Crescimento e Ambiente
O homem demonstra em sua própria natureza uma pressão no sentido do Ser cada vez mais completo, da realização cada vez mais perfeita da sua condição humana, exatamente no mesmo sentido naturalista, científico, em que se pode afirmar que uma glande “pressiona no sentido” de ser um carvalho, ou em que pode ser observado que um tigre “se esforça” para ser tigrino ou um cavalo para ser eqüino. O homem, fundamentalmente, não é moldado ou talhado numa condição humana, nem ensinado para ser humano. O papel do meio consiste, em última análise, em permitir-lhe ou ajudá-lo a realizar as suas próprias potencialidades, não as potencialidades do meio. Este não lhe confere pontecialidades e capacidades; o homem é que as possui em si, numa forma incipiente ou embrionária, exatamente como possui braços e pernas em embrião. E a criatividade, a espontaneidade, a individualidade, a autenticidade, o cuidado com os outros, a capacidade de amar, o anseio de verdade, são potencialidades embrionárias que pertencem à espécie de que ele é membro, tal qual seus braços e pernas, seus olhos e cérebro.
Isso não está em contradição com os dados já reunidos que mostram, de forma clara, que a existência numa família e numa cultura é absolutamente necessária para realizar esses potenciais psicológicos que definem o ser humano. Tratemos de evitar essa confusão. Um professor ou uma cultura não criam um ser humano. Não implantam nele a capacidade de amar, ou de ser curioso, ou de filosofar, ou de simbolizar, ou de ser criativo. O que fazem, sim, é permitir, ou promover, ou encorajar, ou ajudar o que existe em embrião a que se torne real e concreto. A mesma mãe ou a mesma cultura, tratando um gatinho ou um cachorrinho exatamente da mesma maneira, não podem fazer dele um ser humano. A cultura é sol, alimento e água; não é a semente.
A Teoria do “Instinto”
O grupo de pensadores que tem estado a trabalhar com a individuação, o eu, a autenticidade humana etc., logrou estabelecer solidamente a sua tese de que o homem [pág. 193] tem uma tendência para “realizar-se”. Por implicação, ele é exortado a ser fiel à sua própria natureza, a confiar em si próprio, a ser autêntico, espontâneo, honestamente expressivo, a procurar as fontes da sua ação em sua própria natureza íntima e profunda.
Mas, é claro, isso é um conselho ideal. Eles não advertem suficientemente que a maioria dos adultos não sabe como serem autênticos e que, se “se expressarem” a si próprios, podem provocar uma catástrofe não só para eles, mas também para os outros. Que resposta deve ser dada ao estuprador ou ao sádico que pergunta: “Por que motivo não devia confiar em minha própria natureza e expressar-me honestamente?”
Esses pensadores, como um grupo, têm sido remissos em muitos aspectos. Eles sugeriram, sem tornar explícito, que se nos pudermos comportar autenticamente, comportar-nos-emos bem; que, se emitirmos uma ação desde o nosso intimo, será o comportamento bom e certo. O que é muito claramente sugerido é que esse núcleo interno, esse eu real, é bom, ético, digno de confiança. Isso é uma afirmação claramente distinta da afirmação de que o homem se realiza a si próprio (obtém a sua própria individuação) e precisa ser separadamente demonstrada (como creio que será). Além disso, esses autores, como um grupo, furtaram-se definitivamente a uma explicação decisiva sobre esse núcleo interno, isto é, que ele deve, em certo grau, ser herdado, ou então tudo o que eles dizem ficará, em grande parte, confuso e reduzido a nada.
Por outras palavras, temos de nos haver com a teoria do “instinto” ou, como prefiro chamar-lhe, a teoria das necessidades básicas, quer dizer, com o estudo das necessidades, impulsos, desejos e, direi eu, valores da humanidade, originais e intrínsecos, em parte determinados pela hereditariedade. Não podemos fazer, simultaneamente, o jogo da Biologia e o jogo da Sociologia. Não podemos afirmar, ao mesmo tempo, que a cultura faz tudo e que o homem possui uma natureza inerente. Uma coisa é incompatível com a outra.
E, de todos os problemas nessa área do instinto, o que conhecemos menos e deveríamos conhecer mais é o da agressão, hostilidade, aversão e destrutividade. Os freudianos afirmam que isso é instintivo; a maioria dos psicólogos dinâmicos assevera que não é diretamente instintivo, [pág. 194] mas, antes, uma reação onipresente a toda e qualquer frustração das necessidades básicas ou instintóides. Outra interpretação possível dos dados — em minha opinião, melhor — salienta a mudança na qualidade da cólera, segundo a saúde psicológica melhore ou piore (103). Na pessoa mais sadia, a cólera é reativa (a uma situação presente), em vez de um reservatório caracterológico do passado. Quer dizer, trata-se de uma resposta realista e efetiva a algo real e presente, por exemplo, à injustiça, ou exploração, ou ataque, em vez de um transbordamento catártico de revide ou vingança mal dirigida e ineficaz contra espectadores inocentes, por pecados que alguma outra pessoa possa ter cometido há muito tempo. A cólera não desaparece com a saúde psicológica; ela assume, ao contrário, a forma de deliberação, de auto-afirmação, de autoproteção, de justificada indignação, lutando contra o mal e coisas parecidas. E uma tal pessoa está apta a ser um combatente mais eficaz pela justiça, por exemplo, do que uma pessoa comum.
Numa palavra, a agressão sadia assume a forma de vigor e auto-afirmação pessoais. ‘Á agressão da pessoa mórbida, da infeliz ou da explorada, tem mais possibilidades de adotar um certo conteúdo de crueldade, sadismo, destrutividade cega, dominação, malevolência e rancor.
Enunciado dessa maneira, o problema pode ser considerado facilmente pesquisável, tal como se observa no estudo acima referido (103).
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