Manual do professor solange dos santos utuari ferrari



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-- CONGRESSO INTERNACIONAL DE MONTREAL SOBRE INCLUSÃO. Declaração internacional de Montreal sobre inclusão. Montreal/Quebec, 2001. Disponível em: .

-- ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração de Salamanca: sobre princípios, políticas e práticas na área das necessidades educativas especiais. Salamanca, 1994. Disponível em: .

-- REILY, Lucia. O ensino de artes visuais na escola no contexto da inclusão. Cadernos Cedes. Campinas, v. 30, n. 80, p. 84-102, jan.-abr. 2010. Disponível em: .

Este artigo aborda o ensino de artes visuais num contexto de inclusão, preocupado em apresentar ao professor uma proposta de trabalho de ateliê e fruição para ser desenvolvida com os alunos.



2. Orientações teórico-metodológicas

Cada metodologia estimula percepções e encontros diferenciados ao valorizar habilidades, competências e experiências específicas. Na direção do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP), em 1987, a professora Ana Mae Barbosa desenvolveu, com base em suas pesquisas e ações educativas, a Abordagem Triangular. Esse momento pode ser considerado um marco na história do ensino de Arte, uma vez que apresentava, de forma mais sistematizada, um dos primeiros programas educativos do gênero.

Ainda hoje, a Abordagem Triangular é a base da maioria dos programas de Arte-Educação no Brasil, em escolas ou em museus. Essa abordagem consiste em uma metodologia com três eixos de aprendizagem, sem ordem preestabelecida: apreciar, contextualizar e fazer. Deve ser apresentada ao educando uma rica conceituação estética que propicie a leitura em diferentes linguagens da arte, de maneira crítica e teoricamente fundamentada. Quanto à contextualização da produção artística, o ensino de Arte deve proporcionar uma leitura de mundo, uma contextualização histórica da obra de arte como produção social e, portanto, imbuída de todas as suas dimensões histórico-culturais. Quanto ao fazer artístico, é importante salientar que as aulas de Arte devem, necessariamente, ser um espaço de produção criativa de arte, sejam essas aulas de artes visuais, música, teatro ou dança.

Essa abordagem metodológica pretende, segundo Ana Mae, desenvolver a capacidade dos alunos de realizar uma análise crítica da obra de arte. A Abordagem Triangular tem como base procedimentos de descrição e análise na interpretação e avaliação da obra de arte, na investigação de seus significados, além de discutir assuntos de estéticas apresentadas na obra, ampliando o repertório cultural dos alunos e explorando potenciais de criação artística. Ela mostra que a arte está, antes de tudo, presente na vida dos alunos, e sua exploração pode desenvolver conceitos de cidadania e identidade cultural. A arte está em todos os lugares!

A Abordagem Triangular defende, também, que os três eixos de aprendizagem (apreciar, contextualizar e fazer) podem ampliar a capacidade cognitiva e crítica de crianças e jovens. Nesse sentido, o estudante seria estimulado a criar suas próprias manifestações poéticas e artísticas com um repertório

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cultural alimentado pelas produções de diferentes artistas. Essa concepção de ensino de Arte valoriza o processo criativo, o conhecimento de procedimentos artísticos, a acessibilidade de bens culturais, além da relação entre arte e vida.

Em 1991, Ana Mae Barbosa publicou o livro intitulado A imagem no ensino de Arte: anos oitenta e novos tempos, em que apresenta estudos sobre o ensino de Arte nos Estados Unidos, no México e na Inglaterra. Nele, aborda várias proposições pedagógicas em que o “fazer” artístico, a leitura de imagens e o conhecimento de outros aspectos da arte, como a história, a crítica e a estética, estavam presentes. Essas ideias influenciaram as propostas brasileiras no ensino de Arte, principalmente a Abordagem Triangular. Observe a seguir alguns destaques do ensino de Arte nesses países.

⋅ No México, as chamadas Escuelas al Aire Libre foram estabelecidas após a Revolução Mexicana de 1910 e propunham o resgate dos valores nacionais, na busca por uma arte que retratasse e expressasse o povo mexicano e que tivesse como intenção a educação estética e cultural.

