História Universal da Destruição dos Livros Das Tábuas Sumérias à Guerra do Iraque Fernando Báez



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CAPÍTULO 3

Grécia
Entre ruínas e fragmentos
I
A primeira imagem que qualquer pessoa tem da arte grega se refere a algum fragmento ou templo em ruínas. É freqüente ver fotos de turistas se deleitando entre colunas derrubadas, entre escombros e lugares abandonados, espoliados e convertidos em símbolos culturais. Sucede o mesmo com a literatura antiga. Segundo as estimativas mais otimistas, 75% de toda a literatura, filosofia e ciência grega antiga se perdeu. Um historiador pouco nostálgico como K. J. Dover se atreveu a comentar: "[...] De tudo o que os gregos escreveram só se conservou uma pequena porção. Temos os nomes de uma centena de historiadores gregos, mas apenas possuímos as obras de três deles pertencentes ao período clássico e algumas outras pertencentes a tempos posteriores. Em Atenas foram representadas mais de duas mil peças teatrais de 500 a.C. a 200 a.C., mas apenas podemos ler ou representar [...]."

O mais antigo fragmento de um livro grego conservado até agora é o chamado Papiro Derveni, datado do início do século IV a.C., parcialmente carbonizado, com vestígios de uma extensa interpretação alegórica e filosófica de um poema atribuído a Orfeu. Este dado é aterrador: se os primeiros livros gregos, difundidos por meio do papiro importado do Egito, foram compostos no século IX a.C., e só temos um papiro fragmentário do século IV a.C, estamos diante de quinhentos anos de obras perdidas. Os primeiros livros gregos desapareceram em sua totalidade.

Algumas das maiores perdas são da época helenística, isto é, dos séculos III a.C. a I d.C. A compilação Die Fragmente der griechischen Historiker (Os fragmentos dos historiadores gregos) do grande erudito Felix Jacoby ilustra esse aspecto, porque contém os fragmentos de mais de oitocentos historiadores de língua grega do período helenístico cujas obras se perderam.
II
Convém precisar que o livro era então uma folha de papiro apresentada como um rolo, de extensão variável. Quando uma obra ocupava o equivalente a dois volumes ou dois tomos dizia-se que tinha dois rolos. O livro era chamado de biblos, em homenagem à cidade fenícia de Biblos. O ato de ler era denominado anagnoosis, que significa "leitura", mas sobretudo "leitura pública". A leitura, além disso, fazia-se da seguinte forma: com a mão esquerda se desenrolava o papiro e com a direita se segurava o resto do rolo. Para esse ato de desenrolar se usava o verbo anelittoo.

Muito antes de escrever sobre papiros ou de assumir o alfabeto fenício, os gregos de Creta escreveram em tabletas de argila, como os sumérios, utilizando uma escrita silábica, denominada Lineal B por seus descobridores. Tratava-se de inventários e listas de alimentos e animais, mas não de textos literários; correspondiam ao arquivo do rei. Esse fato, vale o comentário, foi exibido pelos defensores de Creta para provar o equívoco daqueles que atribuíam ao mítico Cadmo a introdução das letras fenícias na cultura grega. De qualquer maneira, essa tese não teve sorte e hoje se aceita unanimemente o abandono do cretense pelo alfabeto fenício e, nesse sentido, há testemunhos históricos nas páginas de Heródoto,'" de Sófocles" e de Aristóteles.

Não sabemos o que ocorreu exatamente no século IX a.C, mas, por um lado, o alfabeto foi transformado, sob a pressão inovadora da poesia hexâmetra grega, e adotou vogais regulares fluidas; de outro lado, o papiro acabou por ser aceito como único instrumento para salvar a memória da população e, até o século V a.C., escrever e ler eram atividades comuns nas cidades.

Houve, é claro, e isso se sabe em detalhe, outras formas de difundir os escritos, mas limitadas, como o couro, as tabletas de madeira ou as pedras. Pausânias leu no Monte Hélicon uma versão de Os trabalhos e os dias de Hesíodo, numa placa de chumbo bem deteriorada naquele momento. Disso quase nada resta.

A fixação das leis por escrito foi um passo determinante na organização do mundo grego. Esquines elogiava a existência dos arquivos públicos porque fortaleciam o poder do povo ao possibilitar a verificação de uma mentira. De fato, os tratados ou convênios entre cidades se faziam por escrito para evitar mudanças de opinião dos contratantes. Há uma tábua do ano 500 a.C. com um tratado entre Elis e Heraia onde se pondera a escrita e se adverte que quem danificar o escrito será punido com multa."

O século V a.C. foi decisivo na Grécia: uma revolução cultural começou quando a cultura escrita se impôs sobre a cultura oral. As leituras se faziam em geral em voz alta, uma lembrança indiscutível dos tempos orais, embora haja provas irrefutáveis de leitura silenciosa nessa mesma época. A paixão pelos livros provocou o aparecimento do primeiro comércio de livros. Sócrates zombava de seus juízes ao dizer-lhes que no mercado da agora se podia comprar os livros do ateu Anaxágoras por uma dracma. Existia certamente venda de livros no mercado. O comediógrafo Eupolis de Atenas (por volta de 446 a.C.-411 a.C.) mencionou-a:



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