abrangida pelo Reino Suevo, e transferiu a capital para Toledo,
onde se conservou até à queda da monarquia visigótica. Essa defini-
tiva transformação do Estado visigodo-gálico em visigodo-
-hispânico relaciona-se com a derrota que os Francos infligiram aos
Visigodos, em 507, na batalha de Vougladum (Vouglé)(2). Os Visi-
(') Ver, supra, págs. 114 e seg.
(2) Assinalam alguns autores que este facto histórico simboliza a passa-
gem, no século vi, aos Estados germânicos da segunda geração, nomeadamente o
dos Francos e os dos Lombardos, por contraposição a uma primeira geração de
Estados romano-germânicos, como o dos Visigodos, o dos Ostrogodos e o dos
Burgúndios (ver Giulio Vismara, Lejonti dei diritto romano neWalto medioevo secondo
la piú recente storiografia, cit., in "Stud. et Doe. Hist. et Iur.", vol. XLVII, págs. 20
e24.
119
HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS
godos perderam a Gália, salvo a pequena região da Septimânia e da
Provença, pelo que o seu reino logo passou a confinar-se, pratica-
mente, aos territórios hispânicos.
IV — O Estado Visigótico na Península
Em 576, como referimos ('), o rei Leovigildo (571/586) lançou
uma campanha contra os Suevos, que terminaria, no ano de 585,
com a anexação completa dos seus territórios. A Península fica,
então, a ser visigótica, apenas exceptuando a zona Sul, que conti-
nua a constituir uma espécie de província do Império Bizantino,
ocupada em meados do século VI pelas tropas de Justiniano, impe-
rador romano do Oriente ( ).
Nos começos do século VII, os Visigodos levantam-se, a seu
turno, contra os Bizantinos, que, depois de terem sido impelidos
para a actual região do Algarve, acabaram por sair definitivamente
da Península, em 622, com Suintila (621/631), o primeiro rei visigó-
tico de toda a Hispânia. A esta unificação definitiva da Península,
segue-se cerca de um século de domínio dos Visigodos, que só a
invasão muçulmana, em 711, interrompeu.
21. Condições em que os Visigodos se instalaram na Península
Oferece manifesto interesse para a história do direito o
aspecto político e social do estabelecimento dos Germanos na
Península. É, todavia, nebuloso o problema da eventual partilha de
(') Cfr., supra, pág. 116.
(2) A presença bizantina na Hispânia, que se seguiu à conquista da Itália e
do Norte de Átrica, explica-se por razões expansionistas. Pretendia-se restaurar
o antigo Império Romano do Ocidente. Essa presença, que durou cerca de
setenta anos, origina um problema de grande importância para a história jurídica:
o de saber se ocasionou algum conhecimento e diíusão do direito romano justi-
nianeu. Não se demonstra que tivesse relevo significativo a tal respeito (ver, infra,
págs. 203 e segs.).
120
PERÍODO GERMÂNICO OU VISIGÓTICO
terras entre a população hispano-romana c os Alanos, Vândalos e
Suevos. Não se pode definir, em termos seguros, o tipo de assenta-
mento económico-agrário desses povos ( ).
Também, a respeito dos Visigodos, não existem indicações
directas relativas à Península. Contudo, pensa-se que o sistema foi
idêntico ao da Gália, ou melhor, que teve a base jurídica no mesmo
acordo de hospitalidade militar.
a) Repartição de terras entre Visigodos e Hispano-Romanos
Já se indicou (") que o rei Valia e o imperador Honório cele-
braram, em 418, um "toedus" que disciplinava a instalação dos
Visigodos na Gália, maxime na sua província atlântica da Aquitânia
("Aquitânia II"), embora estes acabassem por expandir-se até à
costa mediterrânica, ocupando a Narbonense. O acordo constituía
uma retribuição dos Romanos pela ajuda na luta contra os Germa-
nos fixados na Hispânia e era também uma forma de os Visigodos
desistirem da ocupação dessa parte do Império.
