Samantha James Alana, a Bruxa



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* * *

Sybil, entretanto, não estava tão satisfeita com o desenro­lar dos acontecimentos. Observava o casal enquanto se entreolhavam: Merrick não disfarçava o brilho desejoso dos olhos, e Alana o fitava com vaga incerteza. A mesa, ela estava qua­se sempre ao lado dele ou a seus pés. E muitas foram as noi­tes em que Merrick se levantara para, em silêncio, estender a mão a ela.

Invejosa, Sybil contorceu os lábios. Que absurdo! Não entendia por que Merrick escolhera aquela idiota magricela e pálida para lhe fazer companhia na cama. Mais espanto­so ainda era o fato de ele ainda não ter substituído Alana por nenhuma outra.

Diziam as fofoqueiras do castelo que o garboso senhor não se interessava por ninguém. Certamente, seu corpo reple­to de curvas era muito mais prazeroso que o de Alana, Sybil concluiu com desdém.

Sem que ninguém percebesse, acariciou os seios fartos e sorriu. Alana não era tão generosamente dotada quanto ela. E os quadris largos e amplos podiam muito bem acomodar um homem do tamanho de Merrick. A ideia de copular com um cavaleiro tão robusto quanto ele a deixou excitada.

Sem dúvida, Merrick seria um amante viril e exigente. O sorriso se desfez. Ora, uma tola como Alana não possuía conhecimento bastante para agradar um homem tão vigoro­so! Sybil, sim, sabia muitas artimanhas para enredá-lo.

Irritada agora, atravessou o corredor principal do caste­lo. Mas seu mau humor não prevaleceu. Raoul a esperava no final da passagem. Seus olhos brilharam quando a chamou.

Embora Merrick fosse o escolhido, Sybil não tinha escrú­pulos quanto a procurar prazer onde pudesse encontrá-lo. E Raoul era um amante muito satisfatório. Aliás, nunca conhe­cera um homem que pudesse agradá-la por horas a fio.

Não demorou muito para a dupla achar o que procuravam: um quarto vazio.

Em segundos, ela se postou nua diante de Raoul.

— Você anda me negligenciando, meu príncipe normando insaciável. — Sybil segurou os seios, como se os oferecesse à aprovação do amante. Embora soubesse que Raoul a dese­java, gostava de vê-lo arfar e, acima de tudo, adorava ver o membro rígido a seu dispor.

— Não por muito tempo, minha coelha. — Raoul riu e acariciou os seios, antes de sugar os mamilos.

Sybil gemeu de prazer e, arrojada, ofereceu-se a ele. Raoul então cobriu a boca sensual com um beijo feroz. Puxou-a para si pelos quadris, colando-se ao corpo curvilíneo.

Rindo de deleite, Sybil abriu as pernas. Com as unhas, ela escarafunchou a túnica até encontrar a pele nua. Mas não se contentou com isso por muito tempo. Inseriu as mãos afoitas na calça de Raoul e abaixou-a até as coxas a fim visualizar o que almejava. O membro ereto despontou, grosso e pesado, para as carícias que sua mão empreendia.

Sorrindo, ela umedeceu os lábios com a língua. Raoul segurou-a pelos ombros e a fez ajoelhar-se. Após alguns momentos, ele emitiu um gemido gutural que surgiu das pro­fundezas de seu peito.

Como a pressa de se atracarem era muita, não perceberam que não haviam fechado a pesada porta de madeira.

Do lado de fora, no corredor, Alana estava a caminho do cômodo de Geneviève. Quando escutou sons de movimentos dentro de um quarto desocupado, estranhou. Foi então que reparou na porta aberta. Curiosa, espiou através da estrei­ta abertura.

Por um brevíssimo instante, estava convencida de que seus olhos a enganavam. Ficou boquiaberta. Um som estranho de descrença travou em sua garganta. Pouco tempo depois, des­cobriu que estava andando para trás porque colidiu em um corpo sólido e alto.

Merrick a segurou e notou sua expressão horrorizada.

— Alana! O que aconteceu?

Perplexa, ela só conseguia sacudir a cabeça.

— Raoul — balbuciou. — Sybil...

Então escutaram uma série de pequenos gritos femininos, seguidos de um ruído crescente, muito parecido com marte­ladas.

Alana ficou pálida.

— Jesus — sussurrou, apavorada. Lutou como uma cria­tura selvagem quando Merrick a abraçou e começou a puxá-la na direção oposta.

— Pare! — Ela se desvencilhou. — Não vou deixar Sybil sozinha com ele.

— O que há entre aqueles dois é melhor evitar que os outros saibam, saxã.

— Você não viu o que eu vi!

Àquela altura, já estavam a sós nos aposentos de Merrick. Ele cruzou os braços e a fitou, sério.

— Pois muito bem. O que você viu? As faces de Alana coraram.

— Não posso lhe contar.

— Pode, sim, saxã.

O normando se mostrou insistente. Determinado. Ele a instigou e questionou até que, gradualmente, a cena que ela testemunhara emergiu de uma vez só.

Entretanto, Merrick não demonstrou nenhum entusiasmo pela história de Sybil e Raoul. Na verdade, os lábios se contorciam como se ele estivesse reprimindo o riso.

A ira de Alana irrompeu. Não achava graça nenhuma na situação.

— Você é cruel! — ela o. acusou. — Raoul é um animal. Certamente, deve ser uma espécie de perversão normanda.

— Garanto-lhe, saxã, que não é. Aposto que ele fez o mesmo com ela.

Alana empalideceu. Seria tão simplória a ponto de inter­pretar erroneamente... Deus do céu, seria verdade?

— Não — murmurou, pasma. — Essas coisas não podem... — Ela se virou, incapaz de encarar Merrick. De repente, sen­tiu-se tola e ingênua.

Mais uma vez, Merrick ficou tentado a rir quando viu os olhos arregalados e as faces avermelhadas de vergonha, mas se conteve. Abraçou-a por trás, colou-a ao próprio corpo e encostou o rosto nos cabelos loiros.

— Há aqueles que dizem ser a festa dos sentidos — ele contou em um sussurro. — A sensação mais extraordinária que um homem e uma mulher podem se conferir.

Ele a fez virar-se. Alana pousou as mãos sobre o peito musculoso e sentiu a maciez dos pelos negros. Um leve tre­mor familiar passou por seu corpo. Mesmo assim se viu com­pelida a dizer:

— Mas ouvi Sybil gritar. Raoul a estava machucando.

— Esses gritos não eram de dor, querida. — Merrick aca­riciou o lóbulo delicado. — Precisa que eu a lembre? — Ele a tomou nos braços devagar. Quaisquer traços de zombaria haviam desaparecido do rosto moreno. — Para mim, seria um grande prazer lhe mostrar, saxã.

E, com a graça de Deus, ele o fez.

