam imediafamente que eu agia

assim por covardia, e me tratariam de acordo com essa con-

clusão. A ... v não era exemplo que se pudesse seguir: denun-

ciava-os ao maior, e era temido por todos. Por oufro lado,

eu não desejava, como os polacos, isolar-me numa frieza e

numa pol ` idez altivas. Via muito bem naquele momento que

eles estavam com raiva porque eu procurava me +ornar ufil,

em vez de fazer caretas e me queixar. C~erfo embora de

que mais +arde seriam obrigados a mudar de ideia a meu

respeito, não deixava en+refan+o de me sentir mortificado:

pelo simples fato de desejar trabalhar e não saber como

o fazer, ia lhes dava o direito de me desprezarem.

a

Quando volfei ' tarde, roido da fadiga, vi-me +ornado



por uma pungente tristeza. "Quan+os milhares de dias idˆn- #

126


DOSTOIEVSKI

Òcos tenho diante de mim, sempre os mesmos, todos imufa-

velmenfe umformes?" cismava. Em silencio, sob a noite,

que caia, ou vagueava sozinho pelas casernas, ao longo da

pa!i‡ada, quando o nosso Charili: correu ao meu encontro.

Char¡t era o cSo do presidio, pois h cães de presidio,

1 como os ha de companhia, de bateria ou de esquadrão.

, ,Vivia al¡ j6 h6 tempo indeferminado. considerando a todos

..c~õmo seus donos e alimentando-se dos restos da cozinha.

,-,. :, Era - um mastim bem grande, ainda não muito velho, com

pelo preto mosqueado de branco, cauda peluda, olhos

Aipifeligentes. Ninguem lhe fazia uma festa, ninguem sequer

,, . , , 'se

prestava aferi‡ão. Logo ao primeiro dia eu o conquis-

1~,I'~4,1~,J,` tara dando-lhe uma codea de pão: e enquanto eu o acari-

--- , , i,

.- Java, ele não se mexia, olhava-me com carinho e sacudia

... cauda para me mostrar o prazer que lhe dava. Como se

,1 . haviam passado alguns dias sem que ele me visse, a mim que,

,L depois de anos, fora a primeira pessoa que lhe fizera uma

1 . 1 festa, Charik correu em busca de mim, no meio dos outros, .

e descobrindo-me por t s das casernas, saltou -ladrando,,

alegremente ao meu encontro. Não sei o que se passou,,

comigo, mas abr¡ os bra‡os para o cão, segurei-lhe a cabe‡ai

en

quanto ele punha as duas patas sobre meus ombros e m



procurava lamber o rosto.

"Esta aqui o amigo que me manda o destino!" pensava

eu. E todas as tardes, durante essas primeiras semanas de

,sofrimento, assim que chegava do trabalho, corria para +rãs

das casernas; vinha aos saltos, ladrava, cumprimentando-me,

eu lhe segurava a cabe‡a, cobria-a de beijos, enquanto um

sentimento suaviss¡mo, e ao mesmo tempo um ~pungente

amargor me apertavam o cora‡ão. Lembro-me bem que

me comprazia naquele tormento, sentia um estranho prazer

'em pensar q--e não me restava senão um amigo no mundo:

o 6.orri, o'fie¡ ChariJk.

