De descartes


partir de uma determinada regiäo e destinado a um dado



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de ax(5nios a partir de uma determinada regiäo e destinado a um dado

alvo é frequentemente referida como uma «projecçäo». Uma sequência de

projecçöes através de várias estaçöes alvo é conhecida como uma «via>@*.

A ideia inovadora que Moniz tinha concebido era a de que, nos

doentes com ansiedade e agitaçäo patológica, as projecçöes e as vias de

massa branca na regiäo frontal tinham estabelecido circuitos anormal 

mente repetitivos e hiper activos. Näo existiam ainda dados que permi 

tissem sustentar tal hipótese, embora estudos recentes sobre a actividade

da regiäo orbital em doentes obsessivos e depressivos sugiram que Moniz

talvez estivesse correcte, pelo menos em parte, mesmo onde os porme 

nores pudessem estar errados. Mas se a ideia de Moniz era arrojada e

avançadaparaaevidênciadisponívelnaépoca,elaerapoucomaisdoque

timida em comparaçäo com o tratamento que ele propunha. Racioci 

Pathzvay, no original. (N. da T.)


78 O ERRO DE DESCARTES


nando combase no caso do doente A enoutros resultados de experiências

com animais, que seräo discutidos mais adiante, Moniz prognosticou que

uma separaçäo cirúrgica dessas conexöes aboliria a ansiedade e a agita 

çäo, deixando inalteradas as capacidades intelectuais. Acreditava que tal

tipo de operaçäo curaria o sofrimento dos doentes e lhes permitiria levar

uma vida mental normal. Motivado pelo estado de desespero que obser 

vou em tantos doentes näo tratados, Moniz planeou e empreeendeu a

opera,äo.

Os resultados das primeras leucotomias pré frontais deram algum

apoio @às previsöes de Moniz. A ansiedade e a agitaçäo dos doentes tinha

sido abolida, e funçöes como a linguagem e a memória convencional per 

maneciam, em larga medida, intactas. Contudo, näo seria correcto assu 

mir que a cirurgia näo diminuiu os doentes noutros aspectos. O seus com 

portamentos, que nunca tinham sido norm@lis, eram agora anormais de

uma maneira diferente. A ansiedade extrema deu lugar à calma extrema.

As emoçöes pareciam estagnadas; os doentes näo pareciam sofrer. O inte 

lecto vigoroso que tinha produzido ideias obsessivas ou delirantes estava

em sossego. A força motriz do doente para responder e agir, por mais

errada que fosse, estava silenciada.

Os dados acerca destas primeras operaçöes estäo longe de serem

ideais. Foram recolhidos há muito tempo atrás com os instrumentos e o

limitado conhecimento neuropsicológico da época, e näo se encontram

täo livres de preconceitos, positivos ou negativos, como seria de desejar.

A controvérsia sobre esta modalidade de tratamento foi avassaladora. No

entanto, os estudos existentes apontam para os seguintes factos: primeiro,

a lesäo da massa branca subjacente às regiöes orbital e mediana do lobo

frontal alterou as emoçöes e os sentimentos, reduzindo os drasticamente;

segundo, os instrumentos básicos da percepçäo, memória, linguagem e

movimento näo foram afectados; e, terceiro, tanto quanto é possivel

distinguir os sinais de comportamento novos daqueles que conduziram

à intervençäo, parece que os doentes leucotomizados eram menos criado 

res e resolutos do que anteriormente.

