Whois Golem-net.net.
Tom esperava a tela mostrar a resposta. Não se podia fazer nada nesses momentos, enquanto as luzes tremeluziam e a ampulheta continuava piscando. Não se podia apressar o computador. As pessoas sempre tentavam fazer isso. Via-se isso nos caixas eletrônicos, as mãos em posição, como a boca de um crocodilo posicionada junto à fenda por onde saía o dinheiro, à espera de agarrá-lo quando aparecesse, assegurando-se de que nem uma fração de segundo seria desperdiçada. Via-se nos escritórios, onde as pessoas martelavam o lápis ou tocavam as coxas como bongôs: "Ande, ande", incentivando o computador ou a impressora a pararem de ser uma coisa tão lerda. Will se esquecia de que há cinco, dez ou quinze anos a tarefa em questão poderia levar a maior parte de um dia de trabalho.
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Ah. Ora, isso é interessante.
Nenhuma ocorrência de golem-net.net.
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Eles inventaram.
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E agora?
Tom voltou para o próprio e-mail e selecionou uma opção que Will desconhecia: "Ver Cabeçalho Inteiro." De repente, várias linhas do que ele teria descartado como palavras e frases truncadas encheram a tela.
— Muito bem — disse Tom. — O que temos aqui é uma espécie de diário de viagem. Mostra a você a jornada da internet feita pelo e-mail. Essa linha no alto é o destino final, e essa, embaixo, o ponto de origem. Cada servidor no percurso tem sua própria linha.
Will olhou a tela, cada frase começando com "Recebido..."
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Hmm. Esses caras estão com pressa.
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Como sabe disso?
— Bem, você pode inventar "linhas recebidas". Mas isso leva tempo... e quem quer que tenha enviado essa mensagem não tinha tempo. Ou não sabia como fazer. Essas linhas recebidas são todas autênticas. Certo, é isso que precisamos. Aqui. — Apontava a linha de baixo, o ponto de origem: Recebido de info.net-spot.biz.
— O que é isso?
— Todo computador no mundo, uma vez conectado à internet, tem um nome. Aquele ali é o computador que lhe enviou o e-mail. Tudo bem. Isso significa que preciso dar mais um passo.
Will via que Tom não se sentia à vontade. Não gostava de fazer as coisas desse modo. Lembrou-se de uma de suas primeiras conversas, quando Tom explicou a diferença entre hackers e crackers, white hats e black hats. Will gostou de todos os nomes; achou que poderiam dar uma matéria.
Tinha uma vaga lembrança. Lembrou sua surpresa ao descobrir que hacker era um termo em geral mal empregado. Muitas vezes o aplicavam aos nerds adolescentes que invadiam os computadores — incluindo a Nasa e a Otan — e causavam estragos. Entre o pessoal de tecnologia, hacker tinha um significado mais brando: referia-se àqueles que brincavam nos gramados virtuais de outras pessoas por diversão, mas não por maldade. Os que tinham más intenções e visavam estragos — espalhando vírus, derrubando o sistema telefônico de Emergência — eram chamados de crackers. Eram hackers que disseminavam destruição.
A mesma distinção aplicava-se aos white hats e aos black hats. Os primeiros fuçavam onde não eram bem-vindos — dentro do sistema dos maiores bancos dos Estados Unidos, por exemplo —, mas com motivações benignas. Podiam bisbilhotar os números das contas dos clientes, até descobrir suas senhas, mas não lhes tiravam o dinheiro (embora pudessem). Em vez disso, enviavam um e-mail ao diretor de tecnologia no banco com alguns exemplos das informações pilhadas. Uma mensagem de um white hat típica, à espera na caixa de entrada do desafortunado funcionário responsável, às vezes dizia: "Se eu posso ver seus dados, os bandidos também podem. Corrija-os." Se o destinatário fosse realmente azarado, uma cópia do e-mail seria enviada ao diretor executivo.
Os black hats fazem a mesma coisa, porém com os objetivos mais sinistros. Invadem redes de segurança máxima, não pelo princípio desbravador — ser o primeiro a conseguir —, mas a fim de causar algum dano. Ãs vezes, para roubar, mas com maior freqüência para vandalismo cibernético: a emoção de abater um grande alvo. Os vírus que ganharam as manchetes do passado — I Love You e Michelangelo — foram considerados obras-primas entre os black hats.
Claro que o chapéu de Tom era tão branco quanto possível. Ele adorava a internet, queria que funcionasse. Raras vezes hackeava, muito menos crackeava. Acreditava que era essencial o mundo passar a confiar na rede, as pessoas sentirem-se seguras nela — e isso significava conter aqueles que, como ele, sabiam onde encontrar buracos na cerca. Mas tratava-se de uma situação excepcional. A vida de Beth estava em perigo.
