Revisão e Editoração Eletrônica João Carlos de Pinho



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Ele riu bem-humorado, mostrando duas fileiras de dentes alvos e bem distribuídos.

— Não. Ainda não. Arranjei um emprego melhor.

Vendo-os entrar juntos na sala de espera do consultório, a secretária convidou Alberto a sentar-se enquanto Lanira dirigiu-se à sala de Daniel, que, surpreendido, abraçou-a com carinho.

— Que bom vê-la! Cabulou a aula?

— Precisava falar com você. Mamãe vai procurá-lo logo mais à tar­de para fazer uma tentativa de convencê-lo a desistir.

— Terei prazer em recebê-la. Ela nunca veio aqui.

— Sua visita não será de cortesia.

— Eu sei. Mas mesmo assim será bem-vinda. Tenho esperança de que um dia ele vai me compreender.

— Esse dia está muito distante.

— Como vão as coisas lá em casa?

— Como sempre. Tudo dentro das regras e dos horários.

— Parece um pouco aborrecida.

— Entediada, talvez.

— Tem visto Gabriel?

— Ele desapareceu desde que o caso veio a público. Nunca mais me ligou. Deve estar sentido.

— Sinto muito. Você apreciava sua amizade. Mas eu avisei. A ati­tude dele era de se esperar.

— Você não o conhece. Ele é diferente. Eu esperava que ele conse­guisse separar as coisas.

— Nunca mais o viu?

— Nunca. O Dr. José Luís e D. Maria Júlia têm freqüentado todos os lugares de sempre, ido a festas, como se nada houvesse. Mas Laura de­sapareceu e Gabriel também. Dizem que está viajando. Penso que largou a faculdade. Não é época de férias ainda.

Daniel passou a mão nos cabelos pensativo. Depois disse:

— É uma pena que pessoas inocentes sejam envolvidas. Você com­preende que nós precisávamos fazer o que estamos fazendo.

— Claro. Você tem uma causa, e como advogado precisa atender os interesses de seu cliente. Depois, o que eles fizeram com Marcelo não se justifica de maneira alguma.

— Ainda bem que você sabe separar as coisas.

— Encontrei-me com Alberto na entrada do prédio e subimos jun­tos no elevador. Está mudado! Elegante, bem vestido. Nem parece o mes­mo. O que faz a roupa! Parece até que aumentou de estatura.

— Ele está trabalhando em uma companhia inglesa. Conseguiu um cargo importante junto à diretoria. Foi educado em um bom colégio na Inglaterra e isso o ajudou.

— Como vai o caso? A audiência é hoje!

— É. Estamos em um momento decisivo. Vamos ver o parecer do juiz. Por isso marcamos essa reunião com Alberto. Estamos esperando Jo­nas também.

— Gostaria muito de acompanhar o caso.

— Pode ficar e assistir à nossa reunião.

— Não vou atrapalhar?

— Não. Vai ser até bom. Você não está tão dentro do assunto como nós e poderá nos dar opinião.

Nesse caso, eu fico. Rubinho não vai se incomodar?

— Tenho certeza de que não. Afinal você nos ajudou desde o come­ço desse caso.

Rubinho entreabriu a porta e, vendo Lanira, abraçou-a com prazer. Ela lhe perguntou se poderia ficar para assistir à reunião e ele não só con­cordou como achou ótimo.

Assim, eles se dirigiram à sala de Rubens para repassar os fatos mais uma vez, esperar Jonas e verificar o que mais ele havia consegui­do descobrir.

Capítulo 10


Jonas chegou pouco depois e encontrou-os reunidos à espera.

— E então, como vão as coisas? — indagou Rubinho logo que o viu acomodado.

— Fervendo. Marilena ouviu uma conversa de Eleutéria com João, o marido. Ela reclamou dizendo que havia conversado com Bóris. O Dr. José Luís não iria mandar o dinheiro enquanto não resolvesse o caso na justiça. Ela disse:

— "O que ele está pensando que é? Isso é desculpa. Ninguém sabe nada sobre o que aconteceu. O idiota do Alberico já morreu. Ninguém pode provar nada."

— "Tem certeza? E se esse moço for mesmo o neto do velho?"

— "Não acredito. Na ocasião o Dr. José Luís afirmou que se livraria do menino para sempre. Que ninguém nunca saberia de nada. Desconfio até que ele o matou. Por isso, esse caso não vai dar em nada."

