Otto maria carpeaux



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oposição: com a Reforma protestante na Alemanha, com o erasmianismo na Península

Ibérica.


#584 OTTO MARIA CARPEAUX

HISTÓRIA DA LITERATURA OCIDENTAL 585

Na Alemanha, o porta-voz da pequena burguesia de feição medieval e credo protestante é Hans Sachs (3O), o famoso sapateiro de Nurenberg. As suas facécias e farsas

carnavalescas, numerosíssimas, são tipicamente medievais: enredos da novelística medieval, sátira contra o clero corruto, contra o cavaleiro empobrecido e o camponês

grosseiro; e Sachs gosta, no fim das peças, de advertências morais. Sachs sabe divertir; as suas peças, embora muito simples, têm efeito humorístico, de modo que

aparecem ainda, de vez em quando, nos teatros alemães, como entremezes, nos dias de carnaval. Nesse caso precisam, porém, de renovação lingüística, porque a linguagem

de Sachs é arcaica, a sua versificação é dura e inábil. Os românticos alemães consideravam êsses arcaísmos como ingenuidade encantadora, celebravam Sachs como um

Boccaccio, Rabelais ou até Shakespeare alemão; sentiram com amargura a falta de uma literatura renascentista na Alemanha e teceram uma verdadeira lenda em tôrno

de Sachs. Depois, a burguesia alemã do século XIX, procurando uma árvore genealógica, viu em Sachs o representante do bom burguês alemão, sólido, sem outras aspirações

políticas além da grandeza da pátria; simpatizaram com o bom burguês protestante que tinha saudado o "rouxinol de Wittenberg", Martinho Lutero, com a famosa canção:

"Wach auff ! es nahent gen dera tag ! ... "

99) Hans Sachs, 1494-1576.

Facécias: Schlaweraffenland (153O) ; Sanct Peter mit den Landsknechten (1556) ; Der bauer mit dem bodenlosen Sack (1563) ; etc.

Farsas carnavalescas: Der farende Schueler im Paradies (155O) ; Frau Wahrheit will niemand Beherbergen (155O) ; Das heisse Eisen (1551) ; Der Bauer im Fegfeuer (1552),

etc., etc. Polêmica reformatória: Die Wittembergisch Nachtigall (1523) ; Disputation zwischen einem Chorherran und einem Schulamacher (1524).

Edição por A. Keller e E. Goetze, 26 vols., Stutrgart, 187O/19O8. P. Landau: Hans Sachs. Berlin, 1924. E. Geiger: Der Meistergesang des Hans Sachs. Bern, 1956.

Assim aparece Sachs nos Mestres-Cantores de Nurenberg, de Wagner, numa Nurenberg romantizada, e Sachs conquistou uma glória póstuma surpreendente. Mas não é um grande

poeta, ou melhor, nem sequer é poeta em ser_tido algum; é apenas uma figura histórica, de importância relativa.

A glória internacional que Hans Sachs conquistou, caberia com mais justiça ao seu contemporâneo português

Gil Vicente (1OO), que tem de comum com o sapateiro ale

mão o humor popular, o gôsto medieval da sátira e as tendências reformatórias; mas Gil Vicente é mais alguma coisa: um grande poeta, um dos maiores da Renascença.

O humor popular, saborosíssimo, de Gil Vicente, não é bem comparável à jovialidade algo grosseira de Sachs; é humor de uma espécie mais fina. É que Gil Vicente não

escreveu para pequenos-burgueses alemães, e sim para a côrte XEl-Rei D. Manuel; os tipos populares com os seus gestos e expressões características tinham de hilarizar

uma côrte de cavaleiros da Renascença, entre os quais havia muitos humanistas. Além de ser grande poeta, Gil

1OO) Gil Vicente, e. 1465/147O-C. 1536.

