Meu mundo por Você Sara Howard



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Capítulo 7
Cal sentou-se na cadeira de balanço da varanda e estendeu os pés sobre a mureta, como costumava fazer todas as tardes para observar o por do sol.

Dentre todas as possíveis locações do condado, Emma Darby se encantara exatamente com a sua casa! Ele meneou a cabeça, exasperado. De uma coisa estava certo, aquela era a mulher mais persistente que já conhecera.

Todos os moradores de Amity achavam que ele estava maluco por se opor, à idéia de transformar a cidade em set de filmagem. Havia conversado com várias pessoas no dia anterior e todos eram unânimes em dizer que Emma era maravilhosa, e estavam excita­dos com possibilidade de receber o elenco do filme.

Claro, não tinha a menor dúvida de que ela era especial. Lem­brou-se do dia anterior, quando a encontrara cuidando de Francine. O pânico no belo rosto a deixara lívida pela preocupação com uma mulher que mal conhecia.

Emma estava longe de ser o monstro que imaginara logo que ficara sabendo do propósito de sua estada em Amity.

Cal inquietou-se na cadeira. Era simplesmente impossível parar de pensar nela!

A forma como ela o fitava no bar, na noite anterior, o pânico no rosto suave quando o viu, o evidente desapontamento quando ele deixara a maleta com a câmera no balcão e saíra sem falar com ela. E, pior de tudo, a doçura e a honestidade dos olhos meigos enquanto dançavam.

Emma Darby não era nada além de problemas! Ela pretendia mudar não só a cidade em que ele vivera sua vida toda, como também conseguira provocar uma verdadeira revolução em seu mundo! Por sorte, aquele seria seu último dia em Amity e, a menos que o destino pregasse uma peça, ela não conseguiria encontrar o que procurava, e partiria para sempre de sua cidade e de sua vida.

Ele perdeu o olhar na paisagem, detendo-se na cerca que ele próprio construíra. Mas ela não sabia daquilo, assim como não sabia das memórias que aquele lugar abrigava.

Nunca contara a Emma sobre a ocasião em que seu irmão Josh o flagrara, aos nove anos, tentando dirigir o trator quando seu pai estava doente, ou sobre a morte do pai, anos depois. Nunca dissera sobre o dia em que Kathy, sua irmã mais velha, anun­ciara que ia se casar e mudar-se para a Califórnia, e de como se sentara com sua mãe na cozinha durante muitas tardes, consolando-a enquanto chorava. Nunca dissera sobre o dia em que voltara da escola quando tinha catorze anos e ajudara a fazer o parto de Emily, sua égua favorita.

Cal se voltou para o portão ao ouvir o ronco de um motor. No momento seguinte, Frank estacionou a caminhonete e abriu o por­tão ruidosamente.

— Muito bem, Cal! Aí está você! — ele saudou subindo os degraus da varanda — Esperava encontrá-lo trabalhando na re­forma do banheiro ou, quem sabe, planejando outra forma de fazer de Emma a visitante mais infeliz que já pisou em Amity.

— O que veio fazer aqui? Prender-me? — Cal resmungou mal humorado — Você tem de admitir, não é nada agradável ouvir alguém dizer que escolheu sua casa para ser a locação de um filme!

— E por que não? A produtora está disposta a pagar muito mais do que você poderia imaginar. Com o dinheiro, você poderia com­prar uma nova casa, moderna e prática, que combinasse mais com um Médico — e ele enfatizou a palavra — Poderia redecorar seu consultório, além de...

— Não quero vender a casa, tio Frank.

— Bem, espero que hoje Emma encontre alguma coisa que a agrade, porque acho que o filme é exatamente o que Amity precisa. Você sabe, ela saiu sozinha por aí e...

— Tio Frank. Não estou disposto a alimentar essa discussão — Cal o interrompeu, irritado — Você sabe o que penso a respeito disso.

E ele encerrou o assunto, levantando-se para atender ao telefo­ne. Nunca ficara tão feliz por ser interrompido.

— Alô?

— Cal? É Caroline.



— Olá, Carol. O que houve? — Ele franziu o cenho diante do tom grave na voz dela.

— Oh, Cal! Estou preocupada com Emma. Ontem à noite, de­pois que você saiu, estávamos conversando e Greg falou a respeito daquele galpão abandonado na rodovia vinte e sete. Você sabe, perto de Meeteetsee.

— Sim, eu sei. Continue.

— Bem, ela ficou muito interessada, e eu pretendia ir com ela, mas Laureen acordou com febre e Greg já havia saído... — Ela suspirou, aflita — Avisei-a de que não poderia acompanhá-la, mas ela estava determinada a ir de qualquer forma. Você sabe como ela é! Quando liguei para o motel, hoje de manhã, ela disse que já conhecia bem as imediações, e que seria impossível se per­der. Oh, Cal, talvez eu esteja exagerando, mas já está anoitecendo e ela ainda não voltou.

Aquilo era tudo que precisava ouvir. A rodovia vinte e sete era exatamente igual a muitas outras ao longo do Rio Greybull, e seguia até a Floresta Nacional de Shosone, considerada perigosa até pelos moradores da região.

— Vou procurá-la — anunciou ele, desligando o telefone.

— Qual é o problema? — Frank perguntou ao vê-lo sair.