— "Se ele apagou mesmo o menino, como esse moço poderia conhe­cer essa história? Será que isso foi coisa da mãe do menino morto? Ela su­miu e vocês nunca mais a viram."

— "Não creio. Que interesse ela teria nisso?"

— "Arranjar um impostor, receber a fortuna. Pode bem ser."

— "Hum!... Acho que não. Se essa história vier a público, ela irá para a cadeia. Não. Não acredito que tenha sido ela. Acho que deve ter morrido."

— "Se não foi ela, então só pode mesmo ser o verdadeiro herdeiro."

— "Isso é que não. O Dr. José Luís não seria tão ingênuo para dei­xar esse menino vivo depois de tudo! Mas, seja como for, se ele pensa que vou me conformar em ser posta de lado por causa do problema dele, está muito enganado. Ao contrário, agora que ele vai precisar dobrar a bola­da. Se eu abrir a boca, ele perde tudo que tem. Acha que ele vai facilitar?"

— "Mas você pode ir presa como cúmplice."

— "Ele não vai deixar as coisas chegarem a tanto. Vai querer sal­var a pele. Agora é hora de pedir o quanto quisermos. Ele vai pagar, você vai ver."

— Pelo jeito eles vão querer tirar partido da situação — comen­tou Daniel.

— Eis a prova de que eu sempre disse a verdade! — comentou Al­berto emocionado.

— Isso nos dá coragem para continuar até que todos esses fatos se­jam esclarecidos — respondeu Rubinho.

— Estamos lidando com gente da pior espécie. Precisamos ter cui­dado — disse Daniel.

— Por que diz isso? — tornou Rubinho.

— Eles farão tudo para salvar a pele. Alberto precisa se precaver — alertou Daniel. — Eles podem tentar alguma coisa contra ele.

— Não tenho medo. Que venham. Assim poderemos esclarecer esse assunto de vez.

— Nada disso. Queremos fazer tudo dentro da lei, sem violência — contrapôs Rubinho.

— Eu também acho — tornou Daniel. — Tenho certeza de que eles nunca o atacariam pela frente. Mas nunca se sabe o que fariam pelas cos­tas. Só falei para que Alberto fique atento. Tome cuidado. Seria bom que não facilitasse andando por ruas desertas à noite, etc.

— Daniel tem razão — considerou Jonas. — Pelo que tenho obser­vado, eles são perigosos. Depois, tenho experiência. Para encobrir um cri­me, o assassino não se importa em cometer outros. Eu estive pensando: talvez possamos armar uma cilada para Eleutéria e o marido.

Todos o olharam com interesse. Rubinho indagou:

— Como?


— Com um gravador de som escondido. Seria uma boa gravar as conversas dos dois.

— Acha que Marilena saberia fazer isso? — perguntou Daniel.

— Posso ensiná-la. Tenho um amigo que sabe direitinho como fa­zer. Uma vez ele gravou uma conversa de um chantagista fazendo a extor­são. Foi sopa depois fazer ele confessar.

— Isso seria excelente. Pode cuidar disso. Acha que Marilena vai con­cordar? — indagou Rubinho.

— Vai. Ela está revoltada com o que tem ouvido. Agora está muito interessada em ajudar Alberto e a justiça.

— Nesse caso, vamos tentar. Vai ficar muito caro para montar tudo? — perguntou Daniel.

— Não. Acho que não. Meu amigo tem a aparelhagem. Pode dei­xar que sei como fazer isso.

— Pode ter certeza de que, quando eu receber o que me pertence, não vou me esquecer de todos que estão me ajudando agora — garantiu Alberto emocionado.

— E bom continuarmos a vigiar Bóris e Pola. Eles podem dar uma boa pista — tornou Rubinho.

— Claro. Preparo todo o material e levo para Marilena amanhã mes­mo. Enquanto ela cuida das gravações, eu volto e vou vigiar Bóris.

— Seria bom que arranjasse alguém para ficar vigiando enquanto você estiver fora. Algo me diz que não devemos deixar Bóris sem vigilância — disse Rubinho.

— Eu também acho. Falarei com um amigo e faremos tudo. Qual­quer novidade, eu entro em contato.

Ele se despediu e saiu. Alberto sentia-se nervoso, inquieto:

— Gostaria que esse dia acabasse logo e pudéssemos saber o resulta­do da audiência. O juiz despacha na hora?

