Sobre o conceito de arte
Robson Lacerda Dutra
Está em cartaz no Rio de Janeiro a peça “Arte” de Yasmine
Reza, na qual se discute o verdadeiro valor que a arte encerra e que,
no caso em questão, gira em torno de um quadro de alguns milhares
de dólares, onde a tela é totalmente branca.
Quais são os critérios que qualificam e distinguem a arte e
fazem com que um quadro de Van Gogh valha mais ou menos que
um outro onde, quer o branco, o azul ou o negro encerrem qualquer
outro conceito artístico?
Bem, a discussão, com certeza, pode assumir diversos contor-
nos e conseqüências sem que se possa concluir muita coisa, dada a
amplitude do tema. De qualquer forma, não é este o objetivo deste
texto, mas sim pensar a integralidade da obra de arte. Até que ponto
ela preserva sua totalidade, se é que isto é possível, e até onde se
pode ir nesta fragmentação?
Muito se fala da revisão, da nova concepção das peças de tea-
tro, por exemplo, numa modernização exacerbada, como se para o
homem moderno fosse difícil ou mesmo impossível compreender
algo que não lhe é contemporâneo. No entanto, não se dão novas
pinceladas em quadros consagrados ou acrescentam-se novos acor-
des às peças de Bach ou Mozart, por exemplo. Isto nos faz supor
que a identificação do conceito de arte nelas incluso não é obstáculo
à compreensão, já que as mesmas vêm sendo executadas há alguns
séculos para diversas platéias, “iniciadas” ou não, atingindo plena-
mente seu objetivo artístico – levar um novo conceito, uma nova
emoção àqueles que as ouvem.
A música, sobretudo, é a maior “vítima” da mutilação artística
que, atendendo a uma falsa premissa de popularização ou “ facilita-
ção”, acaba sofrendo as maiores atrocidades. Como pode alguém
consciente imaginar um movimento avulso de uma sinfonia de
Beethoven, ou de um concerto de Prokofiev ou uma sonata de
Schumann soltos num concerto, numa emissora de rádio ou em qual-
quer situação similar sem que se pague o ônus de uma violência esté-
tica? Do mesmo modo que não se concebe apenas um ato de uma
peça de teatro, um ângulo de um quadro ou até mesmo um segmento
da novela das oito desconectados do seu contexto, não se pode enten-
der apenas um trecho de uma composição musical. O preço, com
Nadiá P. Ferreira & Marina M. Rodrigues
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certeza, é a má formação do público e, sobretudo, um sofisma artísti-
co, onde se pode passar a atribuir a determinado autor um estilo, uma
época, elementos que não lhes são inerentes e, por isto, distanciar a
concepção e a apreciação artística em âmbito maior.
Esperamos que, em tempos de globalização, a arte, ao menos ela,
possa permanecer incólume e continuar a permitir o debate e a apreci-
ação estimulantes, baseados, sobretudo, em premissas verdadeiras.
Psicanálise e Nosso Tempo
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