O paraíso é aqui



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CAPITULO IX

A entrevista com Christopher Freeman foi pré-gravada na terça-feira, para ser exibida na noite seguinte. Com o máximo de delicadeza, Clara re­jeitou o convite que ele lhe fizera para jantar, mas Freeman não era do tipo que desistia facilmente. Por fim, ela se vira forçada a aceitar por motivos profissionais.

— Jantaremos no hotel onde estou hospedado — avisou ele. Clara sabia que o hotel era um dos mais luxuosos da cidade. Pensado bem, talvez não fosse tanto sacrifício as­sim... Mas Gabriel não teve a mesma opinião.

— Poderia ter usado alguma desculpa para dispensá-lo — disse ele, com ar de censura.

— Veja pelo outro lado, Gabriel. Quando se perde algo, ganha-se outra coisa.

— Espero que não estejamos falando de virgindade. Ela estreitou o olhar.

— Você é mesmo terrível.

— Que culpa tenho eu, se não gosto do sujeito? Onde vocês irão jantar?

— No hotel Waverley.

— Onde ele está hospedado? — Ele arqueou uma sobran­celha. — E o que você vai vestir?

Foi a vez de Clara arquear as sobrancelhas.

— Não pensei que se interessasse por moda feminina.

— Eu me interesso pelo que você veste.

— Tudo bem. Estou pensando em usar um vestido preto fechado por um único botão em formato de brilhante, acima do decote.

— Isso não vai facilitar as coisas demais para ele?

— Gabriel, quantas vezes preciso dizer que sei me cuidar?

— Tudo bem. Tome cuidado, Clara.

— Ora, não vai me dizer "divirta-se"?

— Para você se divertir, eu teria de estar por perto. Clara riu e se dirigiu à porta do escritório.

— Oh, eu te amo, sr. McGuire! — exclamou e soprou um beijo para ele.

Gabriel ficou algum tempo olhando para a porta fechada. Se pelo menos aquilo fosse verdade...

Clara conteve o fôlego ao observar o luxo do saguão do hotel Waverley.

— Srta. Cavanagh? — O homem alto e elegante se apre­sentou como Dominic Collins, gerente do hotel. — O sr. Freeman me pediu para acompanhá-la até a suite dele.

Clara franziu o cenho.

— Ele não vai me encontrar no restaurante do hotel? O gerente pareceu surpreso.

— O sr. Freeman pediu que o jantar fosse servido na suite. Eu mesmo providenciei tudo. Não ficará desapontada, srta. Cavanagh.

"Não tenho tanta certeza disso", pensou Clara.

Freeman abriu a porta logo depois do primeiro toque. Olhou Clara de alto a baixo, com ar de admiração. Adorava ruivas vestidas de preto.

— Clara, você está linda. Entre. Achei que seria mais confortável jantarmos na minha suite, para não ficarmos sendo observados por curiosos. Espero que não se importe.

Ela forçou um sorriso e entrou, observando o aposento com cautela. A única saída que havia no lugar era a sacada, a doze andares do chão.

— Obrigado, Collins — ele agradeceu ao gerente. — Cha­marei se precisar de alguma coisa.

— Sente-se e relaxe, Clara. Espero que McGuire não te­nha ficado aborrecido por você ter vindo jantar comigo.

Ela sorriu.

— Ele sabe que você é um cavalheiro, Christopher. Ele também sorriu, servindo duas taças de champanhe.

Em seguida, entregou uma a ela.

O jantar foi maravilhoso, com iguarias variadas e de sa­bores exóticos. Embora estivesse gostando, durante todo o tempo Clara se manteve alerta.

— Vamos tomar o café na sacada — sugeriu Freeman quando terminaram a refeição. — A noite está muito bonita.

Ele tinha razão. Ao chegar à sacada, Clara ficou encan­tada com a beleza das luzes da cidade. Imaginou o que Gabriel estaria fazendo naquele momento.

— Clara? — Freeman se aproximou por trás dela. — No que está pensando?

— Oh, estou apenas admirando a vista.

Ela ficou apreensiva ao sentir a mão dele em sua cintura.

— Não sei se já percebeu, Clara. Mas acho que estou apaixonado por você.

"Oh, Deus, como fui me meter nisso?", ela se censurou.

— Aposto que diz isso a todas as mulheres que vêm jantar com você, Christopher.

Mantenha a calma. Isso é muito importante agora. Clara franziu o cenho. Teria mesmo ouvido aquela voz novamente?

— Tem razão. — Freeman sorriu. — Mas dessa vez estou falando sério.

— Pensei que fosse me falar sobre seu contrato com a Avalon Mercer.

— Quer falar de negócios em uma noite como essa?

Christopher, não quero magoá-lo. Agradeço por haver me dado aquela entrevista exclusiva, mas espero que não me cobre algum pagamento por isso. Não irei para a cama com você assim, sem que haja nada entre nós.

Pela primeira vez, ele pareceu chocado com algo que ela dissera.

— Clara, está sugerindo que deveríamos nos casar primeiro?

Ela arregalou os olhos.

— Isso nem me passou pela mente!

— Confesse que passou. Sei que sou considerado um ótimo partido.

— Não quero estragar nossa amizade com essas coisas, Christopher, Está sendo um prazer jantar com você, mas não espero nada além disso.

Ela fez menção de se afastar, mas Freeman puxou-a para si de repente.