De forma solene e lenta, Merrick a despiu. Em seguida, tirou as próprias roupas antes de carregá-la até a cama. Havia uma gentileza enternecedora no ato amoroso que quase lhe roubou a capacidade de respirar. As mãos experientes per­correram tudo. Alana tremia, enquanto ele investia, faminto, nos mamilos já túrgidos, sugando-os.

Então os lábios foram descendo até chegar à área sensível do ventre. Em um movimento suave, Merrick jogou as pernas esguias sobre os próprios ombros e fez com que os frágeis protestos que ela talvez emitisse morressem em sua boca.

A mente de Alana ficou vazia de pensamentos.

Quando ele se posicionou entre as pernas e começou a acariciá-la com a língua, ela sentiu uma onda de puro delí­rio atravessá-la por dentro. Merrick tinha razão. Aquilo era extraordinário.

De olhos fechados, Alana ergueu os quadris, buscando o tormento elusivo da língua até senti-la no âmago de seu cen­tro feminino. Tomada pelo êxtase, agarrou os lençóis e os puxou. Merrick insistia, determinado. Ela mordeu o lábio inferior quando tentou conter um grito de prazer.

A respiração estava sôfrega e o peito ofegava quando ele enfim finalizou a carícia. Os olhos de Merrick brilhavam. Alana não conseguia desviar a atenção daquele brilho inten­so, mesmo quando ele a penetrou devagar para que ambos vivessem juntos as sensações até não mais suportarem.

Agora abrigando a rigidez de sua masculinidade, Alana agarrou-se aos braços fortes.

— Sua pequena fera já deixou marcas em minhas costas — Merrick disse ainda beijando-a. — Mas não ligo se fizer o mesmo, querida.

Dito isso, ele começou a se mover, devagar a princípio, e depois foi aumentando o ritmo até perder completamente o controle. Mas Alana não se importou. As sensações que o movimento frenético dentro dela lhe traziam eram mais do que podia suportar.

O prazer absoluto espiralou a seu redor. Tomada pelo mesmo frenesi alucinante, cravou as unhas na pele macia dos ombros e deslizou para capturar os quadris também musculosos. De uma só vez, o arrebatamento explodiu dentro dela.

Submetida a um abandono que jamais soube possuir, gritos de deleite emergiram. De súbito, sentiu o corpo de Merrick estremecer por inteiro. O calor de sua semente irrompeu, mais de uma vez, um clímax tão poderoso e tórrido quan­to o dela.

Aos poucos, Alana voltou a si. Somente então percebeu quão voluptuosa havia sido. Acomodou-se ao corpo másculo e pousou a cabeça sobre o ombro de Merrick.

— Foi uma loucura — ela murmurou — as coisas que fez em mim... o jeito que me fez sentir, normando.

Merrick riu, descontraído. Então pegou uma mecha dos cabelos loiros e a enrolou entre os dedos.

— Loucura? — Dessa vez, ele riu com gosto. — Como alguém pode acreditar que é uma bruxa? Você é tão inocente.

Sim, bastava uma simples carícia sensual para que o ar lhe fosse roubado dos pulmões. Alana não se orgulhava da maneira com que seu corpo a traía cada vez que ficavam jun­tos. Não conseguia reprimir nada e a falta de controle era assustadora.

As imagens das cenas de amor compartilhadas com Merrick ainda ocupavam a mente de Alana ao longo de toda a tarde do dia seguinte. Ela trotava ao lado de Simon enquan­to se aproximavam da aldeia para visitar Aubrey. Merrick tinha ido a York.

Embora o dia estivesse ensolarado, a neve brilhante dei­xava o ar excessivamente gélido. O manto forrado de pele que Merrick lhe trouxera de Londres pesava sobre seus ombros, impedindo que o frio a perturbasse.

Estava tão intensamente perdida em pensamentos a res­peito de Merrick que só notou que Simon tinha parado de andar quando a chamou.

Não estavam sozinhos.

Um pequeno grupo de homens a cavalo havia parado logo à frente dos dois.

— Alto lá! — um deles gritou. — Pode me ajudar, por favor, senhorita?

Alana hesitou. Reconhecia o homem como sendo saxão por causa do sotaque e da roupagem. O tom de voz soou ami­gável, mas pairava no ar um clima ameaçador que a deixou em estado de alerta. As túnicas dos homens estavam puídas e sujas. A seu lado, Simon também se postou atento.

— Que tipo de ajuda pede, senhor? — ele perguntou.

O homem coçou a barba por fazer.

— Há uma encruzilhada logo ali atrás. Receio que esteja­mos perdidos. Que estrada nos levará a Londres?

Simon apontou para além deles.

— Se voltarem por onde vieram, a estrada da esquerda os levará para o sul de Londres. São três ou quatro dias de cavalgada.

O homem assentiu.

— Muito obrigado, menino.

Um minuto depois, eles viraram os cavalos e se foram. Alana murmurou uma prece de agradecimento, aliviada por­que aqueles maltrapilhos tinham ido embora. Sorriu para Simon e com ele se apressou até a aldeia.

Em sua algibeira havia um pedaço de bolo de mel, para o qual Aubrey demonstrou uma atenção particular. Ele ficou feliz com a visita de surpresa, como Alana previra.

A noite começava a cair quando ela finalmente se levan­tou para partir. Odiava a perspectiva de deixá-lo, pois pare­cia que somente em presença de Aubrey conseguia ser ela mesma. Com Merrick, estava sempre tensa, sempre alerta para não revelar os sentimentos.

Embora insistisse para que permanecesse sentado, Aubrey a acompanhou até a porta da choupana. Mesmo apoiado no cajado, ele cambaleou um pouco. O inverno não havia sido gentil com o bom homem. Parecia mais velho, Alana pen­sou, desolada.

De súbito, o medo cravou em seu coração como uma fle­cha. Sentiu-se envolvida por uma sensação fugaz. Quantas vezes mais ela o veria novamente?

Alana o abraçou por um longo tempo, tanto que Aubrey foi obrigado a finalizar a despedida.

— Menina, não ouse se demorar mais. Logo vai escure­cer e eu terei de escoltar você e o rapaz até Brynwald. Ouvi dizer que bandos de rebeldes saxões andam à espreita, rou­bando e assaltando. São homens que não ligam para nada ou ninguém.

Alana tocou-lhe o braço.

— Conseguiremos chegar ao castelo antes do anoitecer — assegurou-o. No entanto, sua mente não refletia acerca do aviso de Aubrey, mas fixava-se no estranho sentimento que tivera. Mesmo assim, ele acenou com afeto quando lhes desejou boa viagem.

Talvez, Alana pensou quando deixaram a aldeia para trás, sua imaginação houvesse se tornado zelosa demais.

Mas sua mente logo se voltou para outros assuntos. Tinham acabado de sair da aldeia quando Simon a segurou pelo braço.