Subsistem dúvidas consideráveis sobre os termos exactos do
referido acordo, que os textos legais, as tontes narrativas e o
recurso comparativo a "foedera" paralelos, como o romano-
-burgúndio, não conseguem dissipar inteiramente. Afigura-se que
algumas novas conjecturas deixam de pé as posições tradicionais (3).
(') Ver, em todo o caso, a exposição de Manuki. Torres, Lecciones, cit.,
vol. II, págs. 77 e segs.
(2) Cfr., supra, págs. 118 e seg.
(3) Chama-se a atenção para os estudos de A. García-Gallo, Notas sobre el
reparto de tierras entre visigodos y romanos, in "Hispânia", cit., tomo I, n.° IV, págs. 40
e segs., W. GoFFART, Barbariam and Romans. A.D. 418-584: the Techniques oj Acco-
modation, Princeton, 1980, e Luís A. Garcia Moreno, Hl término "sors" y relaciona-
dos en el "Liber Iudicum". De nuevo el problema de la división de las tierras entre godos y
provinciales, in "An. de Hist. dei Der. Esp.", cit., tomo LIII, págs. 138 e segs., com
amplas indicações bibliográficas. E pouco esclarecedora a nótula de Alexandre
HERCULANO, Sortes Gothícae, in "Opúsculos", tomo V — "Controvérsias e Estudos
Históricos", tomo II, 3.a ed., Lisboa, 1907, págs. 289 e segs.
121
HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS
Ao concederem terras aos Visigodos, os Romanos fizeram-no
de maneira que estes não ficassem em zonas isoladas, antes integra-
dos na população galo-romana. Mas qual a amplitude do objecto da
partilha, em que proporções, quando e como é que ela se verificou?
Os prédios rústicos eram divididos em três partes: duas para os
Visigodos ("sortes gothicae") e uma para os provinciais romanos
("tertia romanorum")^). Parece verosímil que só fossem abrangi-
dos os latifúndios e, quando muito, as propriedades médias — que
compreendiam terras aráveis, pastagens e floresta—, ficando de
fora as pequenas explorações agrícolas. Continuariam a existir os
baldios e as terras comuns ("compascua"), de que beneficiavam
todos os proprietários da localidade.
Também seriam objecto de divisão as alfaias agrícolas e os
escravos, embora verificando-se, talvez, uma divisão igualitária.
Presume-se, ainda, que houvesse partilha das casas de habitação.
Todavia, entramos em deduções a partir dos princípios gerais da
hospitalidade.
Sustenta-se que a execução do acordo foi iniciada no tempo
de Valia, que morreu no próprio ano da sua celebração, e se com-
pletou rapidamente. Tem-se como certo que houve, desde logo,
uma divisão física das terras e não apenas uma entrega aos Visigo-
dos de rendas fiscais correspondentes à parte que lhes competia.
Eis, em síntese, as conclusões que da Gália se transpõem para
a Hispânia. Contudo, admite-se que, mais tarde, ao lado desse sis-
tema, os Visigodos ocupassem também terras peninsulares na sua
totalidade, já sem a observância de qualquer divisão.
(') Na linha de F. Lot, admite García-Gallo que, na repartição dos lati-
fúndios, os Visigodos recebessem um terço das terras exploradas directamente
pelo proprietário ("terra dominicata") e dois terços das terras cultivadas por
colonos e arrendatários ("terra indominicata"), resultando, pois, uma repartição
em partes iguais; os dois terços dos Visigodos na "terra indominicata" seriam as
chamadas "sortes gothicae" e o terço que ficava aos colonos do latifundiário a
"tertia romanorum" (ver García-Gallo, Notas sobre el reparto de tierras, cit., in
"Hispânia", tomo I, n.° IV, págs. 52 e segs.). Será uma conjectura sugestiva, mas
que não se comprova suficientemente.
122
PERÍODO GERMÂNICO OU VISIGÓTICO
Tiram-se argumentos da toponímia espanhola e portuguesa(l).