— Nem sempre. Ele pode querer estudar melhor os fatos e demorar para dar o despacho — esclareceu Daniel, que também se sentia ansioso.

— Nesse caso, como vamos saber?

— Calma, Alberto — esclareceu Rubinho. — A partir de amanhã iremos todos os dias ao fórum tentar descobrir.

Ele passou a mão pelos cabelos num gesto nervoso.

— Vai ser difícil esperar.

Lanira aproximou-se dele, dizendo:

— Como não tem outro remédio, que tal tentar não se atormentar e procurar confiar na justiça?

— Diante do que tem acontecido, eu diria que seria bom confiar em Deus.

Lanira olhou Daniel admirada. Ela nunca o ouvira mencionar Deus. Ele era retraído com religião. Não se conteve:

— Por que diz isso?

— Por nada.

— Nós temos conversado com Júlio sobre espiritismo. Ultimamen­te temos pensado no assunto — esclareceu Rubinho.

— Não diga! Deixe mamãe saber disso!

— Você não vai dizer nada. Chega já os problemas que tenho arran­jado com ela.

— Claro que não. Para dizer a verdade, sempre tive curiosidade. Tia Josefa sempre me falava que via os espíritos. Você sabia que ela faz sessões em casa com alguns amigos? Eu queria ir assistir, mas ela nunca deixou por causa da mamãe.

— Tia Josefa? Tem certeza?

— Tenho. Ela sempre conversa comigo a respeito. Ela conversa com vovô Augusto e com tia Norma. Eles contam a ela coisas que vão acontecer.

— E acontecem? — indagou Rubinho interessado.

— Ela diz que sim. Júlio nunca me disse nada sobre isso. Ele faz ses­sões também?

. — Ele faz regressão. Através da hipnose a pessoa volta no tempo e se recorda de fatos de outras vidas — esclareceu Daniel.

— Mesmo? Puxa! Que interessante. Por que é que vocês nunca me contaram nada? — considerou Alberto.

— Não pensei que se interessasse — justificou-se Daniel.

— Eu me interesso muito por esse assunto. Na Inglaterra há gran­des pesquisadores. Desde o século passado eles vêm fazendo experimen­tações com médiuns, com resultados maravilhosos. Quando eu morava lá, freqüentava sessões em casa de amigos muito sérios e cultos.

Os três olharam-no surpreendidos. Alberto continuou:

— Para dizer a verdade, se resolvi voltar ao Brasil, procurar rea­ver o que me pertence, foi inspirado por alguém que já não é mais des­te mundo.

Vendo que os três o observavam com interesse, ele continuou:

— Quando eu era ainda adolescente, costumava sonhar com um se­nhor muito bondoso que vinha me buscar no quarto, passava o braço por minha cintura e me levava para lugares maravilhosos. Eu sentia uma sen­sação incrível de leveza, bem-estar, enquanto deslizávamos por lugares, como se estivéssemos voando, sobre cidades cujas luzes acesas eu podia ver lá do alto. Eu acordava com pena, sentindo que meu corpo era pesado e mui­tas vezes lhe dizia que gostaria de ficar lá com ele para sempre e não acor­dar mais. Ele, porém, não concordava e respondia: "Não é sua hora. Você tem ainda muito o que fazer no mundo".

— Sei o que quer dizer. E um sonho diferente dos outros — tor­nou Daniel.

— Isso mesmo. É muito diferente. Às vezes eu falava sobre isso com algum colega ou com algum professor, mas eles repetiam que era só um so­nho e que eu não deveria me impressionar tanto. Quando deixei o colé­gio e ingressei na universidade, conheci alguns colegas que conheciam es­ses fenômenos e me convidaram a estudá-los com eles. Compareci às sessões que se realizavam uma vez por semana e os fatos que aconteceram co­migo fizeram com que eu acreditasse na continuidade da vida após a mor­te e na comunicação dos espíritos.

— Você acha que quem já morreu pode vir e se comunicar conos­co? — perguntou Daniel.

— Tenho certeza. Certa vez eu compareci a uma sessão e, quando começou, uma médium me disse que estava vendo um homem de meia-idade perto de mim que desejava falar comigo. Pela descrição dela, reco­nheci o mesmo homem com o qual eu sonhava e, emocionado, disse que estava pronto a ouvi-lo. Ele se aproximou da médium e falou comigo por intermédio dela.

