Maria Iara Santos Deodoro


Beleza, uma questão de visão



Yüklə 322,66 Kb.
səhifə6/7
tarix05.03.2018
ölçüsü322,66 Kb.
#44025
1   2   3   4   5   6   7

3.2.8 Beleza, uma questão de visão

Mais uma vez dois encontros para o mesmo tema, por se tratar de assuntos extensos de mais para um único, a beleza e a estética. No primeiro encontro sobre esse assunto não houve leitura, foi uma vivência, onde recebemos a colaboração da Sra. Eva Souza, professora de artes manuais. Eva trouxe para o grupo várias técnicas de pintura em tecido e trouxe com ela a Celinha e a Isabel, duas meninas que trabalham com tranças afro.

Este dia foi bem diferente do que vínhamos fazendo até então, enquanto umas pintavam, outras se trançavam, outras aprendiam a trançar e assim foram se revezando por toda a tarde. Combinamos o próximo encontro, onde elas deveriam trazer algumas roupas e os tecidos que pintaram nesse encontro, pois receberiam a visita da editora e promotora de moda do jornal Zero Hora, Paola Deodoro.

Na semana seguinte a chegada delas foi hilária, estava chovendo e elas entraram com sacolões, sombrinhas e além dos vários potes com os lanches que costumeiramente fazíamos no final dos encontros. Imaginem a cena, a gritaria, o “vuco-vuco” como elas dizem. A princípio pensei em trazer para o grupo uma lenda da oxum, que é a Deusa da beleza e vaidade, gosta de tudo que é belo. Mas o sentido de beleza que eu queria provocar nas mulheres era um diferente do que elas estavam acostumadas a ouvir.

Com a chegada da Paola lemos a lenda “Orumilá Conquista a Mais Linda Donzela” (anexo 06). Orumilá, também conhecido no sul do país como Oxalá de Orumilaia, é relacionado ao Deus supremo, em uma das suas passagens é o Orixá dos olhos, da vidência, com olhar além das paredes. E foi por isso que escolhi este Orixá para tratar do assunto beleza, pois o objetivo era de que as mulheres percebessem outras belezas além da externa, que tivessem olhos de Orumilá e enxergassem sua própria beleza interior, que significa: “A mais completa e mais perfeita porque ‘emana de nós’. A relação de encanto e desencanto é permanente e funciona como um motor de transformação, que muitas vezes nos perturba e inquieta, mas que também nos traz satisfação, conforto e bem-estar.”34 Mostrando assim que ‘estar na moda’ não depende exclusivamente da roupa que se está usando e que o dinheiro não é tão fundamental, e sim do agregar outros elementos para se sentir “bem vestida”, como por exemplo, estar de bem consigo mesma.

Durante a nossa reflexão falamos de como somos, e de como os outros nos vêem, normalmente detemos nossa atenção na expectativa que os outros têm de nós, nos esquecendo de nos ver como realmente somos, faltando assim, o reconhecimento do “Eu” subjetivo e o “eu” objetivo apontado por Morin como:


“um princípio que, por esta separação/unificação do “Eu” subjetivo e do “eu” objetivo permite efetivamente todas as operações. Este princípio comporta a capacidade de se referir ao mesmo tempo a “si” (auto-referência) e mundo exterior (exo-referência) – de distinguir, portanto, o que é exterior a si , “auto-exo-referência” que quer dizer eu posso distinguir entre o “eu” e o “não-eu”, o “Eu” e o “não-Eu”, bem como entre o “eu” e os outros “eu””Eu” e os outros “Eu”. (MORIN, 2002: 121).
O autor fala de como “Eu” me vejo e como os outros me vêem relacionando com o que Paola falou sobre o perigo da moda, pois nem sempre o que está na moda fica bem para nós, “...a moda segue padrões, é idealizada para pessoas altas, magras e nem sempre fica bem para outras pessoas...” disse ela. Colocou também que é preciso readaptá-la mas que isso é uma preocupação que a mídia impõe, cada um pode criar seu próprio estilo e assim mesmo estarem todos na moda. Para tudo temos que ter personalidade própria, sem esquecer o senso crítico em perceber, por exemplo, que se tenho uma barriga muito grande, não fica bem usar mini-blusa, ou até mesmo a coerência da roupa com o ambiente, vestir-se adequadamente para o lugar freqüentado, isto faz parte do bom gosto, segundo ela.