⋅ Na Inglaterra, o movimento Critical Studies ocorreu nos anos 1970, trazendo uma concepção de ensino de Arte que valorizava os conteúdos teóricos, além das atividades práticas no fazer artístico. Esse movimento tinha por premissa que a linguagem da arte não era apenas uma forma de recreação. O objetivo dessa concepção de ensino era mostrar que o ensino de Arte trazia a possibilidade de apreciação, leitura e análise de obras artísticas, além de propor a percepção da arte como produto histórico-sociocultural, estético e técnico.

⋅ Nos Estados Unidos, a proposta do Discipline-Based Art Education (DBAE) – ensino de Arte com base em quatro disciplinas: estética, história, produção e crítica – mostrava que um ensino mais completo de Arte deve se preocupar com o ensino de História da Arte, dos aspectos estéticos e estilísticos, com as técnicas, os materiais e procedimentos expressos na produção da obra artística, além de desenvolver senso crítico nos alunos, tornando-os capazes de emitir opiniões a respeito das produções apresentadas nesse processo de aprendizagem da arte.

Sabemos que, de forma direta ou indireta, os professores estão atentos aos três eixos (Abordagem Triangular: apreciar, fazer e contextualizar). Entretanto, ao trazer à consciência essa relevância, Ana Mae criou uma forte discussão nos meios acadêmicos – e, posteriormente, nas políticas públicas –, sobre a importância da formação dos professores de Arte e a relevância da Arte como disciplina, com conteúdos, metodologias e avaliações específicos.

A Abordagem Triangular é uma referência incontestável na história do ensino de Arte no Brasil. Entretanto, outras concepções de educação estética, artística e cultural vêm trilhando caminhos próprios nas escolas e nos programas educativos brasileiros. O estudo da cultura visual proposto por Fernando Hernández em seu livro Cultura visual, mudança educativa e projeto de trabalho (HERNÁNDEZ, 2000) também desencadeou vários estudos sobre o ensino de Arte e ainda influencia diversos núcleos de pesquisa em universidades brasileiras. A ideia de cultura visual é interdisciplinar e busca referenciais de arte, arquitetura, história, mediação cultural, psicologia, antropologia. Ela não se organiza somente com base em nomes de peças, fatos e sujeitos, mas na relação estabelecida com seus significados culturais. O autor defende uma abordagem da arte que considere “a arte e a cultura como mediadores de significados”, na qual o “significado pode ser interpretado e construído” e as imagens podem “informar àqueles que as veem sobre eles mesmos e sobre temas relevantes no mundo” (HERNÁNDEZ, 2000, p. 54).

No Brasil, observamos, nos últimos anos, um aumento da produção teórica que valoriza o ensino intercultural na arte (BARBOSA, 2009; RITCHER, 2008; CANDAU, 2008; CARVALHO, 2011), compreendendo “interculturalidade” como um diálogo dinâmico que aponta para uma relação de interpenetração cultural entre grupos diferentes. A abordagem com base na interculturalidade valoriza a identidade dos diversos povos, sociedades e práticas culturais, concentrando-se nos diálogos, encontros e construções conjuntas das diversas culturas e tradições, valorizando o surgimento do novo e das novas identidades culturais.
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Além das duas abordagens já mencionadas, está presente nas propostas curriculares a partir de 2003 a abordagem dos Territórios da Arte e Cultura, que engloba as ideias de Mirian Celeste Martins e de Gisa Picosque (2010). Os territórios de arte e cultura são marcados pela ideia de currículo-mapa, em que o professor traça percursos, escolhe caminhos e é autor de seu próprio trabalho. Nessa proposição, o pensamento rizomático oferece uma possibilidade de criar projetos em ensino de Arte que ampliem visões e percepções sobre como conhecer a arte por diversas vias.

Essa proposta considera os fundamentos dos filósofos Deleuze e Guattari (1997) e fundamenta-se em um currículo-mapa que “germina” em forma de rizomas. Os rizomas desenvolvem raízes e caules em seus nós. São plantas que acumulam reservas de nutrientes e, em alguns casos, crescem em situações adversas. Essa imagem inspirou os filósofos citados a refletirem sobre a ideia de que nosso pensamento também poderia se desenvolver dessa forma, fazendo conexões e criando ideias que vão além da ideia inicial e da ordem preestabelecida, como um pensamento em constante estado de invenção.

