Mário júlio de almeida costa



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que a dirigiu. Quando Gama Barros faleceu, aos 92 anos (1833/1925), continuava

a escrever a. obra em que trabalhou seis décadas, pois começara a redigi-la vinte

anos antes da publicação do primeiro tomo. Pode consultar-se, por todos, Tor-

quato de S. Soares, Henrique de Gama Barros, in "Revista Portuguesa de Histó-

ria", vol. IV, Coimbra, 1949, págs. V e segs.

(2) Sobre Paulo Merêa, consultar L. Cabral de Moncada, Manuel Paulo

Merêa — Esboço de um perfil, Coimbra, 1969, Torquato de Sousa Soares, Prof.

55

HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS



Em oreve apontamento àe síntese, observa que Pau\o Merêa

foi um vulto expressivo da cultura nacional contemporânea e um

dos expoentes mais representativos que a Universidade portu-

guesa teve em todo o seu passado. A obra que deixou publicada,

relativa aos domínios da história e da filosofia do direito, da legisla-

ção comparada e, inclusive, de disciplinas não jurídicas, como a

filologia, a diplomática e a paleografia, revela, caracteristicamente,

exaustiva investigação e reflexão dos temas, plena abertura às soli-

citações e complementaridade dos vários ramos do saber e da cul-

tura, precisão e elegância sugestiva da linguagem, pureza de estilo.

Quando Paulo Merêa entrou para o corpo docente da Facul-

dade de Direito de Coimbra (1914), os estudos de história jurídica e

de história política encontravam-se, no nosso país, manifestamente

decadentes. Isto, apesar dos esforços de Guilherme Moreira — o

patriarca da moderna civilística portuguesa—, que, pelos fins do

século XIX e começos do século XX, reformulou a exposição dos

primeiros períodos da história do direito peninsular, difundindo,

entre nós, a doutrina, então recente, de Eduardo de Hinojosa, sobre

as origens do regime municipal, e as pesquisas de Karl Zeumer,

acerca da legislação visigótica ('). Representaram pequeno avanço

Doutor Manuel Paulo Merêa — Historiador das Instituições Medievais, Coimbra, 1969, e

Mário A. dos Reis Faria, Bibliografia do Doutor Manuel Paulo Merêa, Coimbra, 1969

(seps. da "Rev. Port. de Hist.", cit., tomo XII), Doutor Manuel Paulo Merêa (1889-

-1977), Coimbra, 1979 (sep. da "Revista Portuguesa de Filologia", vol. XVII,

Coimbra, 1975/1978), e Algumas notas biográficas e bibliografia do Doutor Manuel Paulo

Merêa, Coimbra, 1983 (sep. do "Boi. da Fac. de Dir.", cit., vol. LVIII

— "Estudos em Homenagem aos Profs. Doutores M. Paulo Merêa e G. Braga

da Cruz", tomo I). Neste mesmo tomo I do vol. LVIII do "Boi. da Fac. de

Dir.", págs. 41 e segs., encontra-se a publicação póstuma do estudo de Paulo

Merêa, A tradição romana no nosso direito medieval.

(') Cfr. Paulo Merêa, Esboço de uma história da Faculdade de Direito de

Coimbra, fase. III (1865-1902) — As várias disciplinas, Coimbra, 1956, págs. 18 e

segs. (sep. do "Boi. da Fac. de Dir.", cit., vols. XXIX a XXXI; ver, designada-

mente, vol. XXIX, págs. 103 e segs.), e G. Braga da Cruz, A Revista de Legisla-

ção e de Jurisprudência — Esboço da sua História, vol. I, Coimbra, 1975, nota 1051 da

pág. 431, especialmente págs. 433 e seg.


56

INTRODUÇÃO

as lições, destinadas ao ensino universitário, de Marnoco e Sousa

(1904) ou de Joaquim Pedro Martins (1906).

Eis o quadro de que Merêa partiu ao abalançar-se à renovação

da ciência da história do direito português. Já durante o seu curso

jurídico revelou notáveis capacidades intelectuais e dotes de inves-

tigador. Marcaram-no, logo de início, fortes influências das orien-

tações filosóficas idealistas e de reacção contra o positivismo jurí-

dico francês (Duguit e Jèze), que ao tempo predominava(l).