Assim que Alana atinou para o que acontecia, ela e Simon estavam cercados pelos homens maltrapilhos que haviam encontrado antes.

— Fiquem de lado para que possamos passar — Simon ordenou.

— Acho que não, garoto. — O homem que com eles falara na primeira vez, o líder talvez, soltou uma gargalhada sono­ra. — Não creio que seja possível.

O interior de Alana paralisou. Entretanto, teve coragem de enfrentá-los.

— Não fizemos nada a vocês — declarou em voz alta. — Estamos retornando ao castelo de Brynwald...

— Ah, mocinha, disso nós sabemos. — Ele sorriu, reve­lando uma dentadura banguela. — É impressionante o que podemos descobrir fazendo as perguntas certas.

O coração de Alana pareceu parar.

— O que querem de nós? Não temos jóias ou moedas...

— Não é o que queremos de vocês, mas sim o que con­seguiremos do senhor de Brynwald. Mas não tema, moça. Se tudo correr bem, traremos vocês dois de volta em uma quinzena.

Alana sentiu como se uma pedra de gelo tombasse em seu estômago.

— O quê? — perguntou, nervosa. — Não acredito que tencionem nos raptar!

O homem sorriu.

— Ela é inteligente, não é, rapazes?

— Não podem fazer isso! Sou tão saxã quantos vocês!

— E também a protegida de um normando rico. Ele sem dúvida a estima muito, já que lhe deu esse manto. — O ladrão abriu um sorriso largo. — Sei que ele pagará o res­gate de um rei por você e pelo sobrinho também.

O terror a dominou. Aquela altura quatro maltrapilhos haviam apeado. Alana e Simon começaram a recuar, mas infelizmente dois deles já os tinham rendido.

Desesperados, Alana e Simon se debateram, chutaram e socaram os bandidos, mas não houve maneira de se desvencilharem. Em poucos minutos, foram amarrados como porcos e jogados nas costas de um cavalo.

Ao sinal do líder, os saxões saíram a galope em direção à floresta, levando o tesouro que achavam ter encontrado. Mas um pensamento resvalou a mente de Alana à medida que se afastavam de Brynwald.

Merrick certamente concluiria que ela havia tentado fugir... mais uma vez.

Nesse ponto, Alana estava certa.

Merrick ficou furioso quando chegou de York e descobriu que Alana ainda não havia voltado da aldeia. No mesmo ins­tante, saiu à procura de Simon, mas não encontrou o sobri­nho em lugar nenhum.

Enraivecido, invadiu a choupana do velho Aubrey. O bom homem jurou que nada havia de estranho quando Alana saí­ra pouco antes do anoitecer. E garantiu que ela tinha partido em companhia de Simon.

Sentindo-se traído, Merrick fechou os punhos para conter a ira. Ah, não deveria ter confiado nela!... Aqueles lábios tão doces e suplicantes sempre mentiriam e enganariam.

Desprezava o pensamento que lhe surgiu à mente, mas não tinha escolha. Parecia que a saxã astuta havia fugido outra vez.

Mas por que Simon estava com ela? Não fazia sentido. Teria Alana obrigado o rapaz a acompanhá-la? Simon ainda não possuía a força de um homem, mas era musculoso o bas­tante para se defender de uma mulher, especialmente alguém tão esguia quanto Alana.

Enquanto refletia, a neve começou a cair do céu. Em minu­tos, criou-se uma fina cortina diante dos olhos de Merrick. Praguejou durante vários segundos. Não podia fazer muita coisa na escuridão da noite. E se a neve não parasse de cair logo, os rastros que ela poderia ter deixado estariam cober­tos pela manhã.

Mas ele a encontraria, jurou a si mesmo. Pela Virgem Maria, ele a encontraria de qualquer jeito. E quando isso acontecesse Alana descobriria que o havia feito de tolo pela última vez.

Capítulo XV

Nunca em toda sua vida Alana sentira tanto medo. Cavalgaram durante horas, enveredando cada vez mais a escuridão pela floresta. Somente ao amanhecer, pararam em uma espaçosa clareira. A essa altura, o corpo de Alana estava dormente por causa do frio, da fadiga e da fome.

O líder do bando se chamava Bramwell. Ele puxou Alana da garupa do cavalo onde estava sentada. Assim que seus pés tocaram o chão, as pernas doeram após tantas horas na sela. Ela cambaleou e quase caiu, mas conseguiu reprimir um gri­to de dor.

Bramwell a desamarrou para que ela pudesse atender às próprias necessidades pessoais, às quais rapidamente cum­priu. Depois de sair detrás dos arbustos, ouviu o que os ban­didos conversavam em voz baixa.

Alana se assustou quando alguém a tocou no braço. Mas era apenas Simon. Ele acenou para se afastarem do grupo.

— Escutou o que eles disseram? — Simon perguntou.

— Escutei — ela respondeu. — Bramwell enviou um homem a Brynwald com a exigência do resgate.

Simon disse mais alguma coisa, mas Alana não conseguiu entendê-lo, pois o garoto começou a ranger os dentes. Um dos homens de Bramwell havia roubado o manto do jovem e sua túnica de lã. A Simon restara apenas, uma camisa de linho, calça comprida e botas para protegê-lo do frio.

Sem hesitação, Alana tirou o próprio manto e jogou o traje nos ombros de Simon.

— Não precisa — ele protestou.

— Precisa, sim, Simon. Está tremendo de frio. Estou mais acostumada ao inverno que você — Alana mentiu. — E se ficar doente como ficou não faz muito tempo? Sua mãe nun­ca irá me perdoar. Eu jamais me perdoaria.

Relutante, o rapaz a fitou nos olhos. Naquele instante, uma mensagem silenciosa passou entre eles, algo que nun­ca acontecera antes.

Simon tocou o braço de Alana com as mãos amarradas.

— Estou em dívida com você — disse, solene.

Alana fingiu olhar a neve caindo do topo das árvores, mas, na verdade, estava com vontade de chorar. Ela e Simon vinham passando muito tempo juntos, mas sempre houvera uma barreira elusiva entre ambos. Somente agora ela tinha a curiosa sensação de que tal impedimento não mais existia.

Sua atenção, porém, não se ateve ao garoto por muito tempo. Gritou quando um dos homens de Bramwell a puxou pelo braço, quase o arrancando do corpo. Sujos e repugnan­tes, os cabelos dele caíam na altura dos ombros. A barba tam­bém estava imunda. Não havia dúvidas do que ele queria. Os olhos lascivos fitavam os seios de Alana.

O aviso de Simon soou claro.

— Se a ferir, tenha certeza de que Merrick não pagará nenhum resgate. Ele a estima enormemente.

Bramwell, a poucos metros com outro homem, virou-se de repente.

— Ewert! O garoto tem razão. Amarre a mulher outra vez e venha até aqui!