Nessa perspectiva, o pensamento rizomático, proposto por Deleuze e Guattari (1997, p. 17), é uma metáfora sobre pensamentos moventes, construídos em redes, em linhas de fuga, tendo como essência não a unidade e a sequencialidade, mas sim a multiplicidade e a complexidade, a expansão de ideias que se proliferam por campos conceituais. “Não existem pontos ou posições num rizoma como se encontra numa estrutura, numa árvore, numa raiz. Existem somente linhas” (DELEUZE; GATTARI, 1997, p. 17).

Como uma estrutura de pensamento que busca crescer por caminhos nutridos pela inteligência, por encontros, pela afetividade e pelos desejos do ser humano, pensar de forma rizomática é fazer conexões entre pensamentos e saberes; conviver com as incertezas, aventurar-se e espalhar-se por territórios na busca por nutrientes, construindo e ampliando saberes e conhecimentos. Não se trata de explicar a arte ou apresentar certezas, mas de abrir espaços para conversar, trocar ideias e experiências buscando múltiplas fontes de estudos e pesquisas que nutram o pensamento.

As situações de aprendizagem exploram diversos conceitos que visam potencializar a experiência com a arte. Os conceitos de forma e conteúdo nos ajudam a examinar como a arte é constituída em seus elementos de linguagem e temas. Existem diferentes maneiras de articular os elementos de linguagens que criam estilos, discursos e poéticas.

No trato com as materialidades, são observadas as possibilidades e potencialidades das matérias que constituem as obras de arte, por meio da investigação de materiais, suportes, ferramentas, instrumentos e outros aspectos, dependendo da linguagem utilizada, bem como da intenção poética do artista ou dos jovens em seu fazer artístico.

O território do patrimônio cultural auxilia na análise da produção artística de diferentes tempos. São observados o cultivo do espírito de pertencimento, a conservação e a valorização da cultura local e universal, além da reflexão sobre o valor dos bens materiais, imateriais, simbólicos, presentes em espaços fechados ou abertos, em tradições populares ou manifestações de arte contemporânea. Dessa maneira, os saberes estéticos e culturais propõem encontros que vão além da história da arte.

Dentro desse contexto, a interculturalidade, pensada como a criação de códigos artísticos e culturais novos, com base em encontros identitários diversos, é um importante território a ser explorado, dialogando com as diretrizes curriculares tanto da Lei nº 10639/03, que traz a obrigatoriedade da História Africana e Afro-Brasileira nos currículos da educação básica, como da Lei nº 11645/08, que sistematiza a História e Cultura Indígenas.

As conexões transdisciplinares/interdisciplinares entre Arte e outras áreas do conhecimento dentro do currículo escolar ou em temas contribuem para a reflexão sobre o ser humano como ator político-histórico-social que produz linguagens e sistemas simbólicos.

Significativos são os encontros em que podemos escolher caminhos e criar boas conversas. Entre encontros e desencontros, é provável que tenhamos nos emocionado ao entrar em uma instalação, ao perceber um gesto, um movimento, ao ver a cena de um filme, ao ouvir sons de uma música ou as palavras de um poeta. Imagens nas telas dos pintores ou dos computadores podem ter provocado lembranças,
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angústias ou encantos em nós. São momentos de conversas e encontros com a arte. Na convivência entre autor e leitor, propomos um diálogo ao caminhar por campos conceituais e produções artísticas. Também estão convidados para essa trajetória artistas visuais, músicos, atores, poetas, dançarinos, arquitetos, designers e teóricos interessados na conversa sobre concepções de arte e ensino de Arte.



- O professor como propositor

Nós somos os propositores: nós somos o molde, cabe a você o soprar dentro dele o sentido da nossa existência. Nós somos os propositores: nossa proposição é o diálogo. Sós, não existimos; estamos à sua mercê. Nós somos os propositores: enterramos a obra de arte como tal e chamamos você para que o pensamento viva através de sua ação. Nós somos os propositores: não lhe propomos nem o passado nem o futuro, mas o agora.

(Lygia Clark, 1968 apud CLARK, 2008, p. 143)

Lygia Clark apresentou a ideia de “artista propositora” ao dizer que a obra de arte como contemplação está morta. Sua preocupação era apresentar um convite ao processo de criação, que não seria mais apenas de responsabilidade do artista – o público precisava participar da produção da obra de arte. A arte passou a ser vista não mais como algo dado, pronto à contemplação em único percurso, criado apenas pelo artista, mas como um convite à construção de vários percursos poéticos, estéticos e criativos indicados pelo artista e pelo público.

