Sumário prólogo capítulo



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CAPÍTULO 28
OAudi de Colmenares parou alguns metros antes de chegar à rampa de descida do estacionamento. Leonardo se precipitou em direção ao automóvel, abrindo a porta de trás.

—Ainda bem que veio! — afirmou, antes de jogar a mochila lá dentro. As pessoas não paravam de olhar para mim, como se eu fosse um animal raro.

Seus olhos encontraram com os de uma mulher de uns trinta e poucos anos, bastante atraente, que estava sentada ao lado de Nicolas. Seu sorriso o cativou instantaneamente. Devia ser Cristina Hiepes.

Então, sem saber porque, teve a sensação de estar sendo ridículo.

—Se eu me encontrasse com alguém vestido dessa maneira — observou a criptógrafa —, também o olharia por cima dos ombros.

—Eu lhe apresento Cristina — disse Nicolas, entrando na avenida depois de ligar o pisca-pisca —, sua nova ajudante.

—Encantado. Estendeu a mão.

—Existe uma razão que eu não saiba, para estar vestido deste modo? — perguntou Colmenares, sem desviar os olhos da rodovia.

—É uma longa história... — disse, com ar de mistério, ajeitando os cabelos para trás, com as duas mãos, agoniado pelas circunstâncias. - Antes de colocá-los a par do que houve, preciso que me levem a Santomera, um povoado aqui perto. Preciso comprovar uma coisa... — e acrescentou com voz rouca — ... é importante.

—Diga-nos, pelo menos, se você encontrou o diário do pedreiro — insistiu o advogado —, é a única coisa que precisamos saber. Leonardo titubeou alguns segundos.

—Não... ainda não — respondeu finalmente. — Mas há algo pior. Os Filhos da Viúva estão me seguindo.

—Tem certeza? — foi Cristina quem perguntou desta vez. Assentiu em silêncio e continuou falando:

—Contarei a história toda quando chegarmos a Santomera... — prometeu, pois não estava disposto a satisfazer a curiosidade de ninguém sem antes colocar suas idéias em ordem. — No momento, preciso descansar. Não dormi a noite toda, tenho um galo na cabeça que parece uma amêndoa, e perdi algo de muito valor. Aventuras demais para uma noite.

—Perdoe minha insistência — teimou Cristina —, mas creio que você sabe como é importante para nós determos esses criminosos.

Cárdenas arqueou as sobrancelhas, de maneira inquisitoria.

—Quem é você, bibliotecária ou policial? — estava furioso, pois esperava que pudessem compreender sua situação. — Você pode me explicar o que é isso tudo? — sua pergunta era dirigida a Colmenares. — Pode me dizer por que ela está aqui?

—Escute, Leo — começou dizendo Nicolas, e o fez com firmeza.

—A investigação está sendo custeada, desde o começo, graças ao dinheiro de Mercedes. Estamos todos envolvidos nela, muito a contragosto. Eu, como advogado e testamenteiro da falecida, e com o beneplácito dela em vida, represento agora seus interesses até a leitura do testamento. Há alguns dias ela me pediu que assumisse a responsabilidade da busca, se acontecesse alguma desgraça. Deu instruções para que Cristina e você continuassem juntos. Na verdade, a senhorita Hiepes está nos fazendo um grande favor. Não há ninguém que tenha melhor conhecimento da interpretação cabalística e esotérica que cerca o mundo da maçonaria.

Leo começou a rir, de um jeito espontâneo, sem pensar nas conseqüências de sua atitude. Depois, ao perceber que a moça o observava com limitada paciência, tratou de se desculpar.

—Sinto muito, não estava rindo de suas qualificações. É que achei muito engraçado o fato de Nicolas pensar neste assunto como uma transação comercial entre duas empresas, quando, na realidade é bem mais complexo... — pensativo, coçou o queixo. — Vocês vieram de Madri com uma história diferente da minha, com uma idéia preconcebida do que temos de fazer, como se tudo fosse muito fácil. Mas existe um problema. Aqui em Múrcia, vivemos uma situação que não havíamos previsto e dois novos inocentes sofreram as conseqüências. Não sei se permanecem com vida. No momento estão desaparecidos.