— Talvez esteja precisando de algum incentivo...

Clara teve de resistir à vontade de esbofeteá-lo e acabar com aquele sorriso cínico.

— Tudo será maravilhoso se você relaxar — garantiu ele, com um tom de voz que a deixou nauseada.

— Christopher, pare com isso, por favor.

Freeman sorriu, não parecendo convencido de que ela estava falando sério. Fazia tempo demais que ele não era rejeitado por uma mulher, e não seria uma repórter qual­quer que o faria.

— Bem, se você prefere bancar a difícil...

— Não é nada disso! Preciso ir embora.

Para mostrar que estava falando sério, ela se desvenci­lhou dos braços dele, preparando-se para uma fuga deses­perada. Sabia exatamente onde deixara sua bolsa, portanto, não teria maiores problemas em ser rápida.

Freeman achou que aquela tática não daria certo com ela. Pensando em usar outra, adiantou-se com um movi­mento brusco e tentou agarrá-la. De súbito, ouviu um ruído de algo caindo no chão. Era o botão que fechava o decote do vestido de Clara.

Então, várias coisas aconteceram ao mesmo tempo. Free­man tentou agarrá-la novamente, já que o primeiro empe­cilho já havia sido eliminado. Ela gritou, tentando se soltar, mas ele era forte demais e a manteve prisioneira.

De súbito, ouviram uma forte batida à porta.

— Quem diabos será? — Freeman se aborreceu.

Clara tentava se soltar e unir as duas partes de seu decote que haviam se separado com a perda do botão. Sa­bendo que só poderia ser Gabriel à porta, ela se livrou de Freeman e correu para abri-la.

— Oh, Gabriel, eu sabia que era você! — gritou, aliviada ao vê-lo.

— O que está acontecendo aqui? —perguntou ele, alar­mado ao ver os seios de Clara cobertos apenas por um sutiã de renda preta.

Não entendia direito como fora parar ali. Lembrava-se de estar em seu apartamento, assistindo a um filme de Humphrey Bogart, quando ouvira aquela voz familiar lhe dizer: Clara está precisando de você!

Saíra no mesmo instante e fora direto para o hotel Waverly, disposto a ensinar uma lição a Freeman, se fosse preciso. E, pelo visto, seria.

Fazendo um sinal para Clara ficar de lado, avançou em direção a Freeman, furioso. Em uma atitude quase infantil, Freeman foi para trás da mesa, usando-a como escudo.

— Gabriel, ele não fez nada! — gritou ela, com receio de que ele acabasse agredindo Freeman.

— Não?! — Gabriel franziu o cenho.

— Deixe-a explicar, McGuire — pediu Freeman. Clara respirou fundo.

— Perdi o botão do vestido, só isso. Sei que é embaraçoso, mas acho que ele não estava bem preso.

— Acha que sou algum idiota, Clara?

— É a verdade, Gabriel.

Ele fez menção de se aproximar de Freeman, mas ela se adiantou e segurou-o pelo braço.

— Solte-me, Clara. Preciso ensinar uma lição a esse sujeito.

— Não é preciso — insistiu ela. — Precisamos conversar. Deixe-me apenas tentar consertar o botão.

— Vi uma caixa de costura naquela gaveta — avisou Free­man, com ar prestativo, apontando uma espécie de cômoda. — É compreensível que tenha entendido mal o que viu, McGui­re. Mas não. consigo entender por que veio até aqui.

— Eu... recebi um chamado — emendou Gabriel.

— É mesmo? — Freeman não pareceu muito convencido.

— Por que esse acesso de fúria? Tem algum compromisso com Clara?

— Tomar conta dela tem se tornado parte do meu trabalho — explicou Gabriel.

— Foi tudo um grande engano. — Clara forçou um sorriso, improvisando um nó nas duas partes do decote.

— Estou chocado que tenha pensado qualquer outra coisa

— Freeman disse a Gabriel. — Tenho muito carinho por Clara. — Respirou fundo. — Cheguei até a pedi-la em ca­samento — mentiu.

Gabriel riu com ironia.

— Isso é verdade, Clara?

—Acho que tudo isso não passa de um grande mal-entendido. Christopher, obrigada pelo jantar, mas precisamos ir embora.

— Foi um prazer conhecê-la, Clara. Não sei se posso dizer o mesmo de você, McGuire. De qualquer modo, terei de voltar para Nova York no fim de semana.

Bon voyage — ironizou Gabriel.

Clara ficou apreensiva quando ele não disse nada no ca­minho até o carro. Somente depois de estarem no confortável interior do Jaguar, foi que ele falou:

— Quer me contar a verdadeira versão dessa história?

— Acho que já contei. Agora é você quem me deve uma explicação. Que história foi aquela de receber um chamado? Eu não telefonei para você.

— Que diferença isso faz? — Ele deu de ombros. — Che­guei quando você estava em apuros, e é isso que importa. Não foi muito sensato da sua parte usar aquele vestido.

— Eu queria parecer sofisticada, só isso.

— Então poderia pelo menos estar usando algo menos provocante por baixo do vestido. Renda preta deixa qualquer homem maluco, ainda mais se ele já tiver tendências insa­nas, como Freeman.

— Não vamos mais falar nisso, está bem? Não me lem­bro de haver pedido que viesse me salvar, mas obrigada mesmo assim.

