Revisão e Editoração Eletrônica João Carlos de Pinho



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Maria Júlia iria recusar, mas Laura apareceu na sala e Maria Júlia olhou-a admirada. Sua aparência estava muito melhor. Gabriel olhou para a irmã e disse:

— Vou ligar para Lanira e para o Dr. Gouveia, convidando-os para o chá. O que acha?

Laura olhou-o com ar desafiador e respondeu:

— Por mim está bem. Ainda acha que sou relaxada?

— Não, maninha. Você agora está um chuchu. Se exibir seu lindo sorriso, ficará ainda melhor.

Maria Júlia sentiu seu coração bater mais forte. Olhou-se no espelho. Também estava abatida. Precisava arrumar-se um pouco.

A criada introduziu Lanira e Marcelo na sala. Depois dos cumprimen­tos, Gabriel disse alegre:

— Ainda bem que chegaram. Iria ligar para você vir.

— Tomei a liberdade de convidar Marcelo — respondeu ela. — Ele estava com saudade de vocês, mas tinha receio de incomodar.

— O que é isso, meu filho? — disse Maria Júlia. — Venha sempre que quiser. Teremos muita alegria em recebê-lo.

— Obrigado, D. Maria Júlia. Eu estava com saudade mesmo.

— Fiquem à vontade. Vou subir um pouco. Com licença. Gabriel olhou para Laura e piscou o olho. Ela entendeu.

— O que está acontecendo por aqui que eu não sei? — indagou La­nira aproximando-se de Gabriel.

Marcelo sentou-se ao lado de Laura no sofá e perguntou:

— Sente-se melhor?

— Estou tentando reagir.

— Fico feliz de vê-la mais calma. Estive aqui duas vezes e você nem desceu. Fiquei apreensivo.

— De fato, eu estava mal. Mas o que aconteceu não tem remédio e a vida continua. Obrigada pelo que fez por mim no tribunal. Ainda não tive ocasião de lhe agradecer.

— Naquele dia fiquei muito abalado. Eu desvendei essa história. Sa­bia que vocês iriam sofrer, mas precisava fazer o que fiz. Senti-me culpa­do por seu sofrimento. Queria muito que me perdoasse por isso e que acei­tasse minha amizade. Garanto que é de coração.

Laura olhou-o nos olhos durante alguns segundos, depois disse:

— Estou precisando muito de amigos. Quando o escândalo estourou, as pessoas afastaram-se de nós e as que se aproximavam tinham intenção de especular para comentar depois. Por isso Gabriel largou a faculdade. To­dos os amigos desapareceram.

— Menos Lanira. Ela tem sido fiel.

— É. Quem eu menos esperava. A vida tem dessas surpresas. Lanira sentara-se em outro sofá com Gabriel e conversavam baixi­nho. Marcelo olhou-os e entristeceu-se.

— Também está apaixonado por Lanira? — indagou Laura.

— Por que pergunta?

— Você ficou triste quando os olhou tão próximos.

— Confesso que ela me atrai. Mas pelo jeito ela prefere Gabriel. — Ele tentou desviar o assunto: — E você, está apaixonada?

— Tive alguns namoradinhos, mas nunca me apaixonei. Para dizer a verdade, penso que amor é ilusão. As pessoas unem-se por interesse. O homem para ter um lar, filhos, perpetuar o nome da família; a mulher para ter quem cuide dela pelo resto da vida.

— É isso que você pensa? Quando chegar a hora, escolhe um bom moço, casa-se e pronto?

— Confesso que o casamento não me atrai nem um pouco. É uma prisão sem graça em que a mulher se anula a cada dia.

Marcelo meneou a cabeça dizendo:

— O dia em que o amor entrar em seu coração, mudará de idéia. Sem­pre vivi só, e sonho encontrar uma mulher que eu ame e que me corres­ponda para criar uma família como nunca tive. Tenho muito amor guar­dado dentro de mim e uma vontade muito grande de dividir isso com al­guém e poder finalmente viver em um ambiente de carinho e de paz.

Laura olhou-o admirada.

— Você é um romântico. Acha que Lanira seria essa mulher?

— Não sei. Para que meu sonho se realize, minha companheira terá que me amar muito, tanto quanto eu a amarei. Lanira me atrai, tem sido

gentil comigo, mas não parece me amar. Veja, seus olhos brilham quan­do fala com Gabriel.

— Não se importa de perder?