— Emma foi para a rodovia vinte e sete para ver aquele galpão abandonado — ele disse, colocando a maleta de primeiros socorros na caminhonete — Estou indo encontrá-la.

— Bem, ainda não estou oficialmente perdida — Emma mur­murou para si, olhando ao redor.

Estava exausta, humilhada e faminta, mas não tinha tempo para pensar naquilo. A noite começara a cair e o vento forte na copa das árvores provocavam um silvo que a fazia lembrar-se dos apavorantes filmes de terror que costumava assistir quando era adolescente.

Quando Greg comentara sobre o galpão abandonado na noite anterior, julgara que poderia ser uma boa idéia ir até lá. Depois do constrangimento ao descobrir que a casa ideal para eu projeto per­tencia a Cal, ela mal conseguira tocar na comida. Ele saíra antes da sobremesa, com a desculpa de que precisava ir ao hospital vi­sitar Walter. De qualquer forma, não queria mesmo que ele ficasse. Se possível, gostaria de não ver aquele homem pelo resto de sua vida!

Congelada no assento do carro, queria apenas que um meteoro caísse do céu e abrisse uma cratera no chão diretamente diante dela, para que fosse tragada para as profundezas da terra e nunca mais ouvisse falar dele!

O pior momento de sua vida fora descobrir que a casa perfeita para o filme pertencia a Cal. Era estranho, mas realmente não poderia ser de outra pessoa. Tudo combinava com ele. Parecia ser um lar de verdade, quente, aconchegante, forte e capaz de enfrentar todas as intempéries. Aquela casa era a representação perfeita do intangível círculo de famílias e amigos, histórias e tradições das quais ela nunca fizera parte.

E mesmo que Cal, por algum ato milagroso ou por pura insa­nidade, concordasse em vendê-la, ela não aceitaria filmar ali. Jamais se esqueceria da expressão severa no rosto dele no jantar da noite anterior, fazendo-a desejar nunca mais vê-lo.

Emma balançou a cabeça, tentando se concentrar na estrada. Olhou de relance para o mapa no assento de passageiros. Mesmo que o galpão fosse satisfatório, a localização seria um problema.

Não podia imaginar o set ali, à beira da estrada, tão longe da civilização.

Ela acelerou, apavorada com as rajadas de vento forte anun­ciando uma tempestade iminente.

— Não vou entrar em pânico — murmurou, tentando se con­vencer.

Quando as primeiras gotas de chuva começaram a cair no pára-brisa, ela teve certeza de que sua vida estava fadada ao fracasso. Não encontrara a locação, teria de enfrentar a fúria de Rusty e, mais importante, sua carreira estaria destruída.

Porém, naquele momento tinha de manter a calma, lembrou a si mesma. Precisava tomar um atalho para a cidade mais próxima, e tinha de se concentrar para não seguir pelo caminho errado.

Emma dirigiu mais dois quilômetros, tentando ignorar a fúria do vento. Ao avistar uma placa indicando um retorno, girou a direção para a direita e sentiu o sangue congelar nas veias quando o carro derrapou na pista. Apavorada, agarrou-se ao volante, ten­tando se lembrar do que fazer.

O carro deslizou com violência para a esquerda e a única coisa que ela viu foi um enorme tronco de árvore se aproximando rapidamente.

Depois disso, tudo se tornou escuro.

— Se você queria me ver, bastava ter telefonado — ela ouviu uma voz que parecia vir de muito longe.

Emma abriu os olhos com dificuldade e julgou que estivesse tendo uma alucinação ao ver Cal debruçado sobre ela.

— Cal?


— Sim, sou eu — Ele estendeu a mão diante do rosto dela — Diga-me, quantos dedos você está vendo?

— Dois.


— E qual é seu nome?

— Oh Cal, você sabe... — ela murmurou, tentando erguer a cabeça — O que aconteceu?

— Fique onde está, mocinha — Ele segurou-a com gentileza, impedindo-a de ele mover — Você sabe seu nome?

— Cal Worth, você sabe muito bem que meu nome é Emma Darby — As palavras emergiram como um gemido, e só então ela percebeu a dor lancinante na cabeça — Sei também que hoje é dia quinze de outubro e sei quem é nosso presidente, mesmo que não tenha votado nele.

— Está bem, já basta. Você está se sentindo bem?

— Sim, embora esteja com uma terrível dor de cabeça. O que aconteceu?

— Você não se lembra?

Ele a fitou profundamente, e Emma percebeu que estava diante do Médico, e não do homem arrogante, orgulhoso e incrivelmente sexy do qual ela planejara nunca mais ver poucos minutos atrás.

— Tudo que me lembro é que o carro derrapou e aquela árvore apareceu do nada. Oh, meu Deus! O carro alugado! Cal, o que eu fiz?

— Está tudo bem — ele a tranqüilizou — É por isso que os carros alugados vêm com seguro. Estou feliz que o carro tenha sofrido mais danos do que você.

Ele tocou-a no rosto e ela fechou os olhos, saboreando aquele toque surpreendentemente doce.

— Você acha que pode ter acontecido alguma coisa mais séria comigo?

—Bem, você tem um galo enorme na testa e estava inconsciente quando eu a retirei do carro, o que é preocupante. Felizmente você estava usando cinto de segurança e não sofreu maiores danos, mas preciso examiná-la com mais cuidado.

— Me examinar? Você deve está brincando!

— Relaxe, mocinha. Sou Médico, lembra-se?