—Eu sabia...! Você contou a Cláudia sobre o manuscrito! — Colmenares olhou irritado pelo espelho retrovisor. — Outro dia, quando se ausentou para resolver um assunto doméstico, foi encontrar você em sua casa... — respirou fundo, duas vezes —... estou certo?

—Reconheço que foi um erro, mas tive de fazê-lo.

—Ninguém mais devia saber o real motivo do assassinato de Jorge! — o advogado estava furioso. — Fico surpreso diante de tanta irresponsabilidade.

Cárdenas resolveu deixar as coisas bem claras.

—Você se lembra? Cláudia e eu temos uma relação que vai além da casa de leilões e suas normas — replicou mordaz. — Tive de preveni-la.

—Está bem, será melhor nos acalmarmos... — foi a opinião de Cristina —... já que não há remédio... Deveríamos levar Leo até Santomera e ver que surpresa nos aguarda. Se é de seu agrado nos contar o que aconteceu, vamos ouvi-lo. Se não, haverá tempo quando esti¬ver mais calmo... isso lhe parece bom? — sua pergunta era dirigida a quem viajava no banco de trás.

—Perfeito — respondeu Leonardo, fechando os olhos no momento em que esticava seu corpo.

O advogado guardou um prudente silêncio, embora preferisse prolongar a conversa, para saber de onde ele vinha vestido daquele modo tão ridículo. Por ora, Cristina tinha razão: deviam lhe dar um pouco mais de tempo.

Dirigiu sem dizer uma só palavra até chegarem a Santomera.

Uma vez lá, Leonardo foi indicando o caminho que devia seguir. Atravessaram o povoado e seguiram por uma estrada vicinal. Depois de alguns quilômetros, desviaram para pegar outra estrada, que, finalmente, os levou a uma propriedade cercada de largos e pontiagudos barrotes. Além do portão de ferro, fechado naquele momento, puderam contemplar a majestosa fachada da caverna e os soberbos jardins que a envolviam. Tanto Nicolas quanto sua acompanhante ficaram maravilhados ao deparar-se com aquela obra-prima da arquitetura.

—É incrível! — Cristina saiu do carro levada pela curiosidade.

Os homens a seguiram, de maneira que foram, todos, até a entrada principal, com o objetivo de espiar, através dos barrotes pintados de preto.

Leonardo tratou de ver se encontrava indícios do regresso de Salvador e Cristina ao ponto de partida. Existia a possibilidade de que tivessem sido forçados a partir sem poder avisá-lo, esperando que soubesse interpretar seu desaparecimento como uma retirada estratégica. Talvez estivessem dentro da casa, acreditando que era ele quem estava nas mãos dos assassinos. Não viu, porém, o automóvel de Riera por ali.

—Bem... Você vai explicar os motivos de estarmos aqui? — perguntou Colmenares, depois de observar por uns segundos o comportamento singular do bibliotecário.

—Espere um momento.

Sem prestar muita atenção, Cárdenas foi até o pilar esquerdo da entrada, para apertar a campainha do porteiro eletrônico incrustado na pedra. Não houve resposta. Insistiu novamente, porém foi inútil. Não havia ninguém.

—Devo supor que você conhece o dono da propriedade — insistiu o advogado, na esperança de entender a razão de sua presença naquele lugar.

—Não estão... — murmurou — ... porra, não estão aqui! — exclamou. Repentinamente exaltado, golpeou com força a placa do interfone.

—Temos de ir embora — propôs Cristina, ao perceber que os motoristas dos veículos que circulavam pela estrada diminuíam a marcha para observá-los com certa desconfiança. —Estamos dentro de uma propriedade privada, discutindo e observando descaradamente o interior da casa. E isso não é o mais prudente para forasteiros como nós.