Quando chegaram à casa dela, Gabriel fez questão de acom­panhá-la e de verificar se as janelas estavam bem fechadas.

— Não sei o que seria de mim sem você — zombou ela. — O que faria se alguém surgisse atrás da cortina?

— Não faria nada — respondeu ele, sem hesitar. — Dei­xaria tudo por sua conta.

Ela riu.

— Quer um pouco de café?

— Não consegue pensar em outra coisa?

— O que está insinuando com isso? — perguntou Clara. Deus, como Gabriel estava lindo com aquela camisa marrom e a calça bege. Notou que os cabelos dele haviam crescido um pouco, mas se mantinham ajeitados em leves ondas sedosas.

— Por que está me olhando desse jeito? — perguntou ele, com um ar defensivo.

— Que mal há nisso? É um homem muito atraente.

— Ah, está querendo dizer que levou todo esse tempo para descobrir isso.

— Não. Mas pensei que homens morenos não fizessem o meu tipo.

— E qual é o seu tipo?

— Estou olhando para ele —- respondeu ela, observando algo além dele.

Surpreso, Gabriel olhou na mesma direção que ela. Avis­tou a foto do pai dela na estante. Na verdade, havia várias fotos antigas da família.

Gabriel se aproximou da estante e observou com mais atenção aquela que mostrava o pai de Clara. Um homem na casa dos quarenta anos de idade, com cabelos castanhos e olhos acinzentados,

— O nome dele era Peter — explicou ela, aproximando-se também. — Uma ótima pessoa, de quem guardo muitas recordações boas. Estava no auge da carreira de médico quando morreu.

— O universo está imerso em um jogo que não compreen­demos, Clara. — Após um momento de silêncio, Gabriel perguntou: — Quando trará sua mãe para casa?

— Talvez no fim de semana — respondeu ela, indo para a cozinha.

Gabriel a seguiu.

— Também estou pensando em ver minha mãe.

— Por que não a traz para nos visitar? Ela e sua tia — sugeriu Clara.

— Sempre quero fazer isso. O difícil é minha mãe con­cordar. Mas vamos deixar esse assunto de lado, sim?

— Sinto muito, Gabriel. Sei que assuntos ligados à família às vezes são difíceis. Mas pode contar comigo, se precisar.

Ele se aproximou, pousando as mãos na cintura dela. Fitando-a nos olhos, disse:

— Sabe de uma coisa, Clara? Se eu não for embora agora, acabarei fazendo amor com você.

Clara também o desejava mais do que tudo. Estava can­sada de viver sozinha, sem alguém para amar e para com­partilhar seus momentos de alegria e de tristeza. O que sentia por Gabriel era algo novo e intenso demais para ser contido por uma mera amizade.

Ciente disso, abraçou-o com força, deixando-se ficar com o rosto aninhado naquele peito protetor.

— Clara?

— Não vá embora. Fique aqui comigo.

— Não sei se posso.

Ela levantou o rosto para ele. — Terei de levá-lo para meu quarto?

— Clara, isso é sério. Eu a desejo mais do que tudo no mundo, e se começar a fazer amor com você não haverá mais volta.

— Não precisa me tratar como se eu fosse feita de cristal, Gabriel. Eu também te quero, e estou muito ciente disso.

— Então está bem.

Clara ouviu a porta da frente ser aberta e fechada, como se alguém houvesse saído da casa.

— Você ouviu isso? — perguntou a ele.

— O quê?


— A porta da sala.

Os dois foram até lá, mas tudo parecia perfeitamente tranqüilo. De fato, tranqüilo até demais. Perfeito para o amor.

Na penumbra do quarto, Gabriel a despiu devagar en­quanto beijava e acariciava Clara com infinito carinho. Pen­sou que ela ficaria receosa, por ser a primeira vez, mas Clara se mostrou ansiosa para se entregar ao amor. Ela confiava nele e isso era essencial para Gabriel.

Ele seria o primeiro amor da vida dela e nada mudaria isso dali em diante. Queria que fosse perfeito para Clara, para que toda vez que ela se lembrasse daquele momento, um sorriso sonhador surgisse em seus lábios.

O luar atravessou a fresta da cortina entreaberta, ilu­minando o quarto com um etéreo brilho prateado.

"Se eu viver cem anos, a lembrança desse dia seguirá co­migo", pensou Clara, enquanto se entregava ao calor dos braços de Gabriel. As mãos experientes lhe despertaram ondas de desejo que ela não imaginava que fosse capaz de sentir.

Quando seus corpos nus finalmente se encontraram em um abraço íntimo, a dança do amor os conduziu pelo cami­nho do êxtase. A certa altura, Clara sentiu como se seu corpo fosse a corda tencionada de um instrumento, prestes a participar da harmonia de uma linda música.

No momento em que aquele instante mágico finalmente aconteceu, as ondas de prazer que se espalharam por seu corpo se assemelharam ao ápice da canção. Ouviu Gabriel chamar seu nome, como se ele fizesse parte daquela música que soava tão divina em seus ouvidos. Seria aquela a canção dos amantes?

Se houve alguma resposta ao seu questionamento, Clara não chegou a ouvi-la. Estava ocupada demais, nos braços de seu grande amor.

CAPÍTULO X

Delia Cavanagh voltou para casa em uma linda manhã ensolarada. Gabriel promete­ra visitá-las à tarde. Sabia que aquele momento era muito importante para Clara e não queria se intrometer.