Ela abriu a boca para dizer alguma coisa, mas não encontrou palavras.

— Agora, que você está consciente, vou levá-la para o carro. Avise-me se sentir alguma dor, está bem?

— Cal, eu posso fazer isso soz... Ei, espere!

Antes que ela pudesse terminar a frase, ele tomou-a nos braços e caminhou com passos firmes em direção ao Mustang, estacio­nado no acostamento a poucos passos dali.

— Eu queria ter chamado a ambulância, mas levaria muito tem­po para chegar aqui e a chuva poderia nos apanhar antes — disse ele ao acomodá-la no banco — E sei exatamente onde podemos ir para encontrar uma cama macia, um delicioso jantar e muito afeto.

— Uma cama macia? — ecoou ela — E onde encontraremos isso no meio deste imenso deserto?

— Dê-me algum crédito, Emma. Eu tenho meus contatos.

Cal fechou a porta e contornou rapidamente o Mustang, sen­tando-se no banco do motorista.

— Como você soube que eu estava aqui?

— Caroline me telefonou. Ela estava preocupada, e com boas razões.

— Sinto muito, Cal. Por que não me leva de volta para o hotel? Prometo que vou me deitar e ficar bem quietinha e você pode continuar a fazer o que estava fazendo.

— Você deve estar maluca! Você teve um acidente de carro, Emma, e a batida a deixou inconsciente. Vou levá-la para a casa dos O'Connor, que é perto daqui. Preciso examiná-la com urgên­cia, e você poderá descansar.

— Mas...


— Estou falando sério, Emma. Quando penso no que poderia ter acontecido.

Ele se calou. A expressão fechada indicava preocupação, e ela ficou surpresa por notar que ele realmente parecia se importar com ela. O mais curioso era que ele parecia, ao mesmo tempo, furioso e aliviado.

Emma fechou os olhos, usufruindo a deliciosa sensação de ter alguém para cuidar dela. Então, lembrou-se de que, certa vez, quan­do tinha sete anos de idade, saíra de perto do pai na Rua Bourbon, em Nova Orleans, e se perdera. Quando ele a encontrara, reagira daquela mesma forma. Lembrava-se exatamente das palavras que ele dissera,

"Estou tão feliz e tão furioso por encontrá-la que não sei se dou umas palmadas ou um abraço".

Um sorriso se insinuou em seus lábios enquanto Cal seguia pela estrada escura.

— Não durma — advertiu ele, dirigido com o maior cuidado que pode.

— Não sei se vou conseguir. Estou com muito sono.

— Converse comigo — ele sugeriu pisando no acelerador.

— Está bem. Deixe-me ver... — Emma se forçou a manter os olhos abertos, lutando contra o súbito desejo de dormir — Quem são os O'Connor?

— Maureen e Ben têm um rancho perto daqui, o Diamond Bar, mas ambos nasceram e cresceram em Amity. Eu freqüentei a es­cola com os filhos deles, assim como Caroline.

— Creio que eu passei por esse rancho. O nome não me é estranho — ela comentou, esforçando-se por se manter desperta — Pelo que me lembro, é um lugar encantador, embora eu tenha visto apenas de passagem.

— Nesse caso, você está com sorte. Poderá ver o interior da casa. E não se preocupe, eu trouxe sua maleta com a câmera e seu equipamento do carro.

— Obrigada, Cal... — ela murmurou com suavidade — Obri­gada por tudo que tem feito por mim.

—Você precisa de mais alguma coisa, Emma? Quer outro acolchoado, ou mais travesseiros?

— Não, obrigada. Eu não poderia estar mais bem acomodada! — disse ela com sinceridade.

Maureen O'Connor era a enfermeira ideal, pensou ela ao ob­servá-la verificar se a janela estava bem fechada. Era uma mulher de cerca de sessenta anos, de traços delicados e adoráveis olhos azuis. Era simpática e afetuosa, e Emma gostou dela no instante em que a viu.

— Sua casa é maravilhosa, Maureen — ela comentou satisfeita, puxando o acolchoado sobre si.

Cal dera um analgésico depois de examiná-la, e a dor de cabeça havia diminuído.

— Bem, tenho certeza de que Cal vai tomar conta direitinho de você, mas não se esqueça de chamar se precisar de alguma coisa.

— Obrigada, Maureen — sussurrou ela, lutando contra a ur­gência de segurá-la pelos braços e implorar que ficasse.

Sentia-se ridícula por ter ficado tão nervosa quando Cal comen­tara que ficaria no quarto de hóspedes com ela. Maureen havia concordado prontamente, alegando que ela precisava de cuidados.

A simples idéia de tê-lo a seu lado a noite toda bastava para tirar seu sono.

— Ben está precisando de você na cozinha, Maureen — Cal disse ao entrar no quarto — Ele não consegue encontrar o açucareiro para adoçar o leite.

— Oh, ele não consegue enxergar um palmo diante do nariz! — Maureen levantou os olhos para o céu e fechou a porta atrás de si.

— Pronta para ser examinada? — indagou Cal, sentando-se à beira da cama.

— Cal, honestamente, o que pode estar errado comigo? Não tenho nada quebrado, e mesmo com alguns hematomas, meu braço está ótimo.

— Não é tão óbvio que você não tenha nada quebrado — ele argumentou com calma — A dor de cabeça pode ser algo mais sério. Apenas relaxe e deixe-me examiná-la. Prometo, não farei nada que vá machucá-la.

