Difícil é saber renunciar
Sérgio Nazar David
As alunas e as mães do Instituto de Educação resolveram se rebe-
lar contra a decisão da direção da escola de proibir sutiãs que não sejam
brancos ou cor da pele. Pelo que podemos supor pelo noticiário, o
uniforme deve ser de algum tecido fininho, e, portanto, neste caso, o
sutiã, se for vermelho, azul, preto ou rosa choque, deixará de ser peça
íntima. Mães e alunas, pelo visto, realizaram uma queima de sutiãs em
praça pública, lembrando o brado das feministas de outrora. As emis-
soras de televisão dão destaque à insubordinação das alunas. Mas o
que está em jogo na proibição?
Qualquer professor que esteja vivendo por dentro os dramas da
educação hoje, sobretudo no Brasil, sabe muito bem que casos como
este se multiplicam nas escolas. Alunos chegam atrasados e entram em
sala, professores deixam turmas trabalhando durante o recreio em re-
presália à falta de empenho durante o período regular de aula e os pais
telefonam reclamando da atitude do professor, alunos fazem abaixo-
assinado para tirar professor e a direção acata sem procurar saber o
que está acontecendo de fato... Um amigo meu teve contra si um abai-
xo-assinado de alunos de uma escola do Rio de Janeiro onde eram
pedidas à direção providências porque o professor transpirava muito.
São muitas as histórias. E o que está sempre em jogo é a incapa-
cidade de uns de firmar regras e fazê-las cumprir e a incapacidade de
outros de renunciar. Mas renuncia-se a quê?
Quando ouço estas histórias das bravas mães que se enfileiram
em defesa dos filhos oprimidos, lembro-me das tantas vezes em que eu
chegava em casa reclamando do professor, às vezes com toda a razão,
e minha mãe ouvia, para dar ao final a mesma resposta sempre: “Mas
é o seu professor.” E estava encerrada a conversa. Pois se eu fosse mãe
de uma dessas feministas mirins do Instituto eu lhes diria: “Está muito
bem. Você tem o direito de querer usar o sutiã que você quiser. Tem o
direito também de não usar. Mas... É o seu colégio.” E fim de papo. E
já teria gastado 27 palavras para fazer o que minha mãe fazia com 5.
Vejam bem: não estou aqui gastando o meu latim para discutir se
as alunas deveriam ou não deveriam poder usar sutiãs da cor que qui-
sessem. Mas sim para dizer que pais e alunos não sabem e não sabem
mesmo o quanto é difícil manter uma classe atenta: porque o professor
nem sempre pode dar a aula que gostaria, porque as turmas muitas
Nadiá P. Ferreira & Marina M. Rodrigues
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vezes estão cheias, porque os jovens de hoje temem muito pouco... Às
vezes uma brincadeira que o professor faz durante a aula quebra a
concentração dos alunos... Embora às vezes também uma brincadeira
ajude. Os pais deveriam saber, mas muitos não sabem, que educar não
é mole não. Porque o ser humano está longe de ser um poço de bondade
e voluntarismo. Ainda mais quando está abaixo dos 20 anos, e ainda
não levou “paulada na moleira” suficientemente para aprender que co-
nhecimento não entra na cabeça por osmose, que “dinheiro não nasce
no chão”, que “em boca fechada não entra mosca”, que “quem não
trabuca, não manduca...”
O velho Freud entendeu muito bem isso em O futuro de uma
ilusão, há cem anos, quando afirmava que as regras da civilização não
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