O saxão, Ewert, pegou o couro que prendera os pulsos de Alana e a amarrou novamente. Mas antes de ele se afastar, Simon provocou o líder.

— Ora, Bramwell! Tem medo de uma simples mulher? Por isso precisa amarrá-la?

Mais uma vez, a cabeça de Bramwell virou na direção deles. Alana parou de respirar quando reparou na expressão furiosa do líder.

— Você é barulhento demais, normando — Bramwell dis­se, ao se aproximar. — E talvez eu prefira não mais ter de escutar sua conversa fiada. — Ele esfregou a barba e sorriu. — Sim, seria bem melhor eu não ser mais obrigado a olhar para seu rosto normando.

Um medo terrível se instalou no coração de Alana. Tinha certeza de que o bandido pretendia matar Simon. Bramwell se virou e chamou um dos homens. Conversaram em voz bai­xa. Ela tentou ouvi-los.

— ...leve-o para onde o rio encontra o mar... mantenha-o no acampamento... Não! Precisamos ter cuidado porque dizem que Merrick da Normandia é o guerreiro mais sangui­nário da Dinamarca. E queremos só o dinheiro dele, não sua vingança... espere lá até ter notícias minhas. Quando o resga­te estiver em nossas mãos, mataremos os dois...

O sangue de Alana se transformou em gelo. Deus do céu, pretendiam matá-los!

Sentiu um peso enorme nos ombros ao ver Simon desa­parecer na garupa de seu raptor. Queria correr para salvá-lo, mas não podia. A única escolha seria rezar para que Deus o protegesse.

Muito mais tarde, pensativa, fitava o fogo. Temia o que Merrick podia estar pensando. Estava certa de que ele paga­ria qualquer quantia a Bramwell para salvar Simon, mas e quanto a ela? O coração se apertou. A bem da verdade, havia uma chance considerável de Merrick se recusar a usar o pró­prio dinheiro em troca de sua segurança. Sem dúvida, ele aproveitaria a oportunidade para se livrar dela.

Mas que importância tinha se ele pagasse ou não o resga­te? Bramwell mataria os dois de qualquer jeito.

A mente de Alana continuava a girar, enquanto ponderava acerca de todas as possibilidades. Bramwell jogou-lhe uma coberta de pele e ofereceu um pedaço de carne seca, mas ela não conseguiu sequer ingerir uma lasca. A neve já tinha para­do de cair havia horas. A lua estava alta no céu. Os saxões bebiam várias canecas de cerveja. Sentada ao pé de uma árvo­re, ela sentia-se incapaz de dormir ou de deter os devaneios.

De onde a idéia surgiu, ela não sabia. Tampouco se impor­tava porque percebeu repentinamente que, um por um, os saxões caíram de tão bêbados ao redor da fogueira.

Todos dormiam profundamente e roncavam. De fato, não havia ninguém para ver o que ela fazia ou não fazia. Ninguém para impedi-la de ir aonde pretendia. Certamente, aqueles beberrões só acordariam ao raiar do dia.

Como uma ajuda divina, o céu se abriu para que a lua cheia despontasse. Seu brilho prateado se espalhou entre as árvores. Alana não podia acreditar que uma oportunidade lhe surgia. Levantou-se, embora os músculos estivessem rígidos por causa do frio. Pé ante pé, afastou-se da fogueira, atenta a qualquer sinal de que os saxões pudessem ter acordado.

Seu coração batia tão loucamente que temia despertá-los com o barulho. Espantou os cavalos, mas ficou com um que ainda estava selado. Sem montaria, os saxões só consegui­riam persegui-la a pé.

Momentos depois, ela e o cavalo desapareceram na noite.

Foi puro palpite que incitou Merrick a liderar seus homens para o norte da floresta. Como suspeitara, a nevasca da noi­te anterior havia encoberto qualquer indício de pegadas. Mas por volta do meio-dia, próximo a um tronco caído, ele espiou os sinais inconfundíveis de patas de cavalos.

Prosseguiu, mais determinado que nunca.

Não muito tempo depois, um de seus homens exclamou:

— Meu senhor, veja!

Os olhos de Merrick rumaram para onde o soldado apon­tava. Uma figura pequena, aparentemente com roupas molha­das e montada em um cavalo, lentamente andava na direção deles.

Tão logo conseguiu divisar com nitidez o cenário à frente, Merrick soltou uma exclamação e esporeou seu cavalo.

Era Alana.

Mesmo antes de o cavalo parar, ele já apeou e agarrou a rédea do outro animal. As mãos de Alana estavam enroladas em pedaços da saia que ela rasgara. O rosto pálido tornava os olhos verdes vidrados, como duas jóias preciosas. A pele em farrapos sobre os ombros parecia semicongelada. Os lábios formavam o nome dele, mas nenhum som emergia.

Excessivamente exausta e gelada até os ossos, Alana ten­tou concentrar tanto a mente quanto a vista. Talvez a presen­ça de Merrick na floresta fosse apenas uma ilusão, um sonho que podia estar criando pouco antes de morrer, pensou.

Era-lhe necessária toda sua força para se manter senta­da na sela. Levou a mão à testa. Por que estava tão zonza? Porém, em algum canto distante de sua mente, percebeu que havia conseguido escapar.

— Simon — ela murmurou quase sem voz. Doía falar, mover-se e até respirar. — Você precisa encontrar Simon. Eles o levaram...

— Quem, saxã? — Era Merrick. A voz sonora a penetrou como um fluido de realidade. — Quem o levou? E onde ele está?

Braços fortes a pegaram. Ela estava vagamente cônscia de que era puxada do cavalo para, em seguida, ser examina­da por olhos cinzentos. Merrick parecia bravo, concluiu ao notar o semblante sisudo. O coração de Alana se apertou. Por quê? Por que ele sempre se zangava com ela?

Luzes piscavam em seus olhos. O rosto de Merrick se aproximou, mas parecia desbotar. Ela estremeceu violenta­mente, alheia aos braços que a apertavam.

— Saxões — Alana conseguiu pronunciar. — O que se chama Bramwell exigiu um resgate... Eles levaram Simon para o norte, a um lugar onde o rio se encontra com o mar. — Os olhos se encheram de lágrimas. — Você tem de correr. Precisa ajudá-lo...

Merrick começou a ditar ordens. A voz severa reverberava ao redor, arrastando-a, como se a puxasse para a escuridão. Então Alana não se apercebeu de mais nada.

Quando acordou, estava aquecida e seca, confortavelmente deitada na cama em Brynwald. Tão logo as lembranças emergiram, vividas e impiedosas, Alana gritou o nome de Simon. Então alguém murmurou palavras de consolo e sen­tiu o toque feminino em sua testa.

Era Geneviève. Alana abriu os olhos para encontrar a irmã de Merrick inclinada sobre ela. O rosto moreno trans­mitia preocupação. Tentou se sentar, mas a tontura voltou.

