Sam bourne o código dos justos


DEZENOVE SEXTA-FEIRA, 22H05, CROWN HEIGHTS, BROOKLYN



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DEZENOVE
SEXTA-FEIRA, 22H05, CROWN HEIGHTS, BROOKLYN
—- Vejo que nós dois cometemos um erro. O senhor mentiu e continuou mentindo, mesmo sob imensa pressão. Nessas circunstâncias, agora entendo o motivo e chego a achar admirável.

Will mal ouvia as palavras acima do ruído de seu próprio coração pulsando. Estava apavorado, muito mais aterrorizado do que ficara lá fora. O rabino descobrira a verdade. Alguma coisa na carteira o traíra, sem dúvida um recibo solto de cartão de crédito ou um cartão de sócio da Blockbuster há muito esquecido. Deus sabia que dor lhe estaria re­servada agora.



  • Você está aqui para procurar sua mulher.

  • Sim.

Will ouvia a exaustão na própria voz. E a angústia.

— Eu entendo... e acredito que faria o mesmo na sua posição. Te­nho certeza de que Moshe Menachem e Tzvi Yehuda concordam. — Agora os dois facínoras tinham nomes. — É um dever de todos os maridos prover e proteger suas esposas. Essa é a natureza do compro­misso matrimonial.

"Mas receio que as regras gerais não possam ser aplicadas neste caso. Não posso deixar que entre vasculhando tudo, com toda essa dose de heroísmo, e resgate sua mulher. Não posso permitir isso.

— Então admite que ela esteja aqui?

— Eu não admito nada. Não nego nada. Não é sobre isso que es­tou falando, Sr. Monroe. Will, estou tentando explicar que as regras gerais não se aplicam neste caso.

— Que regras gerais? Que caso?

— Eu gostaria de poder lhe dizer mais, Will, gostaria mesmo. Mas não posso.

Will não teve certeza se acabara de sentir-se derrotado pela prova­ção das últimas — o quê?, horas, minutos? — ou se sentia simplesmen­te aliviado por tudo haver terminado, mas teve certeza de que existia algo diferente na voz do rabino. A ameaça tinha desaparecido; a voz demonstrava uma tristeza, um pesar que ele tomou como simpatia, tal­vez até compaixão. Era ridículo: o homem era um torturador. Will per­guntou-se se sucumbia à síndrome de Estocolmo, o estranho vínculo que às vezes se desenvolve entre um seqüestrado e seu seqüestrador: primeiro dependendo do israelense como se ele fosse um cachorro-guia de cego, em vez de um facínora violento — e agora detectando huma­nidade em seu principal atormentador. Sem dúvida era uma reação ir­racional ao fim da tortura a que fora submetido: em vez de sentir raiva por aquilo ter acontecido, sentia-se grato ao rabino por ter acabado com o sofrimento. Síndrome de Estocolmo, um caso clássico.

E, no entanto, Will se considerava um bom juiz de caráter. Reco­nhecia que sempre fora perceptivo e tinha certeza de que ouvia algu­ma coisa verdadeira naquela voz. Apostou no seu palpite.

— Me diga uma coisa que eu tenho o direito de saber. Minha mu­lher está sã e salva? Não está... machucada?

Não conseguiu forçar-se a dizer a palavra que realmente queria — viva — não por temer tanto a reação do hassídico, mas a sua própria.

Temia que sua voz falhasse, que mostrasse uma fraqueza até então oculta.



  • É uma pergunta justa, Will, e sim, ela sairá dessa ilesa... desde que ninguém faça algo leviano ou estúpido, e por "ninguém" me refiro, sobretudo, a você, Will. E por "algo leviano ou estúpido" quero dizer envolver as autoridades. Isso arruinaria tudo, e então não poderia dar quaisquer garantias à segurança de ninguém.

  • Eu não entendo o que vocês poderiam querer de minha mulher. Que foi que ela fez a vocês? Por que simplesmente não soltam ela?

Embora não pretendesse, sua boca tomara a decisão por ele: estava implorando.

— Ela não fez nada a nós nem a ninguém, mas não podemos sol­tá-la. Lamento não poder dizer mais nada. Imagino como isso é difí­cil para você.

Este foi o erro do rabino, a última frase. Will sentiu o sangue correr rosto acima, as veias no pescoço saltarem.