Por tima questäo de justiça para com Moniz e para com as primeras

leucotomias pré frontais, deve salientar se que os doentes receberam

algum benefício com a cirurgia. Uma maior deficiência em termos de to 

mada de decisäo talvez fosse mais fácil de suportar do que a ansiedade

descontrolada. Por muito que uma mutilaçäo cirúrgica do cérebro seja

inaceitável, temos de nos lembrar que nos anos 30 o tratamento tipico para

tais doentes envolvia o seu enclausuramento em instituiçöes mentais e a

administraçäo de doses massivas de sedativos, os quais apenas mode 

ravam a ansiedade e agitaçäo quando os doentes ficavam virtualmente

SANGUE FRIO 79


atordoados ou a dormir. As poucas alternativas à leucotomia incluiam o

colete de forças e a terapia de choque. Sá no fim dos anos 50 é que come 

çaram a aparecer drogas psicotrópicas como a Torazina. Devemos tam 

bém recordar que ainda hoje näo temos maneira de saber se os efeitos a

tongo prazo de tais drogas säo menos destrutivos para o cérebro do que

uma forma selectiva de cirurgia. Näo é possivel formar uma opiniäo de 

finitiva sobre este tema.

Näo há, no entanto, qualquer necessidade de reservas quanto à versäo

muito mais destrutiva da intervençäo de Moniz, conhecida como loboto 

mia frontal. A operaçäo concebida por Moniz provocava lesöes cerebrais

limitadas. Em contraste, a lobotomia frontal era normalmente um traba 

lho de talhante que provocava lesöes extensas. Esta intervençäo tornou 

 se mundialmente infame pela forma questionável como era prescrita e

pela mutilaçäo desnecessária que produzia8.

Com base na documentaçäo histôrica e nos dados obtidos no nosso la 

boratório, chegámos às se@tes conclusöes provisorias:


1. Se o sector ventromediano estiver incluido na lesäo, a lesäo

bilateral dos córtices pré frontais está consistentemente as 

sociada a limitaçöes do raciocinio/tomada de decisäo e das

emoçöes/sentimentos.

2. Quando limitaçöes no raclocinio/tomada de decisäo e nas

emoçöes / sentiinentos se tornam salientes, em contraste com

um perfil neuropsicológico em larga medida intacte, a lesäo

é muito extensa no sector ventromediano; além disso, o do 

minio pessoal/social é o mais afectado.

3. Nos casos de lesäo pré frontal em que os sectores dorsal e la 

teral säo pelo menos täo extensamente lesionados como o

sector ventromediano, as limitaçöes no raciocinio/ tomada

de decisäo já näo se encontram concentradas no dominio

pessoal/social. Essas limitaçöes, assim como as limitaçöes

nas emoçöes/sentimentos, säo acomp@adas por defeitos

na atençäo e na memória de trabalho, detectadas por testes

em que se utilizam objectes, palavras e números.
O que precisávamos de saber agora era se estes estranhos companhei 

ro,,   raciocinio/ tomada de decisäo diminuidos e emoçöes / sentimentos

diminuidos   podiam aparecer sozinhos ou em outra companhia neu 

ropsicológicacomoresultadoda lesäodequalqueroutra zona docérebro.

A resposta foi afirmativa. Os estranhos comp@eiros apareciam de

i (@ @ mi proeminente como resultado de lesöes noutras regiöes. Uma destas


80 O ERRO DE DESCARTES


regiöes era um sector do hemisfério cerebral direito (mas näo do es 

querdo) que contém os vários côrtices responsáveis pelo processamento

de sinais emitidos pelo corpo. Uma outra inclura estruturas do sistema

limbico, como a amigdala.


EVIDENCIA A PARTIR DE LESOES

EM REGIOES NAO FRONTAIS

Existe outro estado neurológico importante que partilha a matriz de

Phineas Gage mesmo quando, superficialmente, os doentes afectados

näo se parecem com Gage. A anosognosia, nome pelo qual esse estado é

conhecida é uma das apresentaçöes neuropsicológicas mais bizarras que

é possivel encontrar. A palavra   que deriva do grego nosos, «doença>,,

e gnosis, «conhecimento»   exprime a incapacidade de uma pessoa estar

consciente da sua própria doença. Imagine uma vitima dum acidente vas 

cular cerebral de grandes proporçöes, totalmente paralisada do lado es 

querdo do corpo, incapaz de mover a mäo e o braço, a perna e o pé, com

metade da cara imóvel, incapaz de se levantar ou andar. E agora imagi 

ne essa mesma pessoa alheada de todo este problema, afirmando que na 

da se passa de especial e respondendo à pergunta «Como é que se seil te?»

com um sincero «Optimo». (O termo anosogtiosia tem sido também utili 

zado para designar ignoräncia da cegueira ou da afasia. Na minha discus 

säo refiro me apenas à forma prototipica deste estado tal como foi acima

mencionado e foi pela primera vez descrito por Babinskil.)

