Fortune, uma mulher impiedosa. Bertrice small



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Fortune sentiu uma súbita e repentina tristeza. Seus olhos se encheram de lágrimas. Olhando para os de Rory Maguire, também os encontrou úmidos.

— Oh, Rory, vou sentir tantas saudades! Prometo que es­creverei — ela soluçou. ,

— Leve sua esposa, Kieran Devers, antes que ela comece a chorar sobre o veludo do meu colete — resmungou Rory, empurrando-a para os braços do marido.

Kieran abraçou Fortune e estendeu uma das mãos para Rory Maguire.

— Adeus, bom amigo. Sabe o que espero que faça por mim, não é?

— Sim, eu sei. Cuidarei dos túmulos, prometo.

Foi a vez de James Leslie despedir-se de Rory Maguire.

— Cuide dos meus garotos — pediu ele. — Sei que Adam vai aprender muito com você.

— Farei tudo o que estiver ao meu alcance, milorde. Bride Duffy, ainda choramingando, deu adeus a todos.

Fergus Duffy conduziria a carruagem até o porto, onde o navio os aguardava.

Jasmine trocou as últimas palavras com o primo, Cullen Butler.

— Tenha cuidado, Cullen. Não quero mártires pesando em minha consciência. Isso tudo é muito delicado, e não quero o fantasma de minha mãe pairando sobre mim, censurando meus atos e minhas decisões.

— Não agi bem todos esses anos, minha querida? — per­guntou o padre.

— Tudo mudou muito nesse último ano que passamos aqui, Cullen. Os protestantes militantes tornaram-se mais ferozes e ruidosos e tendem a fazer mais barulho com o passar do tempo. A Inglaterra comanda a Irlanda, e na Inglaterra o próprio rei está lidando penosamente com os puritanos para manter a ordem. Ele precisa ser muito cauteloso, ou sua rainha francesa católica será acusada de tê-lo influenciado. Vivemos tempos difíceis, não acredito que a situação vá melhorar tão cedo. Cau­tela e previdência são sempre características úteis, mesmo em um sacerdote.

— Deus vai olhar por mim.

— Deus ajuda a quem se ajuda — lembrou ela com um sor­riso triste. — Cuide dos meus meninos. Se alguém tentar inter­ferir ou forçar sua mão, lembre-se de que o duque de Glenkirk é a autoridade final em qualquer questão relativa aos filhos dele, Cullen.

O sacerdote beijou a mão dela.

— Deus a abençoe, prima. Agora vá.

Os Leslie e os Devers partiram para a.costa. A enorme baga­gem que Fortune levara ao castelo no ano anterior era agora ainda maior e já havia sido despachada no dia anterior. Havia apenas um coche de viagem: um veículo que transportava a bagagem necessária, Rohana e Adali. Os dois outros criados, assim como seus senhores, preferiam cavalgar a enfrentar o confinamento da carruagem. Eles evitaram Appleton no cami­nho de volta, percorrendo uma distância um pouco maior para poderem passar a noite na hospedaria Golden Lion, da Senho­ra Tully.

Quando chegaram à costa, encontraram a bagagem já es­perando nas docas, sendo embarcada no navio que os levaria de volta à Escócia. Lentamente, as carroças eram esvaziadas, e os baús e as arcas carregados pela prancha de embarque para serem acomodados no porão do navio.

— Felizmente nos preveniu para virmos vazios, milady — comentou o capitão sorrindo ao cumprimentar Jasmine. — Fico feliz por ver que a jovem senhora encontrou o que veio buscar em Ulster.

A duquesa de Glenkirk sorriu.

— Sim — respondeu. — Fortune provavelmente obteve mais do que esperava encontrar, capitão.

A viagem foi curta. Ao ver desaparecer a costa de sua terra natal, Kieran Devers sentiu um leve aperto no peito, mas não se arrependia por ter decidido partir. Estavam fazendo o que era certo, e antecipava com alegria a aventura que tinham pela fren­te. Nunca havia estado fora da Irlanda, diferentemente de sua jovem esposa, para quem viajar era algo comum e corriqueiro. Especulava sobre o que seria deles. O que fariam se Lorde Baltimore os recusasse? Esperava que a influência do sogro os ajudasse, pois queria saber como era esse Novo Mundo.

Kieran Devers olhou para a costa da Escócia, que agora podia ser vista, depois de dois dias no mar. Seu braço repousa­va sobre os ombros de Fortune, e ela sorria.

