O leitor na era eletrônica
Maria Helena Sansão Fontes
“A juventude já não lê”. Essa frase ouvida hoje aos quatro cantos,
talvez esvaziada da exclamação com que se ensimesmavam os mestres
de outrora, revela a constatação realista dos professores de literatura
que insistem ainda na emoção de passar aos alunos globalizados a pai-
xão pela leitura de romances e (por que não?) de poesia.
Se nos adolescentes o desinteresse se justifica pelo apelo imbatí-
vel da imagem do vídeo e do ritmo alucinante das discotecas, nos
jovens estudantes das faculdades de letras, o descaso pela leitura se
transforma em sintoma de distorção vocacional. Num país assolado
por graves problemas econômicos e sociais - onde o desemprego é um
fator iminente para cada jovem que entra na universidade - escolher a
literatura como opção de carreira poderia significar a vitória do so-
nho sobre a crua realidade da sobrevivência, ou, melhor ainda, a bus-
ca heróica da realização existencial em detrimento do sedutor prestí-
gio social advindo de outras carreiras mais promissoras financeira-
mente. Entretanto, o que se constata é que a corrida por essa última
opção há muito mutila a verdade da vocação, debilitada por anos de
descompromisso dos governos com a cultura e a educação.
A escolha pela literatura já se despojou, assim, de seus méritos
salutares de amor às artes. A disputa pelo mercado de trabalho seguro
e promissor é verdadeira e exige preparo, conhecimento e poder com-
petitivo. Nela não há lugar para todos. E os que sobram, os que não
alcançaram o pódio ou não tiveram ânimo suficiente para enfrentar a
competição, onde ficam? Acomodam-se onde a procura é menor, onde
antes habitavam os sonhadores, os artesãos da existência, os caçadores
da liberdade: as faculdades de letras, entre outras de prestígio também
desvalido. Mas, por estarem fora de lugar, marcham na contramão dos
poucos que ainda buscam, errantes, o seu sonho de realização através
das páginas que insistem em serem escritas.
Buscar saídas que tranqüilizem os professores de literatura em
relação à gradativa extinção do leitor do futuro faz parte de um
complexo questionamento, que abrange a ineficácia dos modelos
educacionais superados diante da velocidade dos tempos. Tal velo-
cidade parece não permitir o paciente exercício da leitura, feito atra-
vés do olhar que percorre cada linha da esquerda para a direita,
enquanto a imaginação tece sua teia de labirintos e sonhos, sem
Nadiá P. Ferreira & Marina M. Rodrigues
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pressa de virar a página.
Atendendo a essa louca ânsia da aventura, os meios eletrôni-
cos de comunicação são muito mais eficazes do que os livros. Sons
e imagens exercem seu fascínio em decibéis e explosão de luzes e
cores, sem que se perceba que a emoção dessa era de velocidade
proclama a despedida da sensibilidade despertada pela leitura, que
coloca o homem diante de si mesmo para entender o mundo, e não
diante de imagens virtuais nas quais ele se perde, transformando-se
em meros fragmentos de si mesmo.
Psicanálise e Nosso Tempo
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