Daí em diante, desenrola-se toda uma vida consagrada ao

estudo e à elaboração de uma obra de extraordinário significado

científico e cultural. A minuciosa análise crítica dos factos e dos

documentos constitui um dos seus notáveis atributos. Mas essa

severa exegese apresenta-se sempre completada pela preocupação

de entender os problemas nos seus nexos e explicação de conjunto.

É neste aspecto que se revelam as permanentes preocupações cultu-

rais, a infatigável actualização e a fina e rara intuição de Paulo

Merêa, quer se movesse na área da história das instituições, quer na

das ideias.

Dedicou-se Merêa a inúmeros temas históricos, não só do

direito privado e do direito público, mas também relativos a alguns

aspectos do pensamento político nacional e europeu. O seu campo

de investigação alongou-se desde o período medieval até aos tem-

pos modernos. Só inexcedíveis escrúpulos científicos impediram que

essa obra fosse mais extensa (2). Dela decorrem preciosas sugestões

(') Ver o estudo de Paulo Merêa, Idealismo e Direito, Coimbra, 1913

(republ. in "Boi. da Fac. de Dir.", cit., vol. XLIX, págs. 285 e segs.). Trata-

-se de uma conferência que, três anos antes, ainda estudante, Merêa proferiu no

Instituto de Coimbra. Aí se põem em causa os fundamentos ontológicos da téc-

nica jurídica que alicerçava a dogmática juspublicista nos postulados do positi-

vismo científico de Comte e do sociologismo de Durkheim e Lévy-Bruhl. É

nítida a simpatia do autor pelo institucionalismo de inspiração bergsoniana.

(2) Quanto a sínteses para uso dos alunos, Paulo Merêa chegou a publicar

vários textos com estrutura e opiniões que o seu espírito exigente considerava

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HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS



e permanente estímulo, pelo que não admiram os reflexos que

alcançou nos meios científicos e culturais, de aquém e além-

-fronteiras, criando uma verdadeira "escola" de que se confessam

tributários destacados pensadores e investigadores, nacionais e

estrangeiros (*).

Circunscrevemos as nossas referências a historiadores do

direito portugueses, infelizmente já falecidos. Entre estes se contam

dois colaboradores e continuadores de Paulo Merêa: Luís Cabral de

Moncada, sem dúvida mais comprometido com a filosofia do

direito, e Guilherme Braga da Cruz.

O primeiro destes mestres, Cabral de Moncada (1888/1974) (2),

foi condiscípulo de Merêa nos bancos universitários e depois seu

colega e colaborador nos estudos histórico-jurídicos. Mas, desde

cedo, a filosofia esteve presente no modo como compreendeu a

muito provisórias. Assim: a Exposição sucinta da História do Direito Português (prelec-

ções compiladas por Adelino Marques/Constantino Cardoso), Coimbra,

1922, as Lições de História do Direito Português, Coimbra, 1923, o Resumo das Lições de

História do Direito Português, Coimbra, 1925, e as Lições de História do Direito Português

(prelecções compiladas por Brites Ribas/Miranda Vasconcelos/Alves Gomes),

Coimbra, 1933. Ao 5.° ano (Curso Complementar de Ciências Jurídicas), fez

Merêa algumas exposições monográficas, de que forneceu apontamentos polico-

piados, como sobre as Origens do testamento português, Coimbra, 1937, a História da

Enfiteuse, Coimbra, 1942, e as Disposições "pro anima", Coimbra, 1946.

(') Ver, por ex., o estudo de Paul Ourliac, Ce que 1'histoire du droit français

doit à Paulo Merêa et à G. Braga da Cruz, in "Boi. da Fac. de Dir.", cit., vol. LVIII,

tomo I, págs. 771 e segs.