— Tudo vai dar certo, Kieran, meu amor. Eu sinto. No fundo do meu coração. Nosso lugar está no Novo Mundo. Lá cons­truiremos uma vida esplêndida e grandiosa, um futuro mara­vilhoso para nós e nossos filhos. Lorde Baltimore certamente nos aceitará. Como poderia nos recusar?

— Nunca em toda minha vida senti o peso da responsabili­dade como agora, Fortune — admitiu Kieran. — Sempre tive de responder apenas por mim mesmo. Morei na casa de meu pai, onde havia proteção e segurança. Agora tudo é diferente. Tenho você para amar, mas não temos um lugar para chamar de nosso, onde possamos viver juntos. Não temo, mas confes­so que me preocupo, meu amor.

— Não precisa se preocupar, Kieran. Já disse: tenho certeza de que o que estamos fazendo é o certo. O mundo é nosso! — e seu sorriso confiante o convenceu de que tudo realmente daria certo.

Capítulo 14
George Calvert era filho de Leonard Calvert, um cavalheiro do campo, e de sua esposa Alicia. Ele nasceu em Yorkshire no ano de 1580.0 pai era protestante, e ele havia sido criado como um, mas a mãe era uma católica que praticava sua fé em silên­cio. Calvert fora educado no Trinity College, em Oxford. Ao concluir seus estudos, partiu numa turnê pelo continente, como era comum entre os cavalheiros de sua posição. Na embaixada inglesa em Paris, teve a sorte de conhecer Sir Robert Cecil, Se­cretário de Estado a serviço da rainha. Cecil gostou do jovem circunspecto e ofereceu a ele uma posição em sua equipe.

Elizabeth Tudor faleceu, e James Stuart foi coroado rei. Cecil foi mantido em sua posição e fez de George Calvert seu secre­tário particular. Aquela altura, George havia contratado um casamento com Anne Mynne, uma jovem de boa família de Hertfordshire. Os Calvert deram ao primeiro filho o nome de Cecil, em honra ao patrono de George. Outros filhos nasceram. Mais três meninos e duas meninas.

Sir Robert tornou-se o Conde de Salisbury, o que só fez ele­var a estatura e a visibilidade de George Calvert. Quando o rei e a rainha fizeram uma visita a Oxford em 1605, Calvert estava entre os cinco homens a receber um diploma da universidade. Os outros quatro cavalheiros eram nobres de elevada posição. O rei passou a enviar o secretário de Sir Robert em seus assun­tos oficiais na Irlanda, pois gostava dele, confiava em sua leal­dade e sabia que era muito competente.

Quando Cecil morreu, em 1612, o rei manteve George em seu posto e, 5 anos mais tarde, sagrou-o cavaleiro. Pouco de­pois, Sir George Calvert foi feito Secretário de Estado do rei e membro do Conselho Privado. O filho do homem do campo chegara bem longe.

Trabalhador esforçado, homem honesto por natureza, Calvert era muito apreciado pelos homens com quem lidava diariamente. Não tinha inimigos, com poucas exceções na cor­te. Com o aumento rápido de sua fortuna, ele e a esposa plane­javam uma casa maior em Kiplin, Yorkshire, onde ele havia cres­cido. Mas Anne morreu no parto de seu sexto filho e, devastado, George Calvert decidiu se voltar para a religião católica de sua mãe em busca de consolo e conforto. Ele mantinha a nova fé em segredo, obedecendo às leis severas impostas aos cidadãos da Inglaterra.

Infelizmente, foi nesse tempo que o Rei James pediu ao fiel servidor que participasse de um comitê que se formava com o propósito de julgar um grupo de homens que se negavam a per­tencer à Igreja da Inglaterra. Alguns eram católicos; outros, pu­ritanos. A consciência e a ética de George Calvert falaram mais alto. Ele não podia assumir aquela tarefa nas circunstâncias re­ligiosas em que se encontrava. Assim, antes falou com seu se­nhor, o rei, e depois anunciou publicamente sua conversão ao catolicismo. Ele se desligou do gabinete, desistindo inclusive do posto de Secretário de Estado, apesar de o rei ter proposto liberá-lo do juramento de supremacia, o que poderia mantê-lo no serviço real. A verdade era que não se encontrava com facili­dade cavalheiros da competência de Sir George Calvert.