—Estive nesta casa nos últimos três dias... — alfinetou Leonardo de forma abrupta — e isso me concede certos privilégios. E mais, desejo resgatar meus pertences.

Agarrou-se às barras da cerca e fez um movimento para subir no muro de pedra, com o objetivo de saltar a grade. O advogado segurou-o pelo braço, antes que cometesse uma loucura.

—Conte isso à polícia, se passa por aqui e o surpreende do outro lado do muro — acrescentou Colmenares, farto de tanta conversa mole.

—Por favor, Leo... — suplicou Cristina — ...podemos voltar num melhor momento, não acha? Agora, você precisa mudar de roupa e fazer um belo asseio. Proponho que a gente se instale em um hotel, para descansar algumas horas, depois de um bom banho. Mas, antes, vamos parar em uma loja para lhe comprar uma camisa decente e uma calça do seu tamanho... — sorrindo irônica, acrescentou — ...não creio que o deixem entrar do jeito que está!

Leo reconheceu não estar preparado para continuar procurando Cláudia e Salvador. Cristina tinha razão. Deviam encontrar um lugar para descansar. Ele, pelo menos, precisava. Estava uma pilha de nervos e seus pensamentos eram cada vez mais erráticos.

Decidiram voltar a Múrcia e hospedar-se num hotel do centro. Mas, antes de entrar no veículo, Leonardo fez uma confidência em voz baixa:

—Querem saber onde passei a noite e o motivo de eu estar vestido dessa forma, digamos, tão ridícula?

Nicolas se surpreendeu com aquela mudança de atitude, mas logo recordou que ele havia prometido contar tudo quando estivessem em Santomera.

—Claro que estou curioso — reconheceu o advogado, apoiado na porta do carro.

—Como diria Iacobus de Cartago: eu desci aos infernos. E aqui tenho a prova disso... — tirou o pequeno DVD do bolso, mostrando-o, orgulhoso, como se fosse um troféu de caça — gravei o lugar onde se esconde o diário... Além disso, asseguro que sei como encontrá-lo.

Cristina, analisando a situação, olhou Colmenares com certo entusiasmo mal reprimido. Era evidente que Leonardo tinha algo importante para mostrar-lhes, talvez a prova inegável de que existia realmente uma história verdadeira atrás do delirante escrito de um pedreiro.


Lilith não entendeu nada. Estava observando à distância a chegada dos inesperados visitantes. Dos três, o que mais chamou sua atenção foi o homem vestido com calça de camuflagem e camiseta preta, justamente a pessoa que demonstrou claramente sua irritação ao encontrar a porta da casa fechada.

Deviam ser cúmplices do tal Leonardo e de seu amigo, o arquiteto; isso, se não fossem eles. Incomodada, inclinou a cabeça.

Ao ver que estavam indo embora, decidiu segui-los. Além disso, havia permanecido tempo demais ali e podia chamar a atenção do pessoal que começava a sair da venda para iniciar seu trabalho. Regressaram a Múrcia, algo que não a surpreendeu. Seguiu-os até Atalayas, onde a estrada estava engarrafada pelo grande fluxo de veículos em direção ao centro comercial da região. Depois de suportar uma fila interminável de carros, já com a paciência esgotada, viu-os virar à esquerda, para estacionar diante da entrada do hotel Rosa Victoria. Com cautela, parou vários metros atrás, junto a uma concessionária de carros. Pegou o telefone do bolso e fez de conta que estava falando com alguém.

Viu quando desceram do automóvel. Achou que iam entrar no hotel, mas eles ficaram parados na calçada para discutir algum assunto, provavelmente relacionado com a indumentária daquele extravagante indivíduo vestido à maneira militar, pois a mulher apontou várias vezes para a roupa dele. Depois de alguns minutos, os homens foram embora, deixando a mulher sozinha. Lilith se inclinou dissimuladamente no banco do passageiro, quando ambos passaram pela janela aberta de seu carro.