— Não, fique quieta — Geneviève ordenou. — Ainda não está pronta para se levantar.

Infelizmente era verdade. Alana sentia-se como se hou­vesse levado uma surra.

— Como vim parar aqui? — perguntou, enfraquecida.

— Merrick mandou um de seus soldados trazê-la. Ele foi procurar Simon.

— Ele ainda não voltou? Geneviève meneou a cabeça.

Por mais que tentasse, Alana não conseguiu conter a ansiedade. Ironicamente, foi Geneviève quem a assegurou, afagando-lhe as mãos que jaziam sobre as cobertas de pele.

— Não tema, Alana. Meu irmão não poupa esforços para proteger aqueles a quem ama. Ele vai encontrar Simon antes que algum mal lhe aconteça. — Ela sorriu, afetuosa. — Para ser sincera, foi você que me deu um susto enorme. Quando a vi tão imóvel e pálida... Oh, Deus, pensei no pior. Você dor­miu um dia e uma noite inteiros. — Genevieve se levantou. — Deve estar faminta. — Caminhou até a porta e pediu uma refeição.

Assim que viu a bandeja diante de si, Alana descobriu que estava morta de fome mesmo. Comeu até a última migalha de pão e queijo.

Genevieve riu de alegria.

— Quer mais? — Ela caminhou em direção à porta.

— Quero... — Alana começou a dizer, mas de repen­te tudo parou. Jogou as pernas para fora da cama, tapou a boca com a mão e lutou para controlar o súbito mal-estar no estômago.

A Genevieve bastou ver os olhos arregalados e a palidez de Alana para correr e pegar uma bacia.

De joelhos, Alana expeliu tudo o que havia ingerido. Sua pele estava fria e coberta de suor. Sentia-se tão fraca que Genevieve teve de erguê-la e ajudá-la a se deitar novamente. Jogou-se nos travesseiros, esgotada.

Com um pano úmido, Genevieve começou a banhar o rosto daquela que se tornara sua amiga.

— Perdoe-me. — Alana tentou sorrir. — Não costumo passar tão mal assim. Mas devo dizer, apesar da vergonha, que isso tem acontecido com freqüência.

— Não é a primeira vez? — Genevieve perguntou, pensativa.

— Não. — Alana ficou assustada quando viu o rosto apreensivo de Genevieve. Não entendia por que a amiga a fitava de modo tão esquisito.

— O que é? — perguntou, rindo. — O que foi, Genevieve? Fale comigo.

Por um momento, tudo indicava que ela continuaria calada. Então, de uma só vez, soltou:

— Oh, detesto dizer isso, mas... você é tão esguia, Alana. Quando eu a despi não pude deixar de notar que sua cintu­ra engrossou. — Ela hesitou por um instante. — Quando foi seu último ciclo? Você se lembra?

Alana empalideceu visivelmente. Aflita, tentou buscar a resposta na memória. Com as mudanças drásticas de sua vida nos últimos tempos, não prestara atenção...

— Não sangro desde que cheguei ao castelo — disse, trê­mula. — A última vez deve ter sido em dezembro.

— Alana querida, eu raramente me engano com essas coi­sas, mas acho mesmo que está grávida.

Atônita, tocou a barriga. Deus, havia uma leve protuberância que não existia antes.

— Não pode ser.

Ao ver a expressão angustiada de Alana, Geneviève sen­tou-se na cama e a abraçou.

— Calma — disse com carinho. — Não fique assustada. Sei que Merrick...

— Merrick! — Alana agarrou-se a Geneviève. — Não pode contar para ele! Eu lhe imploro, não conte nada!

Claramente incerta, Geneviève mordeu o lábio inferior. Alana suplicou e chorou até convencê-la a concordar. A jovem estava tão desesperada que a Geneviève restou acei­tar. Conseguiu, por fim, acalmá-la e a fez deitar-se outra vez antes de cobri-la com as peles.

Mas não houve descanso para Alana.

Encolheu-se sob as cobertas e fitou a outra extremidade do quarto. Seus olhos ardiam de tão secos. Geneviève sus­surrara que aquele bebê seria uma bênção. Uma mortalha de desespero se apossou de seu coração.

Uma criança era uma possibilidade que ela não previra. Oh, como fora tola! De um minuto ao outro, ficou apavorada com o que o futuro reservava para ela e o filho.

Não tinha dúvidas de que Merrick não ficaria nada satis­feito assim que descobrisse que ela estava grávida.

Alana permaneceu no quarto pelo restante do dia. Uma neblina suave do crepúsculo atingiu as janelas justamente quando houve uma repentina comoção no pátio do castelo.

Alana correu até a janela. Um grupo de viajantes acabava de chegar. Enquanto observava a cena, avistou Simon apear do cavalo. O alívio que sentiu foi imenso, contudo, não con­seguiu ver nada mais além de Merrick, quando ele também desmontou.

Nesse momento, Geneviève apareceu correndo. Quando a mãe abraçou o filho, Alana sentiu algo curioso no cora­ção. Geneviève chorava sem parar. Merrick se aproximou dos dois e tocou a cabeça do sobrinho, um gesto que tradu­zia a afeição familiar.

Lágrimas marejaram os olhos de Alana. Merrick trataria o próprio filho do mesmo jeito? Ela não conseguia refrear o rumo de seus pensamentos. Seria muito improvável que ele assumisse o filho. Uma tristeza melancólica a invadiu. Nunca se sentira tão sozinha. Era como se não pertencesse...

E, de fato, não pertencia.

Algum tempo depois, alguém bateu à porta.

Alana hesitou por um momento.

— Entre — disse.

Seus músculos relaxaram quando avistou Geneviève. Nas mãos ela trazia o manto forrado de pele que Merrick compra­ra em Londres. Sorridente, depositou o traje sobre a cama.

— Simon lhe é muito grato, como eu também sou. Alana sorriu.

— Os bandidos roubaram o manto e a túnica de Simon. Fiquei com medo que ele adoecesse de novo.

— Eu sei. Simon me contou. — Ela encarou Alana. — Estão preparando uma comemoração no hall. Peço-lhe que se junte a nós.

Foi inevitável. Os pensamentos de Alana se dirigiram a Merrick. Ocorreu-lhe a fantasia de que ele somente ao fitá-la saberia a verdade. Que tolice, pensou. Como o homem pode­ria desconfiar se ela própria nada deduzira até Geneviève sugerir a possibilidade naquele mesmo dia?

Tanta hesitação a delatou. Geneviève tomou-lhe as mãos e a encarou com seriedade.

— Não conseguirá evitá-lo para sempre, Alana. Ele espe­ra que você... Eu gostaria que descesse para partilhar essa alegria comigo. — Ela sorriu. — Isso me agradaria enormemente.

Lágrimas tolas marejaram os olhos de Alana. A vonta­de de chorar travava sua garganta. Ainda assim, pôde atinar para quão próxima se sentia àquela mulher. Pareciam irmãs. Como poderia recusar?