Além disso, James Stuart era um homem honrado que va­lorizava as poucas amizades verdadeiras que possuía. Ele sa­bia que, apesar da fé cristã, George Calvert seria sempre leal a ele e a seus herdeiros. Poderia ter enviado o ex-secretário para a torre. Em vez disso, ele o fez barão na linhagem irlandesa, com terras em County Longford. Depois, como o novo Lorde Baltimore sempre havia desejado fundar uma colônia no Novo Mundo, o rei deu a ele uma vasta extensão de terra na penínsu­la Avalon em Newfoundland.

Colonizadores foram enviados para lá e, mais tarde, Sir George seguiu com a nova esposa e a família. Em pouco tempo, descobriu que Newfoundland não era um lugar muito hospi­taleiro. Os ventos se estendiam desde o meio de outubro até o mês de maio. Não havia tempo para plantar e colher grãos. A pesca era excelente e poderia se tornar um empreendimento lucrativo, apesar de os franceses começarem a assediar Avalon. Calvert enviou a família para a Virgínia, no sul, e passou o in­verno na colônia. Com a chegada da primavera, descobriu, ali­viado, que havia conseguido sobreviver. Então, mandou uma carta ao rei explicando a situação e partiu para encontrar a es­posa na Virgínia. Com tristeza, George Calvert deduziu que Avalon não era a colônia que ele desejava fundar.

Uma vez reunido à família em Jamestown, dedicou-se a encontrar território mais propício, onde poderia realizar o so­nho de implantar uma colônia na qual todas as religiões fos­sem igualmente toleradas. Os amigos o receberam bem na Vir­gínia, mas também havia entre muitos a suspeita de que sua escolha religiosa o faria mais leal aos correligionários que se es­palhavam desde a Espanha até o sul da Virgínia do que aos seus compatriotas. Ignorando-os como podia, George Calvert come­çou a procurar por terras no sul, mas, apesar do clima agradável, não havia ali local de águas suficientemente profundas para per­mitir a ancoragem dos navios ingleses que transportariam su­primentos e homens. Aquela altura, uma carta do rei esperava por ele em Jamestown, ordenando que retornasse à Inglaterra.

Porém, antes que pudesse receber a carta, George Calvert chegou ao norte da Virgínia, à região de Chesapeake. O que ele viu o encheu de entusiasmo. Havia ali grandes baías abrigadas e portos onde as ondas não ultrapassavam meio metro em dias normais. As baías, que se encontravam formando uma área bem vasta, eram alimentadas por numerosos rios, alguns navegá­veis até bem perto do continente. A região era repleta de peixes, patos e gansos. Nas florestas que contornavam Chesapeake havia perus, cervos e coelhos. Ele reconheceu numerosas árvo­res cuja madeira serviria para a construção de casas e navios. George Calvert, Lorde Baltimore, acreditava ter encontrado o paraíso onde fundaria sua colônia.

De volta a Jamestown, recebeu a missiva real e retornou imediatamente à Inglaterra, deixando para trás a segunda es­posa e os filhos. Seu objetivo era obter uma licença para ocupar as terras da área de Chesapeake, pois aquele era o local perfeito para sua colônia. Na Inglaterra, James I estava morto, mas Charles I, seu filho, era igualmente apegado a Lorde Baltimore. Ele decidiu que o velho amigo e fiel servidor de seu pai parecia cansado e enfraquecido, e tentou dissuadi-lo da idéia de come­çar uma nova etapa de vida no Novo Mundo. Porém, Charles I finalmente compreendeu que George Calvert não se deixaria dissuadir até que pudesse fundar a colônia sobre a qual falava por tantos anos. Quanto à tolerância religiosa, o rei duvidava de que ela pudesse ser alcançada, mas deixou o cavalheiro fa­zer sua tentativa.

Lorde Baltimore obteve a terra mediante decreto real: até o real meridiano da primeira nascente do Rio Pattowmeck. Criada a propriedade, os direitos do Lorde sobre esse território eram pra­ticamente equivalentes aos de um rei. Ele podia criar leis, for­mar um exército, perdoar criminosos, conferir direitos e distri­buir títulos. E o Rei Charles deu ao amigo de seu pai um direito especial que não havia sido dado nem mesmo à colônia de Vir­gínia: a colônia de Lorde Baltimore poderia negociar com qual­quer país que quisesse; em troca, o rei receberia um quinto de qualquer ouro ou prata encontrados na colônia, bem como o pagamento anual de impostos.