Durante todo o tempo elas se mostraram atentas nas dicas da editora, até o momento em que foram convidadas para a prática. Espalharam as roupas por cima das mesas enquanto a Paola fazia as combinações. Após se vestirem, uma a uma passava pela maquilagem que Keila fazia, de acordo com cada rosto. Seguindo a dinâmica, a Paola organiza um desfile com as mulheres já produzidas e registra com fotos e filmagem.

Estes dois encontros foram uma experiência maravilhosa , pois saímos da teoria para a prática, onde despertou em algumas a possibilidade de geração de renda através das pinturas em tecido, outras visualizaram esta possibilidade nas tranças afro, e isto é realmente satisfatório, do encontro surgiram novas possibilidades, seja para busca profissional, ou seja para desenvolver seu eu mulher, elevando sua auto-estima e organização pessoal, o importante foi que estavam em um brilhante processo de transformação.
3.2.9 O fim para um novo início

Escolhi este sub-título pois já estávamos nos encaminhando para os últimos encontros, mas com a certeza da continuidade do projeto já sinalizado pela direção da instituição, onde o grupo de mulheres após o término dessa primeira fase seria inserido nas atividades da instituição, como mais um projeto oferecido à comunidade. Este foi nosso décimo primeiro encontro, reservado para recapitular tudo que havíamos feito no grupo, expus que só no restavam mais três encontros para terminarmos esta primeira fase do grupo. E o que eu havia pensado para o último encontro era uma festa, onde elas se mostrariam para a seus familiares e amigos com alguma apresentação, que poderia ser de dança ou teatro, ficando os dois próximos encontros para ensaio, então perguntei se elas concordavam.

Nossa, foi uma loucura, não esperava que a idéia agradasse tanto, logo se manifestaram falando em festa, como organizar, quem convidar..., quando fui dar uma sugestão a Gâmbia (40 anos, 4 filhos) disse: “Iara, nós estávamos conversando e escolhemos fazer um teatro, mas gostaríamos de fazer sozinhas. E a festa também, a gente organiza tudo, só vamos pedir ajuda da Keila e da Didi (minha filha, que todas conhecem e tem bom relacionamento).” Eu concordei e muito me alegrei com a autonomia do grupo, que se mostrou bastante fortalecido para tomar decisões, sem precisar da minha participação, após fui “expulsa” do salão, pois elas queriam iniciar o planejamento dos próximos encontros, de imediato fiquei assustada, talvez excluída daquele momento, no qual iríamos mostrar o resultado, mesmo que parcial do nosso trabalho.

Nos outros dois encontros fiquei na secretaria, não participei de nenhum ensaio e só me chamavam na hora do chá, mas nenhuma deixava escapar nada sobre a tal apresentação surpresa. Fiquei muito ansiosa a cada encontro delas, era muita movimentação e agitação e eu sem saber de nada do que estava acontecendo. Conversei com minha colega Jaqueline Costa que fez estágio comigo, no Odomode, com um grupo de adolescentes do projeto e que também estava finalizando suas intervenções, sugeri que ela conversasse com as mulheres para combinar uma possível união dos dois grupos em uma só festa de encerramento.

A princípio elas concordaram com a Jaqueline, mas logo mudaram de idéia e ficaram constrangidas em se oporem. Até que, dias depois, criaram coragem e vieram conversar comigo sobre a proposta da Jaqueline, e que estavam arrependidas de programar a festa junto com o grupo de adolescentes, pois acreditavam que aquele momento era delas, e não gostariam de dividí-lo com ninguém, nem mesmo com os filhos. Falei que entendia o posicionamento delas, mas que elas tiveram total liberdade de escolha e que se o fizeram mal, a responsabilidade do ato era delas também. Mas que, ainda sim, eu iria falar com a Jaque se poderíamos reverter a situação. Mas ao conversar com a Jaqueline ela colocou-me que já havia comunicado os adolescentes de seu grupo que a festa seria dividida com as mães, mas mesmo assim ela abriria mão e não realizaria mais festa de encerramento do grupo de adolescentes, por não terem condições de fazê-la sozinhos; mas também não achava justo que as mulheres não mantiveram sua posição inicial, ou seja, fazer a festa juntando os dois grupos.