Porém, o receio de Emma não era de que ele a machucasse. O simples toque das mãos poderosas fazia sua pele queimar.

Ela sentou-se na cama e desabotoou com relutância o pijama que Maureen havia emprestado, envergonhada por ficar apenas de calcinha e sutiã.

— Avise se sentir dor — ele disse em tom profissional, examinando as costas — Está vendo os hematomas aqui?

Ela voltou a cabeça e olhou para a parte posterior do braço. A pele perto dos ombros estava vermelha, e ela sentiu uma pontada de dor quando ele movimentou seu ombro com cuidado.

— Creio que não há nada quebrado, mas amanhã vou imobilizar seu braço apenas por precaução.

A competência e a seriedade que ele demonstrava não dava margem para discussão, e Emma apenas meneou a cabeça em con­cordância.

— Agora, deixe-me examinar suas pernas.

Emma obedeceu sem relutar, e estendeu as pernas sobre a cama, fechando os olhos quando sentiu o toque firme e quente das mãos incrivelmente gentis. Por um segundo, ela se pôs a imaginar o que ele poderia fazer com aquelas mãos e sentiu seu rosto corar.

— Está doendo?

— Sim, um pouco — ela respondeu, embora não fosse por aquela razão que havia enrubescido.

— Não creio que esteja quebrada, embora seja melhor tirar uma radiografia quando voltarmos para a cidade. Depois de uma queda, é comum sentir dores e surgirem hematomas. Um analgésico re­solverá o problema.

— Isso é ótimo.

— Pronto. Pode vestir o pijama — Cal anunciou, tocando-a de leve no queixo.

Ela abriu os olhos e o fitou. Os maravilhosos cabelos castanhos caíam sobre a testa e ela teve de resistir ao impulso de tocá-lo. Podia sentir a deliciosa fragrância máscula que emanava da pele morena e respirou profundamente, tentando imprimir aquela lem­brança na memória.

Quando deu por si, arregalou os olhos ao observar que ele estava tirando as botas.

— O que você está fazendo?

— Ora, estou tirando as botas — Cal respondeu com natura­lidade.

— Sim, é óbvio que está tirando suas botas, mas importa-se de me explicar por quê?

— A maioria das pessoas por aqui tira as botas para ir para a cama.

Ela congelou diante da resposta.

— Você vai se deitar na mesma cama que eu?

— Bem, só há uma cama no quarto — Ele olhou ao redor e ergueu os ombros, resignado — Acho que não teremos escolha.

— Por que você precisa ficar neste quarto? — insistiu ela, co­meçando a entrar em pânico — Há pelo menos quatro quartos neste andar, sem contar com o quarto de Maureen e Ben.

— Porque preciso observá-la enquanto dorme e tenho de acor­dá-la de hora em hora. Quando alguém perde a consciência depois de uma batida na cabeça, como aconteceu com você, existe a pos­sibilidade de uma concussão, e seria muito perigoso deixar que dormisse por muitas horas seguidas.

— Oh.


Emma sentiu-se ridícula por imaginar que ele estivesse com segundas intenções. Quem, em sã consciência, se sentiria atraído por uma mulher com um galo na testa e vestida com um pijama que era duas vezes maior que seu número?

Mas quando ele se estendeu na cama ao seu lado, apagando a luz do abajur, Emma prendeu a respiração. Seu primeiro impulso foi se aconchegar ao peito largo. Porém, permaneceu paralisada, como se houvesse um muro os separando.

— Você não está acostumado a dormir de calça jeans, não é?

— Como você adivinhou? — murmurou ele, virando-se na ca­ma — Emma, eu... Eu sinto muito.

— Pelo quê? Por me resgatar de um carro destroçado?

— Não. Por... Bem você sabe. Por tê-la tratado com rispidez.

Ela prendeu a respiração.

— Ora, Cal, se alguém tem de se desculpar, esse alguém sou eu.

Antes que ela soubesse o que estava dizendo, ele girou o corpo para ficar face a face com ela. O luar prateado que entrava pela janela refletia-se no rosto másculo, revelando a expressão séria e compenetrada com que ele a fitava.

— O que eu quis dizer é que você estava certa. Eu me fixei a uma imagem de Amity sem querer admitir a passagem do tempo. Sempre fui muito feliz aqui, mas a verdade é que tudo muda. Todos os meus amigos foram embora. Meus irmãos, minha mãe. E eles não voltarão, ao menos não para ficar. Muitas pessoas deixam a cidade todos os anos, o que me deixa furioso. Eu sempre achei que aqui era o melhor lugar do mundo, e ainda acho. Mas, fico pensando que. Bem, não conheço muito sobre o resto do mundo e eu não estava excitado com a idéia de que parte do resto do mundo iria se mudar para Amity.

— Oh, você não precisa mais se preocupar com isso — ela o tranqüilizou, sensibilizada com as revelações que acabar de ouvir — Não consegui encontrar nada que fosse útil para o filme. O galpão abandonado que vi hoje era minha última esperança, mas é muito longe de tudo e o acesso é muito difícil.

— Espero que não perca seu emprego por isso.

— Bem, só saberei quando voltar.

— Sinto muito, Emma.

Então, ele se aproximou e fez menção de beijá-la, mas recuou no último instante. Por fim, deu-lhe um leve beijo de boa noite na testa, um gesto polido entre dois amigos.