(2) Sobre Cabral de Moncada, podem consultar-se G. Braga da Cruz e

Afonso Queiró, Prof. Doutor Luís Cabral de Moncada, in "Boi. da Fac. de Dir.",

cit., vol. XXXVI, págs. 281 e segs. As investigações histórico-jurídicas de Cabral

de Moncada estão fundamentalmente reunidas nos seus "Estudos de História do

Direito", vols. I, II e III, Coimbra 1948/1950, e, também, in "Estudos Filosóficos

e Históricos", vols. I e II, Coimbra, 1958/1959. Existe um pequeno opúsculo com

o título História do Direito Português. Direitos de Família: Casamento e Regimes de Bens,

Coimbra, 1930, que contém as prelecções de Cabral de Moncada, coligidas por

Artur A. de Castro/Mário M. ReymAo Nogueira.

58

INTRODUÇÃO



história do direito e a respectiva metodologia, bem como, conse-

quentemente, na sua produção historiográfica, a respeito da escolha

dos temas ou da forma de encará-los. Aliás, os trabalhos de Mon-

cada mais representativos ligam-se à história das ideias e dos siste-

mas filosófico-jurídicos e filosófico-políticos.

Deve considerar-se Braga da Cruz (1916/1977) (l) como o dis-

cípulo directo de Paulo Merêa. A morte colheu-o prematuramente,

quando muito se esperava ainda da sua personalidade multiforme,

mas que situou a matriz mais especializada, do ponto de vista cien-

tífico, nos domínios da historiografia do direito.

Igualmente numerosa e valiosa se apresenta a produção cientí-

fica de Braga da Cruz. Nela se compreende uma considerável

variedade de temas — do direito antigo e medieval aos precedentes

históricos imediatos do moderno sistema jurídico. A sua obra paten-

teia apurado rigor científico, uma inteligência esclarecida e culta, a

ponderação e a serenidade com que encarava os problemas. Nos

seus escritos se reflectem, de resto, os atributos de uma exemplar

personalidade moral e intelectual.

(') A respeito de Braga da Cruz, ver M. J. Almeida Costa, in História do

Dirdto e Ciência Jurídica — Homenagem póstuma a Guilherme Braga da Cruz, Porto,

1979, págs. 83 e segs., Manuel de Paiva Boléo, Dr. Guilherme Braga da Cruz

(1916-1977), Coimbra, 1979 (sep. da "Rev. Port. de Filol.", cit., vol. XVII),

Rafael Gibert, Braga da Cruz, cien anos de Historia dei Derecho português, Madrid,

1979 (sep. do "An. de Hist. dei Der. Esp.", cit., tomo XLIX), Luís de Albu-

querque e Aníbal Pinto de Castro, ^4 Memória do Doutor Braga da Cruz. Na

Abertura da Exposição Bibliográfica, em 31 de Março de 1980, in "Boletim da Biblioteca

da Universidade de Coimbra", vol. XXXVI, Coimbra, 1981, págs. 347 e segs.,

vários depoimentos in Guilherme Braga da Cruz, Um Homem para a Eternidade, vols.

I e II, Braga, 1981/1985, Mário A. dos Reis Faria, Bibliografia do Prof Doutor

Guilherme Braga, da Cruz, Coimbra, 1983 (sep. do "Boi. da Fac. de Dir.", cit., vol.

LVIII, tomo I), e Martim de Albuquerque, Elogio do Prof. Doutor Guilherme Braga

da Cruz, Lisboa, 1985 (publ. da Academia Portuguesa da História). No cit. tomo

I do vol. LVIII do "Boi. da Fac. de Dir.", págs. 69 e segs., publica-se postuma-

mente o estudo de G. Braga da Cruz, Coimbra ejosê Bonifácio de Andrada e Silva.

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HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS



Como Paulo Merêa, jamais Braga da Cruz foi conquistado

pela sedução das conclusões e sínteses precipitadas. Nunca hesitou

em se limitar à preparação paciente e segura dos alicerces, sempre

que a sua escrupulosa probidade e a extrema insatisfação científica

não consideravam os temas suficientemente esclarecidos(l). Nesta

atitude humilde e sábia reside, afinal, a superioridade dos autênticos

intelectuais.