Como se constitui um professor propositor?

Ser professor propositor implica abrir espaço para a voz do outro, escolher caminhos nos quais os jovens possam estar presentes de forma ativa, sendo protagonistas de seu processo de construção de saberes e ampliação de repertórios culturais. Um professor propositor é pesquisador, porque tem sede de saberes, e sensível, porque tem vontade de beleza. Ser propositor é pensar e permitir que o outro pense. Não é explicar, mas saber perguntar, provocar pensamento. O estado de dúvida são ventos para pensamentos moventes.

Ser professor propositor inclui ouvir, querer saber o que o outro pensa, sente, intui. Em obras de arte propositivas, para que se completem, é fundamental que haja um movimento entre criação, interação e poética. A ação propositora é aquela que abre espaços para diálogos entre jovens, artistas, obras e apreciadores, entre arte e vida.

Dentro do contexto de professor propositor, as “situações de aprendizagem” substituem a ideia, muitas vezes empobrecedora, de atividades de arte. Entretanto, como apontam Mirian Celeste Martins e Gisa Picosque (2010), não se trata apenas de fazer trocadilhos de palavras, mas de uma nova concepção a respeito do processo de fazer e pensar a arte.



PARA SABER MAIS

Os Parâmetros Curriculares de Arte, terceiro e quarto ciclos (BRASIL, 1998, p. 99-101), destacam: “[...] A prática de aula é resultante da combinação de vários papéis que o professor pode desempenhar antes, durante e depois de cada aula”.

Antes da aula:

⋅ o professor é um pesquisador de fontes de informação, materiais e técnicas;

⋅ o professor é um apreciador de arte, escolhendo obras e artistas a serem estudados;

⋅ o professor é um criador na preparação e na organização da aula e seu espaço;

⋅ o professor é um estudioso da arte, desenvolvendo seu conhecimento artístico;

⋅ o professor é um profissional que trabalha junto à equipe da escola.


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Durante a aula:

⋅ o professor é um incentivador da produção individual ou grupal; o professor propõe questões relativas à arte, interferindo tanto no processo criador dos alunos (com perguntas, sugestões, respostas de acordo com o conhecimento que tem de cada aluno etc.) quanto nas atividades de apreciação de obras e informações sobre artistas (buscando formas de manter vivo o interesse dos alunos, construindo junto com eles a surpresa, o mistério, o humor, o divertimento, a incerteza, a questão difícil, como ingredientes dessas atividades);

⋅ o professor é estimulador do olhar crítico dos alunos com relação às formas produzidas por eles, pelos colegas e pelos artistas e temas estudados, bem como às formas da natureza e das que são produzidas pelas culturas;

⋅ o professor é propiciador de um clima de trabalho em que a curiosidade, o constante desafio perceptivo, a qualidade lúdica e a alegria estejam presentes junto com a paciência, a atenção e o esforço necessários para a continuidade do processo de criação artística;

⋅ o professor é inventor de formas de apreciação da arte — como apresentações de trabalhos de alunos —, e de formas de instrução e comunicação: visitas a ateliês e oficinas de artesãos locais, ensaios, maneiras inusitadas de apresentar dados sobre artistas, escolha de objetos artísticos que chamem a atenção dos alunos e provoquem questões, utilizando-os como elementos para uma aula, leitura de notícias, poemas e contos durante a aula;

⋅ o professor é acolhedor de materiais, ideias e sugestões trazidos pelos alunos (um familiar artesão, um vizinho artista, um livro ou um objeto trazido de casa, uma história contada, uma festa da comunidade, uma música, uma dança etc.);

⋅ o professor é formulador de um destino para os trabalhos dos alunos (pastas de trabalhos, exposições, apresentações etc.);

⋅ o professor é descobridor de propostas de trabalho que visam a sugerir procedimentos e atividades que os alunos podem concretizar para desenvolver seu processo de criação, de reflexão ou de apreciação de obras de arte. Assim, exercícios de observação de elementos da natureza ou das culturas, por exemplo, podem desenvolver a percepção de linhas, formas, cores, sons, gestos e cenas, o que contribuirá para o enriquecimento do trabalho artístico dos alunos;

⋅ o professor é reconhecedor do ritmo pessoal dos alunos, o que envolve seu conhecimento da faixa etária do grupo e de cada criança em particular;

⋅ o professor analisa os trabalhos produzidos pelos alunos junto com eles, para que a aprendizagem também possa ocorrer a partir dessa análise, na apreciação que cada aluno faz por si do seu trabalho com relação aos dos demais.