Emma resistiu à urgência de beijá-lo até que se esquecessem do mundo.

— Boa noite, Emma — ele disse, dando-lhe as costas — Vou acordá-la de hora em hora.

— Boa noite — sussurrou ela, tentando ignorar o calor do corpo vibrante a seu lado.

E durante a noite, quando ele murmurava seu nome na escuri­dão, ela respondia em meio a um delicioso sonho no qual a cama era um casulo aconchegante e quente, onde ela e Cal faziam amor esquecidos do mundo.


Capítulo 8
— Aceita mais café, Emma? — Maureen fez menção de encher a xícara, mas Emma a deteve com um gesto.

— Não, obrigada — Ela olhou de soslaio para Cal sentado à sua frente na mesa da cozinha.

— Já ingeri cafeína além do permitido pelo meu Médico.

— A cafeína não é indicada quando o paciente está com dor de cabeça — ele comentou sem desviar os olhos do jornal.

— Sim, Doutor — ela replicou com doçura.

— Oh, como eu seria feliz se Ben fosse tão compreensivo quan­to sua paciente!

Maureen comentou com uma risada.

— Não se preocupe. Algumas pessoas levam mais tempo para se adaptarem à aposentadoria.

— Especialmente quando não é voluntária.

Emma se voltou ao ouvir o comentário atrás de si e se deparou com Ben parado à porta da cozinha.

— Ben, por favor, não comece! — Maureen ergueu as mãos e meneou a cabeça — Vamos, sente-se conosco e coma mais uma fatia de bolo.

— Está se sentindo melhor, Senhorita Darby?

Ele sentou-se ao lado dela e endereçou um sorriso relutante.

— Estou ótima, e devo isso a vocês.

E ela pousou a mão no braço de Ben, fazendo com que ele alargasse o sorriso.

— Ora, não diga isso! — Ele abaixou os olhos, constrangido com o elogio.

— Obrigada. Vocês não imaginam como a calorosa acolhida me fez bem! Foi maravilhoso Maureen me deixar dormir até tarde e me surpreender com este café da manhã espetacular!

— É um prazer recebê-la em nossa casa, querida — Maureen completou, levantando-se para recolher a louça da mesa — E agora, rapazes, por que vocês dois não vão ao local do acidente para verificar se o guincho já foi buscar o carro de Emma? Creio que ela esteja ansiosa por um pouco de paz e tranqüilidade, o que só será possível sem a presença de vocês!

— Vamos, Ben — Cal fechou o jornal e se levantou, não sem antes apanhar mais uma fatia de bacon — E não quero mais ar­gumentos seus mocinha. Você vai para minha casa para se recu­perar depois de passarmos no hospital para radiografar seu braço, mesmo que eu tenha de telefonar para seu escritório pessoalmente e dizer que você só voltará quando estiver recuperada.

— Cal, eu não acho que seja necessário.

— Não perca tempo argumentando com ele, querida — Mau­reen meneou a cabeça — Cal insistiu tanto que acabou conven­cendo Ben a se aposentar.

Assim que eles saíram, Maureen conduziu Emma ao confortá­vel sofá da sala.

— Você gostaria de ler o jornal? Quer outro analgésico?

— Não, estou ótima, obrigada.

Emma acomodou-se no sofá macio e suspirou, satisfeita depois da farta refeição.

— Cal me disse que estudou com seus filhos — comentou, olhando em volta para admirar a decoração aconchegante do aposento.

Havia uma imensa lareira e janelas que se abriam para a vastidão dos campos, e pensou que seria impossível não ser feliz ali.

— Sim, eles estudaram juntos — Maureen respondeu, acomodando-se na cadeira de balanço à frente dela — Ben e eu cresce­mos em Amity e compramos este rancho quando as crianças ainda eram pequenas. Minha irmã morava na cidade e eles ficavam com ela durante a semana para irem à escola, e voltavam para casa na sexta-feira e nas férias de verão.

— Deve ter sido difícil para você.

— É verdade, mas comprar este rancho era nosso sonho. Além disso, podíamos ver as crianças durante a semana, quando íamos à cidade fazer compras. A escola de Meeteetsee é bem próxima ao rancho, mas a cidade é ainda menor que Amity, e nós queríamos que eles crescessem em uma boa comunidade.

Ela estava sorrindo, mas uma sombra de tristeza transparecia em seus olhos.

— E onde eles estão agora?

— Suzanne se casou e mora em Montreal. Jake está em Boston e Will — Ela fez uma pausa, contendo a emoção — Will faleceu.

— Oh, Maureen, sinto muito! Eu não sabia.

Emma se aproximou e tomou as mãos dela entre as suas.

— Foi um acidente, o tipo de coisa que sempre pode acontecer em um rancho como este, mas Ben se culpa até hoje.

— O que aconteceu?

— Três anos atrás, todo o rebanho adoeceu no inverno, e eles estavam trabalhando noite e dia para salvar as reses. Will estava cuidando de um touro bravo, o macho dominante do rebanho, e foi atacado por ele — Uma lágrima solitária rolou pelo rosto rosado — Ben não teve como ajudá-lo. Ele teve pneumonia quando tudo acabou. Acho que foi devido ao excesso de trabalho e, prin­cipalmente, pela morte de Will. Desde então, ele nunca mais foi o mesmo.