Algumas povoações, que ainda hoje se chamam, por exemplo, Con-
sortes, Sortelhas, Suertes, Tercias, Tersos, Tertia, reflectem o sis-
tema de repartição de terras. Enquanto outras, que conservam
nomes como Godinhos, Godos, La Goda, Romainho, Romano,
Romão, denunciam que nelas viveram apenas, ou predominante-
mente, pessoas de uma das raças. Argumentos que, no entanto, não
se podem considerar definitivos (2).
Do mesmo modo, procuram-se vestígios da repartição de ter-
ras nos toponónimos derivados de explorações agrícolas que tive-
ram a denominação do seu proprietário romano ou visigodo: os
casos, respectivamente, de Villarcayo (de um Arcádio) e Villavin-
cencio (de um Vicente), ou de Villafáflla (de um Fávila) e Villa-
fruela (de um Fruela). Este argumento mostra-se menos convin-
cente do que o anterior. E natural que tais nomes resultem tão-só
do onomástico dos fundadores, nada demonstrando sobre a raça dos
habitantes. Nem se exclui que muitas dessas vilas já existissem na
época romana e que outras, cujo topónimo tem raiz gótica, proce-
dam ^la Reconquista (3).
b) Diferenças étnicas e culturais na Península depois da ocupação visigótica.
Seu desaparecimento lento
A instalação dos Visigodos na Península levou a que passassem
a existir nela três núcleos populacionais com características diver-
(') Ver, sobretudo, Menéndez Pidal, Orígenes dei Espaíbl, 5.a ed., Madrid,
1964. Entre nós, por ex., consultar Josf.ph M. Pif.l, Os nomes germânicos na toponí-
mia portuguesa, I e II, Coimbra, 1937 e 1945, e O património visigodo na língua portu-
guesa, in "Congresso do Mundo Português", vol. I — "Memórias e comunica-
ções apresentadas ao Congresso de Pre e Proto-História (I Congresso)", Lisboa,
1940, págs. 563 e segs.
(2) Por ex., no sentido de que os termos "sors" e "consors" nada têm a
ver com os problemas suscitados pelo referido assentamento dos Visigodos se
pronuncia Luís A. García Moreno, El término "sors" y relacionados en el "Liber
ludicum", cit., in "An. de Hist. dei Der. Esp.", tomo LIII, págs. 137 e segs.
(3) Cfr. García-Gali.o, Notas sobre el reparto de tierras, cit., in "Hispânia",
tomo I, n.° IV, pág. 43, nota 11.
123
HISTÓRIA OO DIREITO PORTUGUÊS
sas: Hispano-Romanos, Suevos e Visigodos. O mais reduzido era o
dos Suevos (!). Também os Visigodos se calculam, apenas, entre os
dois e os cinco por cento da população total, que andaria talvez nos
dez milhões. Tudo estimativas, evidentemente, com larga margem
de incerteza, mas que sempre proporcionam alguma ideia dos valo-
res relativos.
Durante muito tempo, estes povos viveram, lado a lado, sem
se mesclarem. A separação apresentava-se mais marcada entre os
Hispanos-Romanos e os Visigodos. Para isso contribuíram, espe-
cialmente, as diferenças religiosas — os primeiros eram católicos e
os segundos arianos —, assim como a proibição de casamentos mis-
tos, quer dizer, de pessoas de uma das raças com as da outra, na
medida em que esta tenha recebido aplicação efectiva. As circuns-
tâncias se encarregariam, porém, da aproximação e miscigenação
das duas populações.
Apressou o fenómeno a conversão solene de Recaredo ao
Catolicismo, perante o III Concílio de Toledo, no ano de 589,
seguida de conversões em massa ( ). A par deste aspecto religioso,
outros vectores sociais e jurídicos actuaram no mesmo sentido. Foi
relevante o facto de os Visigodos, desde cedo, adoptarem a língua
latina. Saliente-se, também, a derrogação, atribuída a Leovigildo
(571/586), do preceito que vedava os casamentos mistos (3).
Tal proibição possuiria um alcance mais teórico do que prá-
tico. Tudo leva a pensar que não foi observada ou que, pelo menos,
(') Cfr., supra, pág. 116.
(") Sobre o tema, verJosÉ Orlandis, El Cristianismo en Ia Espãhi visigoda, in
"Estúdios Visigóticos", cit., vol. I, págs. 1 e segs.
