44
Mind, Beginners Mind) de Shunryu Suzuki, Esteja aqui agora {Be Here Now) de Ram Dass e um manual underground chamado Overlandto índia estavam no sumário da onda das décadas de 1960 e 1970 de ocidentais que faziam suas "viagens para o Oriente". íris, minha jovem esposa há um ano e meio, e eu, pós-hippies, pré-yuppies, estávamos naquela onda dos que foram para a índia. íris queria encontrar o guru indiano de Ram Dass, um homem velho, gordo e barbudo que usava um manto xadrez e se chamava Neem Karoli Baba. Eu, que sempre fui romancista, estava mais a fim de uma aventura do tipo Rudyard Kipling, quanto mais exótica, melhor. Tínhamos aquela visão de tudo que era indiano tão limitada na época que quando estávamos em Sarnath, um dos quatro locais mais sagrados do budismo, apesar de cercados pelas imagens do Buda, nem fomos visitar o lugar onde ele fez seu primeiro sermão. Aquela peregrinação era para descobrir a estrada, ter uma idéia do tamanho do mundo e dos bilhões de vidas vividas todos os dias em algum lugar sem que — imaginem só! — eu tivesse conhecimento delas. Apesar de não termos passado a usar mantos cor de abóbora na volta dessa viagem, e de não termos adotado nomes hindus, o passeio sugeriu que talvez existissem respostas para perguntas que eu não tinha sabedoria sequer para perguntar.
Agora, trinta anos depois, eu ia para lá de novo e armado com algumas dessas perguntas — dessa vez mais velho, um pouco mais sábio, mas ainda muito distante do grau de iluminação dentro de mim que me faria mais feliz. Enquanto isso a rádio Dharma, aquela estação cheia de estática que parecia que só eu conseguia sintonizar, continuava enviando comunicados misteriosos para mim, canalizando o Buda através dos mensageiros mais improváveis. Quem poderia pensar, por exemplo, que K. D. Lang, o cantor e compositor canadense declaradamente gay, entendesse de budismo? E no entanto...
Constant craving (Desejo constante) Has always been... (Sempre foi...)
Acima de tudo, qualquer peregrinação é uma metáfora. Peregrinação, como a própria meditação, se torna inevitavelmente uma
45
expedição ao nosso interior. Henry David Thoreau provou que podíamos fazer uma peregrinação no nosso próprio quintal. O Buda mostrou que podíamos fazer dentro da nossa cabeça.
Era ao mesmo tempo o pior e (suponho, portanto) o melhor momento para dar uma espiada dentro da minha cabeça. Claro que eu estava encarando alguns problemas pessoais - ou melhor, eu me recusava a encarar: minha relação com o dinheiro, minha relação com as mulheres, minha relação com a família, minha relação com o que eu escrevia, minha relação com o meu corpo, minha relação com a minha própria psique, minha relação com as relações. Mas tendo um itinerário complicado para montar era necessário (e mais fácil) me concentrar na viagem externa do que na interna. Raciocinei que devia ter feito alguma coisa certa ao longo do caminho para poder trocar meus cupons de Mérito Plus por aquele contrato de trabalho. E não pense que todos os dias na estrada, mesmo naqueles dias de pesadelo que acompanham qualquer viagem longa, não fiquei me beliscando. Sentado num banco no Sri Lanka, ou entrevistando o Dalai Lama, ou deslizando pelo rio Ganges, ou no topo de uma das mais belas montanhas da China acompanhado por uma das mais belas mulheres da China, eu tinha apenas uma explicação para o fato de ter chegado lá: um bom carma! Isso podia ser o mais próximo do nirvana jornalístico que eu ia alcançar. Mas como disse muito bem o dr. Kabat-Zinn: "Aonde quer que você vá, é lá que estará." E "eu" apareceria nos lugares mais indesejados, nos momentos mais inesperados, me arrastando como vorazes, apesar de esquizóides, paparazzi. Com o tempo eu ia ter de enfrentar os meus problemas, mas a nuvem mágica tinha acabado de se instalar e eu não tinha nenhuma intenção de desviar minha atenção do que achava que era meu "verdadeiro" objetivo, que na tradição antiga da minha profissão era "conseguir a história".
A noite antes de deixar Nova York tinha de ser uma das mais frias na história da cidade. Fui a um jantar de despedida com a minha filha Ariana e meu futuro genro Ryan. Agora eu estava parado numa esquina deserta da Lower Manhattan, encolhido de frio, tentando em vão chamar um táxi para voltar para o meu
46
hotel. Sentia tanto frio que pensei que minhas bochechas iam rachar e cair do meu rosto.
- Belo começo! - berrei bem alto para ninguém do meu lado. Meu vôo era no dia seguinte, e aquelas Grandes Perguntas
que eu pomposamente havia feito pareciam tão essenciais quanto a proverbial bicicleta para um peixe. Já estava vendo a manchete: "Escritor itinerante de viagens morre congelado tentando ir para o norte da cidade."
- Eu não estou mais aqui! - berrei para o meu companheiro invisível.
47
DESCOBRINDO A VERDADE DE BUDA PARA O SOFRIMENTO NA POLÔNIA
Dostları ilə paylaş: |