Quando o mapa da nova colônia era traçado, o rei sugeriu que, como o lugar ainda não recebera um nome, talvez Lorde Baltimore pudesse dar à região o nome da rainha. George Calvert concordou. Terra Mariae passou assim a fazer parte do mapa, mas logo passou a ser chamada por seu apelido inglês Mary's Land, ou Terra de Maria.

Lady Baltimore e as crianças foram levadas para lá, mas, depois de uma viagem tranqüila, o navio em que eram trans­portadas naufragou na costa inglesa, desastre que não deixou sobreviventes. Lorde Baltimore ficou devastado. Havia perdi­do duas esposas e vários de seus filhos. Exausto, esgotado por muitos anos de trabalho duro, entristecido além do que era pos­sível descrever, morreu repentinamente em 15 de abril de 1632. Dois meses mais tarde as terras foram designadas oficialmente ao segundo Lorde Baltimore, Cecil Calvert, um belo jovem de 27 anos.

Em Glenkirk, James Leslie havia sido informado sobre tudo isso pelo enteado, Charles Frederick Stuart, duque de Lundy. As notícias chegaram quando Kieran e Fortune se preparavam para seguir viagem para a Inglaterra ao sul.

— Duvido que ele consiga zarpar ainda este ano — disse o duque —, mas não saberão enquanto não conversarem com Lorde Baltimore. Irão primeiro a Queen's Malvern, e Charlie os orientará quanto ao próximo passo. Não conheço essa gente, mas como todos estão ligados à corte, Charles certamente os conhece.

James Leslie e a esposa decidiram que não iriam para o sul com a família na costumeira visita anual de verão. O duque esti-vera afastado de suas terras por muito tempo e não viajaria no­vamente tão cedo. Jasmine ainda se recuperava do parto havia sete meses. Não queria levar um bebê ainda tão jovem quanto Autumn em outra jornada. A viagem de volta para casa já havia sido excessivamente arriscada para uma criança tão adorada e preciosa. Fortune e Kieran iriam sozinhos para a Inglaterra.

Com a aproximação do dia da partida, a duquesa de Glenkirk se entristecia. Quando sua segunda filha se fosse, não teria mais nenhum de seus filhos em casa, exceto Patrick Leslie, agora com 16 anos. Embora amasse a mãe e tolerasse sua preocupação, ele se considerava um homem. A pequena Autumn Rose crescia tão depressa que Jasmine tinha a impressão de que piscaria e a veria adulta, também deixando o lar.

Fortune sentia a tristeza da mãe e tentava alegrá-la.

— Ela é só um bebê, mãe. Ainda a terá em sua companhia por muitos anos. E poderá se dedicar a ela como não conseguiu se dedicar realmente a nenhum de nós. Acho que Autumn tem muita sorte, mãe.

— Sim — respondeu Jasmine, animando-se um pouco. Fortune era muito astuta. Ela sempre havia sido sua filha mais prática. Quando ela e os irmãos eram pequenos, Jasmine esti-vera na corte. Não tivera para nenhum deles o tempo que teria para sua caçula, — Vou sentir saudades — confessou a duque­sa de Glenkirk.

— Eu também, mamãe. Por um lado, estou muito entusias­mada com a idéia de ir para o Novo Mundo, mas, por outro, confesso que tenho um pouco de medo. É uma aventura grandiosa e, como bem sabe, nunca fui aventureira. Nunca planejei viver nada disso. No entanto, aqui estou eu, partindo para o desconhecido com meu querido Kieran. Por que as pessoas não podem conviver com suas diferenças religiosas? Assim eu não teria sido forçada a deixar Ulster. Acha que essa Mary's Land vai mesmo ser um local de tolerância mamãe? E se não for? Para onde iremos, então?

— Voltarão para casa, pára Glenkirk, onde terão nossa pro­teção — respondeu a duquesa com firmeza. Depois, abraçou a filha. — Você e Kieran serão sempre bem-vindos aqui, Fortune. Sempre!

Era tão difícil partir, Fortune pensou no dia em que deixou Glenkirk. Havia grande possibilidade de nunca mais voltar a ver o lugar onde havia crescido. Um oceano a separaria de casa, e, depois de atravessá-lo uma vez, não sabia se teria coragem para repetir a jornada de volta. Como sempre dizia, não era um espírito aventureiro. Mas não era uma aventura o que começa­va a viver? O lugar para onde se dirigiam era selvagem. Não havia castelos, casas, cidades nem comércio. Como sobrevive­riam? E que escolha tinham?