Não podia. E não o fez, embora lhe fosse necessária toda a coragem que possuía para tomar seu lugar no hall naque­la noite.

Até então, não havia visto Merrick porque ele não retor­nara ao quarto. No fundo, estava grata, pois temia reencon­trá-lo agora que gerava o filho de ambos.

Moreno e garboso, ele se sentava à cabeceira da mesa. Cada vez que o fitava, Alana sentia o ar ser roubado de seus pulmões, uma. experiência que a atemorizava sobremaneira.

Algumas horas depois, levantou-se e caminhou até ela. A expressão séria não revelava nada.

— Você já se recuperou? — Merrick perguntou, frio.

Alana assentiu. No mesmo instante, fitou Geneviève que desviou o olhar. Ela cumprira a promessa e nada dissera ao irmão, mas Alana não deixara de perceber que a boa mulher os observava de quando em quando.

— Os saxões não a feriram?

— Não — respondeu. — Simon disse-lhes que você não pagaria o resgate, se me ferissem. Mas o líder afirmou que matariam nós dois assim que recebessem o dinheiro. —Alana estremeceu. — Foi uma sorte você ter encontrado Simon a tempo.

— É verdade — Merrick concordou. — Ele me contou que teria padecido de frio se não fosse por você. Pelo jeito, eu lhe devo a vida de meu sobrinho, saxã.

Como não soubesse o que dizer, Alana permaneceu quie­ta. Mas Merrick a fitou por tanto tempo e com tanta intensi­dade que ficou incomodada.

Algo estava errado. Havia alguma coisa que o perturba­va. Quanto mais o silêncio se fortalecia, mais certeza ela adquiria.

Insegura, entrelaçou os dedos e molhou os lábios.

— O que foi? Por que está me olhando desse jeito?

— Acho perturbador, saxã, que o saxão Bramwell tenha enviado um homem para exigir um resgate. Nenhum mensa­geiro apareceu em Brynwald.

— Você não estava aqui! — Alana exclamou, nervosa.

— Entretanto, meus soldados estavam e minha irmã também. Nenhum saxão apareceu para exigir um resgate e agora me pergunto o que você tem a dizer a seu favor.

Quando a raiva emergiu, Alana cerrou os dentes.

— Não faço a menor idéia — argumentou. — Talvez o homem tenha se perdido. Talvez seus soldados tenham se enganado...

— Ou talvez você esteja mentindo, saxã. Aliás, certa vez me disse que se aliaria ao diabo, se isso a fizesse fugir daqui. Só estou curioso. Por acaso, você se juntou ao ban­do de saxões? Agarrou a primeira oportunidade e armou uma armadilha para mim?

O tom soou tão gélido quanto o olhar. A mente de Alana obscureceu. Por um momento, sentiu-se à beira das lágrimas. Ele realmente acreditava que seria capaz de armar um plano perverso para ludibriá-lo?

Um gosto amargo se apossou de sua boca. Já havia salva­do a vida do sobrinho dele duas vezes. Mesmo assim, Merrick continuava a condená-la sem razão ou causa, ainda acredita­va que ela era capaz de ações hediondas.

A revolta, originada pela mágoa, emergiu. Alana não mais podia controlar a língua como também não conseguia apagar as chamas da raiva.

— Sua gratidão me comove, meu senhor... Ah, esqueci, meu senhor conquistador! Consegue me agradecer e me con­denar quase na mesma frase! — exclamou, irada. — Esteja certo de que não cometerei o mesmo erro outra vez!

Em seguida, Alana se levantou e atravessou correndo o hall repleto de gente. Atrás de si, escutou algo quebrar, seguido de um impropério vicioso. Ela ofegava. Ouviu pas­sos... ou seria as batidas alucinadas de seu coração?

Alana tinha acabado de atingir o topo da escadaria quan­do ele a alcançou. Para detê-la, Merrick a segurou pelo bra­ço com força.

— Droga, saxã! Está correndo porque é culpada? Porque traiu minha generosidade? Não vai sequer negar a acusação?

Ela se desvencilhou daquela mão de aço, mas os olhos azuis continuavam implacáveis.

— Por que pergunta? — ela gritou. — Prefere acreditar no que quer. Pouco importa o que eu digo ou não digo. Mas preste atenção, normando. Eu não fiz nada! Está me acusan­do injustamente.

A fraca luminosidade das tochas do corredor formava sombras no rosto de Merrick.

— Talvez eu esteja errado. Mas sei que não me enganei quanto a um detalhe. Eu a observei esta noite, saxã. Você estava dispersa, perturbada. Seu desconforto em minha pre­sença foi percebido por todos. Então me diga, querida. Não esperava que eu voltasse a Brynwald? Planejou uma embos­cada para mim?

Mais uma vez, Alana precisou conter a fúria. Claro que pensava o pior dela. Merrick nada sabia a seu respeito e não se importava com ela. Seus sentimentos, seu orgulho. A alma de Alana clamava por justiça.

Ele alegava traição, mas no final quem se mostrava o grande traidor? Merrick não confiava nela. Alana representa­va somente mais uma posse a acumular.

Empinando o nariz, ela cerrou os lábios e enfrentou o olhar cruel.

A paciência de Merrick esgotou. Segurou-a pelos ombros e a sacudiu.

— Responda, saxã! Alana ficou de súbito tão raivosa que começou a tremer.

Ela ergueu o rosto e o encarou com igual intensidade.

— E se fui eu? Eu o desprezo — ela destilou. — Você incendiou minha casa. Você e seus homens mataram meu pai. Fez de mim e de minha irmã suas escravas. Lamento o dia em que você e seus comparsas normandos atracaram em nosso litoral e almejo o dia em que partam ou morram sob a lâmina saxã! Aliás, vou adorar! Fala como se eu lhe deves­se lealdade, mas não lhe devo nenhuma submissão. Não lhe devo nada!

Indignado ao extremo, Merrick praguejou. Voltou a sacu­di-la tanto que a cabeça de Alana pendeu para trás. Ela o encarou, chocada.

— Por Deus! — ele exclamou. — Você me deve sua vida!

Nenhum dos dois percebeu que Geneviève também correra escada acima. Ela apareceu no corredor naquele ins­tante. Com um grito de horror, agarrou o braço do irmão.

— Merrick! Meu Deus, homem, tenha cuidado! Ela está grávida!



Capítulo XVI

Merrick não conseguia explicar a sombra negra que o possuiu, a dúvida que o corroía por dentro. Ela havia chorado por Simon quando temera pela vida do garoto. Mas as lágrimas eram reais ou um embuste? Alana podia mui­to bem ter armado com os saxões para capturar Simon como uma forma de atraí-lo à densa floresta e matá-lo.

Irritado, cerrou os dentes. Nem um minuto se passara sem que pensasse em Alana, fosse por vontade própria ou não.