Foi um momento muito delicado, fiquei com sentimento de culpa por ter provocado aquela situação, quando fiz a proposta da festa com os dois grupos. Voltei a falar com as mulheres, dizendo que não tínhamos como reverter aquele caso, uma vez que os adolescentes já haviam sido informados da festa conjunta e já estavam se articulando para isto, e que a decisão estava nas mãos delas e as conseqüências também.

Outro dilema foi o meu questionamento sobre o andamento do grupo, era tudo tão certinho que eu me perguntava se não estava deixando de perceber alguma coisa, a final nada é perfeito. Quase no final dessa primeira fase do grupo, em um dos últimos encontros, fomos brindados pelo acaso, um imprevisto, uma crise, uma novidade que ainda não havíamos experimentado, e assim tivemos que fazer uma pausa nos preparativos da festa para conversar sobre o acontecido. A crise que se instaurou no grupo naquele momento significou “o momento de decisão num processo de desenvolvimento e cursos incertos.” (Epstein,1986). Com o que Epstein diz, percebi a necessidade de uma reflexão dos fatos, para assim decidirmos o que era melhor e justo para os grupos.

Entendi e até me emocionei com as várias colocações das mulheres, mas trago a fala da Gâmbia que pode resumir todas: “ Iara, talvez a gente pode até estar sendo egoísta, mas é que agora que a gente experimentou e aprendeu que a gente tem o direito de ter um lugar só nosso e que a gente pode fazer alguma coisa só nossa, fica difícil a gente dividir esse momento que é tão especial pra nós. Mas sei também que o grupo das crianças tem o direito de festejar. Posso dar uma sugestão? Eles fazem a apresentação deles e agente assiste, a final quase todos tem mãe no nosso grupo. Depois é a nossa vez e eles assistem, e no final eles tocam e a gente dança, se todas concordarem acho que é uma solução.”

Após todas concordarem, falei que mais importante do que achar a solução é assumir a responsabilidade pelos nossos atos, e isso não era especificamente para aquele momento mas para todos os momentos de nossas vidas. Temos o direito, o livre arbítrio, de fazer qualquer coisa, mas também somos responsáveis por aquilo que fizermos e devemos arcar com as conseqüências.

Saímos da crise com mais um saldo positivo, as mulheres do grupo auto-ecoorganizaram-se para saírem da crise, o enfrentamento do problema mostrou-me o quanto elas estão se desenvolvendo e abertas para aceitar o novo e as mudanças que isso acarreta.

Enfim chegou o dia da festa, dia tumultuado na instituição. Entra e sai das mães, trazendo os salgados e doces preparados por elas. As crianças saíram neste dia ás 16h da instituição, ficando apenas os adolescentes do grupo da Jaqueline que estavam encarregados de limpar o pátio e enfeitar o salão.

A noite chegou, e com ela os convidados. As mulheres visivelmente nervosas mas também muito alegres, os adolescentes ansiosos, e eu nem se fala. O que elas haviam preparado? Será que o que provoquei nessas mulheres foi o melhor que pude? Ah meu deus... quantas dúvidas, ou será medo? A esta altura minhas dúvidas não importavam tanto, o importante era que aquela noite era delas e com certeza não eram as mesmas mulheres que ali chegaram há quase três meses.

A apresentação iniciou com os adolescentes e logo após, a das mulheres. Eu nem pude acreditar no que estava vendo, a keila anunciou que aquele era um grupo de mulheres que iriam mostrar o processo de transformação pelo qual passaram. Elas entraram da mesma forma que chegaram no primeiro encontro, algumas inclusive com a mesma roupa e a apresentação delas foi contando alguns encontros, com encenação de algumas lendas. Foi muito lindo ver o cuidado e o carinho delas com tudo que acontecera no grupo e na platéia os maridos, filhos, parentes e amigos estavam surpresos com o que estavam vendo. Eram verdadeiras artistas, exibindo seus talentos. Entre eles, estava eu sentada na platéia, foi nesse momento que percebi que a noite era minha também, quando elas pediram para organizar tudo, naquele momento elas estavam me dizendo que o motivo de quererem fazer tudo sozinhas para simplesmente para me mostrar o quanto haviam se transformado, por dentro e por fora, no “Eu” e no “eu”.