Quando as duas entraram na casa, Delia olhou demora­damente ao redor, ciente de que não teria mais a companhia do marido e do filho. Apesar disso, continuava muito serena e isso também deixou Clara com uma sensação de paz. En­quanto andavam pela casa, tinha a impressão de que Peter e Timothy estavam acompanhando-as em espírito.

Passaram um bom tempo no jardim. Algumas flores haviam desabrochado nos últimos dias, em uma espécie de saudação à nova moradora. Delia ficou encantada com a beleza do jardim e com o zelo com que Clara o havia conservado.

— Oh, querida, senti tanto sua falta! — exclamou ela, enlaçando a mão pela cintura de Clara. — Manteve tudo tão lindo! Como conseguiu isso ocupada com tanto trabalho?

Clara sorriu.

— Bem, na verdade, nem eu mesma sei. Contratei um jardineiro para cuidar do jardim uma vez por semana, e eu cuido da casa quando tenho tempo, nos fins de semana.

— Vamos entrar, querida? Estou morrendo de vontade de tomar uma xícara de chá.

— Sim, claro.

As duas entraram novamente em casa, felizes com a pers­pectiva da nova vida que se iniciava.

Durante os dias que se seguiram, Clara sentiu-se grata aos céus por sua mãe estar se recuperando tão bem. Ficou ainda mais feliz ao saber que alguns amigos iriam visitá-la.

Delia e o marido, na época um médico talentoso, haviam feito muitas amizades. As pessoas haviam ficado abaladas com o que acontecera após o acidente, mas à notícia de que ela se recuperara deixara todos animados e ansiosos para revê-la.

Clara, por sua vez, passou a semana seguinte se prepa­rando para a visita anual dos jornalistas ao hipódromo mais famoso da Austrália, marcada para o sábado. Algumas pes­soas da imprensa haviam sido convidadas, incluindo ela e Gabriel. Por ser uma repórter conhecida em todo o país, sabia que deveria aparecer o mais elegante possível no even­to. Porém, o detalhe interessante era que a BTQ8 estaria pagando os gastos com sua roupa.

Foi a uma butique ver o que lhe ficaria bem, mas acabou ficando em dúvida entre dois lindos modelos de tailleur es­tilizados. Um era branco com detalhes em preto, e o outro cor-de-rosa com botões dourados. Ambos era acompanhados por chapéus e sapatos combinando.

As roupas lhe caíram tão bem, que até mesmo as ven­dedoras ficaram em dúvida sobre qual delas seria melhor Clara escolher.

— Pedirei a opinião do meu chefe — disse ela. — Ele tem um gosto excelente para roupas e quer que eu esteja muito elegante na ocasião.

Porém, Clara não conseguiu falar com Gabriel durante o dia inteiro. Segundo ficou sabendo, ele tivera uma longa reunião com dois influentes industriais americanos, que o haviam conhecido quando ele estivera em Washington.

— Gabriel se destacou muito quando esteve por lá — disse Jennifer, de pé, diante da mesa de Clara. — Ele me disse que adorou a época em que esteve nos Estados Unidos, e que aprendeu muito do que sabe com os jornalistas de lá.

— E mesmo assim preferiu vir trabalhar na Austrália?

— Sim, ele gosta muito daqui — confirmou Jennifer. — Mas você já deve ter notado que Gabriel não está usando todo o potencial que tem.

— É verdade. Com tanto talento profissional, ele já de­veria ter seu próprio canal jornalístico.

— Talvez algum americano reconheça isso e acabe chamando-o para ter algo mais "sólido" nos Estados Unidos, quem sabe? — Jennifer supôs. — Não ficaria surpresa se recebêssemos essa notícia. Portanto, tome cuidado para não ficar envolvida demais com ele, Clara -— acrescentou ela, com um sorriso falso. — Fique contente ao saber sobre a recuperação de sua mãe. Claro que não iria querer deixá-la para ir morar nos Estados Unidos, não é?

Não, não teria coragem de fazer isso, concluiu Clara, quando Jennifer se retirou. Sua mãe estava ganhando mais força e disposição a cada dia, embora Clara desconfiasse que houvesse restado algumas seqüelas. Delia continuava dizendo que conversava com Timothy.

Mas quem era ela para criticar a mãe, se também andava ouvindo "vozes" de vez em quando?

Ao longo da semana, várias pessoas abordaram Clara para perguntar sobre sua mãe e para lhe contar detalhes sobre os visitantes de Gabriel.

— Espero que não estejam tentando convencê-lo a voltar para os Estados Unidos.— disse Bob, em um dos encontros para um café, no corredor. — McGuire é o melhor chefe que já tive. Precisamos de alguém com pulso firme por aqui, e ele é a pessoa certa. Demorou algum tempo para nos acostumarmos com ele, depois da morosidade de Clive, mas agora estamos indo de vento em popa. Até mesmo você já se acostumou com ele, Clara.

Ela assentiu, sem conseguir falar ao sentir um nó na garganta.

— Ele é atraente aos olhos das mulheres e pode acabar indo para a frente das câmaras, se os americanos o con­vencerem a tentar. Se McGuire aceitar, tenho certeza de que acabará se dando bem.

— Logo saberemos, Bob — falou Clara, olhando na direção da sala de Gabriel. — A propósito, eu gostaria de lhe perguntar sobre o passeio do sábado. Vão mesmo filmar e fo­tografar todo o evento?

