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CAPÍTULO 56
Um colossal bloco de gelo deslizou pela plataforma Mime, lançando uma nuvem de fragmentos no ar. O barulho do gelo se rompendo e se atritando contra a geleira era insuportável. Ao descer e penetrar na água, a placa perdeu a aceleração por um momento, e o corpo de Rachel, que flutuava, bateu com força na superfície. Tolland e Corky também se chocaram dolorosamente contra o gelo, próximos a ela.

Mas, com o impulso da queda, o bloco mergulhou fundo no mar. Rachel podia ver a superfície espumante do oceano subindo rapidamente, como o chão se aproximando de alguém que estivesse fazendo bungee-jump com uma corda demasiado comprida. A água veio subindo até chegar no nível deles. O pesadelo infantil de Rachel estava de volta. Gelo... água... escuridão. Era um medo primitivo, instintivo.

A superfície da placa desceu abaixo da linha-d'água, e o gélido oceano Ártico invadiu-a com força pelas extremidades. Com o mar avançando por todos os lados, Rachel sentiu-se sugada para baixo. A pele exposta de seu rosto ficou rígida e ardida quando foi atingida pela água salgada.

De repente, o chão sumiu debaixo dela. Rachel lutou para manter-se acima da superfície, flutuando com a ajuda do gel de sua roupa. Ela afundou brevemente, engoliu uma porção de água e, tossindo, conseguiu voltar à superfície. Podia ver os outros debatendo-se ali perto, ainda presos às cordas. Rachel havia acabado de se equilibrar na água quando Tolland gritou:

- Está voltando!

Suas palavras se misturaram à confusão do momento, e Rachel sentiu a água subindo por baixo dela. Como uma enorme locomotiva revertendo sua marcha, o bloco de gelo havia parado de afundar e começara a se elevar. Poucos metros abaixo, um ronco medonho e grave ressoou pelo mar, à medida que a gigantesca placa submersa rasgava seu caminho de volta à superfície.

O bloco emergiu rápido, acelerando ao chegar mais próximo da superfície e surgindo em meio à escuridão. Rachel sentiu seu corpo ser levantado, e o oceano se transformou num turbilhão ao seu redor quando o gelo finalmente a atingiu. Ela debateu-se em vão, tentando encontrar equilíbrio enquanto era empurrada para cima, junto com milhões de litros de água do mar. Boiando, a enorme massa de gelo oscilou sobre as ondas, subindo e balançando, procurando seu centro de gravidade.

Com água pela cintura, Rachel se remexia sentindo uma extensa superfície plana logo abaixo dela. Quando a água começou a ser drenada, a corrente engolfou Rachel e puxou-a em direção à borda.

Escorregando, estendida no chão, ela podia ver a extremidade da placa se aproximando rapidamente.

Segure firme! dizia a voz de sua mãe dentro de sua cabeça, exatamente como no dia em que ela ficou submersa no lago gelado. Segure firme! Não afunde!

A puxada forte em seu boldrié pressionou a barriga de Rachel, fazendo-a expelir o pouco ar que ainda tinha. Parou a poucos metros da borda. O movimento fez com que seu corpo girasse. A 10 metros dali, podia ver que o corpo flácido de Corky, ainda unido a ela pela cordada, havia parado também. Eles tinham sido empurrados para fora do gelo em direções opostas e acabaram freando um ao outro. A água continuava escorrendo de volta para o mar, e ela viu uma outra forma surgir na escuridão ao lado de Corky. Estava de quatro sobre a superfície, segurando a corda de Corky e vomitando água do mar.

Era Michael Tolland.

Quando o último refluxo escorreu de volta para o oceano, Rachel ficou parada, em um silêncio aterrorizado, ouvindo o som do mar. Logo depois, sentindo o princípio de uma onda de frio, apoiou as mãos e os joelhos sobre o iceberg, que ainda balançava de um lado para outro, como um gigantesco cubo de gelo. Sentindo muitas dores e num estado meio delirante, engatinhou na direção dos outros dois.

Lá em cima, bem alto na geleira, Delta-Um olhou o mar com seus óculos de visão noturna. Viu o Ártico agitando-se em torno de seu mais novo iceberg. Não viu nenhum corpo na água, mas isso não chegava a ser surpresa. Estava escuro e as vítimas vestiam roupas e capuzes pretos.