— O que foi que ele disse? — indagou Lanira.

— Disse que se chamava Antônio, que me amava muito e que esta­va sempre comigo. Que éramos ligados por laços muito fortes do passado e que iria me ajudar. Que eu tivesse confiança e continuasse indo às ses­sões, que ele voltaria a falar comigo. Naquela hora, senti uma emoção incontrolável. As lágrimas caíam de meus olhos sem que eu pudesse conter. Nossos encontros se repetiram e ele me falou do passado, dizendo que es­tava na hora de eu voltar ao Brasil, onde eu tinha coisas importantes a rea­lizar. Eu não queria voltar antes de me graduar, mas quando parei de re­ceber dinheiro fui forçado a interromper os estudos. Ele insistiu que eu nada mais tinha a fazer na Inglaterra e que deveria voltar ao Brasil. Eu não que­ria também interromper as sessões, nas quais recebia tanta ajuda espiritual, tanto conforto. Uma vez no Brasil, como poderia conversar novamente com ele? Mas ele disse que nunca me abandonaria e eu acabei aceitando e voltando. Mesmo sem ir às sessões, tenho certeza de que ele tem cum­prido a promessa. Às vezes sinto sua presença a meu lado, inspirando-me. Para ser franco, sinto que sem ele eu não teria descoberto a trama de meu passado. Agora eu sei que ele é o espírito de meu avô que sempre me amou e com o qual eu tenho grande afinidade espiritual.

Daniel ouvia calado, pensativo. Começava a pensar que seus sonhos deveriam ter algo a ver com essa situação, uma vez que eles haviam co­meçado quando Alberto apareceu em sua vida. Não disse nada, mas pelo olhar de Rubinho percebeu que ele estava pensando a mesma coisa.

— Tenho uma idéia! Vamos falar com tia Josefa, contar-lhe tudo. Podemos ir às sessões em casa dela, tentar conversar com esse espírito. Do jeito que as coisas estão, vamos precisar muito da ajuda dele — suge­riu Lanira.

— Ele poderá nos orientar — disse Rubinho.

— Não sei se faremos bem envolvendo-nos com essas coisas — res­pondeu Daniel.

— Eu acho bom. Desde que voltei ao Brasil não fui procurar ajuda

espiritual com os espíritos porque não queria que ninguém soubesse de meu caso antes da hora. Depois, aqui as pessoas praticam um espiritismo dife­rente do que eu estava acostumado. Em Londres, as sessões eram sempre de estudos, pesquisa, visando aprender alguma coisa. Aqui, cuidam mais de atender espíritos sofredores e ninguém faz pesquisa. Não era esse meu objetivo.

— Júlio é um estudioso e faz trabalho de pesquisa — informou Rubinho.

— Isso é interessante. Ajudar espíritos sofredores que incomodam pes­soas, doutriná-los, é uma ajuda passageira. O bom é ensinar as pessoas a lidar com as próprias emoções, com os desafios da vida, para que se equi­librem. Desta forma se libertam para sempre das influências de espíritos sofredores. Na Inglaterra, há médiuns de cura, mas eles trabalham apenas com imposição das mãos. Não recebem nem doutrinam espíritos pertur­bados. Dizem que é preciso melhorar a sintonia e ligar-se com os espíritos superiores — esclareceu Alberto.

— Estou vendo que você conhece o assunto — tornou Lanira com interesse. — Tia Josefa é pessoa muito equilibrada e isso sempre me im­pressionou. Mamãe vive dizendo que essa história de espíritos é perigosa e leva à loucura. Nunca acreditei nisso. Dizem que a tia é médium desde criança, e, pelo que tenho observado, é a pessoa mais tranqüila e serena que já vi. Muito mais do que mamãe, papai e até que nós todos.

— É sinal de que ela se ligou com espíritos superiores e sabe o que está fazendo. A mediunidade é uma porta preciosa para a conquista da sa­bedoria e da paz. Mas é preciso aprender a usar — explicou Alberto. — Se vocês conseguissem combinar com ela, eu gostaria muito de ir assistir a uma sessão.

— Eu prefiro tratar do assunto com Júlio — disse Daniel.

— Vamos fazer o seguinte, hoje mesmo falarei com tia Josefa. Vocês me autorizam a contar o que se passa? — perguntou Lanira.

— Seria melhor você dizer a ela que estamos estudando a comuni­cação com os espíritos e gostaríamos de ir a uma sessão em sua casa — su­geriu Alberto.