— Sim, por quê?

— Porque preciso ter certeza de que estarei elegante o suficiente. Aliás, poderia me ajudar, dando uma opinião sobre minha roupa.

Bob arqueou as sobrancelhas.

— Clara, não poderia escolher outra pessoa para fazer isso? Mas tudo bem, darei minha opinião.

— Estou em dúvida entre um tailleur branco e outro cor-de-rosa.

— Tenho certeza de que você ficará linda com qualquer um deles. — Ele fez menção de se retirar, mas parou um instante. — Jen não foi convidada dessa vez. Ela foi eleita a mais elegante da festa nos últimos anos.

— Eu sei. — Clara suspirou. — Sei que ela está magoada, mas não posso fazer nada se fui convidada para ir no lugar dela, Bob.

— Jen é talentosa, mas não tanto quanto você. Lamento que ela a esteja atacando com palavras ultimamente. Jen não está conseguindo disfarçar a inveja de você.

— Não deve estar sendo fácil para ela — disse Clara, em um tom compreensivo. — A única coisa que me deixa aliviada é ter a certeza de que nunca prejudiquei ninguém para que meu talento fosse reconhecido. Eu nunca teria coragem de fazer isso.

— Eu sei, querida.

No final da tarde, Clara recebeu um recado para ir à sala de Gabriel. Ao chegar lá, sentou-se diante dele e esperou que ele falasse. Quando estavam na empresa, Gabriel nem parecia o mesmo homem que a havia amado com tanto ardor naquela noite.

Ali, ele era McGuire, seu chefe e o jornalista que coman­dava o BTQ8, tornando-o um dos canais de televisão mais bem-sucedidos do país.

Gabriel estava examinando uma página impressa. Pare­cia muito concentrado no que estava lendo, mantendo o cenho franzido enquanto fazia algumas anotações.

Quando finalmente olhou para ela, mostrou um sorriso que deixou Clara sem fôlego.

— Tudo bem com você?

— Sim. — Achando melhor manter o ar profissional, ela continuou: — Consegui fazer uma rápida entrevista com Elle Macpherson, antes de ela começar a fazer a divulgação do novo filme que fez para o cinema. Depois conversei com George Clooney. Deve haver pelo menos uma centena de jornalistas de televisão, rádio e jornais tentando obter uma entrevista com eles.

— Está brincando!

— Não, não estou. Verá com seus próprios olhos no no­ticiário dessa noite porque já mandei as matérias para a edição. George é muito simpático, e Elle a elegância em pessoa. Por falar nisso, estou com dúvida sobre o que deverei vestir no sábado. Pensei em pedir sua opinião, antes de tomar a decisão final.

— Sim, claro. Será um prazer. Como está Delia?

— Melhor do que imaginei que ela ficaria. Está recebendo visita de amigos, cuidando do jardim... Enfim, tudo que ela sempre gostou.

— Então por que ficou com ar de preocupação ao falar sobre ela?

Clara respirou fundo.

— Ela continua falando com Tim.

Os lábios de Gabriel se curvaram em um sorriso.

— Já disse para você não se preocupar com isso. Talvez Delia esteja mesmo conversando com Tim. Que mal há nisso?

Ela suspirou, sem responder nada. Após um momento de silêncio, perguntou:

— Como foi seu encontro com os americanos? Gabriel passou a mão pelos cabelos fazendo as mechas sedosas se ajeitarem sobre sua testa.

— Um deles é Jack Sting, presidente de um importante canal de televisão — explicou. — O outro é um repórter de Nova York, chamado Joe Costello.

— E o que eles queriam com você?

Gabriel deu de ombros.

— Sei que parece inacreditável, mas eles querem que eu vá trabalhar com eles. Joe, em particular, lembra do tempo em que trabalhamos juntos, em Washington.

— Quando você pretendia me contar?

— Clara, estive com eles o dia inteiro e só fiquei livre ainda a pouco.

— Desculpe-me.

— Não precisa se desculpar. Contei isso para poucas pes­soas, e você é uma delas. O que acha?

— Eu nunca o incentivaria a desistir de sua grande chan­ce, Gabriel. Você merece todo sucesso possível e uma car­reira melhor do que a que tem agora.

— Preciso de algum tempo para pensar nisso. Sentiria minha falta, se eu decidisse ir?

— Claro que sim.

— Não gostaria de ir comigo?

— Não posso, Gabriel. Minha mãe está tendo uma se­gunda chance na vida e não posso deixá-la nesse momento. Preciso estar por perto se ela precisar de mim. Entende o que quero dizer?

— Sim, claro. Sei que você abriria mão de sua própria " felicidade pelo bem de sua mãe.

— Ela faz parte da minha felicidade.

— Eu a entendo, Clara. Fomos bem longe com tudo isso, não?

— Sim. E acho que acabei me apaixonando por você — confessou ela. — Mas entendo sua ambição, Gabriel. Nesse aspecto, sou muito parecida com você.

— Não precisaremos nos separar se não quisermos.

— Continuaríamos como amantes, você quer dizer. Não sei se quero isso para mim. Quando me entreguei a você, foi de corpo e alma.

— Eu sei. E foi maravilhoso — disse Gabriel. — Ainda não tomei nenhuma decisão, Clara. Não estou dizendo que vamos nos separar. Queria apenas que soubesse o que está acontecendo na minha vida.