Monólogo dei vaquero (15O2) ; Auto Pastoril Castellano (15O2) ; Auto dos Reis Magos (15O3) ; Auto de la Sibila Calandra (15O3?, 1513?) ; Auto de S. Martinho (15O4)

; Auto de los cuatro tiempos (15O8?) ; Farsa do Escudeiro; Auto da Alma (15O8) ; Auto da índia (15O9) ; Auto da Fé (151O) ; Farsa dos Físicos (1512?) ; Velho da

Horta (1512) ; Exortação da Guerra (1513) ; Comédia do Viúvo (1514) ; Auto da Fama (1515) ; Auto das Fadas (1516?) ; Barca do Inferno (1516?) ; Barca do Purgatório

(1518) ; Barca da Glória (1519) ; Tragicomédia das Côrtes de Júpiter (1521) ; Comédia de Rubem (1521) ; Farsa das Ciganas (1521?) ; Farsa de Inês Pereira (1523)

; Auto Pastoril Português (1523) ; Frágua de Amor (1525) ; Tragicomédia de D. Duardos (1525?) ; Juiz da Beira (1525) ; Templo de Apoio (1526) ; Clérigo da Beira

(1526?) ; Farsa dos Almocreves (1526?) ; Divisa da Cidade de Coimbra (1527) ; Tragicomédia Pastoril da Serra da Estréia (1527) ; História de Deus (1528) ; Nau de

Amôres (1528?) ; Auto da Feira (1528?) ; Triunfo do Inverno (1529) ; Auto da Lusitânia (1531) ; Amadis de Gaula (1533) ; Romagem de Agravados (1533?) ; Auto da Cananéia


Este livro foi digitalizado por Raimundo do Vale Lucas, com a

intenção de dar aos cegos a oportunidade de apreciarem mais uma

manifestação do pensamento humano..
Vicente é grande artista, superior aos comediógrafos latinizantes da Itália. Como quase todos os escritores portuguêses da época, é bilíngüe, empregando com facilidade

e arte iguais a língua portuguêsa e a língua castelhana; as suas farsas, além de representarem tôdas as facêtas da vida portuga sa da época, refletem vários aspectos

da vida européia, da qual a Lisboa de então era umm dos centros m-:"is vivos. Gil Vicente, sem deixar de ser filho do povo português, é cosmopolita da Renascença,

e no seu riso barulhento e gostoso ecoa qualquer coisa do grito de júbilo com o qual Hutten saudou a nova época: "Juvas vivere !". Como homem da Renascença em país

católico, Gil Vicente é erasmiano. Foi Drmião de Góis que chamou a atenção de Erasmo para as farsas do português, e com razão: Gil Vicente é erasmiano, no sentido

de exigir, com a fôréa poderosa do seu riso satírico e com a seriedade própria de todos os grandes humoristas, a reforma da Igreja, a purificação do clero, a volta

aos costumes da Igreja primitiva; em suma: uma Renascença cristã. O Auto da Feira o Clérigo da Beira, a Farsa dos Físicos são peças capitais de um teatro erasmiano;

em tôda a parte se encontram em Gil Vi

(1534) ; Auto da Mofina Mendes (1534) ; Auto da Festa; Floresta de Enganos (1536).

Edição princeps: Lisboa, 1562.

Edições por Mendes dos Remédios, 3 vols., Coimbra, 19O7/1914; por Margues Braga, Coimbra, 1933 (incompl.).

Edição das poesias espanholas por Dám. Alonso, Madrid, 1934.

Teóf. Braga: Gil Vicente e as Origens do Teatro Nacional. Pôrto, 1898.

I. J. Brito Rebrülo: Gil Vicente, 2.a ed. Lisboa, 1912.

Carol. Michaëlis de Vasconcelos: Notas Vicent:nas. 4 vols. Coimbra, 1912/1923.

A. Braancamp Freire: Gil Vicente, Trovador, Mestre da Balança. Pôrto, 1919.

Aubrey F. G. Bell: Gil Vicente. Oxford, 1921.

A. Forjai de Sampaio: Gil Vicente, a Sua Vida e a Sua Obra. Lisboa, 1925.

Dám. Alonso: La poesia de Gil Vicente. México, 194O.

A. J. Saraiva: Gil Vicente e o fim do Teatro Medieval. Lisboa, 1942.

HISTÓRIA .DA LITERATURA OCIDENTAL 587

Gente alusões ou paralelos à doutrina de Erasmo. Contudo, seria um anacronismo, da perspectiva do século XIX, considerar Gil Vicente como livre-pensador anticlerical.