() "Lex Visigothorum", III, 1,1 ("Antiqua"). A proibição dos matrimó-
nios mistos constava de um preceito do Código Teodosiano (3,14,1) que transitou
para o Breviário de Alarico (ver, infra, págs. 129 e seg.). Quanto ao problema,
consultar Paulo Merêa, Sobre os casamentos mistos na legislação visigótica, in "Est. de
Dir. Vis.", cit., págs. 231 e segs., e Álvaro D'Ors, La territorialidad dei derecho de los
visigodos, in "Estúdios Visigóticos", cit., vol. I, págs. 102 e segs.
124
PERÍODO GERMÂNICO OU VISIGÓTICO
conheceu inúmeras e crescentes violações. Ora, o cuidado posto na
revogação de um preceito ao tempo sem vigência concreta, como o
próprio legislador reconhece, constitui um testemunho manifesto da
unidade social de todos os súbditos do Estado Visigótico, indepen-
dentemente da raça. Em consonância, aliás, com a orientação dos
monarcas visigodos.
Pode concluir-se que, pelos fms do século VI e começos do
século Vil, se produziu a fusão generalizada das populações da
Península. O que não significa que tenham desaparecido completa-
mente as diferenças. Ainda no ocaso da Monarquia Visigótica havia
famílias que reconheciam os seus avoengos romanos ou germânicos.
Mas isto verificou-se quase só com as classes aristocráticas. Ao
nível do grosso da população, em meados do século VII, a conver-
gência era absoluta.
Resulta do que ficou exposto que, através do longo período de
ocupação visigótica, se combinaram na Península dois elementos
culturais: o romano e o germânico. Ponto importante é o de saber
qual deles teve a primazia na formação do ambiente cultural e
jurídico em que a Península se encontrava, quando a invasão
muçulmana abiu um novo ciclo da sua história. De qualquer modo,
não parece lícito exagerar o papel do elemento germânico, como
fazem vários autores. As invasões germânicas não representaram a
substituição de uma civilização por outra muito diferente, mas o
simples enxerto de um elemento novo na romanidade "vulgari-
zada". Muitas instituições culturais dos Romanos foram assimiladas
pelos povos invasores e adaptadas à sua feição específica, sem per-
derem, contudo, as características fundamentais, que a procedência
lhes conferia. Além disso, a cultura romana teve do seu lado, ainda
nesta época, representantes e defensores de extraordinário prestí-
gio, como, por exemplo, S. Martinho de Dume ( ) e S. Isidoro de
Sevilha ( ).
(') Ver, supra, pág. 117.
(2) Ver, infra, págs. 141 e segs.
125
HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS
Considera-se, em síntese, que o elemento romano não foi,
nem de longe, ofuscado pelo elemento germânico, na contribuição
que prestou para a formação do novo quadro cultural da Península.
Voltaremos ao tema a respeito dos aspectos jurídicos.
22. Fontes de direito do período visigótico
Não cabe nos limites da presente exposição uma análise
desenvolvida da legislação visigótica e das instituições jurídicas que
a mesma patenteia. Recorde-se, em todo o caso, que as ideias tradi-
cionais sobre o direito visigótico têm sido modernamente objecto
de profunda revisão crítica, com realce para os estudos de Ernst
Levy, Paulo Merêa, Garda-Gallo e Álvaro d'Ors.
Encontra-se superada a concepção que encarava as fontes visi-
góticas de um puro ângulo germânico. Pelo contrário, entende-
-se actualmente que essas fontes constituem um inestimável reposi-
tório do chamado direito romano vulgar do Ocidente. Tal
perspectiva faz surgir questões novas e ressuscita questões antigas
que pareciam ter recebido um juízo definitivo.
Uma longa e sucessiva investigação vem sujeitando a exegese
aturada os textos jurídicos e os testemunhos literários e narrativos,
respeitantes ao direito visigótico ('). Apesar disso, subsistem pro-
blemas difíceis, tanto relativamente à evolução geral e às fontes
desse direito, como sobre as suas instituições. Aos pontos de vista
que eram aceitos, juntaram-se outros que, mais do que carrearem
certezas, têm posto em dúvida as teses anteriores.