Examinou cuidadosamente a superfície do bloco de gelo. Era difícil manter o foco, pois ele se afastava rapidamente, puxado para o alto-mar por fortes correntes oceânicas. O soldado estava quase desistindo quando viu algo inesperado: três pequenos pontos pretos no gelo. São corpos? Delta-Um tentou melhorar o foco.

- Você está vendo alguma coisa? - perguntou Delta-Dois.

Delta-Um não respondeu, ampliando a imagem com seu zoom. Ficou impressionado ao distinguir três formas humanas imóveis sobre o iceberg. Era impossível saber se estavam vivos ou mortos. Já não importava mais. Se estivessem vivos, mesmo usando roupas térmicas, morreriam dentro de uma hora, no máximo. Estavam molhados, uma tempestade se aproximava e eles flutuavam sem rumo num dos oceanos mais mortíferos do planeta. Seus corpos nunca seriam encontrados.

- Apenas sombras - respondeu por fim Delta-Um, virando-se. – Vamos voltar para a base.


CAPÍTULO 57
O senador Sedgewick Sexton deixou sua taça de conhaque Courvoisier sobre a prateleira acima da lareira em seu apartamento de Westbrooke.

Depois remexeu o fogo durante algum tempo, coordenando as idéias. Os seis homens em seu escritório esperavam sentados em silêncio. As apresentações e conversas introdutórias tinham terminado. Era hora de o senador vender seu peixe. Eles sabiam disso. Ele também.

Estabeleça uma relação de confiança. Deixe que saibam que você compreende os problemas deles.

- Como vocês provavelmente já sabem - disse Sexton, virando-se para o grupo -, ao longo dos últimos meses eu me encontrei com muitos outros na mesma posição que vocês se encontram agora. - Ele sorriu e sentou-se para se colocar no mesmo nível deles. - Vocês são os únicos que recebi em minha casa. São todos homens extraordinários e estou honrado em conhecê-los.

O senador entrecruzou as mãos e deixou seus olhos circularem pelo escritório, estabelecendo contato visual com cada um de seus convidados. Então focalizou seu primeiro alvo: um grandalhão usando chapéu de caubói.

- Space Industries of Houston - disse Sexton. - Estou feliz de recebê-lo aqui.

O texano resmungou:

- Odeio esta cidade.

- Não o culpo. Washington tem sido muito injusta com você.

O homem olhou para ele por baixo da borda do chapéu, mas não falou nada.

- Há 12 anos você fez uma oferta ao governo - prosseguiu Sexton. - Propôs a construção de uma estação espacial americana por apenas cinco bilhões de dólares.

- É isso aí. Ainda tenho todos os planos.

- Porém, a NASA convenceu o governo de que uma estação espacial americana deveria ser um projeto da NASA.

- Exatamente. E a NASA começou a construção há cerca de 10 anos.

- Uma década. E, não bastasse o fato de que a estação espacial ainda não está funcionando plenamente, o projeto já custou até agora 20 vezes o valor que você havia proposto. Como cidadão e contribuinte, isso me revolta.

Um rumor de aprovação circulou pela sala. O candidato percorreu novamente o grupo com os olhos.

- Estou perfeitamente ciente - disse, dirigindo-se agora a todos – de que várias de suas empresas se ofereceram para lançar ônibus espaciais privados por apenas 50 milhões de dólares por vôo.

Mais sinais de concordância.

- Ainda assim, a NASA promove um dumping no mercado cobrando apenas 38 milhões por vôo, mesmo que seu custo real seja superior a 150 milhões de dólares!

- É assim que eles têm conseguido nos manter longe do espaço – disse um dos homens. - O setor privado não tem condições de competir com uma organização que pode se dar ao luxo de lançar vôos com 300% de prejuízo sem quebrar.

- É totalmente injusto.

Todos assentiram.

Sexton virou-se então para o indivíduo de aspecto austero que estava ao seu lado, cujo perfil ele havia lido com particular interesse. Como muitos dos executivos que estavam financiando sua campanha, esse homem era um engenheiro militar que se cansara dos salários baixos e da burocracia do governo e abandonara sua posição no Exército para buscar riqueza no setor aeroespacial.

- Kistler Aerospace. - O senador sacudiu a cabeça como se estivesse lamentando algo. - Sua empresa projetou e fabricou um foguete que pode lançar cargas por um preço muito baixo, cerca de quatro mil dólares por quilo, o que é excelente quando comparado aos custos da NASA de mil dólares por quilo. - Sexton fez uma pausa dramática. – Ainda assim, você não tem clientes.