Lembrava-se de como ela se entregava ao calor da pai­xão, o sabor dos lábios carnudos, delicadamente umedecidos pelos beijos ardentes e como o corpo feminino se movia no auge da união amorosa. E, no entanto, ele questionava se conseguia incitar nela o mesmo desejo arrebatador que ela lhe estimulava.

Entregara-se tão desprendidamente apenas para enganá-lo?

Lamento o dia em que você e seus comparsas normandos atracaram em nosso litoral e almejo o dia em que partam ou morram sob a lâmina saxã! Aliás, vou adorar!

O choro raivoso ecoava nos recônditos de sua mente. Não, Merrick refletiu. Alana não deixaria de lado o ódio pelos nor­mandos com tanta facilidade. Era prudente de sua parte des­confiar dela.

Tudo isso e muito mais invadiu a cabeça de Merrick em um segundo. Logo, o tom de voz soou tão cruel quanto a per­gunta que lhe veio à mente.

— A criança é minha, saxã? Ou será que se deitou com um inglês?

Para Alana, teria sido menos doloroso se ele a tivesse estapeado. Sua garganta travou. No espaço de um segundo, as palavras lhe escaparam. Ela então avançou com todo o ódio que podia sentir em sua alma.

— Detesto você, normando. Deus, como eu o detesto.

Alana o empurrou e entrou no quarto, batendo a porta com toda a força. Merrick soltou uma imprecação antes de ir atrás dela. Mas Geneviève postou-se diante dele e o impediu.

— Você é um imbecil — disse sem preâmbulos.

— E você está me atrapalhando — ele grunhiu. -— Saia da frente.

Sediciosa, ela o enfrentou.

— Como pode se tão cruel? — Quanto mais baixo era o tom, mais a voz vibrava com sua fúria. — Acusou-a de um pecado hediondo quando sabe muito bem que Alana não teve intimidade com nenhum homem além de você. Quanta cruel­dade pensar que ela planejou sua morte com aqueles bandi­dos. Os aldeões a condenam por ser uma bruxa, enquanto você a condena por coisas que não são verdade!

A expressão de Merrick se tornou tão dura quanto pedra.

— Acha que sou cruel? Ela não é tão inocente quanto ima­gina, Geneviève. Alana já tentou fugir uma vez. E você esta­va no hall esta noite. Viu como estava aflita... ela não quer saber de mim!

— Alana estava, sim, com receio de encontrá-lo, mas não pelo motivo que imagina. Não sabia como lhe contar que está grávida. E você, bruto como é, provou que ela tinha razão. — Geneviève o encarou, indignada. — Você conhece as maldades do mundo melhor do que ela, Merrick. Se não queria ter um filho, não deveria tê-la levado para sua cama. Então se pretende recriminá-la...

— Não recrimino ninguém! — Merrick explodiu. — Eu só não esperava essa novidade!

— Se semear a terra, o campo irá florescer, meu irmão — ela declarou, compreendendo que ele não entendera o óbvio.

Merrick fitou a irmã, tentando ignorar a culpa que sentia. Mas sua voz interior não lhe dava sossego.

Ela tem razão, dizia a voz. Você devia ter desconfiado muito tempo atrás.

— Se for sábio, vai deixá-la em paz, Merrick. O momen­to é delicado e...

— E mais uma vez você interfere em um assunto que não lhe diz respeito. Essa sua mania está ficando irritante, Geneviève. Agora, por favor, deixe-me passar.

A despeito do tom educado, aquilo estava longe de ser um pedido e ela sabia disso. A disposição de Merrick esta­va explícita na intensidade do olhar. Geneviève, portanto, rendeu-se com aceno sutil. Preocupada, observou-o passar. Quando a porta do quarto se fechou, murmurou uma prece fervorosa.

Os ombros de Alana enrijeceram assim que ele entrou no quarto. Precisou de muita coragem para se virar e encará-lo.

O tempo pareceu parar. O silêncio engolfou a ambos. Finalmente, Merrick resolveu se manifestar.

— Precisamos conversar, saxã.

— Não tenho nada a lhe dizer, normando — ela declarou, orgulhosa.

Merrick refreou a réplica grosseira que emergiu em seus lábios. Atrás dela, a luz do fogo da lareira a banhava em uma silhueta dourada. Alana entrelaçou as mãos diante de si e permaneceu em pé. Seus olhos-grandes o fitavam com calma, embora o rosto estivesse pálido.

Uma avalanche de emoções estranhas caiu sobre ele.

Nunca a vira tão desejável. Jamais a percebera tão linda. E, para sua crescente irritação, Alana nunca estivera tão inatingível.

— Não deveria ter falado daquele jeito. É claro que o bebê é meu. — O tom soava curto e objetivo. — Fui rude, mas você me provocou diversas vezes.

— Eu o provoquei? Ora, nem sequer disse nada! — Para o horror de Alana, sua voz vacilava por causa das fortes emo­ções. — E não entendo por que você está tão bravo. Não é minha culpa.

— Eu não disse que era sua culpa. Mas continuo curioso, saxã. Está feliz por gerar um filho meu?

Merrick estava tenso. Ficou claro que suas palavras reve­lavam a mentira. De repente, o peso do que acontecera nos últimos dias tornou-se demais para ela. Embora se odiasse por tamanha fraqueza, o olhar de Alana não ocultou o que sentia.

Uma máscara de gelo se instalou. O som que Merrick emi­tiu foi de puro desgosto.

— Eu devia saber que isso não a faria feliz. — Ele fez uma breve pausa. — Vá dormir. Conversaremos amanhã. — Dito isso, Merrick lhe deu as costas.

Alana não precisou de estímulo. Tirou as roupas e se dei­tou somente de combinação. Cobriu-se com as peles e obser­vou Merrick. Rígido, ele estava em pé diante da lareira.

O tempo passou. Não se ouvia nenhum som, a não ser o estalar das lenhas no fogo. Incapaz de suportar aquele silên­cio horrível, Alana se virou de lado e encolheu as pernas. Nunca em toda sua vida se sentira tão infeliz.

Após um longo momento, escutou o roçar de roupas antes de os trajes de Merrick caíram no chão. Ele apagou a vela e se deitou. Alana fechou os olhos e fingiu dormir.

Mas não houve a bênção do sono para ela naquela noi­te. Não sabia dizer por quantas horas permaneceu sob a penumbra do quarto em silêncio. Embora poucos centíme­tros os separassem, a distância lhe parecia abissal.

Ele não a tocou, mas, por mais incrível que parecesse, era o que Alana mais almejava. Sentir aqueles braços pode­rosos a seu redor e ouvir as batidas estáveis do coração de Merrick.