(') Ver a extensa resenha analítica de García-Gallo, Consideración critica de
los estúdios sobre la legislación y la costumbre visigodas, cit., in "An. de Hist. dei Der.
Esp.", tomo XLIV, págs. 343 e segs. No mesmo sentido, ver Giulio Vismara, Le
fonti dei diritto romano nelValto medioevo secondo lapiú recente storiografia (1955-1980), cit.,
in "Stud et Doe. Hist. et Iur.", vol. XLVII, págs. 1 e segs.
126
PERÍODO GERMÂNICO OU VISIGÓTICO
Abstraindo das controvérsias levantadas no âmbito das insti-
tuições, podemos seriar os problemas seguintes: o do elenco das
fontes normativas visigóticas; o do carácter pessoal ou territorial
destas; o da persistência de um antigo direito consuetudinário; e o
das fontes jurídico-canónicas. Daremos conta de cada um deles.
22.1. Referência sumária às principais fontes de direito do período
visigótico
Apenas se conhecem, do Reino Visigodo, três textos legais
completos é com elementos seguros sobre a autoria e a data: o
Breviário de Alarico (506), a Lei de Teudis (546) e o Código Visi-
gótico, nas suas versões de Recesvindo (654) e de Ervígio (681) ( ).
E muito pouco.
As restantes fontes normativas encontram-se incompletas e
não contêm indicações precisas que autorizem a sua atribuição
líquida aos Visigodos e, às vezes, até uma definição inequívoca da
respectiva natureza. Porém, a crítica histórica não as coloca no
mesmo plano, pois a respeito de algumas delas existem menores
dúvidas. Assim sucede com o Código de Eurico e o Código Revisto
de Leovigildo.
Deixaremos de parte os textos jurídicos sobre que se acumu-
lam conjecturas bastante incertas (2). Estes apresentam, aliás, algu-
, ( ) Cír. García-Gallo, Consideración crítica de los estúdios, cit., in "An. de
Hist. dei Der. Esp.", tomo XLIV, págs. 357 e segs.
(2) Assim: os Fragmentos Gaudenzianos ou de Holkham — constituem-nos
catorze capítulos, cujo carácter é problemático, respeitantes a questões de direito
privado e de processo, que integravam uma compilação jurídica relativamente à
qual nada se sabe; mesmo relacionando-os com a Península, mostram-se de
importância reduzida para a sua história, visto que deviam ter conseguido nela
uma vigência mais teórica do que prática; foram descobertos por Gaudenzi num
códice da Biblioteca de Holkham (Inglaterra) (ver, por todos, Paulo Meréa,
Fragmenta Gaudenziana (para a solução de um enigma), in "Est. de Dir. Vis.", cit.,
127
HISTORIA DO DIREITO PORTUGUÊS
mas conexões entre si. Por outro lado, pode dizer-se que não se
relacionam com a evolução legislativa unicamente baseada nas fon-
tes que, sem quaisquer dúvidas ou com as maiores probabilidades,
se consideram visigóticas^).
I — Código de Eurico
Aceita-se, em geral, a existência de leis promulgadas pelos
monarcas visigodos logo a seguir à sua instalação na Gália. Essas
leis — as chamadas Leis Teodoricianas, porque devidas a Teodorico I
págs. 121 e segs., e Edictum Theodorici e fragmenta gaudenziana (A propósito de um
recente trabalho do Prol Vismara), in "Boi. da Fac. de Dir.", cit., vol. XXXII, págs.