Termina a encenação e elas saem do palco, então a Keila pede que aguardemos alguns instantes que elas voltariam, quando elas retornaram, outra surpresa, estavam irreconhecíveis, lindas, produzidas, então subiram ao palco e me chamaram, fizeram um agradecimento emocionado e emocionante e passaram-me um pote com confetes, pedindo que eu jogasse um punhado em cada uma delas, simbolizando o pozinho mágico que as transformou, lembrando a lenda da Oxum que, após receber o tal pó transformou-se em pombo e ganhou a liberdade. Após jogar o pó em todas, joguei em mim, na Keila e na Didi, agradecendo á todas por essa convivência e mostrando que nós também havíamos nos transformado de alguma maneira a partir daquele grupo.

Convidei as outras mulheres que estavam assistindo á participar do grupo e receber o pozinho mágico. Foi uma surpresa maravilhosa, uma noite encantada e abençoada por todos os orixás que estiveram presentes nos nossos encontros e certamente, não faltaram naquela noite. Terminamos a festa com todos dançando ao som dos adolescentes. Inesquecível!

Considerações Finais
Minha vida sempre foi movida pela ação, pela prática, as teorias não me chamavam a atenção, confesso que não me preocupava com elas, pois fazia e seguia as minhas próprias. Durante minha infância, época em que meninas só brincavam de bonecas, eram os brinquedos ditos de meninos que me chamavam atenção e era com eles que eu brincava.

Na minha adolescência, enquanto grupos organizados do movimento negro reuniam-se em torno de uma mesa para discutir sobre o preconceito racial, respaldados por uma pequena elite intelectual negra da época, eu criei um grupo que através do movimento corporal fazia as mesmas denúncias e questionamentos. Enquanto gritavam nos megafones por justiça e direitos para o povo negro, o meu grupo reivindicava cantando. E enquanto os jovens negros sonhavam e idealizavam seu ingresso na universidade, pois ali acreditavam ser a única alternativa para um futuro melhor para os negros, busquei na formação informal a minha possibilidade de construir algo de bom para minha gente, meu povo, minha raça.

Dançar sempre foi o que eu sempre quis e fiz, não tendo na época faculdade de dança no sul, e nem eu condições de ir para outra região ou estado como o Rio Janeiro ou Bahia, centros onde já existia a formação em dança em nível superior.

Me restou fazer curso de dança como bolsista, estudei por 10 anos na escola de dança da professora Nilva Pinto, e ali aprendi várias técnicas e ritmos, além de noções básicas da historia da arte. Ao final desses dez anos, nós, alunas, estávamos aptas a fazer especializações em danças folclóricas, mas a maioria das meninas não fizeram esta opção, pois encaravam a dança como lazer e não profissão. Eu fiz parte do pequeno grupo que optou por continuar com a formação, nos espelhamos pelos mais diversos segmentos folclóricos, umas para a cultura alemã, outras na italiana, portuguesa, espanhola... e eu, como não poderia deixar de ser, pela cultura africana.

Na década de 70 não existia, aqui no sul, quem conhecesse e dominasse o folclore africano, deste modo tive que trilhar meu caminho, sozinha, estudando, pesquisando, usando toda a minha criatividade. Criei inclusive minha própria técnica e teoria, sem conhecer outras e muitas vezes acreditando ser desnecessário este conhecimento.

Com o passar do tempo e minha própria evolução, comecei a perceber que me faltava algo, sem saber distinguir o que. Aos 45 anos de idade ingressei na Universidade, no curso de serviço Social, pois o rumo que eu havia dado ás minha ações profissionais, mesmo sendo diretamente relacionadas com a dança, me levou a buscar novos conhecimentos, sair da homeostase, e me auto-organizar. O mundo que eu havia criado, com minhas técnicas e teorias próprias, precisava interagir com outros mundos e se alimentar de novos saberes.

Para conquistar estes novos saberes enfrentei, dentro da universidade, muitos desafios, pois voltar a estudar aos 45 anos não é tarefa fácil. Apesar de ter a maturidade como aliada, tem o tempo como inimigo, pois tudo que se faz é cronometrado, casa, família, trabalho, estudo, tudo funcionando como uma engrenagem. Tem que se ter tempo para dividir-se entre as atribuições diárias.