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Novos conhecidos - Petrov

confudo iam-se passando os dias, e, pouco a pouco, eu

me habituava ...quela nova vida, cujas cenas cotidia-

nas a principio me mortificavam tanto. Os acon-

tecimentos, o ambiente, os individuos, tudo me deixava in-

diferente. Parecia-me impossivel habifuar-me ...quela exis-

fencia, e, entretanto, era mais que chegado o tempo de me

habituar, uma vez que estava diante do inevitavel ... Dis-

simulava minhas inquiefa‡6es no recesso mais profundo da

minha alma, i6 não vagueava mais como um tonto, não dei-

xava mais que vissem a minha dor. Os olhares ferozmente

curiosos dos for‡ados ia não se-definham com a mesma fre-

quencia sobre a minha pessoa, e diminuia a exagerada in-

solencia com que me tratavam: eu fambem lhes ficara in-

diferente, ‡‡vsa que muit¡ssimo me alegrava. Eu ia e vinha #

130


DOSTOIEVSKI

como denfro de minha casa, no presidio. Conhecia o meu

lugar na tarimba, acostumara-me com coisas que supunha

,n3o poder acei+ar nunca. De oito em oito dias ia ao

barbeiro para que me raspasse mefade da cabe‡a; nos s -

bados, duranfe o nosso periodo de repouso,, faziam-nos pas-

sar um a um no corpo de guarda, (deixar de comparecer

era motivo para puni‡ão) onde os barbeiros do batalhão,

depois de nos ensaboar a cabe‡a com agua fria, raspavam-

,na sem do com navalhas cheias de mossas: so a lembran‡a

dessa tortura ainda hoje me arrepia. Todavia, depressa des-

cobri um rem‚dio para isso: Akim Akimifch me indicou um

defen+o da se‡ão militar que, mediante um copeque de pa-

gamenfo, raspava a gente de acordo com o regulamenfo,

usando uma navalha de sua propriedade, que consfifuia , o

seu ganha-pão. Tinha varios clientes entre os for‡ados, gen-

te dura, que, porem, fazia tudo para escapar aos barbeiros

oficiais. Chamavamos ao nosso colega barbeiro "maior"

- mas nao sei em que poderia ele recordar o maior au-

fenfico. Enquanfo escrevo estas linhas, revejo-c, menfalmen-

te, ao "maior": rapagão magro e silencioso, talvez est£-

pido, sempre enfregue a sua obriga‡ão, fendo na mão uma

correia na qual, noite e dia, afiava confinuamenfe uma nava-

lha admiravelmente amolada: decerfo encontrara naquela

-profissão a meta definitiva da sua existencia. Mos+rava-se

francamente radiante quando alguern se vinha entregar aos

seus cuidados; tinha sempre a navalha afiadissima, a agua de

-sabão quente, a mão macia como veludo. A genfe via que

,ele tinha orgulho da propria pericia. Recebia com ar distrai-

do a moeda ganha e parecia trabalhar mais por amor da arte

que pelo dinheiro. A. passou mal um dia em que, ao fazer

O seu relaforio a quem de direito, chamou imprudentemente

o nosso barbeiro pelo apelido. O verdadeiro maior enfu-

receu-se como um louco:

- Então não sabes, crapula, o que e um maior? berrou,

deitando escuma pela boca, e aplicando em A. um castigo

a sua moda. Compreendes q que e um maior? E ~ncon,

RECORDA€õES DA CASA DOS MORTOS

131

cebivell Chamar de maior a qualquer presidiario imundo,



e na minha presen‡a!

o

S' A. seria capaz de entender aquele homem.



Logo no primeiro dia comecei a sonhar com a liberfa- #

‡ão. Minha ocupa‡ão favorita ficou sendo confar o fem-

pc, que me resfava a cumprir, de mil diferenfes maneiras.

Não conseguia, pensar noutra cousa, e creio que todas as

pessoas privadas de Rk>erdade agem da mesma maneira.

Ignorava se os outros for‡ados pensavam ou contavam como

eu, mas logo ao primeiro dia, a inconcebivei leviandade

das suas esperan‡as me impressionou muito. As esperan-

‡as de um prisioneiro nada +ˆrn que ver com as esperan-

‡as de um homem livre. O homem livre pode esperar por

uma mudan‡a de sorte, ou pela realiza‡ãQ de uma ambi‡ão

qualquer, porem Vive, age, e a vida real o arrasta sem cessar.

Ja não acontece o mesmo com o prisioneiro. Admitamos

que a vida da prisão, o presidio, +ambern ‚ vida: mas seja

qual for o for‡ado, e sejam quais forem os anos de sua

defen‡ão, ele se recusa instintivamente a considerar sua sorte

como positiva, definitiva, como fazendo parfe da sua exis-

fencia. No presidio, qualquer for‡ado sente que não "es+6

em sua casa", supõe-se por assim dizer em visita. Encara os

vinte anos da sua pena 'como Se fossem umcamente dois;

esta convencido de que aos cinquen+a anos, quando soar

a hora da sua liberta‡ão, sera fão jovem quanto agora,

aos trinta e cinco apenas. "Ainda terei muito tempo bom

a viver!" cisma ele; expulsa obstinadamente todas as dUvi-

das, todos os +ristes pensamentos que o assaltam a esse res-

peito. E af‚ mesmo os condenados a gal‚ perpetua, ate

mesmo os da se‡ão especial, +ˆm como certo que um belo

dia vira de Pi+er (1) uma ordem que o mandara para as mi--

nas de Nerfchinsk, e a vida no comb¢¡o e bem melhor que

no presidio, e depois, findo o seu tempo em Ner+chinsk,

então! ... Escutei velhos de cabelos brancos raciocinarem

assim.