- E por que teria? - questionou o executivo. - Na semana passada a NASA ganhou uma concorrência cobrando da Motorola apenas 1.600 dólares por quilo para lançar um satélite de telecomunicações. Em outras palavras, o governo lançou aquele satélite com um prejuízo de 900%!

Sexton balançou a cabeça, num gesto de compreensão. Os contribuintes estão subsidiando, sem saber, uma agência que é quatro vezes menos eficiente do que a concorrência.

- Acho que está claro - disse ele, com uma voz preocupada - que a NASA vem trabalhando consistentemente no sentido de impedir a competição no espaço. Ela mantém as empresas particulares do setor aeroespacial à distância oferecendo serviços abaixo do preço de mercado.

- Estou de saco cheio e cansado de ser forçado a pagar milhões de dólares em impostos sobre meus negócios para que o Tio Sam possa usar esse mesmo dinheiro para roubar meus clientes! - reclamou o texano.

- Entendo seu ponto - disse o senador.

- No caso da Rotary Rocket - disse um homem vestido impecavelmente - o que está nos matando é a impossibilidade de usar patrocínio comercial. As leis contra o patrocínio são criminosas!

- Mais uma vez, estou plenamente de acordo. - Sexton ficara impressionado ao descobrir que, como parte da estratégia para manter seu monopólio no espaço, a NASA tinha conseguido a aprovação de leis federais proibindo a colocação de anúncios em veículos espaciais. As companhias privadas do setor aeroespacial não podiam levantar fundos através de patrocínio ou propaganda de outras empresas, como acontecia nas competições de automobilismo, por exemplo. Qualquer veículo espacial estava limitado, por lei, a exibir apenas as palavras ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA e o nome do próprio fabricante. Num país em que os gastos com publicidade chegam a 185 bilhões de dólares por ano, jamais um dólar sequer de propaganda foi parar nos cofres das empresas aeroespaciais particulares.

- É uma roubalheira - interveio outro executivo. - Minha empresa espera lançar o primeiro protótipo de ônibus espacial para turismo do país dentro de alguns meses. Teremos uma enorme cobertura na imprensa. A Nike acabou de nos oferecer sete milhões de dólares de patrocínio só para pintarmos seu logo e o slogan "Just do it!" na lateral do veículo. Depois veio a Pepsi e nos ofereceu o dobro para colocarmos "Pepsi: para uma nova geração". Mas, de acordo com as leis federais, se nossa nave tiver qualquer propaganda, seremos proibidos de lançá-la.

- De fato, é o que diz a lei - respondeu Sexton. - Mas, se eu for eleito, vou trabalhar para que essa legislação antipropaganda seja abolida. Isso é uma promessa. O espaço deveria estar tão disponível para publicidade quanto cada milímetro da Terra.

O candidato parou e olhou para sua audiência, seus olhos travando contato com cada um deles, sua voz tornando-se solene.

- Temos que estar cientes, contudo, de que o maior obstáculo à privatização da NASA não são as leis. É a percepção do grande público. Muitas pessoas ainda têm uma visão romântica do programa espacial americano. Ainda acreditam que a NASA é uma agência necessária ao funcionamento de nosso governo.

- Culpa desses malditos filmes de Hollywood! - queixou-se outro homem.

- Afinal, quantas toneladas de lixo no estilo NASA-salva-o-mundo-de-um-asteróide-mortal esses idiotas conseguem produzir? Isso é propaganda!

O boom de filmes sobre a NASA era uma simples questão econômica, como Sexton bem sabia. Depois do grande sucesso de Top Gun: Ases Indomáveis, um dos primeiros filmes de Tom Cruise, que mais parecia uma propaganda de duas horas da Marinha norte-americana, a NASA compreendeu o enorme potencial de Hollywood como centro de divulgação e relações públicas. Discretamente, a agência espacial começou a oferecer aos estúdios de cinema acesso gratuito para filmagens em todas as suas impressionantes locações: torres de lançamento, controle de missões, locais de treinamento de pilotos, etc. Acostumados a pagar caro para obter esse tipo de autorização, os produtores aproveitaram a oportunidade de economizar milhões em seus orçamentos fazendo filmes de ação que se passam nos cenários "gratuitos" da NASA. Claro que Hollywood só tinha acesso aos locais depois que a NASA aprovasse o roteiro.