Também não se pode esquecer a moderna e importante histo-

riografia jurídica produzida por investigadores formados em torno

da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Visto que nos

limitamos aos autores já falecidos, apenas se menciona Marcello

Caetano (1906/1980). Todavia, dessa escola continuam saindo estu-

dos do maior interesse e de apurado nível científico.

Distinguiu-se Marcello Caetano, principalmente, como um

cultor da ciência política, do direito constitucional e do direito

administrativo. No entanto, entre as outras áreas do ensino e da

investigação a que se dedicou, sobressai a história jurídica. Neste

domínio, pesquisou e escreveu como um historiador do direito a

tempo inteiro. Teve uma meditada concepção historiológica, adop-

tou uma segura metodologia, possuiu invulgar intuição das questões

históricas, nunca esqueceu a probidade que se impõe ao cientista,

foi dotado de raras qualidades de organização do trabalho e de

clareza. Não admira, dada a sua formação de base, que se haja

voltado, principalmente, para a história do direito público.

(') Referiu-se, em "Nota Prévia", que Braga da Cruz estava longe de

considerar definitivos vários dos pontos de vista que constam dos textos polico-

piados das suas exposições coligidas por alunos. Essa História do Direito Português

conheceu duas versões: a primeira (Coimbra, 1946/1947), da responsabilidade de

Ernesto Faria Leal/Ãngelo de Castro César; e a segunda (Coimbra,

1955/1956), muito pouco divergindo da precedente, de que se encarregou A.

Barbosa de Melo. Existem, ainda, os Aditamentos de Direito Português — O pro-

blema da personalidade ou territorialidade da legislação visigótica, anteriormente a Recesvindo,

Coimbra, 1958, coligidos por Daniel Gonçalves.

60

INTRODUÇÃO



Aliás, a historiografia jurídica representou a absorvente tarefa

intelectual dos seus últimos anos de vida, dedicados a repensar e a

reformular escritos anteriores, com a utilização de fontes ainda não

exploradas. Infelizmente, deixou o projecto inacabado (*).

(') Como sua obra póstuma, foi publicada a já cit. História do Direito Português,

vol. I — Fontes. Diráto Público (1140-1495), Lisboa, 1981. Dos elementos didácticos

irosos que Teèbgru -para tjs vSttàaatea, WHJtfiBftft lhie "WíieVfc tS3rfcaifò X) ICtÉBfb

desta disciplina na Faculdade de Direito de Lisboa (de 1939 a 1942 e de 1961 a

1963), salientam-se as Lições de História do Direito Português, Coimbra, 1962. Ver

Jorge Borges de Macedo, Marcello Caetano, historiador, in "Brotéria", vol. 114, n.°

2, Lisboa, 1982, págs. 151 e segs., e José Adelino Maltez, História do Diráto

Português (1140-1495) de Marcello Caetano, in "Rev. da Fac. de Dir. da Univ. de

Lisb.", cit., vol. XXVI, págs. 611 e segs.

61

PARTE I


ELEMENTOS DE HISTÓRIA DO

DIREITO PENINSULAR

PARTE I
ELEMENTOS DE HISTÓRIA DO

DIREITO PENINSULAR

PARTE I
ELEMENTOS DE HISTORIA DO

DIREITO PENINSULAR

CAPÍTULO I

PERÍODO PRIMITIVO

8. Característica básica. Fontes de conhecimento

Iniciamos a exposição da história do direito peninsular com

uma referência ao sistema anterior à dominação romana. Trata-se

do chamado período primitivo ou ibérico (').

A característica básica a pôr em evidência a respeito dele é a

de que a Península estava longe de oferecer uma unidade étnica,

linguística, cultural, religiosa, política, económica ou jurídica. Sob

qualquer dos ângulos referidos, constituía um conjunto bastante

diversificado.

Acrescenta-se que existe uma reconstituição muito fragmen-

tária e insegura das instituições desse período. As fontes disponíveis

para o seu estudo revelam-se escassas. Entre as mais importantes,

cabe destacar os restos epigráficos e arqueológicos. Assinalam-se,

também, os dados que se recolhem nas obras de escritores da

Antiguidade.

