Freud explica a diferença
Nadiá Paulo Ferreira
Um amigo me disse a seguinte preciosidade: o médico pode
recorrer à técnica da psicanálise em sua clínica. É óbvio que esse
dito saiu da boca de um médico, colocando em cena o não reconhe-
cimento da prática da psicanálise. Esta questão é muito mais antiga
do que se possa imaginar e faz parte da história da psicanálise. Em
1926, precisamente há setenta e dois anos, Theodor Reik foi acusa-
do, em Viena, de prática ilegal da psicanálise. Freud, nesse mesmo
ano, escreve o artigo Análise Leiga (Psicanálise e Medicina) para
situar os fundamentos teóricos e o campo de ação da psicanálise,
demarcando a diferença entre os tratamentos analítico e médico. Eu
disse a diferença. Não se trata, em momento algum, de avaliação,
no sentido de privilegiar uma prática em detrimento da outra.
Quando alguém vai procurar um médico, é porque está sentin-
do algum mal-estar, localizado no corpo, ou está querendo se sub-
meter a exames preventivos. A prática clínica da medicina visa à
cura, a partir de um diagnóstico. As descobertas científicas, tanto
na área médica quanto em outras áreas científicas, possibilitam
novos recursos para a cura e a prevenção de doenças.
Por que alguém vai procurar um analista? Em primeiro lugar,
é porque está sofrendo de sintomas que afetam a sua subjetivida-
de, criando transtornos graves em suas relações afetivas, familia-
res e profissionais, provocando, inclusive, efeitos no próprio cor-
po. O que faz um psicanalista, ao contrário de um médico? É bom
lembrar o que Freud disse: O analista concorda em fixar um ho-
rário com o paciente, faz com que ele fale, ouve o que ele diz, por
sua vez conversa com ele e faz com que ele ouça.
O não reconhecimento da prática clínica da psicanálise implica
jogar no limbo a grande descoberta de Freud: há uma outra cena
chamada inconsciente. E, justamente por isto, é preciso saber escutá-
lo para libertar sua fala. Do contrário, ele continuará deslocando
para seu corpo o que não consegue dizer em palavras. Até porque
quando fala não escuta, fazendo com que o ficou dito não seja
integralizado em seu discurso.
Psicanálise e Nosso Tempo
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