A sua crítica à Igreja-e ao clero é mais de ordem moral do que dogmática; no Auto da Alma e no Auto da Mofina Méndes, com as suas mordacidades contra os monges e

a filosofia escolástica, Gil Vicente revela perfeita ortodoxia católica e até fé ingênua, comovente - o Auto da Alma tem qualquer coisa do Everyman inglês, e em

meio da luta entre anjo e diabo pela alma do homem, ocorrem expressões nas quais Gil Vicente defende, assim como Erasmo, a doutrina católica do livre-arbítrio contra

o determinismo dos protestantes. As expressões irreverentes de Gil Vicente contra os representantes da Igreja não têm nada de comum com o anticlericalismo moderno;

ou antes, é preciso lembrar o fato de que a Idade Média conheceu outro anticlericalismo, diferente mas não menos intenso. O clero, na Idade Média, não era considerado,

como é pelos anticlericais modernos, como parasito anacrônico, e sim como corporação profissional entre as outras corporações profissionais, em lugar privilegiado

da hierarquia social, e portanto com deveres maiores e mais rigorosos. A falta a êsses deveres estava sujeita à crítica, como as faltas das outras profissões; e

uma sociedade em que não existiam heréticos nem livres-pensadores os próprios católicos se encarregaram da crítica, com uma liberdade de expressão que

os católicos modernos não compreendem, assim como as compreendem mal os livres-pensadores modernos. Gil Vicente, exercendo essa crítica, utiliza as armas do erasmianismo;

mas a índole medieval da sua crítica revela-se no fato de incluir a crítica ao clero na crítica a tôdas as classes da sociedade. A trilogia da Barca do Inferno,

Barca do Purgatório e Barca da Glória lembra a sátira social do Narrenschiff, de Sebastian Brant, aluno da Universidade de Basiléia, cidade de Erasmo; ou lembra,

pela idéia de atacar os pecadores, no momento da travessia das suas al

t:"

#588 OTTO MARIA CARPEAUX



HISTÓRIA DA LITERATURA OCIDENTAL 589

1

mas para o outro mundo, as Danças Macabras da Idade Média. Mas do ponto de vista estético, êsses precursores não podem ser, nem de longe, comparados a Gil Vicente,



artista extraordinário e poeta de categoria universal na apresentação de inúmeros tipos populares, falando todos êles com o acento característico da sua porfissão

e da sua província. Só Chaucer tem fôrça parecida de caracterização dramática, e mesmo a Chaucer, que é poeta narrativo, Gil Vicente é superior como poeta lírico.

A dramaturgia de Gil Vicente é primitiva, às vêzes infantil; está entre os Mistérios medievais, as Morality Plays, e as farsas francesas à maneira do Maitre Pathelin.

Mas o gênio lírico do poeta Gil Vicente, em ambas as línguas, é extraordinário. As canções portuguêses como "Remando vão remadores", "Adorai, montanhas", "Exortação

à guerra", e as espanholas como "Muy graciosa es Ia doncella" ("tal vez Ia poesia más sencillamente bella de Ia poesia espanooa", segundo Dámaso Alonso), "Dicen

que me case yo", "Cuál es Ia nina" - não têm paralelo em todo o teatro peninsular; só Shakespeare e alguns outros dramaturgos elisabetianos oferecem a mesma abundância

de lirismo espontâneo. Na poesia lírica, Gil Vicente revela-se grande artista, pelo uso criterioso das formas populares, envolvendo o material folclórico em todo

o brilho da arte renascentista, sem cair na maneira erudita ou aristocrática. Assim como os poetas dos "song books" elisabetianos representam a "Merry Old England"

antes da invasão do puritanismo, assim Gil Vicente representa o velho Portugal alegre, antes da invasão do humanismo erudito. E considerando-se que o sentimento

nacional de Gil Vicente não é menos vivo do que o de Camões, figura maior e menos original, o crítico estrangeiro, não embaraçado pelo pêso das tradições convencionais,

saudará em Gil Vicente o maior poeta da língua portuguêsa; sem esquecer o seu lugar na poesia espanhola.

Com efeito, Gil Vicente pertence à história do teatro espanhol. Sofreu a influência direta de Juan del Encina

(1O1), dramaturgo primitivo em quem, como em La Celestina, o amor moderno vence os conceitos medievais, e poeta popular encantador. Contemporâneo de Gil Vicente

é Bar


tolomé de Torres Naharro (1O2), autor da Soldadesca, Hi

menea e outras comédias, reunidas na coleção Propaladia, erasmiano resoluto e satírico contra a Igreja. E os verdadeiros sucessores de Gil Vincente não são os seus

imitadores portuguêses, como Simão Machado, e sim dois es

panhóis: Lope de Rueda (1O3), farsista popular de Sevilha, e Juan de Ia Cueva (1O`1), que na utilização de assuntos his

tóricos, contemporâneos e da novelística italiana, já é o precursor imediato de Lope de Vega.