Depois da aula:

⋅ o professor é articulador das aulas, umas com relação às outras, de acordo com o propósito que fundamenta seu trabalho, podendo desenvolver formas pessoais de articulação entre o que veio antes e o que vem depois;

⋅ o professor é avaliador de cada aula particular (contando com instrumentos de avaliação que podem ocorrer também durante o momento da aula, realizados por ele e pelos alunos) e do conjunto de aulas que forma o processo de ensino e aprendizagem; tal avaliação deve integrar-se no projeto curricular da sua unidade escolar;

⋅ o professor é imaginador do que está por acontecer na continuidade do trabalho, com base no conjunto de dados adquiridos na experiência das aulas anteriores.”


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As ações propositoras criam e potencializam processos de ensino e aprendizagem da arte. Com base nessas premissas, assume-se que cada professor tem seu jeito próprio de ser e estar no mundo, e, por isso, fará com que nasçam trabalhos singulares e especiais, porque, para que a “práxis docente seja competente, não basta, então, o domínio de alguns conhecimentos e os recursos a algumas técnicas” (RIOS, 2001, p. 96); é preciso ir além e trazer para o processo de ensinar e aprender o compromisso com as necessidades dos jovens estudantes.

Ao observar obras artísticas, o aluno formula hipóteses, estabelece relações e percebe soluções técnicas e estéticas para alimentar seu próprio processo criativo. Durante os percursos de aprendizagem, há vários momentos de nutrição estética. Cada obra de arte foi escolhida para apresentar conceitos que estão sendo explorados a cada situação, e as possibilidades de leituras estão em forma de sugestões na concepção da mediação cultural.

- O planejamento sob a ótica dos Projetos de Trabalho

A perspectiva de conhecimento globalizado e relacional é o que fundamenta e inspira os Projetos de Trabalho propostos por Hernández e Ventura (1998). Segundo os autores:

[...] [o] projeto pode organizar-se seguindo um determinado eixo: a definição de um conceito, um problema geral ou particular, um conjunto de perguntas inter-relacionadas, uma temática que valha a pena ser tratada por si mesma... Normalmente, superam-se os limites de uma matéria. (HERNÁNDEZ e VENTURA, 1998, p. 61)

O projeto tem como função favorecer a criação de estratégias de organização dos conhecimentos escolares em relação ao tratamento da informação, bem como favorecer a relação entre os diferentes conteúdos em torno de problemas ou hipóteses, de modo a facilitar a construção do conhecimento pelos alunos.

O planejamento sob a ótica de Hernández e Ventura (1998) vem somar-se a outras proposições metodológicas para o ensino de arte, como a Abordagem Triangular, bem como contemplar a interdisciplinaridade que deve ocorrer constantemente em todo o currículo, propiciando a interlocução entre a arte e os diferentes campos do conhecimento e a transversalidade do conhecimento de diferentes disciplinas.

A criação de projetos de trabalho baseia-se na significatividade da aprendizagem e na globalização do conhecimento. O Projeto de Trabalho prevê que professores e alunos criem e potencializem passos/caminhos nos trajetos do ensino e da aprendizagem da arte, tais como:



1 Escolha do tema:

⋅ Realizar sondagens para perceber os interesses dos alunos e os temas que emergem para, assim, integrá-los ao projeto de trabalho.

⋅ Definir os objetivos do Projeto de Trabalho após a identificação de interesses dos alunos e dos temas relacionados aos seus interesses: um fato da atualidade, vivências, um olhar sobre a realidade, proposição do professor etc.

2 Elaboração de um índice ou roteiro inicial de investigação e organização do percurso

⋅ Elaborar com os alunos sequências de trabalho, planejando percursos e propondo a escolha de caminhos, num diálogo permanente entre professores e alunos.

⋅ Organizar o tempo e o lugar em que o projeto de trabalho poderá ocorrer.

⋅ Prever os recursos necessários para o desenvolvimento do projeto de trabalho e buscá-los.