Fortune fingiu grande coragem e despediu-se daqueles que amava. O padrasto, James Leslie; a mãe, Jasmine; o irmão, Patrick Leslie; a irmã caçula, Autumn. Todos os criados chora­vam. Pela primeira vez notou que eles envelheciam. Nunca mais os veria, compreendeu repentinamente. Foi com grande emo­ção que a jovem abraçou Adali, o mordomo que a vira nascer e crescer. Não havia palavras para expressar o que sentia em seu coração. Ele a abraçou em silêncio, depois se virou, mas não com rapidez suficiente para esconder as lágrimas. Rohana e Toramalli a abraçaram e a beijaram chorando profusamente.

Fortune e Kieran deixaram Glenkirk levando em seu rastro uma enorme procissão de carroças contendo arcas e baús. Até os limites de Queen's Malvern o casal viajou protegido por uma tropa armada composta pelos homens de Leslie. A viagem era pacata, sem grandes eventos, mas, para Kieran, Róis e Kevin, era tão excitante quanto havia sido a viagem desde Ulster. Para Fortune era só mais um deslocamento pelo verão inglês.

Charles Frederik Stuart, o duque de Lundy, os esperava em sua casa, Queen's Malvern. A propriedade havia sido dada aos bisavós dele por Elizabeth Tudor e transferida para ele com a bênção de seu avô, o Rei James. Posteriormente, o rei dera ao neto um ducado. Charlie, como a família o chamava, era alto e esbelto, com cabelos claros e os olhos cor de âmbar dos Stuart. Ele era mais parecido com o pai, o falecido Príncipe Henry, do que com a família da mãe. Completaria 20 anos em setembro e era um cortesão tão polido e elegante quanto seu tio-avô Robin Southwood, o conde de Lynmouth, havia sido em sua idade.

— Parece feliz e satisfeita — comentou ele ao cumprimen­tar a irmã mais velha. Havia em seus lábios um sorriso malicio­so e debochado. — É óbvio que o casamento lhe fez muito bem, Fortune.

— Sempre um Stuart, como mamãe gosta de dizer — res­pondeu ela, rindo.—Este é meu marido, Kieran Devers. Kieran, este é Charlie, nosso Stuart não tão real.

Os dois homens trocaram um aperto de mãos e experimen­taram uma simpatia recíproca e imediata.

— Henry chegará de Cadby em alguns dias — contou Charlie à irmã. Em seguida, explicou ao cunhado: — Ele é nos­so irmão mais velho.

Todos se dirigiram ao salão da casa, onde criados já se mo­vimentavam para servir os hóspedes. Reunidos em torno da lareira, visto que o dia de junho era frio, conversavam.

—Papai disse que você saberia como entrar em contato com Lorde Baltimore — disse Fortune ao irmão.

— Ele está no Castelo de Wardour em Wiltshire.

— E como podemos chegar lá? — indagou Kieran, impa­ciente.

— Fortune ficará aqui — anunciou Charlie. — Você e eu seguiremos viagem a cavalo dentro de alguns dias. Mandarei um mensageiro marcar uma entrevista com ele, pois sua expe­dição é extremamente popular e ele é muito assediado por aque­les que estão interessados em acompanhá-lo. Muitos, é claro, querem apenas conquistar terras, propriedades que deixarão aos cuidados dos colonizadores enquanto eles, os proprietá­rios, retornam à Inglaterra e à boa vida da corte. Cecil Calvert, como o pai antes dele, quer colonizadores responsáveis, que se comprometam em permanecer em Mary's Land. Creio que vocês se qualificarão, e isso, além da capacidade de se susten­tar, pesará em favor de uma decisão positiva. Sem mencionar que eu, sobrinho querido do rei, intercederei pessoalmente pe­dindo um lugar para minha irmã e seu marido na expedição.

— Temos navios próprios — lembrou Fortune. — Eu vou com vocês, Charlie. Não vai me deixar aqui enquanto se diver­te com meu marido.

— Wardour não é lugar para mulheres. Uma importante expedição está sendo planejada naquele lugar. Há muitos ho­mens, e agora você é uma respeitável mulher casada, minha irmã.

— Lorde Baltimore não tem uma esposa, Charlie?

— Sim, Lady Anne Arundel.

— Ela está lá?

— É claro que sim! O castelo é do pai dela!