— Se ela gosta dele, não estou perdendo nada. Só estou perceben­do que ela não é a moça de meus sonhos.

— Vai continuar esperando por ela?

— Vou.

— E se ela não aparecer?



— Virei atrás de você para dividir minha solidão. Sei que está se sentindo muito só também. Acho que, enquanto o amor não aparece, po­demos fazer companhia um para o outro. Que tal?

Laura sorriu:

— É uma boa idéia.

Maria Júlia desceu mais arrumada e Gabriel trocou um olhar alegre com Lanira. Telefonara para Guilherme convidando-o ao chá. Ele che­gou dez minutos depois e cumprimentou a todos com prazer.

Seus olhos brilhavam e Gabriel sentiu-se feliz percebendo que Ma­ria Júlia, com a fisionomia distendida, fazia as honras da casa com prazer. Fazia muito tempo que ele não via seu rosto tão calmo. Olhando todos na sala conversando animadamente, sentiu que dali para a frente tudo iria mu­dar para melhor.
Lanira entrou em casa mais animada. Laura estava melhor e Gabriel dissera-lhe que a amava cada dia mais. Pela emoção que sentiu naquele momento, compreendeu que era a ele que amava.

Marcelo era atraente, inteligente, agradável, mas Gabriel tocava fun­do em seu coração, com seus olhos doces, sua figura elegante, seu jeito ca­rinhoso e firme de ser. Se ele a pedisse em namoro, aceitaria.

Passava das nove. Ela iria subir para o quarto quando ouviu vozes no escritório. Prestou atenção. Seus pais estavam discutindo? Aproxi­mou-se da porta que estava entreaberta e ouviu a voz firme de Maria Ali­ce dizendo:

— A decisão é sua. Não vou mais tolerar essa vergonha. Ou você man­da sua secretária embora, acaba com essa ligação vergonhosa, ou sairá des­ta casa para sempre.

— Isso é uma calúnia. Não pode deixar-se levar por uma carta anô­nima. Tenha bom senso.

— Não adianta, Antônio. Há muito tempo que sei de tudo. Se nun­ca falei nada, foi porque desejava preservar o bom nome de nossa família.

O futuro de Lanira não pode ser prejudicado por um desquite. Mas sua fal­ta de vergonha chegou a um ponto que já é de domínio público. Portan­to meu sacrifício tornou-se inútil.

— Tenha calma, Maria Alice. Você sempre foi ponderada.

— Já coloquei suas coisas no quarto de hóspedes. Por enquanto vou tolerar sua presença nesta casa. Não quero que diga que não lhe dei chan­ce de arrepender-se e de acabar com essa sujeira. Mas nosso relaciona­mento acabou. Assim que Lanira se casar, quero o desquite.

— Como pode agir assim depois de tantos anos juntos? Você não tem sentimentos. Acaba com nosso casamento com essa calma....

Maria Alice olhou-o friamente. Como pudera amar aquele homem tão falso? Foi com voz firme e indiferente que respondeu:

— Minha consciência não me acusa de nada. Sempre fui esposa fiel e cumpridora de meus deveres. Sempre respeitei o nome que me deu e aju­dei-o a galgar todos os degraus de sua carreira política. Foi você quem traiu, foi você que de tanto mentir para seus eleitores acabou mentindo para a própria família. Não quero mais isso em minha vida. Tenho o direito de exigir respeito e de viver em paz sem compactuar com suas falcatruas.

— O que direi a Alicia? Ela é uma senhora direita. Não merece essa suspeita vil.

— Isso é problema seu. Se tem dificuldade em despedi-la, posso fa­zer isso amanhã mesmo.

— Você teria coragem de fazer uma cena em meu escritório? Nun­ca pensei que fosse capaz de uma baixeza dessas!

— Eu sou. Se não tem coragem, eu irei até lá e a despedirei com pou­cas palavras, sem me alterar. Afinal, ela já usufruiu bastante. Teve bons passeios, hospedou-se em hotéis de luxo, ganhou roupas finas, jóias. O que pode querer mais? Está muito bem paga. Não tem do que se queixar.

— Você está louca! Se pensa que vou permitir isso, está muito en­ganada. Não vou fazer uma inocente pagar por suas suspeitas injustas.

— Nesse caso, pode ir direto para um hotel. Aliás, no quarto de hós­pedes há uma mala preparada para essa eventualidade. Amanhã manda­rei o restante.