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3 Levantamento de hipóteses e problematização

⋅ Saber fazer perguntas que possam contribuir para melhor conhecer o tema e conceitos envolvidos na investigação.



4 Busca de fontes de informação

⋅ Incentivar a autonomia dos alunos assumindo a mediação de saberes, orientando os alunos na busca de informações necessárias para o desenvolvimento do projeto.

⋅ Mediar a criação no percurso de aprendizagem da arte, elaborando textos ou produzindo em outras linguagens artísticas.

⋅ Dialogar durante o percurso, retomando conceitos construídos inicialmente a fim de que os alunos não percam de vista os objetivos e o foco do trabalho.

⋅ Elaborar e apresentar a história do percurso de aprendizagem do aluno.

5 Registro do percurso

⋅ Apresentar as possíveis formas da produção final por meio da criação de registros como: diários de bordo, portfólios e outros que favoreçam a avaliação do processo de aprendizagem.

⋅ Apresentar novas possibilidades de passos/rotas e caminhos a serem traçados em meio a outras ações inseridas no projeto de trabalho.

É importante ressaltar que esse processo é repleto de singularidades e deve oferecer ao professor possibilidades de trabalho no ensino da Arte.



PARA SABER MAIS

Hernández e Ventura (1998, p. 179-180) apresentam a visão dos alunos sobre os projetos. São os protagonistas expondo o seu olhar sobre o desenvolvimento do Projeto de Trabalho.

A visão dos alunos:

Quanto à escolha do tema:

⋅ “Primeiro propusemos, escolhemos e votamos o tema que queríamos trabalhar.”

⋅ “Apresentávamos propostas, explicávamos o que queríamos trabalhar em cada proposta e então o escolhíamos com toda turma.”

⋅ “A professora nos disse o que lhe parecia que nós gostaríamos de trabalhar.”



Quanto à organização do conteúdo:

⋅ “Escrevemos o que queremos estudar, o ordenamos e este será o primeiro índice.” “Então, com todas as opiniões, fazíamos o índice geral.”

⋅ “Então fazíamos o índice coletivo; de todos os índices saía um que se faz das ideias mais importantes.”

Quanto à hipótese e problematização:

⋅ “A hipótese vem muito bem porque facilita mais o índice e a ordenação. Então, se verifica, uma vez que se tenha feito o índice, se responde à hipótese.”



Quanto à busca de informação:

⋅ “Buscamos informação, buscamos nos livros e depois, se faz falta, anotamos numa folha ou fazemos fotocópias; também podemos trazer fotos que encontramos e recortamos.”

⋅ “Quando pesquisamos num livro, como não sabemos explicá-lo, o copiamos, e, depois, no projeto, fazemos um resumo.”

⋅ “Explicamos à professora e a toda turma a informação que encontramos.”


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Quanto ao diálogo com a informação, entre professor e aluno:

⋅ “Cada um diz o que tem, e, depois, o professor vê algo que não entendemos e nos explica.”

⋅ “Depois faz perguntas do tema e nós temos de responder o que aprendemos. No final, nos dá uma pergunta livre onde devemos colocar outras coisas que aprendemos do tema e que não colocamos ainda.”

Quanto ao registro:

⋅ Deve-se ter uma caderneta para ir anotando o que se diz”. “Nós o fazemos em folhas”.



(Reescrito e adaptado, incluindo as fases do Projeto de Trabalho a que os alunos faziam referência.)

Nessa perspectiva de desenvolvimento de Projeto de Trabalho, estamos assumindo uma nova postura diante do conhecimento e do aluno. O aluno é ativo e protagonista na busca de conhecimento.

Podemos e fazemos transmitir “ideias” preparadas, ideias “feitas”, aos milheiros; mas geralmente não nos damos muito trabalho para fazer com que a pessoa que aprende participe de situações significativas onde sua própria atividade origina, reforça e prova ideias – isto é, significações ou relações percebidas. Isso não quer dizer que o docente fique de lado, como simples espectador, pois o oposto de fornecer ideias já feitas e matéria já preparada e de ouvir se o aluno reproduz exatamente o ensinado, não é inércia e sim a participação na atividade. Em tal atividade compartida, o professor é um aluno e o aluno é, sem saber, um professor – e, tudo bem considerado, melhor será que, tanto o que dá como o que recebe a instrução, tenham o menos consciência possível de seu papel (DEWEY, 1959, p. 176).