— Não, NÃO PODE imaginar como é difícil, porra. Você não teve a sua mulher seqüestrada! Não foi agarrado, teve os olhos vendados, foi atirado na água gelada e ameaçado de morte por pessoas que nun­ca mostram o rosto. Portanto, não me diga que pode imaginar alguma coisa. Você não pode imaginar NADA!



Tzvi Yehuda e Moshe Menachem quase pularam para trás, nitida­mente chocados por essa explosão tanto quanto o próprio Will. A raiva vinha se acumulando desde que ele chegara a Crown Heights — na ver­dade, muito antes. Desde o momento em que a mensagem pipocara no seu BlackBerry: Estamos com sua mulher.

  • Você disse que era hora de jogar limpo. Então que tal jogar lim­po? De que se trata essa merda?

  • Não posso responder. — A voz foi mais baixa que até então, quase imperceptível. — Mas trata-se de uma coisa muito maior do que possa imaginar.

  • Isso é ridículo. Beth nunca fez nada. Ela é uma psiquiatra. Trata de meninos que não falam e meninas anoréxicas. Que coisa maior po­deria envolvê-la? Você está mentindo.

  • Estou dizendo a verdade, Will. O destino de sua mulher depende de uma coisa muito maior que você, ela ou eu. De certa forma, tem a ver com uma história antiga, uma história que ninguém poderia ima­ginar que acabaria seguindo esse rumo. Ninguém previu isso. Não houve nenhum plano de contingência. Nenhuma preparação em nos­sos textos sagrados, ou pelo menos nenhum que tenhamos encontrado até agora. E acredite em mim, estamos procurando.

Will não tinha a mínima idéia sobre o que o sujeito falava. Pela pri­meira vez, perguntou-se se os hassídicos não eram simplesmente ma­lucos. Não os vira naquela mesma noite em êxtase, em adoração ao seu líder, adorando-o como seu Messias? Não era possível que tivessem en­trado num estado de loucura coletiva, com esse homem, o líder, sendo o mais louco de todos?

  • Eu gostaria de dizer mais, porém os riscos são muitos. Temos de fazer isso direito, Sr. Monroe, e não temos muito tempo. Que dia é hoje? Shabbos Shuva? Restam apenas quatro dias. Por isso é que não pos­so me permitir correr riscos.

  • O que quer dizer com os riscos são muitos?

  • Não acho que seria útil eu dizer mais que isso, Will. Primeiro, meu palpite é que você não acreditaria numa única palavra.

  • Se quer dizer que é improvável eu confiar num homem que quase me matou, você tem razão.

  • Eu entendo. E um dia, desconfio que muito em breve, você en­tenderá por que tivemos de fazer tudo isso: tudo se esclarecerá. É as­sim que essas coisas funcionam. E o que eu disse é verdade. Temi que você fosse um agente federal e, quando confirmei que não era, tive medo que fosse algo muito pior.

  • Por que teria medo de um agente federal? E o que seria ainda pior que isso? Em que estão envolvidos?

  • Vejo por que é jornalista, Will: sempre fazendo perguntas. Você se sairia bem em nosso ramo de trabalho, também: é disso que se trata o estudo da Torá, fazer as perguntas certas. Mas receio que já demos todas as respostas possíveis. É hora de nos despedirmos.

  • É só isso? Vai deixar tudo assim? Não vai me dizer o que está acontecendo?

  • Não, não posso correr esse risco. Portanto, vou lhe deixar com algumas coisas para se lembrar. Pode escrevê-las depois, se quiser. A primeira é que essa história toda é muito maior que qualquer um de nós. Tudo em que acreditamos, tudo em que você acredita, se equili­bra numa balança. A própria vida. Os riscos não poderiam ser mais altos.

"A segunda é que sua mulher ficará em segurança, a não ser que você ponha a vida dela em perigo com sua imprudência. Peço que não faça isso, não apenas pelo seu próprio bem, mas pelo bem de todos nós. De todo mundo. Assim, embora ame e queira proteger sua mulher, rogo que acredite que o melhor que tem a fazer, como marido apaixonado, é ficar longe. Afaste-se. Interfira, e não poderei oferecer quaisquer garantias por ela, por você, por nenhum de nós.