— Oh, meu Deus. O que vocês farão agora?

— Oh, essa é uma pergunta e tanto! Com um rancho como este, só é possível sobreviver com muito trabalho, mas depois que Will se foi, Ben vive resmungando pelos cantos da casa. Nos últimos tempos, não temos nada além de contas e dívidas. Mas não quero pressioná-lo a tomar uma decisão. Este rancho tem sido a vida dele por muitos anos.

— E um lugar maravilhoso — concordou Emma.

— Sim, mas está começando se tornar um problema para nós.

— Maureen sorriu com ternura, surpreendendo-a com o que disse a seguir — Mas eu quero falar de outra coisa, querida. Carl Worth está louco por você!

Cal e Emma foram embora por volta das duas horas da tarde, depois de um magnífico almoço e de tirar inúmeras fotografias do rancho.

— Guardarei boas recordações daqui — ela disse ao se despedir de Maureen — Vocês foram maravilhosos!

— Não deixe de nos visitar na próxima vez que vier ao condado

— Ben despediu-se com um caloroso aperto de mão.

— Vou mandar algumas cópias das fotografias para vocês — ela gritou ao entrar no carro.

— É muita gentileza de sua parte, mas nesse exato instante, temos de ir para a cidade para radiografar seu ombro — Cal disse com impaciência, girando a chave na ignição.

Emma não argumentou, acenando para eles enquanto se afas­tavam. Depois de ser acordada de hora em hora durante a noite toda, ainda estava exausta, e adormeceu quase imediatamente ape­sar dos solavancos do carro pela estrada de terra.

Cal seguiu para o hospital de Power, que possuía um moderno centro cirúrgico e os melhores equipamentos da região. Ao saber que Francine estava internada lá, Emma insistiu em visitá-la depois de passar por uma meticulosa sessão de radiografias e sair do con­sultório do ortopedista com uma tipóia no braço.

— Você teve sorte de não ter quebrado nada — Cal comentou enquanto a conduzia para o setor de oncologia.

— Você acha que é realmente necessário que eu use isso? — E ela ergueu o braço enfaixado.

— Sim, é absolutamente necessário. E dê-se por satisfeita por ser destra e ter enfaixado o braço esquerdo! — ele censurou com ternura, detendo-se diante do quarto de Francine — Ouça, não devemos demorar muito. Ela acabou de passar por uma cirurgia de emergência, e precisa repousar.

— Claro. Como ela está?

— Bem, foi diagnosticado um tumor maligno no intestino reto, que foi o responsável pela dor e pela perda de apetite — explicou ele com expressão grave.

— Oh, Cal! Eu sinto muito!

— Ela é uma mulher forte, e vai conseguir superar — ele assegurou com um sorriso — Ela vai se submeter a algumas sessões de radioterapia e há grandes chances de ficar completamente curada. Creio que ela ficará muito feliz em vê-la.

Ele abriu a porta do quarto e fez um gesto para que ela entrasse.

— Francine, eu tenho uma surpresa para você!

Antes que Emma entrasse, ele segurou-a pelo braço e disse ao ouvido,

— Vou visitar um de meus pacientes e a encontro no estacio­namento em dez minutos.

Ela concordou e observou-o caminhar com elegância e altivez até virar à direita no final do corredor.

— Emma! — Francine desligou a televisão e se ergueu assim que ela entrou — Estou tão feliz que. Meu Deus, o que aconteceu com você?

Francine arregalou os olhos ao ver o galo em sua testa e o braço suspenso pela tipóia.

— Oh, foi um pequeno desentendimento que tive com uma imensa árvore — explicou ela com um sorriso — Na verdade, foi entre meu carro alugado e a árvore. Por coincidência, eu estava entre eles.

— Lamento querida. Deve ter sido horrível! Mas Cal está to­mando conta de você, e não poderia estar em melhores mãos!

Emma dirigiu-lhe um sorriso de cumplicidade e sentou-se na cadeira ao lado da cama.

— E você, como está?

— Estou me sentindo muito bem. Ainda estou me recuperando da cirurgia, mas já sinto um enorme alívio por ter ficado livre da dor abdominal que quase me matou nos últimos meses! — Ela sorriu e a fitou com carinho — Eu ainda não tive tempo de agra­decê-la por me socorrer.

— Ora, nem mencione isso, querida! Vamos mudar de assunto — Ótimo! Nesse caso, que tal se me contasse como foi sua noite?

— Francine, não seja indiscreta! — censurou Emma, sem deixar de sorrir ao ver a expressão de malícia iluminar-lhe no rosto — Como você sabe que passamos a noite juntos?

— Frank me ligou hoje pela manhã. Todos já sabem, e ficamos muito felizes, especialmente porque você ficar mais alguns dias e se hospedará na casa dele.

— Não há segredos em Amity?

— Não se pudermos evitar.

Meia hora depois, Emma e Cal percorreram a estrada que levava a Amity no mais completo silêncio. Como encarar os habitantes do vilarejo, sabendo que todos deveriam estar fazendo apostas sobre o que aconteceria entre eles? Emma pensou aflita.

Depois de passarem pelo motel para apanhar a bagagem e en­cerrar a conta, seguiram para o restaurante Mamma Sweet, onde Cal havia encomendado o jantar.

Frank os esperava na entrada, e se apressou a abrir a porta do carro para Emma.