A combinação da poesia lírica com outro gênero literário - recurso preferido da literatura popular - também

se encontra nos romances de Thomas Deloney (1O5), um

1O1) Juan del Encina, 1469-1529.

Cancionero (1496) ; Auto del Nacimiento y de la Pasión; Égloga de Fileno, Zambardo y Cardonio; Égloga de Placida y Victoriano; Égloga de Cristino y Febea.

Edição das poesias por A. Barbieri (in: Cancionero musical de los siglos XV y XVI. Madrid, 189O).

Edição das obras teatrais por M. Carrete e A. Barbieri, Madrid, 1893.

J. P. W. Crawford: Spanish Drama before Lope de Vega. Philadelphia, 1937.

1O2) Bartolomé de Torres Naharro, i

Propaladia (1517).

Edição (com introdução) por M. Menéndez y Pelayo, Libros de antano, vols. IX/X.

1O3) Lope de Rueda, e. 151O-1565.

Comédias (1567).

Edição por E. Cotarelo, 2 vols., Madrid, 19O8.

E. Cotarelo: Lope d: Rueda y el teatro espanol de su tiempo. Madrid, 1898.

1O4) Juan de Ia Cueva, c. 155O-161O.

Tragedia de los siete infantes de Lara; Comedia del Infamador; etc.

Edição por Fr. Icaza, Madrid, 1917.

1O5) Thomas Deloney, e. 1543 - c. 16O7.

Jack o/ Newberry (1597) ; The Gentle Craft (1598) ; Reading (16OO).

Edição por F. O. Mann, Oxford, 1912.

A. Chevalley: Thomas Deloney. Paris, 1926.

depois de 153O.

Thomas of

59O

dos escritores mais curiosos da literatura inglêsa, tão rica


em figuras singularep. Os seus romances de enredos com

plicados à maneira dás novelas italianas, são genuinamente


inglêses e destinados a leitores populares; na mistura de

sentimentalismo melodramático com episódios humorísti

cos há nêle algo não só _de Dickens, mas também da mistura de elementos trágicos e cômicos no teatro elisabetiano. Assim como os Mistérios medievais foram representados

por determinadas corporações de artífices, assim dedica Deloney cada romance a determinada profissão: Jack of Newberry aos comerciantes, The Gentle Graft aos sapateiros,

Thomas of Reading aos alfaiates; da Gentle Craft tirou Dekker o enrêdo da comédia mais popular do teatro elisabetiano, Shoemaker:"s Holiday. Mas"Deloney não é um

precursor; ao contrário, a sua defesa das corporações medievais inclui a defesa da aristocracia rural. Deloney é um "reacionário pleiteando, contra a nova burguesia

comercial, a volta.à estrutura social da Idade Média. É êsse reaciónarismo um aspecto, digno de nota, de grande parte dá literatura popular ,do século.

A tendência contrária, levando à ciência e técnica da burguesia, manifesta-se no empirismo. O.precürsor é Leonardo da Vinci (1O6) : o grande artista plástico. não

é merior como pensador científico; e como escritor é o predecessor imediato de Galileu. O século de intervalo só se explica pelo fato de os escritos de Leonardo

terem ficado escondidos nos arquivos. O lugar de Leonardo na evolução do pensamento científico foi ocupado por Bacon, o empirista. Mas o empirismo tem, por mais

estranho que pareça, uma pré-história mística: o ponto de partida está na magia e cabalar Constituiu antigamente um enigma a atitude de

1O6) Leonardo da Vinci, 1452-1519.


Edição dos escritos filosóficos e literários por E. Solmi, Firenze, 192O:
E. Muentz: Léonard. Paris, 1899.

V. von Seiditz: Leonardo da Vinci, der Wendepunkt der Renaissance. Paris, 19O9.

HISTeIA DA LITERATURA OCIDENTAL 591

Pico da Mirandp, adepto apaixonado da magia e cabala, escrevendo um belo contra a astrologia; falava-se até em crise espiritual d° grande humanista. A análise da

atitude dos humanistas p "Quattrocento" revelou, de Salutati até Pico, a sua av&ão permanente contra a astrologia, enquanto que a meia os apaixonou ao ponto de buscarem

processos cabalísticos nos escritos dos judeus desprezados:


causou-1 nãoncia o determinismo astrológico, limilles repus

tando a liberdad+ do indivíduo, ao passo que a magia pa


recia prometer w iniciado a onipotência (tos-A), . No século XVI, a vagia Cepeça a sua transformação em ciência experimental: Gio-,mni Battista Delia Porta (1535-1615),

comediógrafo plautino, dedicando-se a estudos quase doidos de magia experimental, é ao mesmo tempo um dos fundadores & óptica Científica. Na Alemanha, o famoso Para

