CAPÍTULO 5
Um século de desastres
Hanlin Yuan e a Grande Enciclopédia do Mundo
Em 24 de junho de 1900, em Pequim, a coalizão das tropas aliadas ocidentais enfrentou o poderoso movimento nacionalista chinês. A guerra fora declarada dia 21 e cerca de três mil católicos, entre os quais se encontravam 43 italianos e marinheiros franceses, refugiaram-se na Catedral. Em certo momento, os chineses incendiaram a embaixada inglesa comandada por sir Claude MacDonald e o vento estendeu o fogo até o prédio de Hanlin Yuan, o centro intelectual mais importante da China.
A voracidade das chamas tornou-as incontroláveis e logo as paredes se incendiaram juntamente com o piso e o teto, não sem alcançar também a biblioteca. Lancelot Giles, filho do sinólogo Herbert Allen Giles, foi testemunha dos fatos e descreveu o pânico causado entre os eruditos pela queima da famosa enciclopédia Yung-lo Ta-tien que consistia em 22.937 seções sobre todas as coisas humanas e divinas em mais de 370 milhões de palavras (aproximadamente 1.480.000 páginas). Lancelot entrou nas chamas e numa lacônica confissão informou: "Salvei a seção 13.345 por iniciativa própria.
Era quase irônico, inútil, porque todas as seções remetiam a outras. Alguém chegou a dizer que para ler um parágrafo dessa múltipla enciclopédia era necessário conhecer todos os dialetos e se aventurar na exploração da astronomia e zoologia. Conta-se também que, lá quando foi concluída, alguém a comparou ao universo, porque se supôs que ninguém jamais a leria inteira. Como a Grande Muralha, a enciclopédia era uma vasta construção destinada a engajar gerações inteiras na defesa da identidade chinesa. A enciclopédia original nunca foi impressa e sempre se conservou manuscrita.
Desapareceu pela primeira vez num incêndio ocorrido em 1449: a única cópia existente, reconstituída de memória, era a queimada em 1900.
Peter Fleming, outra testemunha-chave, chamou a atenção para a falta de um catálogo fiel da biblioteca de Hanlin Yuan, embora contasse, entre outras coisas, com uma enciclopédia que fora encomendada pelo segundo imperador Ming. Fora concluída em 1407, depois que dois mil sábios trabalharam nela. Esse célebre trabalho abarcava "a essência de todos os clássicos históricos, filosóficos e literários escritos até então, incluindo astronomia, geografia, ciências ocultas, medicina, budismo, taoísmo e as artes em geral
Os ingleses culparam os chineses pela queima de sua própria cultura, e os chineses rebateram dizendo que foram os ingleses que desviaram o fogo. Mas o resultado foi o mesmo: a destruição da grande enciclopédia.
Outros livros extraordinários foram queimados nesse incêndio. Vale a pena ressaltar que em Hanlin estavam depositados os exemplares de uma coleção de 3.500 clássicos transcritos em 36 mil volumes exóticos. Essa coleção, conhecida como Siku Quan Shu, explorava todas as espécies de vida no mundo, e quase desapareceu por completo.
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