Qualquer pessoa que näo esteja familiarizada com a anosognosia

poderá pensar queesta @

gica», que é uma reacçäo de adaptaçäo ao sofrimento. Posso afirmar com

segurança que näo é isso que acontece. Consideremos a imagem simétrica

da tragédia, aquela em que é o lado direito do corpo que está paralisada

e näo o esquerdo. Os doentes assim afectados näo têm habitualmente ano 

sognosia e, embora estejam muitas vezes seriamente incapacitados de uti 

lizar a linguagem e possam sofrer de afasia, estäo plenamente cientes da

sua situaçäo. Além disso, alguns doentes com uma devastadora paralisia

do lado esquerdo, mas causada por um padräo de lesäo cerebral diferen 

te daquele que provoca paralisia e anosognosia, podem ter uma mente e

um comportamento normais e aperceberem se da sua limitaçäo. Em

suma, a paralisia do lado esquerdo, causada por um determinado padräo

de lesöes cerebrais, é acompanhada por anosognosia; a paralisia do lado

80 O ERRO DE DESCARTES


regiöes era um sector do hemisfério cerebral direito (mas näo do es 

querdo) que contém os vários córtices responsáveis pelo processamento

de sinais emitidos pelo corpo. Uma outra incluia estruturas do sistema

limbico, como a amigdala.


F,VIDENCIA A PARTIR DF, LESOES

EM REGIOES NAO FRONTAIS

Existe outro estado neurológico importante que partilha a matriz de

Phineas Gage mesmo quando, superficialmente, os doentes afectados

näo se parecem com Gage. A anosognosia, nome pelo qual esse estado é

conhecida é uma das apresentaçöes neuropsicolôgicas mais bizarras que

é possivel encontrar. A palavra   que deriva do grego nosos, «doença»,

e gnosis, «conhecimento»   exprime a incapacidade de uma pessoa estar

consciente da sua própria doença. Imagine uma vitima dum acidente vas 

cular cerebral de grandes proporçöes, totalmente paralisada do lado es 

querdo do corpo, incapaz de mover a mäo e o braço, a perna e o pé, com

metade da cara imóvel, incapaz de se levantar ou andar. E agora imagi 

ne essa mesma pessoa alheada de todo este problema, afirmando que na 

da se passa de especial e respondendo à pergunta «Como é que se selite?»

com um sincero «Optimo». (O termo anosognosia tem sido também utili 

zado para designar ignoräncia da cegueira ou da afasia. Na minha discus 

säo refiro me apenas à forma prototipica deste estado tal como foi acima

mencionado e foi pela primera vez descrito por Babinski9.)