Voltou à posição anterior, mas continuou a observá-los pelo espelho retrovisor: eles se dirigiam aos grandes centros de compras.

Enquanto isso, a ruiva, vestida de forma discreta, porém elegante, acendeu um cigarro decidida a esperar o regresso deles em frente à porta de acesso à recepção do hotel. Lilith resolveu manter o celular ao ouvido, como se estivesse dando continuidade à suposta ligação, até que eles decidissem voltar. Passados uns vinte minutos, ali estavam, de novo. O mais jovem carregava umas sacolas com o logotipo do centro comercial, mas deviam estar acondicionando a roupa suja, pois ele agora estava vestido de maneira impecável: camisa azul, calça cinza e sapatos novos. Então, com um deles já transformado num ser civilizado, entraram todos juntos no hotel.

Lilith desceu do carro e foi até o de Nicolas, enquanto suas mãos buscavam no bolso da jaqueta um pequeno transmissor de freqüência que costumava levar consigo. Fez como se tivesse caído uma moeda no chão e agachou-se para pegá-la. Com rapidez, colocou o equipamento na parte traseira do automóvel, embaixo do chassi, de maneira que ficasse preso à chapa inferior, graças a um potentíssimo ímã que ficava instalado na base. Logo se levantou, regressando a seu carro.

A partir daquele momento, poderia controlar toda a movimentação deles.


CAPÍTULO 29

Depois de oito horas de viagem, o Talgo Barcelona-Múrcia chegava pontualmente à estação de Carmen. As portas se abriram entre silvos e apitos, provenientes de algum lugar incerto do trem. Os viajantes foram descendo dos vagões com certa lassidão, andando pela plataforma em busca da saída. Entre eles, Altar, que se misturou à massa humana que abandonava a ferrovia, fazendo parte do conjunto.

Dirigiu-se a um dos veículos de transporte público estacionados na porta. Perguntou ao taxista se podia levá-lo à Avenida Espinardo. O homem assentiu com um gesto cansado, depois de tirar o palito que segurava na boca. Em seguida, abriu a porta do automóvel num gesto de cortesia, pois, devido ao sotaque, compreendeu tratar-se de um estrangeiro, e os gringos, ele achava, costumavam ser generosos com as gorjetas.

Acomodado na parte de trás do carro, Altar abriu o computador e se esqueceu do motorista. O GPS incorporado ao notebook rastreou o plano da cidade até que surgiu na tela uma luz, de cor vermelha, piscando ao percorrer o labirinto de ruas e avenidas intermináveis que formavam a cidade de Múrcia. De acordo com o guia virtual, Lilith conduzia seu veículo pelos arredores de um centro comercial, situado no bairro de Atalayas. Surpreendeu-se que ela não estivesse no edifício onde havia passado a noite, algo que comprovou sistematicamente, a cada meia hora, o tempo que durou o trajeto desde Barcelona.

Pelo visto, Lilith havia levantado cedo com o propósito de realizar alguma tarefa própria do trabalho, talvez estivesse seguindo alguém. Aquilo, de certo modo, se ajustava a seu propósito. Ia dar uma olhada no lugar onde Lilith passou a noite, agora que ela não estava em casa. Desta forma, poderia traçar um plano de ataque-surpresa, eliminando riscos desnecessários. Lilith não era precisamente uma novata. Sabia se esquivar do perigo, como qualquer assassino de aluguel capaz de sobreviver em seu ofício. Um só deslize e, em vez de executor, ele seria a vítima.

Voltou a olhar a tela. Lilith estava parada na Avenida Del Rocio. E ali ficou sem se mover. Não pôde evitar um sorriso. Sua velha amiga havia passado de ícone de conduta, dentro da Corpsson, para engrossar a lista de vítimas internas da empresa. Não era a primeira nem seria a última a cometer o grave erro de atuar por conta própria. Essas irregularidades afetavam o bom funcionamento da Agência, razão pela qual, às vezes, era necessário tomar medidas drásticas e amputar, pela raiz, o membro gangrenado. Por isso, o melhor era acatar as ordens, com todo o rigor que merecia o trabalho.