Mas o meu maior desafio, com certeza, foi o de estudar teorias. Eu, mulher madura que nunca me aprofundei em estudar alguma teoria, estava li em um curso fundamentado pelos referenciais teóricos e suas teorias. Mas nem por isso minha resistência e minha compreensão da importância da mesma me fizeram mudar de idéia. No decorrer do curso compreendi sua importância, a necessidade do fazer profissional dentro de um paradigma.

Mas cada referencial teórico que conhecia, não me satisfazia, faltava alguma coisa neles que os entrelaçassem com a minha verdade. Por muitas vezes me deparei com conceitos e posicionamentos que não contemplavam tudo o que eu acreditava, não quero aqui desmerecer este ou aquele outro paradigma, porém acho pertinente me colocar em relação á posição incômoda em que me encontrava, durante minha formação acadêmica. E só agora venho a entender aquele incômodo, mas para fazer justiça, devo agradecer ter tido a oportunidade de conhecer outros paradigmas, pois foi sob a luz do materialismo-histórico que desenvolvi o meu bem fazer profissional, que agora transfiro para o paradigma da complexidade.

Após tanto tempo estudando principalmente as teorias materialista-históricas, até que não está sendo tão difícil a transcrição para a complexidade. Meus conhecimentos com esse paradigma são mínimos, mas já é um começo, já consigo dialogar melhor com a sociedade onde vivo, pois a final sou produto desta sociedade que também sou produtora. A complexidade invade minha vida dia á dia, e foi sob a luz dela e dos Orixás que realizei este trabalho. Chegando ao mesmo lugar da partida, mantendo o meu compromisso com um referencial teórico-metodológico, ético-político e técnico-operativo que vem ao encontro do código de ética profissional e agora, auto-ecoorganizada, respondendo minhas inquietações desde a adolescência em relação á teorias.

Meu campo de estagio, como já citei no corpo deste trabalho, não me era desconhecido, pois fiz parte de sua fundação e hoje ocupo o cargo de coordenadora dos projetos sociais, o Odomode, uma ONG que atende á crianças e adolescentes e suas famílias.

Minha intervenção como estagiaria foi com as famílias, mais diretamente com as mães, as quais formaram um grupo multifamiliar, apenas com mulheres. A escolha por trabalhar exclusivamente com as mulheres se deu por que foi nas mães que enxerguei novas possibilidades de organização para as crianças e adolescentes do projeto do Odomode. Sendo elas, na grande maioria, provedoras e cuidadoras de suas famílias, percebi a necessidade de que, primeiramente, elas se cuidassem, para depois dar conta de suas famílias. O que a complexidade, através de Morin, traz como a auto-ecoorganização.

Minha intervenção aconteceu em quatorze encontros, cada um com três horas, e neste tempo busquei intervir de maneira atrativa com a realidade econômica, política, social, cultural e espiritual dessas mulheres, onde mesclei a realidade do dia-a-dia com a vida dos Orixás.

Durante quase três meses, convivi com um grupo de quatorze mulheres e, pelo fato de já conhecê-las pré-julguei que o trabalho seria facilitado, mas na prática esse fator não fez muita diferença, pois minhas expectativas sempre foram muito intensas e renovadas a cada encontro.

Passamos por momentos muito tristes por conta de relatos que as mulheres trouxeram para o grupo, mas paralelo á isso também vivemos momentos muito alegres, divertidos e descontraídos.

A maneira que escolhi para conduzir este trabalho foi uma grande aliada, acredito que fomos abençoadas pelos orixás, uma vez que dialogávamos com eles nos nossos encontros através das leituras e reflexões das lendas. Estive rodeada de pessoas que desejavam o sucesso do grupo, e para isto também se empenharam. Assim como minha supervisora de campo a Assistente Social Keila Dias, que em momento algum me abandonou e vibrava com a forma que eu conduzia cada encontro. Além da minha supervisora acadêmica, hoje minha orientadora, minha mestra maior, Profª. Drª. Kelinês Gomes, que suavemente me conduziu ao encontro com a complexidade, com muito carinho e paciência acompanhou minha lenta, mas consciente auto-ecoorganização.