O desespero começou a dominá-la. O que havia de errado com ela, afinal? Antes de se deitar, havia jurado que o odia­va e falara a mais pura verdade de sua alma. Agora desejava acima de tudo banir palavras tão dolorosas e fingir que nada acontecera. Mas essa magia seria impossível porque as bar­reiras entre eles estavam ainda maiores.

Merrick reagira da maneira que ela havia previsto, ou melhor, temido. Ele se mostrara tão enraivecido e tal cons­tatação fizera o coração de Alana sangrar. A angústia, mistu­rada à tristeza, a engoliu como um nevoeiro. Sentiu o ar lhe faltar. A emoção devastadora travava sua garganta, enquanto lutava contra as lágrimas.

Imaginando que Merrick agora dormia, Alana não mais se conteve e soltou um soluço choroso.

Ele se virou imediatamente. Acomodou-se de lado para espiá-la. Alana permanecia encolhida, com as mãos cola­das aos seios. A cabeça estava baixa. Era parecia uma bola. Havia um desamparo naquela pose, uma sofrida vulnerabili­dade que Merrick não podia ignorar.

Ela o repudiou quando tentou tocar-lhe o ombro. Teimoso, tirou as mechas loiras do rosto delicado para que pudesse enxergar a expressão dela sob a luz do fogo.

— O que foi, saxã? Por que está chorando? Sente-se mal? — ele perguntou, impaciente.

Alana meneou a cabeça. Mas agora as lágrimas caíam em profusão.

Agoniado, Merrick a virou para que pudesse vê-la melhor. Quando ela buscou evitar encará-lo, ele a tocou no queixo.

— Conte-me — pediu. — Por que chora?

Um soluço escapou e, de repente, tudo despencou de uma só vez.

— Você pensa que me uni àqueles saxões malvados, mas juro que não fiz isso. Então me perguntou se eu estava feliz. Para ser sincera, não sei o que sinto... Mas ficou evidente que você não gostou da novidade, está zangado comigo e...

— Se estou zangado, saxã, é porque soube da novidade através de minha irmã, quando era eu quem deveria ser o primeiro a saber. Por que você não me contou?

Apesar de estar calmo, a voz ainda transparecia certa amargura. Alana sentiu-se absurdamente culpada.

— Eu... eu mesma só descobri esta manhã. Foi Geneviève quem deduziu. — Ela hesitou antes de prosseguir, chorosa. — Entendo que você não me queira mais. Sei que não dese­ja o bebê.

Merrick não permitiu que ela terminasse.

— Esse bebê também é meu, saxã. E está errada porque eu ainda a quero.

Alana tentou conter as lágrimas.

— Você queria uma escrava. Uma meretriz. Não uma criança para criar.

Novamente tenso, Merrick a fitou com séria paciência.

— Não é uma escrava nem uma meretriz, saxã.

Ela tremia, pois podia perceber o olhar azulado sobre si.

— Serei um fardo em sua vida. Um estorvo que em breve irá cansá-lo. —- Alana não conseguia evitar a forte emoção que a traía. — Meu bebê será um fardo.

— Um fardo! Por tudo que é mais sagrado, você não pen­sou que eu a mandaria embora, pensou? — Merrick prague­jou. — Pensou?

Tímida, Alana assentiu. Sim, aquela possibilidade lhe ocorrera durante todo o dia.

— Não posso deixá-la ir, saxã. Não farei isso. Venha aqui.

— Embora a voz soasse ríspida, as mãos demonstraram cari­nho. Sem mais palavras, ele a acomodou de modo que toda a extensão das costas de Alana ficou colada ao peito musculoso. Uma das mãos pousou sobre o ventre que agora abrigava o fruto de ambos.

O silêncio se instalou mais uma vez, mas não causou des­conforto ou opressão. Quando ela estremeceu um pouco, Merrick estreitou o abraço.

— Você tem tido enjôos?

— As vezes, pela manhã — Alana admitiu. — Foi idioti­ce a minha ser tão cega, mas aconteceu.

Talvez não fosse tanto a cegueira e sim o medo de consta­tar a verdade. Mas essa observação Merrick guardou para si. Durante algum tempo, permaneceram calados. Ele se retraiu um pouco, tomado por uma nuvem de emoções conflitantes.

A proximidade de Alana o tentava enormemente. Parte dele, a que mais a desejava, aninhava-se à maciez dos qua­dris. Cerrava os dentes cada vez que ela se mexia, pois ansia­va satisfazer a necessidade de deitá-la de costas, arrancar-lhe a combinação e fazê-la esquecer tudo, exceto a paixão que fluía entre eles.

Entretanto, Merrick não ousou molestá-la porque, naque­le momento preciso, Alana parecia mais jovem, apesar de dentro de si gerar uma nova vida.



Seu filho, pensou com orgulho. Foi nesse instante que a importância daquela revelação se instalou por completo.

Merrick a sentiu tensa quando começou a explorá-la de modo gentil. Com a mão, traçou a protuberância dos seios para então se aventurar mais abaixo. Fascinado, acariciou o ventre arredondado.

— Posso perceber as mudanças em você — comentou. — Eu também devia ter deduzido, saxã.

Alana corou. Embora não pudesse ver o rosto delicado, Merrick pôde sentir o aumento de temperatura da pele. Uma poderosa sensação de posse o assolou. Deus, como ela era suave!

Beijou a pele sedosa do ombro e inalou a essência deli­ciosa de Alana.

— Quando você acha que o bebê vai nascer?

A voz soava rouca e baixa. Alana sentiu um arrepio per­correr-lhe o corpo. Uma dor estranha fisgou o seio. Queria acreditar que Merrick dizia a verdade, que não estava bra­vo. Pensar que ele poderia rejeitar aquela criança era demais para Alana. Porém, não percebeu nenhuma dureza nele, o que a fez se agarrar à frágil esperança de que havia um futuro para eles.

Pensativa, tentou voltar no tempo. Devia ter acontecido à primeira vez que...

— Não tenho certeza — murmurou. — Mas acho que deve nascer ao final do verão, antes da festa de São Miguel.

— São Miguel. — Havia satisfação na voz. — Brynwald estará colhendo os frutos dos campos, enquanto eu colherei o fruto de uma fria e prazerosa noite de inverno.

Alana ficou chocada com tamanha rudeza. Mas Merrick simplesmente riu de alegria e a puxou para si. Entrelaçou os dedos nos dela e pousou as mãos de ambos sobre o ventre que crescia.

O gesto foi simples e, para Alana, significou muito. As lágrimas voltaram a surgir. Mas, dessa vez, eram lágrimas de felicidade. Talvez não fizesse sentido. A verdade era que havia conforto, um mundo inteiro de aconchego, naquela proximidade.

Não se importava com o peso do braço em sua cintura. Às costas, podia sentir as batidas do coração de Merrick. Apesar do dia turbulento, Alana estava tão contente que seus olhos começaram a fechar. Aos poucos, a tensão se dissipou. Ela então adormeceu profundamente.


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