315 e segs., GarcíA-Gallo, Consideración crítica de los estúdios, cit., in "An. de Hist.
dei Der. Esp.", tomo XLIV, págs. 382 e segs., e Giui.io Vismara, Le jonti dei
diritto romano nell'alto medioevo, cit., in "Stud. et Doe. Hist. et Iur.", vol. XLVU,
págs. 13 e seg.j. A "Lectio legum"—trata-se de seis capítulos de conteúdo jurídico
secai,ir incluídos numa colectânea que, sob essa epígrafe, reúne textos muito
variados, em regra de direito canónico, que se encontra na Biblioteca Vallice-
liana de Roma (ver, por todos, García-Gali.o, Consideración crítica de los estúdios,
cit., in "An. de Hist. dei Der. Esp.", tomo XLIV, págs. 388 e segs.). E o "Edic-
tum Theodorici regis"—um texto jurídico muito mais importante do que os dois já
referidos, com data posterior a 458, integrado por um prólogo, cento e cinquenta
e cinco capítulos e um epílogo; mercê do seu conteúdo, pertence às "leges roma-
nae barbarorum"; têm-lhe sido atribuídas diversas origens, prevalecendo as teses
que sustentam a sua proveniência ostrogoda ou visigoda, mas não existindo, de
qualquer modo, dados que demonstrem que haja sido conhecido ou utilizado na
Hispânia (ver, por todos, Paulo Mi-réa, Edictum Theodorici e jragmenta gaudenziana,
cit., in "Boi. da Fac. de Dir.", vol. XXXII, págs. 315 e segs., Giulio Vismara, El
"Edictum Theodorici,y, in "Estúdios Visigóticos", cit., vol. I, págs. 49 e segs., e Le
jonti dei diritto romano nell'alto medioevo, cit., in "Stud. et. Doe. Hist. et Iur.", vol.
XLVII, págs. 8 e segs., e García-Gallo, Consideración crítica de los estúdios, cit., in
"An. de Hist. dei Der. Esp.", tomo XLIV, págs. 390 e segs.).
(') As fontes de direito visigótico podem ser consultadas na "Colecção de
Textos de Direito Peninsular e Português"—"Textos de Direito Visigótico",
vols. I e II, Coimbra, 1923 e 1920, respectivamente. Esta colectânea, organizada
por Paulo Merêa, baseia-se nos "Monumenta Germaniae Histórica", cit., cuja
edição, como se observou, foi dirigida pelo famoso germanista K. Zeumer.
128
PERÍODO GERMÂNICO OU VISIGÓTICO
(419/451) e a Teodorico II (453/466) — ocupam-se, além de outros
aspectos de direito privado, sobretudo, da repartição de terras con-
sequente ao acordo de hospitalidade militar ocorrido entre Visigo-
dos e Romanos.
Todavia, a primeira colectânea importante de direito visigó-
tico foi o Código Euriciano, promulgado pelo rei Eurico, à volta de
475, talvez mesmo em 476. Trata-se de uma fonte tradicionalmente
enquadrada na categoria já nossa conhecida das leis dos bárbaros
("leges barbarorum")^). Mas é de todas elas a que mais larga-
mente se ocupa do direito privado. Além disso, a reconstituição que
a moderna crítica histórica fez do Código de Eurico mostra a sua
larga receptividade ao direito romano vulgar. O que não causa
estranheza, dado o grau de civilização adquirido pelos Visigodos e
a possível intervenção nos trabalhos legislativos de pessoas conhe-
cedoras do direito romano ( ).
II — Breviário de Alarico
Como referimos ( ), existe o texto completo do Breviário Alari-
ciano ou Lei Romana dos Visigodos ("Lex Romana Visigothorum"),
que Alarico II promulgou em 506. Integra-se, pois, na categoria das
leis romanas dos bárbaros ("leges romanae barbarorum")( ).
(') Cfr. supra, págs. 109 e segs.
(") Quanto ao conteúdo desta importante fonte e aos problemas que sobre
ela se levantam, consultar Ai.varo D'Ors, El Código de Eurico — Edicción, Palinge-
nesia, índices, in "Cuadernos dei Instituto Jurídico Espanol", n.° 12 —"Estúdios
Visigóticos", cit., vol. II, Roma-Madrid, 1960. Sobre o específico problema da
data, ver Álvaro D'Ors, ibid., pág. 4, La territorialídad dei derecho de los visigodos,
cit., in "Estúdios Visigóticos", vol., I, pág. 112, nota 71, e CE. -277 y La fecha dei
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