— Entendo.

Ele respirou fundo.

— Estarei livre amanhã, às dez e meia, para ver sua roupa. Para surpresa de Clara, no dia seguinte Gabriel não levou nem um minuto para decidir qual das roupas ficaria melhor nela.

— A branca com detalhes em preto — disse a ela. — Esse chapéu ficou arrasador em você.

— O que há de errado com o visual cor-de-rosa? — Clara arqueou uma sobrancelha.

— É bonito, mas serviria mais para uma festa em um jardim, com todas essas florzinhas no chapéu. A branca a deixou glamourosa, como você deverá estar. Confie em mim.

No sábado, a festa e as apostas no hipódromo se revela­ram mais divertidas do que Clara imaginara. Seu visual "arrasador", segundo Gabriel definira, realmente chamou a atenção de muitas pessoas.

Tara, em particular, não se mostrou nem um pouco sa­tisfeita ao vê-la. Trajando um vestido preto curto demais para parecer elegante, a moça teria liquidado Clara com o olhar, se isso fosse possível.

— Deve estar um bocado desapontada nos últimos dias, não? — perguntou ela, aproximando-se de Clara, assim que teve chance.

— Por que deveria? Na verdade, estou muito feliz.

— Por sua mãe, talvez. Mas já deve estar sabendo que Gabriel está pensando em nos deixar.

— Como sabe?

— Ele mesmo me contou — Tara mentiu. — Achou que me devia uma satisfação, afinal, fomos amantes durante algum tempo...

— Isso é novidade para mim, Tara.

Clara tentou se manter calma. Precisava aprender a con­fiar em Gabriel.

— Há muitas coisas que não sabe sobre mim e Gabriel, minha cara. Mas não quero estragar seu divertimento. Apro­veite a festa!

Dizendo isso, Tara se retirou com seu costumeiro andar provocante.

Bem, de fato, ela não conseguiu estragar o divertimento de Clara. Era evidente que aquela história fora inventada apenas para provocá-la.

Quando Gabriel voltou para junto dela, Clara nem achou que valia a pena comentar o que Tara havia feito. Aquilo fora pura infantilidade, nada mais.

— O que é isso? — perguntou, ao vê-lo com alguns bilhetes na mão.

— Não sou muito de apostar, mas hoje senti vontade de apostar em todos os cavalos que tivessem nomes re­lacionados a anjo ou algo do gênero. — Riu.— Acabei de ganhar mil dólares com Mistério. Trouxe a lista para você escolher outro.

— Que ótimo! — festejou Clara. Pegando os bilhetes, leu os nomes. — Asas de Anjo, Paraíso, Guardião... — Ela riu para Gabriel. — Aposte em Asas de Anjo. É sempre bom voar alto.

— Você é quem manda — respondeu ele, saindo para fazer a aposta.

Dessa vez, ganharam mil e quinhentos dólares. Encantada com a sorte do dia, Clara havia escolhido um lugar mais próximo da raia para assistir à corrida seguinte. Gabriel havia saído para buscar refrigerante, e ela continuou atenta à corrida.

Os cavalos estavam correndo a toda velocidade quando, de repente, algo atingiu o focinho de Raio Solar, um belo animal de pêlo castanho. Demorou algum tempo para Clara conseguir identificar que fora um chapéu feminino, provavelmente car­regado pelo vento que se tornara forte de repente.

Assustado, o cavalo derrubou o jóquei e seguiu em frente, parando próximo do gradil. Bufando e relinchando, ele fez menção de pular a cerca para avançar sobre o público.

Clara estava a alguns metros de distância. Em vez de ficar apavorada, como as outras pessoas, pulou a cerca com cuidado e foi se aproximando do cavalo devagar.

— Ela é louca! — gritou alguém.

— Mas talvez seja nossa única salvação — falou outra pessoa. Clara continuou a se aproximar fazendo ruídos iguais aos que os tratadores de cavalos costumavam fazer. Lembrava-se de quando tivera um pônei, aos seis anos, e de como seu pai a ensinara a "conversar" com ele. E foi isso que ela fez. Como que por milagre, o cavalo se acalmou e até deixou que ela lhe acariciasse o focinho.

Gabriel, que estava chegando com dois copos de refrige­rante, não acreditou no que viu. Clara estava entregando as rédeas do cavalo ao jóquei, que fora buscá-lo e que não sofrera nenhum ferimento.

— Isso vai estar em todos os jornais amanhã! — exclamou Bob, do lado dele. — Espero que tudo tenha sido filmado dessa vez — acrescentou, lembrando-se do que acontecera no protesto pela preservação dos coalas.

— Nunca vi algo assim — falou Mike, ao lado de Bob. — Clara não mudou mesmo, hein, chefe? Sempre sob os refletores, sendo e fazendo notícia.

— Sim, é verdade — anuiu Gabriel.

O anjo da guarda de Clara devia ser tão impetuoso quanto ela para conseguir aqueles "milagres", pensou ele.

Quando Clara avistou Gabriel vindo em sua direção, sor­riu para ele, satisfeita.

— Oh, Gabriel... Você viu?

— Clara, acho melhor levá-la para casa. Não, vou tirar os olhos de você nem por um minuto!

— Eu estou bem, não se preocupe — ela disse e desmaiou nos braços dele.