(1) Petersburgo. N. de K Q) #

132


DOSTOIEVSKI

, Vi em Tobolsk homens chumbados a parede, ao lado do

cafre, por uma corrente de um sachene (2) de compri-

men+o. SSo punidos assim por algum crime horrendo, co-

metido -Ia na Siberia apos a deporta‡ão: e ficam ali cinco,

dez anos. Eram na maioria bandoleiros de estradas. Um

umco, que fora empregado não sei em que, aparentava um

melhor a pecto; falava com um sorriso adocicado, um tom

resignado e sibilante; mos+rou-nos a corrente, disse qual a

maneira mais c"moda de dormir com ela. Era mesmo uma

ave estranha! Todos se portam muito bem, e parecem de

bom humor, embora estejam roidos pelo desejo de verem

terminado o seu tempo na corrente. Para que? da-nos von-

tade de perguntar. Mas então ele sair6 daquela masmorra

sufocante, de fec+o baixo, em arcadas de tijolo, podera

passear no pa+io ... Isso, apenas isso, porque jamais poder6

franspor'as portas do presidio. O preso sabe muito bem

que os que estão acorrenfados ficarão Ia, que morrer3o pre-

sos as grilhetas. Sabe-o, e, enfrefan , to, deseja ardentemen-

te terminar o seu tempo nos ferros. iE, com efeito, sem

essa esperan‡a, poderia -um homem. ficar acorren+ado cinco,

seis anos, e não morrer, não enlouquecer? Poderia ele re-

sisfir,- realmente?

Quanto a mim, eu compreendia que so, o trabalho me

poderia preservar a saude e o corpo. A inquieta‡ão

moral perpetua, a irri+a‡ão dos nervos, o ar mefifico das

-casernas me teriam abatido completamente. "O air livre,

a fadiga, o h6bi+o de carregar fardos pesados, - isto ‚

que me salvara, pensei. H6 de me manter o vigor e a

juventude ate o instante da liber+a‡ão". Não me enga-

nava: o trabalho e o movimento me foram muito ufeis. Vi

com ferrcir um dos meus companheiros, ex-ficialgo, (3) con-

sumir-se no presidic, como uma vela: entrara ao mesmo tem-

po que eu, ainda jovem, belo e forte; quando saiu, era apenas

um farrapo de homem, asmafico, encanecido, pernas trˆmu-

las. "Não, dizia-me ou. olhando-o: quero viver e viverei".

(2) A toesa russa; 1 m 98. (N. de R. Q.)

(3) Duroy. Ver nota p gina 45. (N. de H. M.)

RECORDA€õES DA CASA DOS MORTOS

e

133



De inicio, durante longos meses, meu ardor no trabalho me

granjeou, da parte dos for‡ados, um grande desprezo, in- #

finitas indiretas, mas eu não me importava e ia alegremente

para oncle me mandavam. queimar e moer alabastro, por

1 e

exemplo. Esse oficio, um dos pr~meiros que aprend¡, '.



muito facil. Alias. os oficiais de engenharia aliviavam o

mais. que podiam as tarefas designadas para os barines

e isso menos por inclulgencia que por esp¡rito de iusfi‡a.

issimo menos vi-

Seria estranho exigir de um homem muiff Ö

goroso e deshabifuado a labuta manual o mesmo esfor‡o que

,se exige de um trabalhador. Essa "poupan‡a", porem,

era feita quase as escondidas, -porque eramos vigiadissi-'.

mos. Com frequencia era a tarefa excessivamente penosa;

e, então, os nobres sofriam duas vezes mais que os outros for-

‡ados. Eram em geral mandados para o alabastro trˆs

ou quatro homens idosos ou pouco vigorosos; a eles nos re-

umam, mas +inhamos como monifor um operario de verdade,

que conhec~a o oficio. Durante varios anos seguidos, o nosso

monifor foi sempre o mesmo, certo Almazov. individuo

severo, trigueiro, magro, ia velho, calado e exigente no fra-

balho. Desprezava-nos profundamente: como, porem, não

gostava de falar. n3o se dava ao trabalho de nos passar des-

composturas. O galpão no qual moiamos o alabastro erguia-

se na margem escarpada e deserta do lrfych. No inverno,

principalmente durante os dias escuros, a vista do rio e da

outra margem longinqua provocavam uma grande nostalgia.