— Não vou fazer o que quer. Esta casa é minha e daqui não sairei.

— Tentei uma solução amigável. Mas você não entendeu. Nesse caso estou decidida a procurar um advogado para tratar de nossa separação.

— Quer arruinar minha carreira? Está com tanta raiva de mim que pretende destruir-me?

— Engana-se. Quero apenas cuidar de minha vida do meu jeito. Não preciso fazer nada para destruir sua carreira. Você já fez isso muito bem. Estou cansada e vou dormir.

Vendo que ela ia sair, Lanira afastou-se da porta, subiu rapidamente as escadas e ficou esperando no quarto, com o coração batendo forte. Ou­viu quando ela subiu, dirigiu-se para o quarto do casal e fechou a porta.

Não teve coragem de bater no quarto da mãe com medo que seu pai as surpreendesse. Ficou atenta ao menor ruído e deixou a porta de seu quarto apenas encostada para poder ouvir melhor.

Ouviu quando seu pai subiu as escadas e bateu na porta do quarto vá­rias vezes. Ela não abriu e ele acabou indo para o quarto de hóspedes.

Lanira preparou-se para dormir, mas o sono não vinha. Sabia que Maria Alice estava segura do que dissera. Sua voz estava firme, revelan­do uma atitude refletida largamente. Depois, ela tinha a força de quem sabe o que faz e está com a razão. O que seu pai faria? Aceitaria uma situação que sempre odiara ou acabaria com aquele relacionamento? Por mais que pensasse, ela não sabia o que ele iria fazer.


Capítulo 28
Daniel apressou-se. Estava atrasado para a cerimônia. Ainda tinha que passar em casa de Lídia para apanhá-la. O casamento estava marcado para as sete da noite. Olhou-se no espelho com satisfação. Estava muito ele­gante. Iriam ser padrinhos dê casamento de Rubinho e Marilda, e ele que­ria apresentar-se bem, pois tinha certeza de que Lídia estaria muito bem vestida.

Dentro de mais alguns meses, eles também estariam se casando. Havia comprado uma bela casa e já estavam decorando com capricho e alegria.

Um ano depois do julgamento de José Luís, tudo havia se modifica­do. Marcelo tomara posse da fortuna que lhe pertencia e pagara regia­mente seus advogados. Maria Júlia ficara apenas com alguns bens que her­dara de sua família e uma pequena propriedade que José Luís comprara an­tes de tomar posse do dinheiro do tio.

A casa em que Maria Júlia morava com os filhos fora do avô de Mar­celo e pertencia-lhe por direito.

Depois daquela primeira visita a casa de Maria Júlia, Guilherme pas­sou a ir lá todos as tardes, ficando para o jantar. Sua presença discreta, ele­gante, seu jeito ponderado e educado, a delicadeza de suas atitudes, o res­peito que demonstrava por todos, a conversa inteligente sempre interes­sante acabou por encantar Gabriel, que a cada dia mais se sentia feliz em tê-lo como pai. Depois Maria Júlia havia rejuvenescido, mostrava-se mais alegre, mais interessada nas coisas e mais serena.

Aos poucos Laura também foi aprendendo a gostar de Guilherme. Quando a via triste, encontrava sempre uma forma de interessá-la em coi­sas alegres e ela sem perceber acabava se sentindo melhor.

Uma tarde, apareceu com uma cesta na qual havia um lindo cachorrinho branco e peludo e colocou-a no colo de Laura, que encantada apa­nhou o bichinho que abanava o rabinho e a premiava com generosas lambidas, olhando-a com olhinhos brilhantes e tão alegres que ela o abra­çou feliz.

Desde esse dia, onde Laura ia, Mocinho, como ela o chamava, acom­panhava-a. Dormia com ela na cama, o que fez Maria Júlia comentar com Guilherme:

— Nunca pensei que Laura gostasse tanto de cachorro. Dormir com ela na cama é exagero! Comprei uma bela caminha para ele, mas ela não o deixa ficar lá.

— Não se incomode — tornou Guilherme. — Deixe-a. Dar amor devolver-lhe-á o equilíbrio. Ela precisa deixar seu amor sair.

— Nunca pensei que isso pudesse ajudá-la.

— Um animalzinho amoroso, fiel, que depende de seus cuidados, fará mais por ela do que qualquer terapia. Você verá.