— Essas estradas do condado são muito perigosas, não é mes­mo, querida? — Ele estendeu a mão para cumprimentá-la, com um sorriso amplo no rosto amigável — Ainda bem que não acon­teceu nada de grave!

— Espero que a agência de locação do carro também pense assim — Emma replicou, apertando a mão.

— Ora, não se preocupe com isso. Cal já providenciou para que o carro fosse rebocado — Ele voltou-se para o sobrinho, que saía do restaurante com duas embalagens de alumínio — Cal, mante­nha-a quieta e tenha certeza de que terá tudo que precisar, está bem?

— Claro tio Frank. Creio que posso dar conta disso.

— Não vá me decepcionar, filho — Ele riu e ajudou Emma a entrar no carro — Sei que precisa descansar, mas estamos orga­nizando um jantar para amanhã. Estaremos na casa de Cal por volta das oito horas, e Caroline vai levar costeletas de vitela.

— Se eu continuar assim terei de renovar meu guarda-roupa quando chegar a Nova York! — Emma riu enquanto Cal girava chave na ignição — Nunca encontrei pessoas tão determinadas a me alimentar como os moradores de Amity!

— Em Amity, comida é sinônimo de amor — Cal avisou, fe­chando a porta do carro — Está pronta para encarar a reclusão dos próximos dias?

— Sim, estou.

Porém, ela sabia que seria uma verdadeira tortura ficar sob o mesmo teto que Cal sem desejá-lo a cada minuto do dia, especial­mente depois de ter experimentado a deliciosa sensação de passar a noite toda deitada ao lado dele. Não sabia como conseguira re­sistir à proximidade do corpo viril a seu lado, a voz gentil sussur­rada em seu ouvido durante a noite, a fragrância máscula que ema­nava da pele morena.

Esperava apenas que ele não julgasse necessário passar a noite ao lado dela novamente, pois não teria forças para resistir à tenta­ção de tocá-lo.

Ao chegarem à casa de Cal, ele conduziu-a até a sala e voltou para o carro para apanhar a bagagem sem perceber seu desconforto. Ele parecia tão seguro e confiante como o homem que vira pela primeira vez quando chegara à cidade.

Emma agradeceu secretamente por ele sair e dar chance de se tentar se acalmar. Ela olhou ao redor e se pôs a caminhar pela ampla sala. A casa era magnífica, e não se tratava apenas da de­coração cuidadosa, embora toda a mobília fosse sólida e de boa qualidade. Eram móveis como muitos que vira em Amity, mas o mais importante era que aquela era a casa de Cal.

Ela seguiu para a cozinha e deteve-se na porta, encantada com o que viu. O que primeiro atraiu sua atenção foi a imensa janela envidraçada voltada para o sul, que a fez imaginar o aposento iluminado durante uma tarde de verão enquanto o jantar era preparado.

Embora os armários de madeira e vidro fossem antigos, estavam muito bem conservados. A mesa antiga, entalhada em madeira maciça, deveria ter a mesma idade da casa, e ela quase pode ver pequenas mãozinhas batendo palmas diante de um bolo de aniversário.

— Está com fome? — Cal indagou, colocando as embalagens com a comida sobre a mesa — Temos galinha assada e cebola frita.

— Estou faminta!— Emma exclamou com uma risada — Nun­ca comi tanto em minha vida quanto nessa estada em Amity!

— Talvez o ar puro do Wyoming tenha estimulado seu apetite — ele disse enquanto apanhava pratos no armário — Como está o braço?

— Está ótimo, doutor. E agora, vamos esquecer meu machu­cado por alguns minutos e comer.

— Se você insiste... — ele replicou, sentando-se à frente dela e observando-a servir-se com entusiasmo.

Depois do jantar, Cal insistiu para que Emma saboreasse uma xícara de chá enquanto ele lavava a louça. Ao terminar, ele a levou para conhecer a casa, sem esconder o orgulho que transbordava em seu sorriso a cada cômodo que mostrava.

— Este é o escritório.

Ele indicou o amplo aposento conjugado às salas, com duas imensas janelas com vista para o jardim e paredes cobertas por estantes repletas de livros.

— A sala de estar e a sala de jantar — acrescentou enquanto caminhavam em direção à escada — Não vou mostrar o ba­nheiro do andar de baixo porque está na mais completa bagunça. Comecei a reformá-lo, mas ainda não tive tempo de terminar.

— Você é um homem de muitos talentos — ela provocou en­quanto subiam.

— Reformar banheiros não é uma de minhas especialidades — ele respondeu com um sorriso largo — Estou trabalhando nisso há dois anos.

Emma deteve-se no amplo hall do piso superior, revestido com um delicado papel de parede listrado de amarelo-claro e branco, para o qual se abriam cinco portas de madeira maciça. Observou o piso de madeira encerada e um aparador antigo que valeria uma fortuna em uma casa de antigüidades, sem contar o vaso de por­celana branca repleto de rosas.

— Cal, sua casa é maravilhosa! — exclamou ela, encantada — Meu apartamento é menor do que esse hall!

— Posso imaginar — disse ele com simpatia — Não sei como vocês conseguem viver em um espaço tão restrito.

Pela primeira vez em sua vida, Emma teve consciência do que ele acabara de dizer. Como seria bom viver em uma casa como aquela, pensou enquanto ele abria uma das portas.