— Nesse caso, vou com vocês. E um cortesão, Charlie, e não sabe muito além das coisas da corte. E meu marido é um cavalheiro do campo recém-chegado de Ulster, ainda não co­nhece o estilo inglês de fazer negócios. Eu tenho de ir. Sou a única aqui com natureza prática, vamos precisar da minha ca­pacidade de negociação.

— Ela está certa — Kieran a apoiou. — E vai ser muito agra­dável ter a companhia de minha esposa.

O jovem duque refletiu por um momento, depois sorriu.

— Como sempre, você está correta, irmã. Havia me esque­cido de que é a mais sensata entre nós. Sim, você vem conosco, mas viajaremos a cavalo. Nada de criados nem roupas elegan­tes. Wardour em Tisbury fica a muitos dias de viagem de Queen's Malvern. Talvez voltemos por Oxton para visitar Ín­dia e a família dela.

— Oh, que notícia encantadora! — respondeu Fortune, en­tusiasmada.

Eles enviaram uma mensagem a Cadby para Henry Lindley, informando que estavam partindo para Wiltshire e que o ve­riam quando retornassem. Róis e Kevin foram deixados aos cuidados dos criados de Queen's Malvern, e o trio partiu numa manhã clara de junho. Kieran surpreendeu-se ao constatar que a esposa era perfeitamente capaz de cuidar de si mesma. Não havia percebido antes, e de repente era forçado a reconhecer que sabia muito pouco sobre Fortune. Eles chegaram ao Caste­lo de Wardour vários dias mais tarde. A construção tinha forma hexagonal e o Grande Salão ficava acima da entrada.

Cecil Calvert os recebeu pessoalmente.

— Charlie! É um prazer vê-lo, milorde! O rei está bem?

— Não vou à corte há um mês — respondeu Charlie. — E hoje estou aqui para pedir-lhe um favor, Cecil. Esta é minha irmã, Lady Fortune, e o cavalheiro é marido dela, Kieran Devers. Kieran era herdeiro de uma encantadora propriedade em Ulster, mas sua madrasta, uma inglesa, decidiu que o filho dela, meio-irmão de Kieran, seria melhor senhor para Mallow Court.

— É católico? — perguntou Lorde Baltimore com tom com­preensivo.

— Sim, milorde, eu sou — respondeu Kieran.

— Eles querem ir com você, Cecil — resumiu Charlie. Lorde Baltimore parecia preocupado.

— Já temos mais gente do que eu havia antecipado.

Fortune decidiu que era hora de falar.

— Temos nossos próprios navios, milorde. Meus dois na­vios de comércio. O maior será usado para nosso transporte. O outro levará os cavalos. E temos colonizadores, também. Qua­torze homens. Cinco agricultores, dois pescadores, dois oficiais de tecelagem, um ferreiro, um artesão em cobre, um curtidor, um sapateiro e um farmacêutico. Os cinco agricultores têm es­posas e filhos. Todos são saudáveis, esforçados e de bom cará­ter. E temos uma médica, a Senhora Happeth Jones, mais dois criados pessoais meus. Podemos cuidar das provisões de nos­sa gente e da manutenção de nossas naus, milorde. Por favor, aceite-nos. Não há outro lugar para nós, pois meu marido é ca­tólico, mas eu sou anglicana. Dizem que em Mary's Land to­das as fés serão toleradas. É o lugar perfeito para nós.

Cecil Calvert olhou para a adorável jovem diante dele. Ela usava um traje próprio para montar — uma calça revestida de couro de cervo na parte traseira — que chegava a ser ofensivo aos costumes puritanos da Inglaterra, mas era possível notar que suas roupas eram caras e elegantes. As mãos eram de uma dama. Seu discurso era refinado.

—Não vai ser um lugar muito fácil para viver, Lady Lindley. Terão de construir sua própria casa, e isso vai ser apenas o co­meço. Falamos aqui de uma região ainda por desbravar. E há outros perigos, também. Alguns nativos não são exatamente amistosos, tão propensos à guerra quanto franceses e espanhóis, embora eu tenha esperança de negociar a paz com esse povo. Terá de levar tudo de que possa necessitar, pois não encontrará nada lá. Estará longe de sua família, que, como Charlie já me contou, é grande e amorosa. Não verá seus irmãos e irmãs por muitos anos, se é que voltará a vê-los. Tem certeza de que é isso o que quer, milady? Empreender essa grande jornada para vi­ver em um mundo novo e desconhecido?


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