- Fazem lavagem cerebral em larga escala - reclamou outro executivo. - A pior parte não são os filmes, mas as jogadas publicitárias. Qual o objetivo de enviar um idoso ao espaço? E agora a NASA está pensando em montar uma equipe só de mulheres para o próximo vôo do ônibus espacial. Tudo isso de olho na publicidade!

O senador soltou um suspiro e depois disse em tom trágico:

- Senhores, creio que é hora de fazer com que os americanos compreendam a verdade, pelo bem de nosso futuro comum. - Ele parou teatralmente na frente do fogo. - É hora de os americanos entenderem que a NASA não está nos levando para o infinito, e sim atrasando a exploração do espaço, um negócio igual a todos os outros. Manter o setor privado fora do jogo é quase um crime. Pensem no setor de informática, onde os avanços são tão grandes que tudo muda de uma semana para a outra! E por que isso acontece? Porque o setor de informática funciona com base nas leis de livre mercado: gera maiores lucros para os que são mais eficientes e que têm melhor visão. Imaginem se esse segmento fosse gerenciado pelo governo! Ainda estaríamos nas trevas. Estamos estagnados no espaço. Devemos colocar a exploração espacial nas mãos do setor privado, que é onde ela já deveria estar. O povo ficará admirado com o crescimento, a geração de empregos e os sonhos que se tornarão realidade. Devemos deixar que as leis de mercado nos levem a novos patamares nos céus. Se for eleito, assumirei o compromisso pessoal de abrir as portas rumo à fronteira final, deixando a passagem aberta e desimpedida.

Sexton levantou sua taça de conhaque.

- Amigos, vocês vieram aqui esta noite para decidir se sou merecedor de sua confiança. Espero que eu tenha sido capaz de conquistá-la. Da mesma forma como é necessário ter investidores para criar uma empresa, é necessário ter investidores para chegar à presidência. E, da mesma forma como os acionistas de uma corporação, vocês, como investidores políticos, também esperam retorno. Minha mensagem é simples: invistam em mim e jamais irei esquecer disso. Jamais. Eu e vocês estamos unidos pelos mesmos interesses e os mesmos ideais.

O senador levantou seu copo em direção a eles num brinde.

- Com sua ajuda, meus amigos, em breve estarei na Casa Branca... e vocês estarão colocando seus sonhos em rampas de lançamento.

A alguns passos do escritório, Gabrielle Ashe continuava de pé, imóvel nas sombras. Ouvia os sons alegres de pessoas brindando com taças de cristal e o crepitar da lareira.



CAPÍTULO 58
Em Pânico, um jovem técnico da NASA correu pela habisfera. Algo terrível aconteceu! Ele encontrou o administrador Ekstrom sozinho perto da área de imprensa.

- Senhor, houve um acidente - disse o rapaz, sem fôlego.

Ekstrom virou-se com um olhar distante, como se seus pensamentos já estivessem muito conturbados por outros assuntos.

- Como assim? Um acidente? Onde?

- No poço de extração. Um corpo acabou de emergir. É o doutor Wailee Ming.

O rosto de Ekstrom ficou branco.

- O doutor Ming? Mas...

- Nós o retiramos imediatamente, mas era tarde demais. Ele está morto.

- Meu Deus. Vocês acham que ele estava lá dentro há quanto tempo?

- Cerca de uma hora, talvez. Parece que ele caiu, submergiu e, quando seu corpo se inchou, flutuou de volta à superfície.

O rosto avermelhado de Ekstrom ficou roxo.

- Mas que diabos! Quem mais sabe disso?

- Ninguém, senhor. Apenas dois de nós. Resolvemos tirá-lo do poço, mas achamos melhor contar ao senhor antes de...

- Fizeram bem - disse Ekstrom, soltando um suspiro pesado. - Guardem o corpo do doutor Ming imediatamente. Não digam nada sobre isso.

O técnico ficou perplexo.

- Mas, senhor, eu...

Ekstrom colocou sua larga mão no ombro do homem.

- Preste atenção. Este foi um acidente trágico e lamento profundamente por isso. Obviamente irei lidar com o problema de forma apropriada quando for a hora. A questão, justamente, é que agora não é a hora.

- O senhor deseja que eu esconda o corpo?

Os olhos frios de Ekstrom se fixaram no homem.

