Não. Nunca sobrava tempo para isso. No seminário, era apenas estudo, estudo, e mais estudo. Textos sagrados. Em casa eu tinha de limpar, cozinhar, trocar fraldas, brincar com os bebês, ajudar os mais novos com o dever de casa. Dividia o quarto com duas irmãs. Não tinha tempo nem espaço.
Você deve ter ficado louca.
Fiquei. Sonhava todo dia em sair dali. Queria ir ao Metropolitan Museum. Para ver os quadros de Vermeer. Mas não era só a pintura.
Continue.
Sei que isso parece engraçado, em vista de como sou agora, mas era muito boa mesmo em estudos religiosos.
Não, desculpe, não acho nada surpreendente.
Eu era a primeira da turma. Achava fácil. Os textos, todos aqueles múltiplos sentidos e referências cruzadas, pareciam abrir-se para mim. Uma vez um rabino me disse que eu era tão boa como qualquer menino.
Oh, Deus.
Fiquei furiosa. Era como se as meninas se destinassem apenas a chegar até ali. Assim que fazem 17 ou 18 anos, tornam-se mulheres... e isso significa se casar, ter filhos, cuidar da casa. Os homens podiam continuar na yeshiva para sempre, mas às meninas só era permitido adquirir o básico. Depois tínhamos de parar. Eram as regras da comunidade. Estudávamos apenas os Cinco Livros de Moisés, talvez um pouco do Gemara, uma espécie de comentário rabínico. Mas só isso.
Exatamente. Você me conhece, se há uma zona proibida, eu quero ir até lá. Encontrei o estranho livro entre as coisas do meu pai, mas sabia que não podia fazer isso sozinha. Precisava de um guia. Assim, pedi ao rabino Mandelbaum.
Quem?
O que me disse que eu era tão boa como um menino. Disse a ele que queria estudar. Procurei-o com todos os textos importantes que provavam que eu tinha o direito, como mulher, de saber o que havia naqueles livros.
— E ele concordou? Em te ensinar?
— Toda terça-feira à noite, uma aula secreta em sua casa. A única outra pessoa que sabia disso era a esposa dele. Ela trazia um copo de chá de limão para ele, um de leite para mim... e rugelach, pequenos pastéis, para nós dois. Fizemos isso durante cinco anos.
Ela sorria.
O que aconteceu?
Ele ficou preocupado. Não por ele, era velho demais para se importar com o que as pessoas achavam, mas por mim. Eu estava chegando à "idade de casar". Ele me disse: "Tova Chaya, seria necessário um homem muito forte para não se sentir ameaçado por uma mulher tão culta." Acho que temia ter me arruinado: que, por sua causa, eu não fosse ficar feliz cuidando de uma casa. Não seria uma boa esposa como a Sra. Mandelbaum. Ele tinha me feito almejar muito alto. Num certo sentido, ele tinha razão.
"Mas não precisava ter-se preocupado; àquela altura eu já tinha planejado minha fuga. Candidatei-me em Columbia; dei o endereço de uma caixa postal para que ninguém visse a correspondência. Candidatei-me a toneladas de bolsas de estudo, para ter meios de conseguir um quarto. Apresentei-me como uma adulta independente; pelo que a faculdade sabia, não tinha pais.