De fato, Laura ganhou mais alegria, ocupou-se de Mocinho e aos poucos foi se interessando mais pelas coisas do dia-a-dia. Esse foi o prin­cípio de sua amizade com Guilherme, que começou conversando sobre o cachorrinho e acabou se tornando um verdadeiro amigo, ouvindo suas confidencias.

Sempre que conversavam, ele nunca lhe dizia o que fazer, mas pro­curava colocar as coisas claras, de maneira que facilitasse a ela compreen­der melhor o assunto, dando-lhe sempre o poder de decisão.

Assim, ela foi se tornando mais confiante em si mesma e, por sentir que as conversas com ele lhe faziam muito bem, procurava-o com freqüência.

Quando Guilherme reuniu-os para uma conversa, convidando-os para uma viagem aos Estados Unidos, onde pretendia conseguir o divór­cio de Maria Júlia e o casamento, Laura concordou.

Seu pai continuava internado, enlouquecido, cada dia mais furioso. Ela se conformou sabendo que, mesmo que ele melhorasse, nunca mais sai­ria da cadeia.

— Depois de nosso casamento, poderemos viajar para onde quise­rem. Tenho três meses de licença e estarei à disposição de vocês. Depois, quando voltarmos ao Brasil, iremos morar em minha casa. Gostaria que fossem até lá comigo antes da viagem e ajudassem-me a transformá-la a seu gosto. Quero que se sintam à vontade, escolham seus aposentos e de­corem-nos como gostam.

— Quer dizer que não voltaremos a morar aqui? — indagou Laura. Foi Maria Júlia quem respondeu:

— Esta casa pertence a Marcelo. Portanto dentro em breve teríamos que deixá-la.

— Espero que gostem de minha casa e se sintam à vontade lá.

— Esta casa me traz péssimas lembranças. É bom poder ir viver em outro lugar. Só tem uma coisa: não quero ficar muito tempo fora. Logo ago­ra que eu e Lanira estamos nos entendendo.

— Você precisa de um tempo para reassumir sua vida. Descobrir o que deseja fazer. Se quer continuar a faculdade ou se prefere dedicar-se a outro trabalho. Esperar um pouco vai dar a vocês mais condições de avaliar os próprios sentimentos. Depois, há o telefone, o correio, vocês podem cor­responder-se. Mas se não agüentar a saudade, poderá voltar antes.

Gabriel concordou. Sentia que viajar, mudar um pouco de ambien­te iria fazer-lhe muito bem. Procurou Lanira, contou-lhe os planos da fa­mília e finalizou:

— Viajaremos dentro de uma semana. Antes de ir, porém, quero es­clarecer algumas coisas com você. Temos estado juntos, tenho dito que a amo muito e tenho percebido que sou correspondido. Uma vez eu a pedi em casamento e você recusou. Talvez porque tenha pensado que eu a pedi só por dever, querendo consertar o que aconteceu. Mas não é verdade. Eu a amo com sinceridade e quero me casar com você. Quero estar a seu lado e amá-la sempre. Você quer?

— Quero. Agora já sei que é a você que eu amo. O casamento me assusta, mas desde já garanto que não pretendo transformar-me em uma matrona acomodada, nem em uma apaziguadora dentro do lar. Tenho gê­nio, faço as coisas do meu jeito e não gosto de ser cerceada. Gosto de con­versar, expor minhas idéias, e só aceito mudá-las quando me provam que há outras melhores. Sinto que vou continuar sendo assim, mesmo aman­do você. Agora sou eu quem pergunta: ainda quer se casar comigo?

Ele a beijou apaixonadamente nos lábios muitas vezes, depois disse:

— Antes de viajar quero falar com seu pai, pedir permissão para namorá-la.

Lanira meneou a cabeça dizendo:

— As coisas lá em casa andam meio complicadas. Talvez não seja um bom momento para isso.

— Acha que ele pode recusar por causa de José Luís?

— Não. Ele e mamãe andam se desentendendo. Estão separados. Ela o colocou no quarto de hóspedes e quer que ele vá embora, mas ele não vai.

— Eles sempre pareceram tão felizes!

— As aparências enganam.

— Falarei com D. Maria Alice. Ela me dirá se posso ir até ele. Gabriel conversou com ela, que consentiu no namoro, sentindo-se aliviada. Com o casamento da filha, poderia cuidar de sua própria vida. Aconselhou-o a não falar com Antônio. Ele estava intratável porque ela havia contratado um advogado para cuidar da separação. Ele estava inconformado. Principalmente porque Alicia, envergonhada, também se recu­sava a sair com ele e a continuar o relacionamento.