Nem todas as inscrições encontradas são presentemente utili-

záveis pelos investigadores, pois, ao lado de algumas escritas em

latim ou grego, há outras que se encontram redigidas em línguas

desconhecidas. Para a leitura destas últimas, não têm faltado tenta-

tivas mais ou menos frutuosas, ou com recurso a princípios filológi-

(') Sobre quanto se escreve a respeito deste período, podem consultar-se

as exposições gerais de Joaquín Costa, Estúdios ibéricos, Madrid, 1891/1895,

Manuel Torres, Lecciones, cit., vol. I, págs. 143 e segs., A. Garcia-Gallo,

Manual, cit., tomo I, págs. 27 e segs., especialmente págs. 36 e segs., 233 e seg., e

327 e segs., Luís G. de Valdeavellano, Curso de Historia de las Instituciones espãho-

las, 2.3 reimpressão, Madrid, 1986, págs. 109 e segs., e Enrique Gacto FernAn-

dez/Juan António Alejandre García/José Maria Garcia Marín, El Derecho

Histórico de los Pueblos de Espana (Temas para un curso de Historia dei Derecho), l.a

reimpressão, Madrid, 1982, págs. 15 e segs.

67

HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS



cos gerais ou baseadas na circunstância de se possuirem inscrições

duplas ou bilingues — ibéricas e latinas. Todavia, os resultados

obtidos mostram-se susceptíveis de dúvida(*).

As notícias fornecidas por historiadores e geógrafos gregos e

latinos são valiosas, embora parcelares e nem sempre concordantes.

Deve salientar-se que apresentam o traço comum de constituírem

pontos de vista de estrangeiros sobre as instituições peninsulares,

em que avulta o propósito de compará-las com as dos respectivos

países, deixando na sombra os aspectos específicos, que precisa-

mente conviriam à sua exacta perspectivação. Aliás, os estudos de

etnologia e de sociologia têm evidenciado, em geral, a dificuldade

de interpretar uma cultura antiga ou moderna com critérios de

outra, ainda que mostrem aparentes semelhanças.

As referidas fontes narrativas não possuem todas os mesmo

interesse para os estudos histórico-jurídicos. Desde logo, os elemen-

tos fornecidos pelos autores que viveram na Península são, via de

regra, mais atendíveis do que os recolhidos indirectamente, através

de escritos ou informações anteriores. Além disso, muitas de tais

obras abordam temas sem a mínima conexão com o direito.

Outras, contudo, fornecem dados importantes sobre as instituições

jurídicas dos primitivos povos peninsulares. Recordam-se autores

como Políbio, Diodoro da Sicília, Estrabão (2) e Apiano Alexan-

drino, que escreveram em grego, Avieno, Júlio César, Tito Lívio,

Plínio e Pompónio Mela, que nos deixaram textos latinos.

(') Acerca dos documentos pré-romanos, dificuldades da sua leitura e

interpretação, ver A. García-Gallo, Los documentos y los formulários jurídicos en

Espana hasta el siglo XII, in "Estúdios de Historia dei Derecho Privado", Sevilla,

1982, págs. 347 e segs. (também publ. in "Anales de la Academia Matritense dei

Notariado", tomo XXII, vol. I, Madrid, 1978).

(2) Da obra deste autor existe uma tradução com comentários de A.

Garcia Bellido, Espana y los espãholes hace dos mil anos según la Geografia de Strabón,

Madrid, 1945.

68

PERÍODO PRIMITIVO



9. Povos anteriores à conquista romana
Não se justificaria uma enumeração geral dos povos que habi-

taram o território peninsular, desde os tempos pré-históricos até à

chegada dos Romanos. As questões etnológicas e de localização des-

ses povos são secundários para o nosso tema.

Apenas nos propomos mencionar os povos autóctones que

ocupavam a Península no século III a.C, quer dizer, antes da domi-

nação romana. Também terá interesse a indicação das colonizações

estrangeiras.