O médico fez Clara ficar imóvel por algum tempo.

— Costuma fazer esse tipo de coisa com freqüência? — indagou o dr. Fraser.

— Apenas em situações de emergência — respondeu ela.

— Faremos alguns exames. Tudo parece perfeitamente normal com você, mas está agindo como se estivesse sob constante estresse. Muita ansiedade, eu suponho.

— Não há nada de errado comigo. Foi Gabriel quem in­sistiu para que eu viesse vê-lo.

— Ele fez bem. Disse-me que você desmaiou.

— Sim, mas estou muito bem agora.

Ao se despedirem, o médico avisou a Gabriel que havia solicitado alguns exames e que Clara deveria voltar dali a alguns dias.

— Por que não passamos pelo meu apartamento? — su­geriu Gabriel, assim que ficou sozinho com ela. — Quero conversar com você, e não moro longe daqui.

Aquela experiência desagradável o fizera perceber quanto Clara era importante em sua vida.

Quando entraram no apartamento, Gabriel fechou a porta logo, como que temendo que ela pudesse fugir. Estava com medo de perdê-la e nem ele mesmo sabia explicar o motivo.

O apartamento tinha uma decoração discreta e tipica­mente masculina. O conjunto tornava a atmosfera do lugar aconchegante e fina ao mesmo tempo.

Gabriel tirou o paletó e afrouxou a gravata. Sentindo-se mais à vontade na companhia dele, Clara também tirou o casaco do tailleur, ficando apenas com a blusa de seda que estava usando por baixo. Em seguida, sentou-se no sofá. Podia sentir que Gabriel parecia nervoso e que havia uma espécie de tensão entre eles.

— O que devo fazer com você? — Gabriel foi o primeiro a quebrar o silêncio.

— O que você quer fazer a meu respeito?

O modo insinuante como Clara sorriu foi uma verdadeira tortura para Gabriel, que teve de se esforçar para não tomá-la nos braços. Porém, ela logo voltou a ficar séria.

— Não quer me magoar, não é, Gabriel? Está sem cora­gem de me dizer que irá embora.

— É você quem está dizendo isso, Clara — falou ele, sentando-se no sofá diante dela.

— Bem, pelo menos foi o que Tara me contou.

Clara não pretendia mencionar aquilo, mas Gabriel estava tão terrivelmente irresistível que ela resolveu provocá-lo.

— Eu?! Pelo amor de Deus, Clara! Ela mordeu o lábio, contendo o riso.

— Tudo bem. "Sei que não disse isso a ela. Mas ninguém está lhe pedindo para desistir de uma oportunidade tão brilhante quanto essa.

— Não fale como se não se importasse — pediu Gabriel. — Você também é muito importante para mim, Clara.

Ela segurou uma almofada junto de si, contendo a von­tade de chorar. Devagar, Gabriel se levantou e sentou-se ao lado dela.

— O que é isso? Um novo tipo de autodefesa? — Roçou os dedos no rosto dela, com gentileza. — Está magoada e não está sabendo como lidar com isso, não é?

Clara sentiu o coração acelerar sob o efeito daquele mero toque.

— Tente entender, Gabriel. Não tive uma vida fácil.

— Mas isso mudou — salientou ele, afagando-lhe os cabelos.

— Mudou? — Clara suspirou. — Você vai mesmo embora?

— Então realmente decidiu que não irá comigo — decla­rou ele.

— Minha mãe precisa de mim.

— Clara, sua mãe não está mais doente. Tenho certeza disso. Você sempre esteve ao lado dela enquanto ela preci­sou, mas agora que Delia está curada, você precisa dar atenção à sua própria felicidade.

— Como? Arrumando minhas malas e indo para Nova York com você?

— Eu não me lembro de ter dito que iria para algum lugar. Por outro lado, estou vendo que está muito ansiosa para que eu vá.

Clara olhou-o com um ar entristecido.

— Gabriel, não faça isso comigo. Se você for embora, sentirei muita solidão.

— Quanta solidão?

— Não sei ao certo. Só tenho certeza de que não conse­guirei mais voltar a ser o que era. Você me mostrou um mundo novo e não quero perder o que conquistei.

Gabriel abraçou-a com carinho.

— Oh, Clara. Por que estamos perdendo tempo em nos torturar?

Ela levantou o rosto, fitando-o nos olhos.

— Quer que eu diga que te amo?

— Bem, acho que seria um bom início — respondeu ele, com um brilho de divertimento no olhar.

— Está bem. Eu te amo, Gabriel. Mais do que você pode imaginar. Está satisfeito agora?

— Não. Clara, quer se casar comigo amanhã? Responda direto, sem se dar tempo para questionamentos. Deixe seu coração responder.

— Gabriel. — Ela levou as mãos ao rosto. — Se não parar de brincar comigo, vai me deixar maluca.

— É essa a intenção. — Ele riu. — Agora responda.

— Quero me casar com você, mas não posso magoar mi­nha mãe.

— Mas não é isso o que eu quero. Uma dás coisas que a torna mais linda é justamente seu senso de lealdade à sua família. Nunca tive uma família de verdade, e não quero

perder a chance de ter uma agora.

— O que está querendo dizer?

— Eu já disse aos meus amigos americanos que iria ficar por aqui mesmo. Isso não diz tudo? Eu te amo, Clara e quero ficar com você. Delia poderá ficar conosco quando nos casarmos.