Daniel chegou em casa de Lídia, que o esperava pronta. Estava lin­da. A cerimônia na igreja foi muito bonita. Daniel sentiu-se emocionado ao lado de Lídia. Gabriel, ao lado de Lanira, pensava como seria feliz quando também se casassem.

Maria Júlia, Guilherme e Laura continuavam viajando. Eles haviam se casado nos Estados Unidos e regressado para a belíssima casa onde fo­ram instalados com luxo e bom gosto. Apesar da boa vontade de Guilherme para mudar o que quisessem, não quiseram mudar nada. A casa era mui­to bonita, cheia de objetos de arte, e eles ficaram encantados em poder viver lá.

Depois de algum tempo, decidiram viajar novamente. Laura estava descobrindo o prazer de conhecer outros países, principalmente porque Gui­lherme era um cicerone maravilhoso. Profundo conhecedor de história, contava coisas de cada lugar em que passavam, tornando ainda mais in­teressante a viagem. Estavam felizes.

Gabriel retomara a faculdade e o namoro com Lanira. Conversara com Antônio, que acabara por consentir. Andava triste, infeliz. Alicia aban­donara-o, cheia de culpa e de vergonha.

Procurara por Maria Alice para pedir-lhe perdão e dizer-lhe que iria voltar para a pequena cidade onde sua família vivia. Dizia-se arrependi­da, sentia-se a última das mulheres.

Maria Alice, vendo que lágrimas nos olhos dela estavam prestes a cair, disse apenas:

— Eu estou me separando dele. Se quiserem continuar, estão livres. O que desejo éque ele desapareça de minha vida e me deixe em paz.

Ouvindo-a, Alicia não conseguiu conter-se ma\s, rompeu em soluços, o que fez Maria Alice dizer com voz calma:

— Não precisa se emocionar dessa forma. Depois de ter sido aman­te dele todos esses anos, chorar não serve para nada. Pelo menos assuma sua posição e agüente com dignidade as conseqüências.

Ela parou de chorar e saiu sem dizer palavra. No mesmo dia, foi ao escritório, apanhou suas coisas e desapareceu. Quando Antônio foi à sua procura no apartamento, ela já havia se mudado. Desesperado, voltou para casa. Sua vida estava se desmoronando. Sua carreira política estava indo por água abaixo. As pessoas olhavam-no com ar malicioso e ele não se atrevia a freqüentar os lugares da moda.

Na roda de amigos já se comentava a separação e ele sentia que as pessoas olhavam-no com ar de reprovação, elogiando Maria Alice. De re­pente ele começou a sentir-se sozinho e triste. Maria Alice continuava lin­da, discreta, admirada, cheia de classe, e ele se arrependeu de haver mer­gulhado naquela aventura com Alicia. Mas era tarde.

Tentou aproximar-se dela, contar de seu arrependimento na espe­rança de que ela o perdoasse e o aceitasse de volta. Entretanto, por mais que fizesse, ela não cedia. Finalmente percebeu o quanto ela estava mu­dada. Algo havia se partido entre eles e não haveria mais volta.

Reuniu o resto de seu sentimento de dignidade que ainda possuía e aceitou a separação, com todas as condições legais que o advogado dela propôs-lhe. Mudou-se para o apartamento e como sempre fizera tratou de fingir diante dos amigos, dizendo que não estava se importando nem um pouco com o fracasso de seu casamento.

A recepção de casamento que os pais de Marilda ofereceram em seu palacete na Lagoa era finíssima. A festa estava animada. Rubinho conse­guira notoriedade e seu casamento marcou época na sociedade, embora ele não se importasse com isso.

Marcelo sentia-se solitário naquela festa. Laura, de quem se tornara muito amigo, estava fora; Lanira, namorando Gabriel, afastara-se natural­mente. Lídia aproximou-se dele dizendo:

— Está tão pensativo! Não está gostando da festa?

— Estou. Tudo está perfeito. Eu é que sou um bicho do mato. Não tenho facilidade em fazer amigos.

— O baile está animado. Há muitas meninas ansiosas para dançar. Por que não tenta?

— Hoje estou me sentindo muito só. Já lhe aconteceu? Estar em meio a muitas pessoas, em uma festa bonita e animada como esta, e sen­tir-se só?