.celso, ocultista ¢ fundador da farmacologia, ocupa lugar
parecido, Váriasteorias ocultistas, sobretudo a da correspondência entre macrocosmo e microcosmo, serviram d-e"hipóteses de trabalho" aos naturalistas; também foram

defendidas elos ,latonistas italianos como Telesio e Patrizzi, precursores imediatos de Giordano Bruno (1O7), o filósofo que reúne à glória de ter criado a cosmologia

moderna a outra glória de criador da literatura filosófica em

1O6A) L- rhorndiké A History of Magic and Experimental Science.

vol, V: ,The Fifteenth Century". New York, 1934.
1O7) Giordano Bruro:" 1548-16OO.

De Nabris ided rum (1582) ; IZ Candelaio (1582) ; Cena de le Ce

neri 11584) -1 Delia Causa Principio ed Uno (1584) ; DelV Infinito Universo e Mo7fdi (1584) ; Spaccio delia Bestia Triunfante (1584) ;

Gli lroici Furdri (1585).

Ediç:"o das Opere italiahe em 3 vols. (vols. HI, Scritti filoso
fici, edit. por G. Gentile; vol. III: Il Candelaio, edit. por V.

Spa4panato). 2 ed. Bari, 1923.

F. de Sanct, . "La Nuova Scienza". (In: Storia delta letteratura
italiaga. 137O. 2á ed. por B. Croce. Bari, 1913. Vol. II.)

A. Geaf: Stud~1 drammatici. Torrou, 1878.

G. Gentile: Gí~rdano Bruno e i2 pensiero dei Rinascimiento. 2

I chki, 19

L. Olschki: : , GíD rdano Bruno. Bar!, 1927.

OTTO MARIA CARPEAUX

É

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592 OTTO MIARIA CARPEAUX



língua italiana e de escritor extraordinário. O monge, convertido da escolástica medieval ao panteísmo como por um raio, uma revelação, ficou deslumbrado: o mundo

fechado dos seus estudos teológicos caiu-lhe em escombros, e abriram-se os espaços infinitos do céu, povoados de inúmeros mundos; e o que será para Pascal motivo

de angústia, foi para Bruno motivo de uma espécie de embriaguez cosmológica. O que êle tinha abandonado - humanismo, convento, teologia, Igreja, a sociedade hipócrita

e submissa da Contra-Reforma - parecia-lhe um tecido de mentiras e falsidades, ocultando como nevoeiro denso, como jôgo de sombras, a verdade brilhante dos inúmeros

mundos e do Universo infinito. A atitude de Bruno foi sempre a do apóstolo - no convento tinham-no educado para isso. Com fúria enorme - Eroici furori é o título

de uma obra sua - dirigiu a sua polêmica contra o "mundo caduco" da "Mentira", "Hipocrisia" e "Violência", que ainda se acreditavam senhoras do mundo, contra a "Bastia

trionfante", e o contraste entre o seu idealismo fanático e a indiferença "bestial" do mundo que o rodeava, inspirou-lhe o desgôsto satírico do qual dá testemunho

a comédia II Candelaio, comédia do pedante Manfurio, que "nihil divinum a se alienum putat", que sabe tudo menos a verdade platônica de que a vida é um jôgo vazio

de sombras; e a comédia de Bruno pretende ser "um candelaio per illuminare le ombre delle idee" e tornar visível, atrás do nevoeiro das imbecilidades, a realidade.

A realidade, porém, era o poder daqulas fôrças que êle acreditara mortas e continuou negando até o momento em que, "na fogueira, devolveu ao Universo a alma ardente".