9.1. Principais povos autóctones
Às diversidades étnicas dos primitivos povos peninsulares cor-

responderam, como se observou, entre outras, diferenças culturais e

de desenvolvimento económico. Alguns deles limitavam-se a redu-

zida produção agrícola e pecuária, enquanto outros, ao lado de uma

economia agrária próspera, tiveram actividades industriais e minei-

ras, assim como intercâmbios mercantis. Daí que não fosse desco-

nhecido, nestes últimos, o uso da moeda.

Tudo indica como zonas mais progressivas as correspondentes

à actual Andaluzia, à parte oriental da Península e à orla marítima

que hoje constitui a costa portuguesa. Parece de admitir, pelo con-

trário, que os povos mais atrasados tenham sido os das' regiões inte-

riores, do Noroeste e do litoral cantábrico.

Não obstante a grande variedade de raças, torna-se possível

reconduzir os povos que habitavam a Península, ao tempo da con-

quista romana, a cinco grupos fundamentais: Tartéssios, Iberos,

Celtas, Celtiberos e Franco-Pirenaicos.

Apresenta-se uma classificação bastante simplificada e sem

preocupações de extremo rigor. Deve salientar-se que cada um

destes grupos étnicos se subdividia em diversos povos. Daremos

indicações sucintas.

69

HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS



I. Tartéssios — Eram, segundo Estrabão, o povo mais culto e

adiantado da Península. Encontravam-se estabelecidos ao Sul,

aproximadamente na região delimitada pelo rio Guadiana. De

entre os Tartéssios, destacam-se os Turdetanos, que ocupavam a

bacia do baixo Guadalquivir.
II. Iberos — Estavam acantonados na orla oriental, expandindo-

-se para o interior através das actuais regiões da Catalunha e de

Aragão. Pertenciam à raça ibérica, por exemplo, os Cantabros ou

Cantábricos, fixados nas montanhas do Oriente das Astúrias e San-

tander. Recorde-se que o qualificativo de Iberos ultrapassou os que

o foram em sentido restrito para designar, ainda, outros povos

peninsulares.
III. Celtas — Ocupavam o Noroeste e o Sudoeste, quer dizer,

respectivamente, as zonas que correspondem ao Minho e à Galiza

actuais e ao sul do rio Tejo, com excepção do território que hoje

integra o Algarve, então habitado pelos Cónios. Naquela primeira

área tomaram o nome de Galaicos, incluindo uma considerável série

de povos que se polarizavam no grupo dos Lucenses e no dos

Bracarenses.
IV. Celtiberos — Discute-se a sua génese. Porém, tenham sido

os Celtas a dominar os Iberos ou o inverso, seguro é que os Celti-

beros resultaram de uma fusão ou mescla desses dois povos. Trata-

-se de um dos grupos mais importantes da Península. Nele se

incluíam os Lusitanos, situados entre os rios Douro e Tejo.
V. Franco-Pirenaicos — Localizaram-se no extremo norte da

Península, a que correspondem as modernas regiões de Navarra e

Vascongadas. Aponta-se aos povos deste grupo uma significativa

expansão cultural. Destacam-se os Vasconsos, que se estendiam por

uma área que abrangia a actual cidade de Pamplona.

70

período primitivo



9.2. Colonizações estrangeiras
Completa-se a breve descrição dos grupos étnicos da Hispânia

pré-romana com uma referência às colonizações estrangeiras.

Apontam-se correntemente viagens marítimas e contactos remotos

com povos europeus e norte-africanos. Todavia, apenas aludiremos

aos colonizadores que mais contribuiram para o progresso cultural

e económico dos povos indígenas: os Fenícios, os Gregos e os Car-

tagineses. Também agora se fará uma exposição resumida.
I. Fenícios — Caracterizam-se os Fenícios como um povo de

comerciantes e navegadores da Ásia Menor, que conseguiu, nos

séculos IX e VIII a.C, alcançar a hegemonia mercantil do Mediterrâ-

neo. Foram os interesses económicos que levaram os Fenícios, no

século IX a.C, a estabelecer várias colónias e feitorias ao longo da

costa africana, de entre as quais sobressai Cartago. Esses mesmos

interesses trouxeram os Fenícios até à Península. Fixaram-se na

costa meridional, fundando Cádiz e outras cidades.


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