Ninguém, senão um assassino de aluguel, sabia melhor o preço que devia pagar para continuar sobrevivendo por tempo indefinido.

Arantxa decidiu ficar em casa e não ir à aula. Havia passado mal à noite, por causa das cólicas menstruais — tinha sido impossível conciliar o sono até as cinco horas da madrugada. Então, quando estava em sono profundo, Mônica foi despertá-la para lhe dizer que a nova companheira de quarto havia saído bem cedo, deixando um recado pendurado na porta da geladeira.

Como resposta, emitiu um grunhido nervoso, para que a deixasse em paz e saísse de uma vez por todas para a aula. Logo estava dormindo outra vez, apesar do ruído incessante do tráfego que, pouco a pouco, ia se apropriando das ruas da cidade. Voltou a despertar, ao sentir uma dor intensa nos ovários. Decidiu se levantar para buscar um analgésico. Cruzou o apartamento de pijama e, ainda sonolenta, deslizou com dificuldade pelo corredor, bocejando zonza de sono. Nesse instante, ouviu o som da campainha. Como um autômato, dirigiu-se à porta para espiar através do olho mágico. Viu um indivíduo delgado e de tez pálida, muito bem vestido. Usava um paletó preto e uma camisa bege. Tinha um cabelo loiro platinado, penteado para trás, e os olhos azuis mesclados de verde, razão pela qual pensou que poderia ser um daqueles estrangeiros que, ultimamente, divulgavam pelas ruas de Múrcia uma nova doutrina denominada Cienciologia, uma espécie de seita de que tanto ouvira falar na televisão e também em conversas com suas amigas, e à qual pertenciam diversos atores famosos de Hollywood. No entanto, nada viu de estranho nas mãos dele, nem sequer panfletos de propaganda, e isso a convenceu de que estava equivocada. Não parecia um pregador e, menos ainda, um vendedor ambulante.

—Quem é? — perguntou antes de abrir.

—Sinto incomodar, mas procuro por uma garota alemã... — ouviu dizer num espanhol mal pronunciado — ... ela mora aí?

Arantxa lembrou-se da novata e do tal recado, aquele que não tinha tido oportunidade de ler. Tratou de se livrar do assunto.

—Não está... — lhe disse, do outro lado da porta — ...saiu de manhã, creio que foi até a universidade. Talvez venha comer, mas não estou certa disso.

Debruçou-se, novamente, para ver a reação do desconhecido.

—Puxa, que pena! — ele parecia contrariado. — Fiz uma viagem extenuante, de muitos quilômetros, para visitar minha irmã e agora terei que esperar que regresse da aula.

Altar não quis ser mais explícito, pois, na realidade, desconhecia a história que sua velha amiga poderia ter inventado. Optou pela prudência.

—Lilith é sua irmã? — inquiriu Arantxa, visivelmente surpresa.

—É isso que dizem nossos pais... — ele respondeu, de maneira sucinta e se pôs a rir inocentemente, para acrescentar: — ...desculpe, mas essa conversa é ridícula. Não sei se você se deu conta de que estamos falando com uma porta.

A jovem captou a mensagem. Afinal de contas, ele era um familiar da nova inquilina. Ademais, ele era bastante atraente e lhe pareceu da maior confiança.

—Um momento, vou abrir.

Girou a maçaneta e abriu. O homem assentiu com timidez, não por nada, mas, como Arantxa estava de pijama, ele supôs que tinha acordado a moça.

—Desculpe, talvez esse não seja o momento mais oportuno — começou dizendo —, mas preciso entrar em contato com Lilith o mais rápido possível. Você se importaria de entregar uma coisa para ela, quando estiver de volta?

O desconhecido se agachou. A jovem descobriu, naquele momento, que no chão repousava uma mala preta de viagem. Ele tirou, dali de dentro, uma caixinha de porcelana do tamanho de um maço de cigarros.