— Não seria melhor contar-lhe tudo? — interveio Rubinho.

— Não. O melhor é não dizer nada e esperar pelos acontecimentos. Os espíritos falam o que precisamos ouvir. Eles sabem ler nosso pensamento, e são mais espontâneos quando o médium ignora o assunto—es­clareceu Alberto.

— E verdade. Se ela ficar conhecendo toda a história com anteci­pação, tudo quanto os espíritos disserem a respeito vai nos parecer opinião dela — tornou Rubinho.

— Por isso é melhor não dizer nada e deixar acontecer. Sei por ex­periência própria que eles, quando querem, fazem coisas incríveis que aca­bam com todas as nossas dúvidas — disse Alberto.

— Então está combinado. Falarei com ela e depois darei a resposta — tornou Lanira.

— O que você vai lhe dizer? — perguntou Rubinho.

— Que queremos estudar o assunto. Apenas isso. Preciso con­tornar a situação de família. Ela sabe que mamãe não gosta e pode ne­gar permissão.

— Tenho certeza de que você saberá convencê-la — disse Alberto olhando-a nos olhos. — Você sempre consegue o que quer!

Daniel olhou-o surpreendido. Como ele podia saber desse traço de Lanira? Concluiu que, como toda pessoa que fala pouco, Alberto era mui­to observador.

— Tem razão. Lanira consegue mesmo.

— Então — tornou Rubinho — contamos com você.

— Pode deixar. Sei como fazer isso.

Eles riram alegres. Lanira notou que Alberto mudava completamen­te a fisionomia quando sorria e seus olhos perdiam aquele brilho duro, so­frido que por vezes fazia-a desviar os olhos quando ele a fitava.

— Tenho que ir trabalhar agora. — Alberto tirou um cartão do bol­so e deu-o a Lanira, dizendo: — Aqui tem meu telefone. Assim que com­binar tudo, pode ligar. Estarei esperando com ansiedade. É muito impor­tante para mim ir a essa sessão.

Lanira pegou o cartão e guardou-o na bolsa prometendo avisar assim que tivesse a data. Depois que Alberto se despediu e saiu, Rubinho não se conteve:

— Daniel, aqui tem o dedo de Deus. Não é possível! Quem poderia imaginar que Alberto estivesse tão ligado aos espíritos? Você pensou o que eu pensei?

— Claro. Tudo começou um dia antes de meu contato com Alber­to. Começo a achar coincidência demais. É perturbador.

— O que está acontecendo que eu não sei? — perguntou Lanira.

Rubinho olhou para Daniel:

— Coisas de seu irmão.

— O que é?

— Você agora não vai me dar paz enquanto eu não contar. Essa his­tória começa a me incomodar.

— Não é melhor contar logo? — sugeriu Lanira.

Em poucas palavras Daniel contou o que estava acontecendo com ele. Quando ele finalizou, Lanira não se conteve:

— Estou toda arrepiada! Puxa! E você ainda duvida? Eu já teria ido ao consultório de Júlio fazer uma regressão para descobrir a verdade. Essa de sonhar com Alberto antes mesmo de conhecê-lo é demais! Como pode acontecer isso?

— Não sei... Isso pode ser apenas uma coincidência. Preocupação com o caso. Por mais que eu queira negar, minha vida mudou radical­mente nos últimos tempos. Deixei a família, estou enfrentando um caso profissional difícil, todos estão contra nós, a vitória é incerta. Tudo isso pode ter me impressionado e feito com que eu tivesse aqueles pesadelos.

Lanira sacudiu a cabeça negativamente:

— Não acredito. É coincidência demais. Depois, Alberto está envol­vido com o espírito do avô. Ele parece estar interessado em fazer justiça. Em devolver ao neto tudo quanto lhe foi roubado. Isso sim faz sentido para mim. Estou pensando que, se vocês estão sendo ajudados por espíritos in­teressados em mostrar a verdade, vocês vão ganhar esta causa, por mais poder que o Dr. José Luís tenha.

— Agora quem está arrepiado sou eu — disse Rubinho. — E verda­de. Contar com uma ajuda dessas dá coragem.

— Vamos ver o que o juiz vai determinar. Nosso caso pode acabar aqui.

— Não seja tão pessimista, Daniel. Nunca vi ninguém ganhar nada acreditando na derrota.