- Pense. Poderíamos contar a todos agora, mas o que iríamos estar fazendo? Estamos a cerca de uma hora da coletiva de imprensa. Anunciar que tivemos um acidente fatal iria ofuscar a descoberta que fizemos e teria um efeito moral devastador. O doutor Ming cometeu um descuido mortal e não tenho a intenção de fazer com que a NASA pague por isso. Esses cientistas civis já ganharam uma importância maior do que deveriam, e eu não desejo que um de seus erros, causado por negligência, manche nosso momento público de glória. O acidente sofrido por Wailee Ming permanecerá, portanto, um segredo até que a coletiva tenha terminado. Fui claro?

O jovem assentiu, pálido.

- Vou esconder o corpo.

CAPÍTULO 59
Michael Tolland já havia passado tempo suficiente no mar para saber que o oceano matava sem remorsos nem hesitação. Estava deitado, exausto, sobre o iceberg e mal podia ver o contorno fantasmagórico da imponente plataforma Mune se afastando cada vez mais. Sabia que a forte corrente do Ártico, formada nas ilhas Elizabeth, criava uma imensa espiral em torno da calota de gelo polar para mais tarde se aproximar novamente da costa no norte da Rússia. Não que importasse muito, já que isso levaria meses.

Temos cerca de 30 minutos, no máximo 45.

Sem o isolamento protetor de seus macacões preenchidos com gel, já estariam mortos. Felizmente, com os Mark IX, os três se mantiveram secos, o fator mais crítico para a sobrevivência em baixas temperaturas. O gel térmico ao redor de seus corpos não só havia amortecido a queda, mas também os ajudava a conservar qualquer resto de calor ainda existente.

Em breve o processo de hipotermia iria começar. No início seria apenas uma ligeira dormência nos braços e pernas, à medida que o sangue se retraísse para o centro do corpo a fim de proteger os órgãos vitais.

Depois viriam as alucinações, quando o pulso e a respiração se reduzissem, retirando oxigênio do cérebro. Por último, o corpo faria um esforço final para reter o que restasse de calor, desativando tudo, exceto o coração e a respiração. Ficariam inconscientes a partir desse ponto. No final, até mesmo os centros nervosos responsáveis pela respiração e pelo coração iriam parar de funcionar completamente.

Tolland virou-se para Rachel, desejando que pudesse ao menos fazer algo por ela.

A dormência que se espalhava pelo corpo de Rachel era menos dolorosa do que ela teria imaginado. Quase que uma anestesia bem-vinda. Morfina natural. Ela havia perdido seus óculos protetores quando o gelo se partiu e mal podia abrir os olhos naquele frio.

Podia ver Tolland e Corky próximos a ela. Tolland estava olhando na sua direção, com uma expressão triste. Corky se movia, mas parecia estar com fortes dores. O osso logo abaixo de seu olho direito parecia quebrado e o rosto estava sangrando.

O corpo de Rachel tremia incontrolavelmente enquanto sua mente procurava respostas. Quem? Por quê? Seus pensamentos estavam embaralhados pelo peso que parecia crescer dentro dela. Nada fazia sentido. Era como se seu corpo estivesse aos poucos se desligando, aquietado por uma força invisível que a chamava para um sono profundo.

Rachel resolveu lutar contra isso. Sentiu uma enorme raiva fervendo dentro dela e tentou manter suas chamas acesas.

Tentaram nos matar! Olhou para o mar ameaçador e sentiu que seus agressores haviam sido bem- sucedidos. Já estamos mortos. Mesmo naquele momento, sabendo que provavelmente não viveria para conhecer a verdade oculta por trás do jogo mortal que estava se desenrolando na plataforma Milne, Rachel suspeitava que já sabia quem era o culpado. O administrador Ekstrom era quem tinha mais a ganhar. Ele os mandara lá para fora, para o gelo. Tinha ligações com o Pentágono e com as tropas de elite. Mas o que Ekstrom teria a ganhar inserindo aquele meteorito sob o gelo? O que qualquer um teria a ganhar com aquilo?

Rachel voltou seus pensamentos para Zach Herney, conjeturando se o presidente também era parte da conspiração ou apenas uma peça no tabuleiro? Herney não está sabendo de nada. Ele é inocente. O presidente obviamente fora enganado pela NASA. Em breve ele iria anunciar a descoberta do meteorito, com a ajuda de um documentário em vídeo no qual quatro cientistas civis respaldavam a descoberta.

Quatro cientistas civis mortos.

Rachel já não tinha mais como impedir a coletiva, mas jurou que o responsável pelo ataque não sairia impune.

