Observe a imagem a seguir.
Figura 21
J. L. Bulcão/Pulsar
Agora, leia o trecho desta letra de música.
Ah!... Saúda Deus no luar,
. Acesso em: 13 mar. 2015.
Página 226
Escutar estrelas?
Pois é, “escutar as estrelas” pode querer dizer, aqui, observar com muita atenção e curiosidade – no silêncio e sem pressa – tudo e todos que estão à nossa volta. De certa maneira, ver o “lindo luar, e tudo e todos, até as estrelas consegue escutar” quem sabe não seria aqui uma proposta, um desafio... tentarmos enxergar as coisas como elas são e não como achamos que elas devem ser, percebendo com delicadeza o movimento e a transformação constante das pessoas e do mundo inteiro.
Temos estudado, neste livro, que os artistas criam com base nas coisas que aprendem a escutar, ver, observar, sentir... E podemos aprender a criar na arte também prestando atenção, aprendendo a “escutar as estrelas”. Isso quer dizer estar sensível e entrar em estados que os gregos chamavam de estesia, ou seja, estar aberto ao sentir, a perceber o sentimento da beleza.
Assim também falava o poeta Olavo Bilac (1865-1918), em seu poema
Via Láctea:
“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!”
[...]
E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas.”
BILAC, Olavo. Via Láctea (trecho XIII). In. ______. Antologia poética. Porto Alegre: L&PM, 2012. p. 28.
Criar com base em histórias de pessoas ou lugares. Encontrar um tema que pode estar tanto na forma de compor uma música quanto no conteúdo, como nas histórias que falam sobre nossos heróis. A história de Chico Rei, cantada nos versos citados, já foi motivo de muita inspiração para criação de várias músicas, livros, poemas, danças, pinturas, peças teatrais e até no ritmo do maracatu.
Volte e leia novamente o trecho da letra da música Chico Rei.
Quem foi Chico Rei?
Figura 22
Ilustração de Chico Rei.
Mariana Waechter
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Trata-se de um importante personagem da cultura brasileira, apesar de sua história não ser muito difundida. Na verdade, os detalhes de sua trajetória são bastante obscuros ainda hoje. Sabe-se que esse herói africano foi capturado pelos portugueses no Congo, ao final do século XVIII, e trazido com muitos de sua tribo para o Brasil. Foi, assim, escravizado e trabalhou nas minas de ouro de Minas Gerais.
Conforme a lenda, enquanto labutava arduamente na exploração do minério, Chico Rei escondia pequenas pepitas entre seus cabelos. Depois, ao lavar-se, recolhia as pedras de ouro. Pacientemente, ele acumulou o valor necessário para comprar a sua própria liberdade e, depois, a de cada um de seus irmãos. De maneira criativa e determinada, Chico Rei teria chegado até mesmo a, segundo dizem, comprar uma mina de ouro, libertar a sua tribo inteira e enriquecer.
Em 1985, a história de Chico Rei virou filme, dirigido por Walter Lima Jr. e premiado no Brasil e na Colômbia.
Figura 23
Cartaz do filme Chico Rei – um filme sobre a liberdade. Direção de Walter Lima Jr. Rio de Janeiro: Embrafilme, 1985. (115 min.).
Filme de Walter Lima Jr. Chico Rei. Brasil. 1985
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PALAVRA DO ARTISTA
Mestre Salustiano (1945-2008)
Figura 24
Mestre Salustiano, especialista em maracatu, tocando uma de suas inseparáveis rabecas, que ele mesmo confeccionava. Foto de 2003.
Rosane Marinho/Agência O Globo
O nome que dá título a este capítulo foi inspirado na história de Chico Rei, africano que um dia se viu em nosso país trazido por navio negreiro e, mesmo vivendo situações muito sofridas, teve força para lutar pela vida e pela liberdade de outras pessoas.
Mestre de maracatu, um instrumentista, pessoa do povo, da comunidade, com vontade de luta, pode também fazer diferença na vida das pessoas. É assim que acontece boa parte das manifestações de arte popular genuínas. São pessoas da comunidade que se organizam, bordam suas roupas, constroem instrumentos, criam as músicas, os passos de danças e saem pelas ruas só para compartilhar.
O que é um Reino?
Cantores, músicos e compositores que conhecemos pela televisão ou somente por aí, andando pelo sertão do Brasil, podem um dia se encontrar e formar também um reino, um lugar de arte e cultura brasileira.
Um reino é repleto de histórias, e algumas começam assim:
Era uma vez...
Um mestre de maracatu chamado Salustiano.
Ele nasceu em Aliança, no Pernambuco. Desde criança aprendeu a construir e a tocar instrumentos musicais. Trabalhou em muitos serviços e ofícios, mas um dia resolveu viver de música, fosse de fazer instrumentos para outro tocar ou para ele mesmo desfrutar. As primeiras lições já sabia, mas quis aprender, com o mestre luthier Mané Pitunga (1930-2002), um jeito de melhorar seu fazer em transformar um pedaço de pau em uma peça mágica, capaz de espalhar notas musicais pelo ar, assim que alguém se atreve a tocar. Na terra da Zona da Mata, no Pernambuco, costuma-se dizer que um bom tocador de instrumento musical é aquele que também o sabe fazer.
Mestre Salu correu um pedaço do mundo, conheceu outras partes do Brasil, tocou para gente do estrangeiro e até para roqueiro.
AMPLIANDO
Luthier é o nome do profissional que constrói instrumentos musicais. Esse serviço é muito especializado e exige conhecimento e habilidade para transformar materiais em objetos para criar músicas. No Brasil, há grandes nomes na construção de rabecas, como Mestre Salustiano (1945-2008) e Mané Pitunga (1930-2002).
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Instrumentista de mão cheia, compositor inspirado, organizador de folgazões e fundador de Nação de Maracatu, Salustiano tinha uma paixão especial. Seu nome era rabeca. Até fundou uma casa para ela na Cidade Tabajara, em Olinda, Pernambuco. É a Casa da Rabeca, que recebe artistas dedicados à arte musical do Nordeste.
A ideia de montar essa casa foi sugestão de um amigo também músico e compositor, mas esse é lá de Salvador. Seu nome, Gilberto Gil, você deve conhecer, de ver na televisão, ouvir na novela, no cinema, no rádio, CD, ou de navegar na internet. Quem sabe? Se você prestou atenção na lição, falamos nele agora há pouco, quando dissemos que ele já cantou: “Quem segura o porta-estandarte, tem a arte, tem a arte”.
Voltando à história, um dia o mestre da Casa da Rabeca encontrou-se de novo com o seu amigo Gil e fez uma proposta:
“Você me ensina violão que eu lhe ensino rabeca.”
Já imaginou se tivesse dado tempo?
Ver esses dois tocando juntos, Mestre Salu no violão e Gil na rabeca... Mas a vida tem pressa!
E nosso Mestre Salustiano precisou ir embora.
Figura 25
Mariana Waechter
Ilustração do encontro de Mestre Salu com Gilberto Gil.
Figura 26
Rubens Chaves/Folhapress
Imagem de uma rabeca, instrumento de origem árabe muito popular no Nordeste brasileiro.
Fontes de pesquisa: FERRON, Maleronka; COHN, Sergio. Manoel Salustiano: dirigente do maracatu Piaba de Ouro. Disponível em:
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