- Proposições pedagógicas, bases teóricas e as linguagens da arte

Poucos fenômenos são tão difíceis de definir quanto a arte. Uma das razões dessa dificuldade provém do fato de que a arte é uma produção histórica. Isso significa que não existe uma definição universal que dê conta de todas as variações de criação artística no tempo e no espaço. (SANTAELLA, 2012, p. 26)

Como afirma Santaella, as linguagens artísticas são manifestações da cultura que criamos ao longo dos tempos. São múltiplas as formas de expressão do pensamento humano, e classificá-las em quatro, cinco ou mais não daria conta de mostrar toda diversidade e riqueza de revelações estéticas e artísticas já criadas pela humanidade.

Procuramos, por meio deste livro, apresentar a diversidade das linguagens artísticas, que podem se manifestar por meio das formas visuais, musicais, cênicas ou híbridas, em que todas essas podem existir em simbiose, buscando as suas interligações e demonstrando como as linguagens artísticas se integram em conceitos, materialidades e poéticas.

Como os alunos encontram as linguagens artísticas? Será por meio de uma ilustração de livro ou revista, de uma música que toca no rádio ou na televisão, em uma cena de dança na rua ou em uma página na internet, imagens em movimento em filmes ou desenhos animados? Quais são as linguagens artísticas que conhecemos e com quais os alunos já tiveram contato? Como apresentar esse universo a eles? Que conceitos e ideias são importantes para explorar em um projeto de arte? Essas são algumas questões a serem analisadas para a proposta de um currículo de Arte.

A arte não está apenas nas instituições culturais, como museus ou casas de espetáculos. A arte está na vida, faz parte dela e é nutrida por ela. Ao observarmos as produções dos artistas, vemos como as memórias e experiências pessoais compõem suas pinturas, ações dramáticas, coreografias, músicas, textos e tantas outras criações artísticas em diferentes linguagens.


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Fundamentos para o ensino de artes visuais

Nas artes visuais, os percursos propõem explorar os conceitos dos elementos de linguagem, como ponto, linha, forma, cor, luminosidade, espaço, mostrando como esses elementos articulados podem criar texturas, tonalidades, variações entre luzes e sombras, valores cromáticos, movimentos. Também se propõe observar como o espaço e as formas podem se apresentar: as relações entre bidimensionalidade e tridimensionalidade, entre outras possibilidades.

Para Fayga Ostrower (1991), poucos elementos de linguagem visual em múltiplas combinações abrem infinitas possibilidades para criar imagens e assim expressar ideias, emoções, sensações. O estudo da gramática visual deve ir além de apenas estabelecer técnicas e códigos, ou se perder em explicações verbais. Para Santaella (2012, p. 13):

[...] a alfabetização visual significa aprender a ler imagens, desenvolver a observação de seus aspectos e traços constitutivos, detectar o que se produz no interior da própria imagem, sem fugir para outros pensamentos que nada têm a ver com ela.

Além de compreender as imagens e seus contextos, os alunos podem aprender a criar a partir da compreensão de como esses elementos são combinados. Por exemplo, há muitas linhas que podem construir texturas e luminosidade nos desenhos.

O desenho é uma linguagem tradicionalmente ensinada nas escolas, mas há muito a transmitir sobre essa linguagem, uma vez que os desenhos na arte podem ser tanto esboços em processos criativos, para construir outras linguagens, como podem ser a obra finalizada. Os elementos que compõem um traçado ou um grafismo podem variar em direções, espessuras e formas.

Podemos começar pelos desenhos, mas o universo da criação de imagens contém muitas possibilidades, entre elas compreender como os artistas criam cores e matizes, colocam cores ao lado de cores ou misturam cores e criam nuances.

Na abordagem da escultura como arte podemos trabalhar com conceitos de espaço e forma tridimensional – por exemplo, as linguagens contemporâneas que se mostram em instalações, Land Art, intervenções e outras.

Os alunos ainda devem perceber que há imagens fixas e imagens em movimento, imagens criadas com um lápis de cor e imagens criadas em programas de computador. Vivemos em um mundo múltiplo de possibilidades de criação de imagens.