Will pôs-se a andar de um lado para outro. Sentia as pernas fracas, o estômago embrulhado. Não comera nada desde que vira aquele e-mail pela primeira vez, umas sete horas atrás. Foi até a geladeira de Tom: múltiplas garrafas de água mineral Volvic e uma caixa de sushi. Da véspera. Pegou-a, cheirou-a e decidiu que continuava mais ou menos comestível. Devorou-a, e então se sentiu culpado por ter apetite enquanto a mulher estava desaparecida. Ao engolir, Beth retornou-lhe à mente. A simples idéia de comida parecia desencadear uma associação com a mulher. As noites juntos preparando o jantar; o apetite imperturbável dela. Tudo o que ele imaginava, calor, fome ou saciedade, só conseguia pensar nela.
Andou de um lado para o outro mais um pouco. Folheou os periódicos de computador e jornais literários obscuros que Tom guardava numa pilha junto ao sofá.
— Will, chegue aqui.
Tom fitava a tela. Fizera um "Whois" para netspotbiz.com e obtivera uma resposta.
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Você não parece feliz — disse Will.
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Bem, é notícia boa e notícia ruim A boa é que agora sei exatamente de onde o e-mail foi enviado. A ruim é que pode ser de qualquer pessoa.
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Não estou entendendo.
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Nosso caminho termina num cybercafé. As pessoas entram e saem desses lugares o tempo todo. Mas que idiota eu sou às vezes! — Deu um soco na mesa. Parecia furioso. — Achei que íamos chegar a um belo e completo endereço. Que imbecil!
Will percebeu que Tom falava consigo mesmo.
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Onde é esse cybercafé?
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E isso lá importa? Nova York é uma porra de cidade bastante grande. Milhões de pessoas poderiam ter passado por lá.
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Tom. — Agora severo. — Você pode descobrir onde é?
Tom voltou para o computador enquanto Will o observava. Finalmente, disse:
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Aí está o endereço. O problema é que não tenho certeza se acredito nele.
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Onde é? — insistiu Will.
Tom encarou-o pela primeira vez desde que ele lhe mostrara o e-mail dos seqüestradores.
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É do Brooklyn. Crown Heights, Brooklyn.
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É bem perto daqui. Por que não acredita que seja lá?
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Olhe o mapa. — Tom fizera uma busca de mapa instantânea, mostrando uma estrela vermelha na localização exata do cybercafé. Ficava na Eastern Parkway. — Percebe onde é?
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Não. Vamos lá, Tom. Pare de enrolar. Desembucha.
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Essa mensagem foi enviada de Crown Heights. É simplesmente a maior comunidade hassídica dos Estados Unidos.
A estrela vermelha brilhava sem piscar. Parecia um X num mapa do tesouro, daqueles que apareciam nos sonhos infantis de Will.
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Que lugar é esse?
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Apesar do local, é possível que não tenham sido eles que o enviaram.
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Tom, o e-mail era em hebraico, pelo amor de Deus.
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É, mas poderia ser só um disfarce. O verdadeiro nome era golem.net.
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Pesquise.
Tom teclou golem no Google e clicou no primeiro resultado. Apresentou uma página de um site de lendas judaicas para crianças. Contava a história do grande rabino Loew, de Praga, que usava um encantamento da cabala, antigo misticismo judaico, para moldar um homem a partir do barro: um imenso e pesado gigante que chamavam de Golem. Will fez uma leitura dinâmica e chegou rapidamente ao final da história, que culminava em violência e destruição, com o Golem enlouquecido. O gigante parecia ser um precursor de Frankenstein.
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Tudo bem — acabou dizendo Tom. — Admito, parece mesmo que são eles. Mas não faz sentido. Por que diabos essas pessoas levariam Beth?
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Nós não sabemos se são "essas pessoas". Poderia ser um psicótico que por acaso é hassídico.
Will pegou o paletó.
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Aonde vai?
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Vou até lá.
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Tá louco?
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Vou fingir que estou fazendo uma reportagem. Vou começar a fazer perguntas. Ver quem está no comando.
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Você está fora de si. Por que simplesmente não diz à polícia o que conseguiu descobrir, a origem do e-mail? Deixe que eles cuidem disso.
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Como assim? E dar a esses lunáticos uma desculpa para matarem Beth? Tô indo.
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Você não pode simplesmente chegar lá, com seu livrinho de anotações e seu sotaque inglês. É mais fácil andar com um letreiro na testa.
— Vou pensar em alguma coisa.
Will não disse, embora pensasse, que vinha ficando muito bom nesse tipo de trabalho detetivesco. Seu sucesso em Brownsville e Montana haviam-no deixado empolgado: nos dois casos, encontrara uma verdade oculta. Agora encontraria sua mulher.
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