— Este é meu quarto — ele disse casualmente com um gesto amplo indicando o imenso aposento que fora de seus pais — E este é o quarto de meu irmão, que será seu enquanto você estiver aqui.

Emma entrou no quarto e olhou ao redor, satisfeita. A cortina de voil branco agitava-se com a brisa perfumada da noite. Nada poderia ser mais aconchegante, pensou ela ao se sentar na imensa cama. Sua bagagem fora colocada sobre a cômoda, e a maleta com seu equipamento estava sobre a escrivaninha a um canto do quarto.

— Só há um banheiro — ele disse em tom de desculpa — Deixei toalhas limpas e um analgésico sobre a pia.

Cal se aproximou e beijou-a de leve na testa.

— Boa noite. Chame se precisar de alguma coisa.

Emma mal conseguiu balbuciar uma resposta, receando ceder ao impulso chamá-lo e se atirar nos braços dele.

O dia seguinte exigiu um esforço sobre-humano de Cal. Ele saiu de manhã para atender seus pacientes, ansioso por voltar para casa o quanto antes. Voltou para casa mais cedo, depois de passar no supermercado e comprar ingredientes para preparar um espa­guete à bolonhesa. Planejava fazer uma surpresa para Emma ofe­recendo-lhe a única refeição decente que era capaz de preparar, e a convidaria para ir ao cinema depois do jantar.

Ele entrou pela porta dos fundos e deixou as compras sobre a mesa sem ver o menor sinal de Emma.

Ansioso por encontrá-la, subiu correndo a escada para o piso superior e deparou-se com uma visão que o deixou paralisado. Ela acabara de sair do banheiro, enrolada em uma toalha que mal co­bria seu corpo.

Cal prendeu a respiração e balbuciou alguma coisa, dando-lhe as costas e saindo à pressas, antes que não pudesse mais resistir ao impulso de tomá-la em seus braços.

Ele já havia começado a preparar o jantar quando Emma apa­receu na cozinha vestida apenas com um robe de seda sobre a camisola, provocando fantasias que fizeram seus hormônios en­trarem em ebulição.

— Humm. O cheiro está ótimo! — Ela se aproximou e apoiou-se na pia — Precisa de ajuda?

— Por favor, pegue o queijo ralado na geladeira — ele pediu sem erguer os olhos.

Sabia que, se olhasse para ela, não conseguiria manter a sani­dade por nem mais um segundo.

— Pronto. E agora, o que quer que eu faça?

— Sente-se e encha as taças de vinho. O jantar está pronto — anunciou ele, colocando a travessa fumegante sobre a mesa.

Aquela foi a refeição mais incômoda de sua vida. Ele não seria capaz de se lembrar de nem uma palavra do que haviam conversado.

—Estava delicioso, Cal — Emma elogiou momentos mais tarde.

—Que bom que gostou — Ele se levantou e recolheu os pratos, voltando a sentar-se diante dela — Como está sua testa?

— Está bem melhor. As compressas de arnica e cânfora fizeram um verdadeiro milagre!

— É verdade — Ele se levantou e tocou-a de leve na fronte — Acho melhor examiná-la.

Ao se aproximar, a fragrância de rosas que emanava da pele alva fez seu coração perder o compasso. Com esforço, Cal lembrou a si mesmo de que aquele deveria ser um exame Médico. Claro, era pouco convencional realizar exames na cozinha, e nunca ne­nhum de seus pacientes ficara hospedado em sua casa.

Ele tomou o pulso e contou as batidas por minuto, balançando a cabeça afirmativamente. Então, manipulou delicadamente o bra­ço machucado observando-a para identificar sinais de desconforto. Porém, a expressão enlevada de Emma sugeria que o contato a agradava, fazendo-o acreditar que também o desejava.

— Você está ótima — ele disse com sorriso — Mas há uma técnica de tratamento que ainda não tentei.

— E qual é? — ela perguntou, com um brilho de desejo ilumi­nando os olhos verdes.

— Você nunca ouviu dizer que o beijo tem o poder de cura? Emma voltou o rosto para ele enquanto um arrepio de prazer subia por sua espinha. A simples idéia de beijá-lo fez com que uma chama viva incendiasse seu desejo.

— Nesse caso, por que não começa por aqui? —e ela entreabriu os lábios, num convite sensual.

Cal segurou-a pelo queixo, percorrendo os lábios macios com a ponta dos dedos, fazendo com que uma onda de eletricidade a percorresse. Quando os lábios famintos se tocaram, o desejo sel­vagem que os sufocava veio à tona com a força de uma explosão.

O mundo parou de girar enquanto os dois corpos sedentos de paixão fundiam-se em uma dança sensual e mágica sobre a mesa da cozinha, como se aquele fosse um santuário de amor feito espe­cialmente para eles.

— Cal, olhe o que fizemos com a cozinha!

Emma olhou ao redor e começou a rir.

Com a respiração ofegante, Cal puxou-a para si e a estreitou em um abraço apertado. Estavam deitados sobre a mesa depois de terem feito amor como se fosse a primeira e a última vez.

No calor da paixão, haviam derrubado a tigela de molho e o pote de queijo ralado sobre as roupas espalhadas pelo chão.

— Precisamos arrumar esta bagunça — ela falou, contendo o riso.

— Vamos deixar para depois — Cal murmurou enquanto aca­riciava as curvas do corpo sensual — Agora temos coisas mais importantes para fazer.




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