...
À
(
IN
)
TENSA
RECEPÇÃO
LITERÁRIA
A figura do herói nacional, principalmente a de Agostinho Neto, sacraliza-
se, de maneira consolidada, em registros escritos angolanos – não só literários –,
desde o período das lutas de libertação. Além de inúmeras exaltações à África-Mãe e
ao povo angolano, muitos são os textos em que a referência aos grandes feitos de
vultos históricos se faz presente.
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Imediatamente após a independência, Pepetela publica, em 1978, aquela
que é considerada a primeira peça de teatro angolana, intitulada “A corda”. A partir
da metáfora do cabo-de-guerra, o autor traz à cena as relações político-partidárias às
vésperas da independência, com o fim maior de enaltecer e/ou denegrir o desempe-
nho de alguns vultos históricos durante as lutas de libertação. O texto, repetindo os
conclames do MPLA, assim se encerra:
(Ouve-se de novo o ngoma e os chocalhos
O Likishi abraça os combatentes. Dançam
Todos juntos.)
COMBATENTES E LIKISHI (de braços erguidos, dançando):
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Em consulta à página do Angola Press, veículo oficial do governo angolano na Internet, tive a oportunidade de
constatar, uma vez mais, a exagerada tendência oficial, em Angola, à sacralização de Agostinho Neto, com o
lançamento do segundo tomo do ensaio biográfico sobre o poeta/político, no quadro dos festejos do 44
º
aniver-
sário do MPLA (10 de dezembro), que se encontra à venda na sede nacional do partido maioritário. A obra,
elaborada pelo centro de documentação e investigação histórica do comité central (CDIH/CC) do MPLA,
abarca o período entre 1952 e 1959 e narra as circunstâncias das duas primeiras prisões a que Agostinho Neto
foi submetido pela então polícia política portuguesa “Pide-DGS” (p. 1 e 2).
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Por isso, menciono apenas algumas situações literárias, mais a título de exemplificação do que de hierarquiza-
ção das mesmas em relação às não mencionadas.
Iris Maria da Costa Amâncio
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SCRIPTA, Belo Horizonte, v. 6, n. 12, p. 309-326, 1º sem. 2003
UM SÓ POVO,
UMA SÓ NAÇÃO!
(Cai o pano.)
Fevereiro de 1976. (Pepetela, 1978, p. 49)
Fernando Costa Andrade, por sua vez, lança poemas em O caderno dos
heróis (1977), por meio dos quais exalta continuamente os heróis da independência.
Todavia, foi pela dramaturgia que tal postura do autor adquiriu maior relevância na
época, com a publicação de No velho ninguém toca (1979). Ndunduma, nome ado-
tado pelo autor, faz uma apologia a Jika e ao povo angolano:
Jika pertence a Henda
a Che Guevara
pertence aos escolhidos definitiva-
[mente
pela unânime inteligência
da renovação da vida.(...)
Jika
é a labareda
e a manhã
a chuva e o germinar.
É fevereiro
e é novembro
Jika é o fogo
Ardendo
Sempre!
O ngoma bate forte e todos os figurantes, à excepção do n. 1, entram na roda do
makopo e dançam com entusiasmo. Cinco minutos. Cai o pano lentamente.
Luanda, abril de 1978. (Andrade, 1979, p. 51)
No prefácio a No velho ninguém toca, Basil Davidson afirma que a peça
“é um hino a Angola, animado pela coragem e pela confiança daqueles que se detêm
para contemplar o caminho já percorrido, e o caminho que agora tem de ser percor-
rido...” (Andrade, 1979, p. 9).
Em Foi esperança e foi certeza (1979), Maria Eugénia Neto homenageia
os heróis angolanos na maioria de seus poemas, dentre os quais destaco “Os heróis
de quatro de fevereiro”:
Nós avançaremos
Com a força indomável da nossa vontade
Com o amor pelo nosso Povo.
Dar-es-Salaam, 4/2/1969 (1979, p. 25)
e o “Poema para Henda”:
Tu deste alicerces a este mundo novo
Onde o MPLA avançará com todo o povo
SCRIPTA, Belo Horizonte, v. 6, n. 12, p. 309-326, 1º sem. 2003
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A
QUELE
POR
QUEM
SE
ESPERA
:
A
TENSA
RECEPÇÃO
LITERÁRIA
DO
DISCURSO
...
Ó filho muito querido do solo angolano
Comandante Henda – Herói Africano
Tanzânia, 5/3/1969 (1979, p. 28)
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