Bruno estêve na Inglaterra. Encontram-se vestígios da sua presença no Hamlet. Uma influência do italiano furioso em Bacon, inglês frio e equilibrado, pareceria impossível,

se não fôsse um intermediário estranho que exerceu influência direta sôbre a idéia baconiana de uma ciência experimental, e que estava em relações com Bruno; um

HISTÓRIA DA LITERATURA OCIDENTAL 593

intermediário que ninguém pensava encontrar na história

da literatura francesa: Bernard Palissy (1O8). Era um gê

nio universal como havia tantos na Renascença, um pequeno Leonardo francês: cientista, técnico, artista e grande escritor. Passou por mil experiências difíceis e

dolorosas, desilusões e perseguições de tôda sorte, até descobrir o que foi a grande ambição da sua vida: a composição e fabricação do esmalte. O título imenso e

pitoresco do seu livro - meio relatório técnico, meio autobiografia - fala primeiramente dos seus trabalhos sôbre águas minerais, naturais e artificiais, sôbre metais,

sais, pedras, terras, fogos e, só no fim, do esmalte, como para aludir às águas e fogos pelos quais devia passar para conseguir a grande obra. O relatório, escrito

num francês ingênuo e saboroso que encantou Anatole Franca, revela o artista: utilizou-se da sua invenção só para enfeitar as "rustiques figulinas" de sua fabricação,

as quais uma análise aguda conseguiu aproximar do sentimento rústico em certas poesias de Ronsard e Du Bellay. Dêste modo, o esquisito inventor francês encontra-se

num ponto entre Andrea Navagero e a ciência experimental, representada por Francis Bacon, que foi também grande escritor, talvez maior escritor do que filósofo.


Pode haver dúvidas quanto à importância de Bacon (1O9) na história da filosofia e do método experimental;

1O8) Bernard Palissy, 151O-1589.

Discours admirables de Ia nature das eaux et das fontaines, tant . naturelles gWartificielles, das métaux, das seis et salinas, das pierres, das terras, du feu et

das émaux (158O). Edição por B. Fillon, 2 vols., Niort, 1882. E. Dupuy: Bernard Palissy, Phomme, Partiste, le savant, Nerivain. 2.11 ed. Paris, 19O2.

B. Hanschmann: Bernard Palissy uno Francis Bacon. Leipzig, 19O3.

1O9) Francis Bacon, baron Verulam, 1561-1626.

Essays (1597, 1612, 1625) ; Novum Organum (162O). New Atlantis (1626), etc., etc.

êste método estava pronto antes de Bacon, e êle nunca pensou em aplicá-lo; e em vez de uma explicação teórica do mundo deu uma utopia do mundo futuro da ciência

e técnica. Mas essa utopia se realizou. Ninguém pode arrancar a Bacon a glória de ter criado - ou antes, pela primeira vez representado em sua plenitude - o espírito

prático, utilitário, pragmatista, dos inglêses, e de o ter expresso numa prosa que é também criação sua, uma prosa sóbria, sêca, sentenciosa, inconfundível: os Essays

de Bacon não são confissões como os de Montaigne; são notas, aperçus, lições, condensadas com uma energia espiritual extraordinária e resumidas em aforismos inesquecíveis:

"A crowd is not company; and faces are but a gallery of Pictures"; "God Almightie first planted a garden"; "It i the solecismo of power, to think to command the

end, and yet not to endure the mean". Mas Bacon não é apenas aforista, nem apenas o moralista dos ensaios sóbre Amizade, Verdade, Velhice, jardins e outros assuntos

permanentes; é mais importante a parte negativa dasua filosofia, que diz respeito aos assuntos perecíveis. "Nen:"s thoughts are much according to their inclination",

diz o Lord; e é preciso aproximar essa observação psicológica de outra, de Maquiavel, do qual Bacon era grande leitor: "Costoro hanno un animo in piazza, e uno in

pala2zo" - para compreender o alcance da teoria baconiana dos "idola" que impedem aos homens o reconhecimento da~7erdade: os "Idola tribus" ou preconceitos dos homens

Como membros da espécie, os "Idola specus" ou preconce¡tos sugeridos pelo ambiente, os "Idola fori" ou preconceitos impostos pela opinião política, e os "Idola theatri"

medição por J. Spedding, R. L. Ellis e D. D. Heath, 14 vols., Loncion, 1857/1874.

1~h. B. Macaulay: "Lord Bacon". (In: Criticai and Historical ssays, 1837.)

^I: Sturt: -Francis Bacon. London, 1932. %. Williams: Francis Bacon. 1933.

HISTÓRIA DA LITERATURA OCIDENTAL 595

ou preconceitos tradicionais. Bacon é o fundador da sociologia do saber; a sua saída do cepticismo é o realismo sólido, material ou quase materialista, que Macaulay


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