Hoje sou uma mulher realizada, e consciente que serei uma ótima profissional, pois não foi só a academia, com seus mestres, que me preparam. Mas tive quatorze mulheres que se transformaram na minha frente, opotunizando-me a fazer parte desse processo, que também fui atingida, fui transformada, pois ensinei e aprendi, e como aprendi, inclusive a dizer não e dar valor á pequenas coisas que nem percebia.

Não imaginei, ao iniciar este projeto o quanto me encantaria e identificaria com essa temática mulher, mas logo entendi, pois minha vida se confunde á vida dessas mulheres em alguns pontos. Mulher, negra, pobre, viúva, chefe de família, três filhas para criar, sem tempo para sim, esta é minha mãe, que por todas as características poderia ser qualquer uma das mulheres do grupo. Não seria possível não me identificar, afinal vivenciei isto por muitos anos. E apenas agora, no final desta intervenção que eu percebo que o que eu fiz por elas era o que eu gostaria de ter tido a oportunidade de oferecer á minha mãe.

Rogo aos meus Orixás, que são também de todos nós, que estas mulheres sempre se permitam ter em suas vidas o espaço de ser mãe, esposa, avó, sogra..., mas que jamais esqueçam de apropriar-se daquilo que já conquistaram, o espaço de ser mulher.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARIÉS, philippe. História social da criança e da família. Tradução de Dora Flaksman. Rio de Janeiro/RJ: Ed.LTC. 1981.


BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico do escravo no Brasil, São Paulo/SP: Ed. da Universidade de São Paulo. 1976.
BRASIL. Constituição. Brasília/DF: Senado Federal. 1988.
CÂMARA, Sheila Gonçalves. Comportamentos de Risco na Adolescência: enfrentamento violento, conduta sexual de risco e consumo de drogas ilegais. Porto Alegre, 2003. Tese (Doutorado) – Faculdade de Psicologia, PUCRS.
CAPRA, Fritjot. As conexões ocultas. São Paulo/SP: Ed. Cultrix/ Amanákey.
COLETÂNIA DE LEIS: Cress ser é lutar - Gestão 1999/2002.
COMISSÃO DE CIDADANIA E DIREITOS HUMANOS, Rio Grande do Sul, Assembléia Legislativa. Relatório Azul 2003-2003: Garantias e violações dos direitos humanos. Porto Alegre/RS: CORAG. 2003.
EPSTEIN, Isaac. Cibernética. São Paulo/SP: Ed. Ática . 1986.
FALEIROS, Vicente de Paula. Estratégias em Serviço Social. São Paulo/SP: Ed. Cortez,4.ed. 2002.
FREITAS, Décio. O escravismo no Brasil, 3º edição. Porto Alegre/RS: Ed. Mercado Aberto. 1991.
GIONGO, Cláudia Deitos. WUNSCH, Dolores Sanches e FELIZARDO, Lúcia Zenilda. Processo de trabalho do serviço Social III. (Caderno Universitário 90). Canoas/RS: Ed. Ulbra, 2003.
KERN, Francisco A. Joaquim. As mediações em redes como estratégia metodológica do Serviço Social. Porto Alegre/RS: EDIPUCRS, 2 ed. 2005
LEAL, Ondina Fachel. Corpo e Significado: ensaio de antropologia social. Porto Alegre/RS: Ed. Da Universidade/UFRGS. 1995.
LOPES, Antonio Herculano. Diversidade cultural brasileira. Rio de Janeiro/RJ: Ed. Casa de Rui Barbosa. 2005.
LUCK, Heloísa. Pedagogia interdisciplinar: fundamentos teórico-metodológicos. Petrópolis/RJ: Ed. Vozes. 1994.
MAIO, Marco Chor (org.). Raça, ciência e sociedade. Rio de Janeiro/RJ: Ed. Fiocruz/CCBB. 1996.
MARTINAZZO, Celso José.
Yüklə 322,66 Kb.

Dostları ilə paylaş:
1   2   3   4   5   6   7




Verilənlər bazası müəlliflik hüququ ilə müdafiə olunur ©muhaz.org 2024
rəhbərliyinə müraciət

gir | qeydiyyatdan keç
    Ana səhifə


yükləyin