Qualquer pessoa que näo esteja familiarizada com a anosognosia

poderá pensar que esta «negaçäo» da doença tem uma motivaçäo «psicoló 

gica», que é uma reacçäo de adaptaçäo ao sofrimento. Posso afirmar com

segurança que näo é isso que acontece. Consideremos a imagem simétrica

da tragédia, aquela em que é o lado direito do corpo que está paralisada

e näo o esquerdo. Os doentes assim afectados näo têm habitualmente ano 

sognosia e, embora estejam muitas vezes seriamente incapacitados de uti 

lizar a linguagem e possam sofrer de afasia, estäo plenamente cientes da

sua situaçäo. Além disso, alguns doentes com uma devastadora paralisia

do lado esquerdo, mas causada por um padräo de lesäo cerebral diferen 

te daquele que provoca paralisia e anosognosia, podem ter uma mente e

um comportamento normais e aperceberem se da sua limitaçäo. Em

suma, a paralisia do lado esquerdo, causada por um determinado padräo

de lesöes cerebrais, é acompanhada por anosognosia; a paralisia do lado

NGUE FRIO 81


direito, causada pelo padräo simétrico de lesäo cerebral, näo é acom 

panhada por anosognosia; a paralisia do lado esquerdo provocada por

padröes de lesäo cerebral diferentes daqueles que estäo associados à ano 

sognosia näo é acompanhada por desconhecimento dessa paralisia. Assim,

a anosognosia ocorre de forma sistemática com a lesäo de uma de 

terrninada regiäo do cérebro, e apenas dessa regiäo, em doentes que po 

dem parecer, para pessoas que näo estäo familiarizadas com os mistérios

neurológicos, mais felizes do que aqueles que têm metade do corpo

paralisada e se encontram limitados na linguagem. A «negaçäo» da

doença resulta da perda de uma funçäo cognitiva especiíica. Esta perda

de funçäo cognitiva depende de um determinado sistema cerebral, que

pode ser danificado por um acidente vascula'r ou por várias outras doen 

ças neurológicas.

Os doentes com anosognosia tipica precisam de ser confrontados com

a sua deficiência gritante para que descubram o problema de que sofrem.

Sempre que eu perguntava à minha doente Di pela sua paralisia do lado

esquerdo, que era completa, ela começava sempre por me dizer que os

seus movimentos eram completamente normais, que talvez tivessem es 

tado limitados mas que agora já estavam bem. Se lhe pedisse para mover

o braço esquerdo, ela procurá lo ia diligentemente e, depois de olhar

para o membro inerte, perguntar me ia se eu queria realmente que,

se movesse «por si próprio». Se eu dissesse que sim, por favor, ela tomaria

entäo consciência vistial da ausência de qualquer movimento naquele

braço e dir me ia «n~ao me parece que ele consiga fazer muita coisa so 

zinho». Como sinal de boa cooperaçäo, ela oferecia o braço bom para mo 

ver o braço mau: «Consigo movê lo com a minha mäo direita.»

Esta incapacidade de sentir o defeito de forma automática, rápida e in 

tema através do sistema sensorial do corpo nunca desaparece nos casos

de anosognosia grave, embora em casos moderados possa ser disfarçada.

Por exemplo, um doente pode possuir a memória visual do membro pa 

ralisado e por inferência aperceber se de que se passa qualquer coisa com

aquela parte do corpo. Ou um doente pode lembrar se das inúmeras afir 

maçöes, feitas pelos familiares e pela equipa médica, de que existe uma

paralisia, existe uma doença, e de que as coisas näo estäo bem. Com ba 

se nessa fonte de informaçäo externa, um dos nossos anosognósicos mais

inteligentes diz consistentemente: «Eu costitmava ter esse problema» ou

«Eu costiiinava ignorar a minha paralisia.» Claro que o problema ainda

existe e que ele ainda continua a ignora lo. A ausência de actualizaçäo

directa do verdadeiro estado do corpo e da pessoa é algo de verdadeira 

mente espantoso. (Infelizmente, esta distinçäo subtil entre a consciência

directa e indirecta do doente sobre o seu estado é frequentemente omitida
Forum da Ciência 29   6

82 O ERRO DE DESCARTES


ou encoberta nas discussöes sobre anosognosia. Para uma rara excepçäo,

veja se A. Marcel".)