Uma impressa . o despecla‡adora de tristeza emanava daque-

la estepe arida e vazia. Mas era ainda pior quando um sol

)claro dardejava os seus raios sobre o imenso campo de ne-

we; a gente sentia o louco desejo de se evadir para aquela

planura dis+,,,.n+,e que come‡ava na outra margem e se alon-

gava em dire‡ão ao sul, como uma toalha infinita, num es-

pa‡o de mil e quinhentas verstas. O silencioso, o severo

Almazov punha-se a trabalhar; nos nos envergonhavamos

porque nao o podiamos ajudar segundo as suas regras, e

ele, contudo, nos dispensava muito de prop¢sito como se

nos quisesse fazer sentir a nossa completa inutilidade. O

:i #


134

DOST61EVSKI

trabalho consistia de inicio simplesmonfe em aquecer ~ o,,"

forno; depgis fraziamos alabas+ro suficiente para enchi 1 -

lo. No dia seguinfe o alabastro estava infeiramenfe cal-

cinado e era refirado do calor. Cada um de n6s fornava

então uma pesada mão de pilão, enchia de alabasfro um,

deposito ia destinado a esse fim, e punha-se a pilar. Não---,

era'frabalho que oferecesse dificuldade. O alabastro, friave[,.'

facilmenfe se esfarelava, e depressa se transformava num p

branco e brilhanfe ... Faziamos um barulho fão grande, a,

pilar, que nos proprios nos admiravamos. Quanfo mais au-a

menfava a fadiga, mais leves nos senfiamos, o sangue nos

subia ao rosto, a circula‡ão se acelerava. Almazovenf‚io nos , .

. olhava com a condescendencia que a genfe fem com crian-

cinhas, punha-se a fumar o cachimbo com ar indulgente, mos,,,

,não podia deixar de rosnar assim que abria a boca. Ali s,

,procedia desse modo com foclo o mundo; no fundo, falvez-

fosse um homem bom.

Ufilizaram-me depois para movimenfar a roda do forno;

era uma roda pesada e grande, que exigia g~ande esforqp

para ser girada, sobretudo quando o +orneiro (um sapador Oe

engenharia) fabricava um balausfre de escada para algÇ

funcionario, ou uns pes de mesa, o que exigia um +ronco de

rvore quase inteiro. Nesses casos, um Unico homem não fes.

ria for‡a suficiente para girar a roda; devam-me erifão corino

auxiliar o meu colega 13.. Fizemos esse frabalho varios anos

seguidos, focla vez que havia qualquer cou , sa para fornear.

13. era um rapaz doentio e magricela, mo‡o ainda, porem do-

enfe do peifo. Chegara ao presidio um ano anfes de mim,

com dois outros companheiros de inforfunio: um - um velhi-

nho que vivia a rezar, (o que lhe conquisfara a estima dos

for‡ados) morreu durante minha reclusão; o outro, robusto o

corajoso adolescente de cara vermelha, durante a caminhada

(quer dizer duranfe setecentas verstas), carregara as costas

o seu companheiro 13. que caira de fadiga, depois de me#4

jornada: valia a pena ver a afei‡ão que tinham um ao outro.'

B. era homem de fina educa‡ão, carafer nobre e generoso, ,

mas a doen‡a o tornava irrifadi‡o. Nos junfos consegu¡a- #

ILECORDA€õES DA CASA DOS MORTOS

137

mos fazer girar tf roda, e o exercicio nos interessava: eu o



considerava excelente para a saude.

Do que mais gostava era de limpar a neve depois das

borrascas, cousa frequente, no inverno. Bastava um dia para

que os turbilhões de neve cobrissem as casernas, as vezes ate

metade das janelas, ou então inteiramente. Assim, quando

o furacão passava e reaparecia o sol, enviavam-nos em bando

(aconfecia at‚ irmos todos) desimpedir os edificios escondi-

dos sob anevasca. Davam a cada um de n6s uma p6 e nos

marcavam uma tarefa, +ão grande que parecia impossival dar

conta dela. Todos se enfregavam alegremente ... labuta. A

neve quase em p6, ainda não umda, mal gelada na superficie,

elevava-se em montes enormes que iamos atirando por parto,

transformada em nuvens de poeira reluzente. As p s se en-

terravurri facilmente na espessura brilhante que luzia ao sol,

e os defentos gostavam daquele trabalho. O ar fresco, os


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