"E a terceira, eu não espero que você entenda. Você se meteu em tudo isso quase por acaso. Ou talvez não seja um acaso, e sim uma sé­rie de passos plenamente entendidos apenas por nosso Criador. Mas isto é o mais difícil. Estou pedindo que acredite em coisas que não pode compreender, que confie em mim. Não sei se é um homem de fé, Will, mas é assim que a fé trabalha. Temos de acreditar em Deus mesmo quando não temos a mínima idéia do que ele tem em mente para o universo. Temos de obedecer a regras que parecem não fazer sentido simplesmente porque acreditamos. Nem todo mundo pode fazer isso,

Will. Ter fé exige força. Mas é exatamente isto que eu preciso de você: fé para confiar em que eu e as pessoas que estão aqui estão agindo ape­nas em nome do bem.


  • Mesmo quando isso significa quase afogar um homem inocente como eu?

  • Mesmo quando o preço é muito alto, sim. Estamos decididos a salvar vidas, Will, e nessa causa quase toda ação é permitida. Pikuach nefesh. Agora preciso me despedir. Moshe Menachem vai devolver suas coisas. Boa sorte, Will. Vá em segurança, e queira Deus que tudo dê certo. Bom shabbos.

Nesse momento, quando imaginou o rabino se levantando da ca­deira e dirigindo-se para a porta, ele ouviu um barulho. Alguém mais entrara na sala. Parecia estar mostrando alguma coisa ao rabino; hou­ve uma conversa sussurrada. A voz era muitíssimo baixa, quase um suspiro. Não precisavam ter-se preocupado: mesmo naquele volume, Will só conseguia entender que não falavam inglês. Parecia alemão, com fleumáticos "chis" e "istis". Iídiche.

A conversa cessou; o rabino parecia ter ido embora. Barba-ruiva, ou seja, Moshe Menachem, agora deixava sua posição de sentinela ao lado de Will e punha-se diante dele. Tinha os olhos envergonhados quando devolveu a bolsa que ele pegara na casa de Shimon Shmuel.

— Eu sinto sobre... você sabe... o que aconteceu antes — mur­murou.

Will pegou a bolsa, vendo que seu livrinho de anotações também estava ali. O telefone também e o BlackBerry, intocados. Ele pegou a carteira, para ver que canhoto ou tíquete o denunciara. Estava, como esperava, cheio de recibos de táxi. Abriu a série de divisórias para car­tões de crédito, que nunca usava. Numa, um talão de selos de correio; noutra, um cartão de visitas de um entrevistado há muito esquecido. Na terceira, um retrato tamanho passaporte — de Beth.

Um sorriso cruzou o rosto de Will: a foto dela o traíra. Claro que iriam reconhecê-la. Ela lhe dera aquele retrato um mês e meio depois de se conhecerem; era verão, e haviam passado a tarde passeando de barco em Sag Harbor. Ao verem uma cabine de fotografia, ela não re­sistiu: entrou na hora.

Ele virou a foto, e no verso estava a mensagem que não deixava dú­vida alguma. Eu te amo, Will Monroe!

Will ergueu os olhos, úmidos. Diante dele, um novo rosto; ima­ginou que fosse o homem que falara brevemente com o rabino mo­mentos antes. Tinha o rosto flácido e redondo, as faces cheias como as de um esquilo, emolduradas por uma barba preta retinta. Ele era rechonchudo, com uma barriga aparente. Will imaginou que teria 20 e poucos anos.

— Venha, eu mostro a saída.

Quando Will se levantou, finalmente viu a cadeira onde o rabino se sentara durante a inquisição. Não era nenhum trono, apenas uma ca­deira. Junto, uma mesa lateral, dessas que um palestrante usaria para guardar suas anotações e um copo d'água. O que havia nela o fez saltar.

Era um exemplar do New York Times, dobrado, com muito zelo, para destacar sua matéria sobre a vida e a morte de Pat Baxter. Então fora isso que o homem de rosto redondo tinha mostrado ao rabino; sobre o que haviam discutido. Will imaginou o que o jovem dissera: Esse sujei­to é do New York Times. Jamais vai deixar isso em segredo. Devíamos mantê-lo aqui, onde não pode abrir a boca.



A essa altura, já haviam saído, Will segurando a camisa branca que o hassídico lhe dera, mas que ainda não tinha vestido: não queria se despir na frente de seus inquisidores. Já tinha sido humilhado demais.

Pararam na rua, diante da shul. Homens continuavam entrando e saindo. Will conferiu as horas no relógio: 22h20. Parecia três da manhã.

— Só posso tornar a pedir desculpas pelo que aconteceu.


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