Näo menos dramática do que a obnubilaçäo que os doentes anoso 

gnósicos.possuem em relaçäo aos seus membros afectados é a falta de

preocupaçäo que demonstram pela sua situaçäo em geral, a ausência de

emoçöes que exibem e a falta de sentimentos que relatam quando sobre

isso säo questionados. A noticia de que tiveram uma grande apoplexie, de

que o risco de problemas adicionais no cérebro ou no coraçäo é muito

grande, ou a noticia de que sofrem de um cancro invasor que agora se dis 

seminou no cérebro   em suma, as noticias de que provavelmente as suas

vidas nunca mais seräo as mesmas   säo normalmente recebidas com

tranquilidade, por vezes mesmo com humor negro, mas nunca com an 

gústia ou tristeza, lágrimas ou fúria, desespero ou pänico. É importante

notar que, se dermos um conjunto comparável de más noticias a um

doente com a lesäo simétrica no hemisfério esquerdo, a reacçäo é intei 

ramente normal. As emoçöes e os sentimentos näo existera nos doentes

anosognósicos, e talvez este facto seja o único aspecto feliz das suas tra 

gédias. Talvez que o facto de a planificaçäo do futuro destes doentes e as

suas tomadas de decisöes pessoais e sociais estarem profundamente di 

minuidas näo seja surpreendente. A paralisia é provavelmente o menor

dos seus problemas.

Através da realizaçäo de um estudo sistemático de doentes anosognó 

sicos, o neuropsicólogo Steven Anderson demonstrou que os doentes säo

täo negligentes com as consequências das suas doenças como com as suas

paralisias". Säo incapazes de antever os problemas que se avizinham;

quando os prevêem, parecem incapazes de sofrer como seria de esperar.

Näo conseguem construir uma teoria adequada para o que lhes está a

acontecer, para o que lhes poderá acontecer no futuro e para o que os

outros pensam deles. Igualmente importante é o facto de näo estarem

cientes de que as suas próprias especulaçöes säo inadequadas.

Os doentes com o tipo de anosognosia acima descrito possuem lesöes

no hemisfério direito. Embora a caracterizaçäo completa das correlaçöes

anatómicas da anosognosia seja um projecto em curso, é sabido que está

associada com a destruiçäo de um grupo especifico de córtices cerebrais

do hemisfério direito que säo conhecidos como somatossensoriais (da

raiz grega soma, corpo; o sistema somatossensorial é responsável tanto

pelo sentido externo do tacto, temperatura e dor, como pelo sentido inter 

no da posiçäo das articulaçöes, estado visceral e dor) e que incluem os cór 

tices da insula; das áreas citoarquitectónicas 3, 1, 2 (na regiäo parietal) e

da área S 2 (também parietal, situada nas profundezas do rego de Sylvius).


A SANGUE FRIO 83


(É de notar que, sempre que utilizo o termo somático ou somatossenso 

rial, tenho em mente O soma, ou corpo, no sentido geral, e me refiro a to 

dos os tipos de sensaçöes do corpo, incluindo as sensaçöes viscerais.) A

lesäo afecta também a massa branca do hemisfério direito, destruindo a

interconexäo entre as regiöes acima mencionadas, as quais recebem sinais

vindos de todo o corpo (músculos, articulaçöes, órgäos internos), e a sua

interconexäo com o tálamo, os gänglios basais e os córtices motor e

pré frontal. A mera lesäo parcial do sistema de multicomponentes aqui

descrito näo provoca o tipo de anosognosia que tenho vindo a discutir.

Desde há muito que a minha suposiçäo de trabalho tem sido a de que

as áreas cerebrais que intercomunicam dentro da regiäo do hemisfério di 

reito danificado na anosognosia produzem, através das suas interacçöes

cooperativas, o mapa mais completo e integrado do estado actual do

corpo.


O leitor pode indagar por que é que o mapa pende apenas para o he 

misfério direito ao invés de serbilateral; afinal de contas, o corpo tem duas

metades ' quase simétricas. A resposta é a de que nas espécies humanas,

assim comonas iiäohumanas, as funçöes parecem estarassimetricamente

repartidas pelos hemisférios cerebrais por razöes que estäo provavel 

mente relacionadas com a necessidade da existência de um controlador

final, em vez de dois, quando chega o momento de escolher uma acçäo ou

córtices somatossensoriais primários

outros córtices somatossensoriais

Figura 4.2   Diagrama de iim cérebro humaiio em que se apresentam os hemisférios

direito eesquerdo vistos defora. As áreas sombreadas abrangem os córtices somatosseilso 

riais primários. Otitras áreassomatossensoriais, respectivanientea seglinda área sensorial

(S 2) e a insula, estäo enterradas no interior do rego de Sylviiis, que é imediataniente atite 

rior e posterior eni relaçäo à base do córtex somatossensorial primário, e näo silo visiveis

niinia apreseiitaçäo da superficie. As suas localizaç(5es aproximadas na profundidade es 

täo identificadas pelas setas.