Os olhos dela se encheram de lágrimas.

— Oh, Gabriel.

— E então? Aceita se casar comigo?

— Claro que sim.

Clara sorriu, feliz. Não soube explicar direito, mas ao abraçar Gabriel, teve a impressão de que um par de asas se fecharam sobre eles, como que abençoando a união. Seria mais algum truque de sua imaginação?

Provavelmente não. Já estava acreditando que o amor era mesmo capaz de realizar milagres.

Naquele mesmo dia, o sr. Beatífico contou a Lucas suas preocupações a respeito do jovem Titus.

Lucas, o anjo da guarda verdadeiro de Clara, já parecia bem mais disposto depois de alguns dias de descanso.

— Não e que Titus não tenha levado alegria à vida de Clara — dizia o sr. Beatífico. — Mas como todo anjo mais jovem, ele é muito impulsivo. Tem injetado energia demais no corpo de Clara, fazendo-a passar por situações embara­çosas. Não intencionalmente, claro. O problema é que Titus não tem noção do potencial de sua força.

— Entendo. — Lucas suspirou.

— Sabia que ele foi o irmão de Clara enquanto esteve na terra, como humano?

— Meu Deus! — Lucas se sobressaltou. — Esse tipo de coisa não acontece com freqüência, não é?

— É raro, mas não impossível. De qualquer maneira, Titus ajudou muito tanto Clara quanto a mãe. Vou para­benizá-lo pelo esforço.

Lucas sorriu com benevolência.

— Ele ficará radiante.

— Eu sei. Mas agora é preciso que volte à sua função de anjo da guarda, Lucas. Será mais fácil proteger Clara de agora em diante. Ela encontrou o amor e isso deixa todos mais tranqüilos.

— E quanto a Titus? Tem algum plano em mente para ele, sr. Beatífico?

— Andei pensando nisso e cheguei à conclusão de que Titus se dará melhor ficando na terra por mais algum tempo. Ele tem muita energia para gastar! Por isso, voltará como um lindo bebê...



EPÍLOGO

Clara se lembraria para sempre do nascimen­to de seu lindo bebê.

As luzes da cidade passando pela janela do carro en­quanto Gabriel dirigia rapidamente até o hospital. O sor­riso encorajador das enfermeiras, o semblante concentra­do dos médicos, o ar de nervosismo de Gabriel segurando sua mão...

Foi seguindo as instruções do médico, até chegar a um ponto em que não foi mais preciso que ele dissesse nada. Ela sabia o que fazer e seu bebê queria muito nascer.

Sentiu os olhos se encherem de lágrimas ao ouvir o pri­meiro choro de seu filho. Um lindo menino com cabelos negros, como os do pai.

Quando a enfermeira o colocou em seu colo, Clara expe­rimentou uma das maiores emoções de sua vida: tinha nos braços o fruto de sua felicidade ao lado de Gabriel.

Beijou-o com infinito carinho, adorando sentir aquele cheirinho de bebê. Seu filho.

— Acaba de ganhar um anjinho, sra. McGuire — disse a enfermeira, com um sorriso.

Clara apenas sorriu em resposta, emocionada demais para conseguir falar.

No dia seguinte, toda a família se reuniu no quarto onde Clara ainda estava descansando.

Gabriel, o pai todo orgulhoso, Delia, adorando a expe­riência de ser avó e Janet, mãe de Gabriel, que viajara especialmente para o nascimento do neto. Assim que se conheceram, ela e Delia se deram muito bem e começaram uma promissora amizade.

Quando a enfermeira chegou com o bebê, Gabriel foi o primeiro a pegá-lo no colo.

— Ele é lindo, não? — Olhou para Clara, que sorriu. As avós cercaram Gabriel e ficaram olhando o neto, encantadas.

— Qual será o nome dele? — perguntou Delia. Gabriel fitou Clara com um ar amoroso.

— Pensei em chamá-lo de Michael — sugeriu, esperando aprovação.

Porém, Clara estava olhando para algum lugar acima do ombro dele. Ela adquirira uma expressão de encantamento, como se estivesse vislumbrando algo divino.

Sem se importar com o que diziam à sua volta, Clara continuou observando a imagem brilhante que aos poucos se materializara acima de seu filho. Era o anjo da guarda de Michael!

O anjo olhou para o bebê com tanta ternura que enter­neceu o coração de Clara.

— Querida? — Gabriel se aproximou da cama segurando o filho. — Gostou do nome?

— Sim, Michael é perfeito, como ele.



Acima deles, o lindo anjo agitou as asas com graciosidade, aprovando a escolha do nome de seu mais novo protegido. Michael, Timothy, Titus... Que importância tinha um nome afinal? A beleza do amor e da vida era o que mais importava. Sempre.

Os romances apaixonados de MARGARET WÁY e as descrições maravilhosamente líricas que ela faz de sua terra, a Austrália, a tornaram uma das favoritas dos leitores. Sua carreira de escritora começou em 1970 com a publicação do primeiro romance. Antes disso, Margaret teve uma carreira musical: foi pianista, professora, treinadora vocal e corista. Ela ainda toca piano; também coleciona objetos de arte e antiguidades e dedica-se ao seu jardim. Nascida em Brisbane, Austrália, Margaret vive atualmente em Moreton Bay, em Queensland.
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