—É a caixa da sorte dela... — entregou-a, com timidez. — Pode dizer a ela que me telefone, assim que chegar? Não tenho para onde ir.

—Sim, claro... — titubeou uns segundos, vacilando entre deixado partir ou convidá-lo para ficar.

Finalmente decidiu não fazê-lo, a menos que ele lhe pedisse.

—Nossa, quase me esqueço! — ele levou as mãos à cabeça. — Acabo de me lembrar que mudei meu telefone celular e Lilith ainda não tem o número... — tirou uma caneta esferográfica do bolso interno do paletó. — Teria um papel à mão, ou um bloco de notas?

De forma instintiva, Arantxa virou a cabeça para dentro da casa. Olhou-o novamente, com um renovado interesse.

—Sim, espere... — disse com suavidade — ...no meu quarto deve ter um caderninho.

Sorriu antes de lhe dar as costas. Deixou a caixa de porcelana sobre a cômoda do vestíbulo e foi direto ao quarto.

Altar, por sua vez, olhou para ambos os lados, querendo certificar-se de que não havia ninguém mais no andar, nem subindo pelo elevador. Então, empurrou a mala com o pé, para introduzi-la de maneira sutil no corredor, e entrou na casa, sem fazer barulho. Depois, fechou a porta com cuidado, seguindo bem de perto a crédula Arantxa. Sem perder mais tempo, tirou do bolso do paletó um cabo de aço cujas extremidades terminavam em empunhaduras de marfim, entalhadas com motivos orientais. Segurou-as com força, para esticar o fio.

—Há algo que não entendo... — Arantxa começou a falar em voz alta, acreditando que ele a esperava na porta. — Como sabia onde vivíamos, se sua irmã se instalou ontem e você acaba de chegar de viagem?

Antes que se voltasse, como intuía que ela pensava fazer, Altar enrolou o pescoço da jovem com o cabo e apertou com firmeza, sem lhe dar tempo de reagir. Ao compreender o que estava acontecendo, Arantxa tentou escapar do agressor, sacudindo o corpo com força. Quis gritar, mas foi impossível. Então, em sua absoluta impotência, decidiu se agarrar ao cabo que comprimia cada vez mais sua garganta, mas a única coisa que conseguiu foi rasgar a pele do pescoço e quebrar uma unha, naquela desesperada tentativa.

Ao cabo de alguns segundos, o corpo de Arantxa estava totalmente imóvel. A execução terminou antes do previsto.

Altar se sentiu satisfeito.

Lilith regressou ao apartamento com a convicção de que tinha sob controle o grupo que estivera espreitando a propriedade. A primeira coisa que tinha pensado em fazer era entrar em contato com eles, sob algum pretexto, com o objetivo de ganhar a confiança deles. Para isso, seria necessário colocar alguns microfones e averiguar qual era a relação deles com o dono do lugar, sobretudo para que pudesse inventar uma história que a incluísse diretamente. Na realidade, porém, não sabia onde colocá-los, já que atuar num local público, como era o hotel, tinha seus riscos. E ela era muito comedida em seu trabalho para cometer um erro dessa envergadura.

Finalmente, descartou a idéia dos microfones. Melhor seria utilizar um disfarce, para espioná-los de perto e escutar sua conversa.

Deixou seus pensamentos de lado, para estacionar o carro a uma centena de metros de onde ia viver uma temporada com duas diabinhas de hormônios inquietos. Uma vez dentro do edifício, pegou o elevador, enquanto procurava na bolsa as chaves que Mônica tinha lhe emprestado depois do pagamento adiantado de um mês de aluguel. Tão logo as encontrou, a porta se abriu automaticamente. Então, percebeu um aroma vagamente familiar, uma fragrância masculina que havia sentido antes em algum outro lugar. Durante uns segundos ficou paralisada, procurando ansiosa no baú de sua memória.