84 O ERRO DE DESCARTES


um pensamento. Se ambos os lados tivessem a mesma importäncia na ela 

boraçäo de um movimento, poderiamos desembocar num conflits   a

nossa mäo direita poderia interferir com a esquerda e teríamos menos

possibilidade de produzir novos movimentos coordenados que en 

volvessem mais de um membro. Relativamente a uma série de funçöes,

as estruturas de um dado hemisfério têm de ter vantagem sobre o outro;

essas estruturas chamam se dominantes.

O exemplo de dominäncia melhor conhecido diz respeito à linguagem.

Em mais de 95% das pessoas, o que inclui muitos canhotos, a lingu4gem

depende em larga medida das estruturas do hemisfério esquerdo*.

Outro exemplo de dominäncia, este favorecendo o hemisfério direito,

envolve o sentido integrado do corpo, através do qual a representaçäo de

estados viscerais, por um lado, e a representaçäo de estados dos mem 

bros, do tronco e das componentes centrais do aparelho músculo esque 

lético, por outro, se reúnem num mapa coordenado dinâmico. É de notar

que este näo é um mapa único e contigus, mas sim uma interacçäo e coor 

denaçäo de sinais em mapas separados. Nesta combinaçäo, os sinais re 

lacionados com o lado esquerdo e o lado direito do corpo encontram o seu

espaço de encontro mais extenso no hemisfério direito, nos três sectores

corticais somatossensoriais anteriormente indicados. De forma intrigan 

te, a representaçäo do espaço extrapessoal, assim como os processos da

emoçäo, também envolvem uma dominäncia do hemisfério direito".

Com isto näo se pretende dizer que as estruturas equivalentes no hemis 

fério esquerdonäo representam o corpo, ou o espaço; apenas que as repre 

sentaçöes säo diferentes: as representaçöes do hemisfério esquerdo säo

provavelmente parciais e näo integradas.

Os doentes com anosognosia assemelham se, em alguns aspectos, aos

doentes com lesöes pré frontais. Os anosognósicos, por exemplo, säo in 

capazes de efectuar decisöes apropriadas sobre assuntos pessoais e so 

ciais, o que acontece também com os doentes pré frontais. E os doentes

pré frontais com capacidade de decisäo diminuida säo, tal como os ano 

sognósicos, habitualmente indiferentes ao seu estado de saúde e parecem

possuir uma toleräncia invulgar à dor.

Alguns leitores poderäo ficar surpreendidos com tudo isto e per 

guntar se por que é que näo têm ouvido falar mais vezes sobre as limita 

çöes na tomada de decisäo exibidas pelos anosognósicos. Por que é que o

pouco interesse concedido ao raciocínio diminuido após lesäo cerebral

tem estado centrado em doentes com lesöes pré frontais? Poderiamos

* Veja se o trabalho de Alexanáre Castro Caldas. (N. do A.)

SANGUE FRIO 85


notar, na procura de uma explicaçäo, que os doentes com lesöes pré fron 

tais parecem nevrologicamente normais (os seus movimentos, as suas

sensaçöes e a sua linguagem encontram se intactes; a alteraçäo encon 

transe nos seus sentimentos e raciocinios diminuidos) e por isso podem

enquadrar se numa série de interacçöes sociais que mais facilmente

daräo a conhecer os seus raciocinios deficientes. Por outro lado, näo há

qualquer dúvida de que os anosognósicos säo doentes devido às suas

enormes limitaçöes motoras e sensoriais, e isso limita o leque de intera 


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