Há muitas propostas para criar momentos de leitura de imagens e desenvolver categorias de pensamento. Na proposta de Robert William Ott (1997) há roteiros de apreciação em que você pode conhecer e criar jogos de leituras para vivenciar experiências de descrever, analisar e interpretar. Pode também, em rodas de conversa, apresentar mais informações sobre o que é visto, instigando os alunos a pesquisarem mais saberes. Ainda é possível motivar os alunos a criar, indo além das cópias, mas revelando conhecimentos e poéticas pessoais.

Nos últimos anos, as formas de manifestação do pensamento estético criaram muitas linguagens artísticas. Desse modo, é importante que os alunos de diferentes níveis de ensino explorem as potencialidades expressivas das artes visuais em suas diferentes produções, como a pintura, a escultura, o desenho, a gravura, a assemblagem, a instalação, a performance, a fotografia, o cinema, a arte digital e outras.

A abordagem do ensino de artes visuais hoje passa pela preocupação em desenvolver tanto a apreciação e interpretação como o fazer artístico e a reflexão sobre o que vemos na arte, na cultura visual em novas mídias.


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PARA SABER MAIS

Experiência estética

Uma experiência estética é algo significativo, marcante e pode influenciar nossa visão de mundo e nossas escolhas. Quem não se lembra de uma cena de um filme, uma pintura, ou desenhos que vimos na nossa infância e que marcaram nossa história. Também uma música, um perfume, uma imagem pode nos fazer viajar a tempos passados. Esse é o poder da experiência estética: o encontro com a beleza ou com a estranheza que nos marca para sempre. Compreender essas questões é importante para nossa formação como seres humanos sensíveis e inteligentes. Mas para vivenciar experiências estéticas é preciso estar disponível para a poesia, estar aberto a sentir.

É importante estimular as crianças a buscarem estados mais sensíveis. Para auxiliar, indicamos estudos sobre a leitura de imagens e sobre a experiência estética.

A experiência estética só acontece quando estamos em estado de estesia, seja por intenção ou por distração. Essa vivência envolve a cognição, a emoção e a memória. Segundo a definição de Duarte Jr. (2001), “estesia” se opõe a “anestesia” – a impossibilidade ou a incapacidade de sentir. A estesia mostra a possibilidade de sentir e significar.

Roteiros de apreciação

Você pode criar roteiros e pautas de perguntas para os momentos de leitura de imagens ou apreciação de obras com as crianças. As perguntas criadas não podem transformar esses momentos de apreciação de imagens em uma enquete, e sim provocar conversações.

O educador e teórico Robert W. Ott estruturou um sistema de leitura de imagens que influenciou muitos programas de ação educativa em museus e escolas no Brasil. Esse sistema ficou conhecido como Image Watching (observação, trabalhando a imagem) e foi reconhecido como uma proposta dinâmica por muitos educadores, que viram nesse tipo de metodologia uma maneira de desenvolver um olhar pensante e noções sobre a crítica de obras de arte. Ott propôs explorar seis momentos. O primeiro, introdutório, chamou de Thought Watching (pensar ou assistir uma imagem ou provocar uma sensibilização, um “aquecimento”). As etapas seguintes trabalham as categorias descrever, analisar, interpretar, fundamentar para desenvolver a crítica e o pensamento estético, e a última etapa propõe que os alunos revelem seus saberes em ação criadora ou escrevendo textos críticos sobre o que aprenderam nas etapas anteriores.

PARA PESQUISAR E APROFUNDAR OS SEUS CONHECIMENTOS

Sobre a experiência estética e a arte, você pode buscar mais conhecimentos lendo estes livros:

-- BARBOSA, Ana Mae (Org.). Arte/educação contemporânea: consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.

-- DEWEY, John. Arte como experiência. São Paulo: Martins, 2010. (Coleção Todas as Artes).

DUARTE JR., João-Francisco. O sentido dos sentidos: a educação (do) sensível. Curitiba: Criar, 2001.



Em 1988, Robert Ott esteve no Brasil e ministrou cursos, participou de seminários. Anos depois, vários teóricos brasileiros lançaram artigos e livros apresentando propostas baseadas no trabalho de Ott. Uma dica de estudos é ler estes materiais, disponíveis em textos como:

-- GENTILE, Paola. Um mundo de imagens para ler. Nova Escola, 2015. Disponível em:


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