As portas do elevador se fecharam novamente, pois havia transcorrido o tempo máximo de segurança, quando ela colocou as mãos no vão e elas se abriram novamente. Saiu, com os cinco sentidos à flor da pele. Teve um mau pressentimento.

E quando ela tinha uma intuição por alguma coisa tão insignificante como um perfume, era porque sua vida poderia estar em perigo.

Colocou a chave na fechadura, girando-a com cuidado para não fazer barulho. Não parecia ter sido forçada. Ainda assim, decidiu não baixar a guarda, até que estivesse dentro de casa e inspecionasse todos os cômodos. Entrou em silêncio, esgueirando-se pela estreita abertura da porta apenas entreaberta, procurando evitar qualquer tipo de ruído que delatasse sua presença no interior da casa. Segundos depois, deslizou sigilosamente pelo corredor.

Novamente aquele aroma.

Desta vez, muito mais forte do que antes. Era o perfume favorito de alguém que conhecia muito bem, estava certa disso. Tratou de recordar quem usava aquela fragrância tão peculiar, mas sua memória teimava em contrariá-la.

Era como quando você tem o nome de uma pessoa na ponta da língua e não consegue lembrar, por mais que se esforce.

Então, viu algo que chamou sua atenção, um detalhe sem importância, mas que evidenciava sua mais terrível suspeita: no piso de cerâmica havia um brilho de água sem secar, e, no ambiente, um ligeiro odor de desinfetante. Não fazia muito tempo que haviam limpado o chão do corredor, e, pelo visto, com bastante profissionalismo, esforço demasiado para qualquer uma daquelas duas preguiçosas.

Tanta eficácia não fez senão deixá-la ainda mais prevenida. Ali dentro estava ocorrendo algo estranho. Seus sensores de advertência lhe indicavam, aos berros, que tivesse cuidado, porque uma limpeza daquele tipo não podia indicar nada de bom. Em seu trabalho era bastante habitual limpar os rastros de sangue com amoníaco para confundir ao máximo a polícia científica, e aquilo tinha todos os indícios de ser o resultado de um excelente trabalho.

Sem perder a calma, agachou-se para tirar uma faca que levava escondida no interior de suas botas. Empunhou-a com força, enquanto esquadrinhava tudo ao seu redor, assegurando-se de que ninguém pudesse surgir de repente de algum dos cômodos. Seu quarto era muito próximo do vestíbulo.

Seria o primeiro a inspecionar.

Girou a fechadura da porta e abriu muito lentamente.

Tudo estava como ela havia deixado naquela mesma manhã. Voltou a agachar-se, desta vez para certificar-se de que não havia ninguém embaixo da cama. Foi até o armário e tirou, de dentro da primeira gaveta, sua pistola automática alemã, guardando-a na parte de trás de sua calça, depois de enroscar o silenciador.

Saiu novamente para o corredor. Revistou também o banheiro, a cozinha e a sala de estar, assegurando-se de que estava sozinha no apartamento e que tudo aquilo era um alarme falso, provocado por uma premonição sem fundamento. O aroma de um perfume não era tão determinante quanto acreditava, já que o uso de um produto comercializado não tinha caráter privativo. Podia ser de um amigo das inquilinas, que tivesse visitado uma delas naquela mesma manhã, depois que ela saíra.

Não obstante, seu sexto sentido lhe disse mais uma vez que continuasse alerta. Apesar de haver somente mais dois cômodos para revistar, ainda era muito prematuro ficar confiante.

Entrou com cuidado no quarto de Mônica. Alguém havia fechado completamente as janelas e não dava para ver nada. Aguardou alguns segundos, até que seus olhos se acostumassem com a escuridão. Aos poucos, pareceu ver a silhueta da cama em frente ao armário embutido, uma mesa de escritório e uma poltrona do outro lado do dormitório.