Juntando todas as suas forças, tentou sentar-se. Seus membros pareciam feitos de pedra, e todas as suas juntas gritavam de dor enquanto ela dobrava braços e pernas. Lentamente, conseguiu ficar de quatro, equilibrando-se sobre o gelo escorregadio. Sua cabeça girava, enquanto ouvia o mar batendo vigorosamente contra o iceberg. Tolland estava deitado bem perto, olhando para ela, sem entender. Talvez ele ache que estou me ajoelhando para rezar, pensou ela. O que não era verdade, lógico, ainda que rezar fosse provavelmente um método tão eficaz para salvá-los quanto o que ela iria tentar.

Com a mão direita, tateou até achar a piqueta de gelo ainda presa em seu cinto. Seus dedos enrijecidos agarraram o cabo. Ela inverteu a piqueta, como um T invertido. Então, com toda a força que lhe restava, bateu com a cabeça da ferramenta contra o gelo. Tum. De novo. Tum. O sangue parecia uma pasta gelada fluindo em suas veias. Tum. Tolland olhou para ela, obviamente perplexo. Rachel bateu de novo com a piqueta. Tum.

Ele tentou apoiar-se sobre o cotovelo.

- Rã... chel?

Ela não respondeu. Precisava de toda a energia disponível. Tum. Tum.

- Eu não acredito... - disse Tolland - ...que um sinal tão ao norte... possa ser captado pela SAA...

Rachel virou-se para ele, surpresa. Ela se esquecera de que Mike era oceanógrafo e poderia ter compreendido o que ela estava fazendo. Sim, a idéia é essa, mas não estou tentando me comunicar com a SAA.

Continuou batendo.

A SAA (Suboceanic Acoustic Array) era uma rede de 59 microfones submarinos espalhados pelo planeta. Relíquia da Guerra Fria, a SAA vinha sendo usada nos últimos tempos por oceanógrafos do mundo inteiro para ouvir as baleias. Como os sons se propagavam por centenas de quilômetros sob a água, a rede era capaz de captar sinais numa enorme área em todos os oceanos. Infelizmente, aquele setor remoto do Ártico não estava dentro da área de cobertura, mas Rachel sabia que outros dispositivos estariam monitorando os sons no fundo dos oceanos, sistemas cuja existência era conhecida apenas por um punhado de pessoas no planeta. Ela continuou batendo. Sua mensagem era simples e clara.

TUM. TUM. TUM.

TUM... TUM... TUM...

TUM. TUM. TUM.

Rachel não tinha nenhuma ilusão de que aquilo salvaria suas vidas. Ela já podia sentir seu corpo enrijecendo com o frio, como se estivesse congelando pouco a pouco. Duvidava que fosse resistir a outros 30 minutos naquelas condições e sabia que não havia uma chance real de serem socorridos. Mas ela não estava pensando em resgate.

- Não vai dar tempo... - disse Tolland.

Isto não tem nada a ver conosco, ela pensou. Tem a ver com a informação no meu bolso. Rachel imaginou a impressão incriminadora do GPR que estava no bolso de velcro de seu macacão Mark IX. Preciso fazer com que esta impressão chegue às mãos do NRO... e rápido.

Mesmo em seu estado quase delirante, Rachel tinha certeza de que sua mensagem seria recebida. Em meados dos anos 1980, o NRO havia substituído a SAA por uma matriz 30 vezes mais poderosa. O NRO tinha agora cobertura total do globo através do Classic Wizard, seu ouvido de 12 milhões de dólares no fundo dos oceanos. Dentro de algumas horas, os supercomputadores Cray do posto de escuta do NRO e da NSA em Menwith Hill, na Inglaterra, iriam indicar uma seqüência anômala de sons em um dos hidrofones do Ártico. Depois decifrariam os batimentos como um S.O.S., triangulariam as coordenadas e um avião de resgate seria despachado da Base da Força Aérea em Thule, na Groenlândia. O avião iria encontrar três corpos em um iceberg. Congelados. Mortos. Um deles seria de uma funcionária do NRO... e ela estaria com um estranho pedaço de papel de impressão térmica em seu bolso.

A impressão de um GPR.

O último legado de Norah Mangor.

Quando aqueles que viessem resgatá-los estudassem a impressão, o misterioso túnel de inserção sob o meteorito seria revelado. A partir daí, Rachel não tinha idéia do que iria ocorrer, mas ao menos o segredo não morreria com ela ali, no gelo.


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