— Já. Como está se sentindo em sua nova casa?

— Morar na casa de meu avô sempre foi meu maior sonho. Pensa­va que lá estaria mais próximo dele. Mas às vezes penso que não foi bom ir morar lá. As lembranças da tragédia de minha família ficaram mais vi­vas. E difícil esquecer quando tudo me recorda o que passou.

— Uma casa guarda sempre a energia de seus moradores. Nessa casa eles viveram momentos de angústia, de medo, de insegurança. Você pode estar sentindo essas influências. Por que não faz uma reforma? É bom para renovar o ambiente.

— Pode ser mesmo. Às vezes sou acometido de tristeza, de angústia, sem nenhum motivo. Vou falar com D. Josefa, pedir ajuda.

— Faça isso. Não o tenho visto nas sessões lá.

— De fato. Tenho me afastado um pouco, ocupado com meus afa­zeres. Estou tentando retomar os negócios do vovô. Comprar novamen­te a empresa que foi dele e que José Luís vendeu.

Daniel aproximou-se e sentiu um aperto no coração. Ver Marcelo ao lado de Lídia incomodava-o. Tentou dissimular:

— Desculpe a demora. Rubinho vai ficar fora um mês e tinha mil recomendações. Não se esqueceu delas nem do dia de seu casamento!

— Tudo bem. Falávamos dos projetos de Marcelo. Sabia que ele está fechando negócio com a empresa que era de seu avô? Acho bonito reto­mar isso também.

— Sabia. Estamos tratando dos contratos. Quer dançar?

— Mais tarde. Está tão agradável aqui!

Daniel sentou-se esperando que Marcelo se levantasse e os deixasse sozinhos na mesa. Mas ele não parecia interessado em fazer isso. Estava segurando a taça de champanhe, pensativo.

Tentando esconder a inquietação, Daniel dirigiu-se a Marcelo:

— Você não gosta de dançar?

— Gosto. Mas hoje estou sem disposição.

— Às vezes basta começar e o entusiasmo aparece — disse Lídia. E voltando-se para Daniel explicou: — Penso que Marcelo precisa fazer al­guma coisa para mudar as energias da casa onde foi morar. Aquelas pare­des ainda guardam as lembranças de seus antigos moradores. Seria bom voltar às sessões em casa de Josefa. Esta falta de entusiasmo não deve ser natural. Você, Marcelo, tem tudo que precisa para ser feliz. É jovem e muito atraente. Tenho certeza de que se olhar em volta não ficará muito tempo sozinho.

Marcelo sorriu e respondeu: ^

— Diz isso para me animar. Quando estava na Inglaterra, tinha fa­ses de depressão. Eu as atribuía à minha orfandade, ao desconhecimento de minha origem. Hoje não tenho mais esses motivos. Só que essas fases ainda permanecem. Às vezes sinto que me falta alguma coisa ainda. Que preciso encontrar alguém. Às vezes sonho com uma mulher que está de costas, fico deslumbrado, sinto que a encontrei. Mas quando me aproxi­mo e vou abraçá-la, ela desaparece e fico desesperado. O vazio reaparece e a sensação de solidão me acompanha por alguns dias.

Daniel sentiu um aperto no peito. Marcelo nunca lhe contara isso. Ele teve certeza de que essa mulher que ele via era Lídia. Olhou-o assus­tado. O que ele faria se um dia descobrisse a verdade? Percebeu que era esse medo que aparecia sempre que ele conversava com ela.

— Interessante — comentou ela. — É sempre o mesmo sonho?

— Às vezes um pouco diferente, mas sempre com a mesma mulher. Ela sempre está de costas e nunca consigo ver seu rosto.

— Os sonhos são sempre assim, confusos — interveio Daniel. — Não se pode acreditar neles.

— Há sonhos e sonhos — respondeu Marcelo. — Esses despertam em mim tantas emoções que devem ter algum significado maior. As ce­nas permanecem em minha lembrança durante alguns dias. E mesmo ago­ra, ao mencioná-los, parece-me vê-los de novo.

— Talvez sejam lembranças de suas vidas passadas. Coisas que mar­caram tanto você que inconscientemente seu espírito as procura duran­te o sono.

Daniel remexeu-se na cadeira inquieto. Por que Marcelo não ia em­bora? Ele parecia não estar nem pensando nisso. Olhos perdidos em um ponto distante, disse:


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