Foi até os pés da cama, ao intuir uma sombra indeterminada embaixo do colchão. Não precisou agachar-se. Via-se parte da sola de um dos sapatos. Então, voltou a sentir por todo o cômodo o aroma fresco daquela fragrância que tanto a obcecava. Desta vez, porém, foi diferente. Lembrou do indivíduo que usava aquele perfume tão particularmente caro e exclusivo: seu velho amigo Altar Leroy, conhecido no círculo de assassinos de São Paulo como O Estrangulador de Toronto, o homem encarregado de executar os profissionais que punham em risco a confiabilidade da Agência.

Estava prestes a pegar a pistola que escondera, entre as costas e a calça, com a finalidade de acabar ali mesmo com a vida de seu inimigo antes que ele se adiantasse, quando escutou um som débil e imperceptível às suas costas. Foi muito mais uma vibração acústica que pôs em guarda seu mecanismo de sobrevivência. Alguém havia saído de dentro do armário, com a disposição de atacá-la por trás, sem saber que ela tinha a vantagem de conhecer de antemão a arma favorita de seu agressor e como era o seu letal modus operandi.

Sem perder tempo, levantou a mão que segurava o facão, alcançando a tempo o cabo de aço que, de forma implacável, pairava como uma ameaça ao redor de sua garganta. Isso fez com que ele se esticasse, em tensão máxima, mas sem entrar em contato com a pele dela. Cedeu pouco depois, quando a lâmina afiada da faca finalmente rompeu o fio. Então, ficou livre para se mexer. Numa fração de segundo, Lilith girou a empunhadura da arma, ao mesmo tempo que desferia um golpe seco para trás. A faca foi cravada no ventre de seu agressor, que gemeu de surpresa ao sentir na carne a frieza do aço. Ela se virou e, fitando-o nos olhos, sacou a automática detrás da calça colocando-a em sua testa.

—Lilith...! — murmurou o canadense, enquanto sua boca expelia um primeiro vômito de sangue.

—Adeus, Altar — ela respondeu, glacial.

A jovem soltou a trava de segurança e apertou o gatilho.

A quantidade de material orgânico que brotou da parte de trás de sua cabeça, com o impacto, fez mais barulho do que o som amortecido da pistola. O infeliz caiu ao chão como um fantoche sem fios. Um líquido sanguinolento e espesso, que saía do buraco em seu crânio, formou uma mancha cada vez maior no chão.

Em seguida, Lilith agachou-se para ver quem estava escondido embaixo da cama. Arrastou o corpo até que estivesse todo para fora, descobrindo que era Arantxa, e não Mônica, como pensara, quem havia tido a má sorte de encontrar-se cara a cara com Altar. Havia sido estrangulada com um cabo de aço. Ainda era possível ver o sangue pisado ao redor do pescoço dela. Se tivesse apertado um pouco mais, ele a teria decapitado.

— Arantxa...? — escutou a voz de Mônica, sobressaltada, aproximando-se pelo corredor. — Amiga... posso saber por que a porta está aberta?

Lilith se colocou em pé, imediatamente, escondendo-se atrás da porta do quarto. Nem sequer teve tempo de ocultar os corpos.

Mônica entrou no quarto, tateando à procura do interruptor. Finalmente acendeu a luz e o que viu a deixou atônita. Sua mente foi incapaz de assimilar o dantesco espetáculo que se descortinava diante de seus olhos. Ia gritar quando uma mão segurou com força sua testa, com o propósito de puxá-la para trás, levantando seu queixo. Então sentiu que lhe abriam a garganta com um talho, e como a vida lhe escapava através do corte. Afogou-se em seu próprio sangue, tentando respirar.

Finalizada a rápida execução, Lilith se dirigiu ao banheiro para lavar minuciosamente as mãos e a faca. Depois foi até seu quarto, recolheu seus pertences e, depois de fechar a porta com a chave, abandonou o apartamento com a terrível sensação de ter se transformado, durante uns minutos, em uma de suas vítimas.

A Agência havia decidido pela sua eliminação. A partir de agora teria que maximizar as medidas de segurança.

A situação era inconcebível.



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