— Lanira tem razão, Daniel. Precisamos conservar o otimismo. Logo agora que Jonas vai tentar obter uma grande prova! Começo a pen­sar que você tem tanto medo de confrontar o passado em uma regressão que prefere perder a causa, acabar logo com essa história para poder fi­car em paz.

— Sempre ouvi dizer que ninguém pode segurar uma verdade quan­do é hora dela. Você vai sofrer e tudo vai continuar. Quem pode lutar contra a força das coisas?

— Vocês dois estão exagerando. Já é tarde e estou com fome. Vamos almoçar? — propôs Daniel.

— Está bem. Vamos. Mas depois irei embora. Mamãe vai vir ao es­critório e não quero que saiba que tenho vindo aqui.

— É melhor mesmo — concordou Daniel. — E que ela não saiba tam­bém dessa história de sessão espírita. Senão vai ter uma crise.

— Pode deixar que eu sei como fazer as coisas.

Eles riram e conversando animadamente saíram para o restaurante. Almoçaram e estavam na sobremesa quando Lanira sentiu um baque no coração. Gabriel veio do fundo do salão, passou por eles e saiu. Ela o viu de costas, mas reconheceu-o imediatamente.

Ele passara por eles e não os cumprimentara. Ele os teria visto e evi­tado cumprimentar? O restaurante estava lotado. Era possível não tê-los visto. Mas ela não tinha certeza. Quando ele teria voltado?

— O que aconteceu? Nem fomos à sessão e você está com cara de quem viu fantasma — disse Daniel.

— Você não viu? Gabriel acabou de passar por aqui.

— Não vi. Também, há tanta gente...

— Será que ele não nos viu ou não quis cumprimentar? — inda­gou Lanira.

— É difícil dizer. Assim como eu não o vi, ele pode não nos ter vis­to — respondeu Daniel.

— Você está apaixonada por ele? — indagou Rubinho.

— Por que diz isso?

— Por sua expressão. Ficou pálida, triste, mudou de fisionomia — explicou Rubinho.

— Não. Apaixonada, não. Gosto dele, isso sim. Como um bom amigo. Até como um companheiro. Ele é muito especial, inteligente, bom. Apesar de tudo, eu tinha esperança de que ele soubesse separar as coisas e continuássemos amigos. Mas parece que ele não quer mais a mi­nha amizade.

— Não seja precipitada. Por que não conversa com ele francamen­te? Se preza tanto sua amizade, deve brigar por ela. Tenho aprendido que com as pessoas que queremos bem não devemos deixar assuntos mal ex­plicados, coisas não resolvidas. Se conversar com ele, mostrar que valori­za sua amizade, ele vai dizer o que pensa e você vai poder avaliar os fatos com clareza. Saber a verdade.

— É, vou pensar. Vamos ver.

— Ele pode estar envergonhado com o escândalo e ter se afasta­do por causa disso imaginando que você o esteja desprezando — suge­riu Rubinho.

— Você acha que ele pode estar sentindo isso? — disse ela assustada.

— Por que não? Qualquer um sentiria vergonha diante de um pro­blema desses. Mesmo que ele não acredite que seja verdade.

— Rubinho está certo. Se eu fosse filho deles, desapareceria do mapa até que tudo ficasse esclarecido. Já pensou os comentários que devem es­tar circulando à boca pequena? Infelizmente não podemos evitar isso.

— Estou começando a pensar que vocês têm razão. Ele pode mes­mo estar se escondendo. Deixou a faculdade. Certamente por causa dos falatórios.

— Nesse caso o melhor seria ele ter ficado e enfrentado os fatos com coragem. Se fosse comigo, eu os teria enfrentado. É melhor do que fugir. Depois, ele é ele, os pais são os pais. Ele não é responsável pelos atos de­les. Acho engraçado como as pessoas pensam. Elas se envergonham pe­los que bebem, pelos viciados, pelos desbocados, pelos desonestos. Carre­gam nas costas o peso do comportamento de toda a família. Não é loucu­ra? Quem pode ser responsável pelos atos dos outros? Só porque você tem parentes, precisa responder por tudo quanto eles fazem? — considerou Rubinho.

— Isso é verdade. Meus pais se envergonharam de mim só porque resolvi cuidar de minha vida de outra forma e assumir o caso contra os Ca­margo. Para mim, fiz o melhor e o que me parece certo.


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