seria uma forma de falar e escrever a língua portuguesa legitimada como
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(denominada "norma culta" pela sociolinguística). Essa forma é caracterizada
por determinadas maneiras de falar, empregar palavras e construir frases que,
na maioria das vezes, indicam a posição social dos indivíduos. Podemos citar
outros exemplos, como as formas de se colocar em entrevistas de emprego ou
até mesmo de se vestir. Dominar a cultura "legítima" resulta em vantagens
sociais, políticas e também financeiras. Por este motivo, o domínio da cultura
legítima é chamado por Bourdieu de capital cultural.
O processo de reprodução social descrito é sustentado, entre outras coisas,
pela aceitação desses padrões de conhecimento e comportamento. Controlar
esse processo é uma forma que os grupos dominantes têm de se manter no
poder, e a escola contribui para isso ao transmitir modos de agir, sentir e
pensar em conformidade com os interesses objetivos, materiais e simbólicos
das elites. Essa imposição de padrões culturais é vista por Bourdieu como uma
forma de violência simbólica, que pode ser exercida não só pela escola mas
também por instituições como o Estado, a mídia, as famílias, entre outros.
Outro pensador que considera que a instituição escolar - bem como o acesso
ou não a ela - produz diferenças associadas à posição social é o austríaco Ivan
Illich (1926-2002). Segundo esse autor:
LEGENDA: Público visita exposição com obras do pintor italiano Caravaggio
(1571-1610) no Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp), em
São Paulo (SP), em 2012. Para Bourdieu, a familiaridade com a cultura dita
legítima resulta em vantagens sociais, políticas e financeiras.
FONTE: Evelson de Freitas/Agência Estado
Deveria ser óbvio que, havendo à disposição escolas de igual nível, a criança
pobre raramente tem a possibilidade de ultrapassar a rica. Podem frequentar
escolas de igual qualidade e começar na mesma idade, mas às crianças
pobres faltam, em grande parte, as ocasiões didáticas que estão normalmente
disponíveis à criança da média burguesia. Estas vantagens vão das conversas
aos livros que têm em casa e em viagens durante as férias, a uma consciência
de si mesma que a criança usufrui na escola ou fora dela. Por isso, quando as
possibilidades de progredir ou de aprender dependem da escola, o estudante
mais pobre permanecerá geralmente atrás. Os pobres têm necessidade de
aprender e não de obter um certificado atestando a assistência recebida por
sua presumida insuficiência.
ILLICH, Ivan. Descolarizzare la società. Milano: Mondadori, 1972. p. 29. Texto
traduzido.
Ligada a esse processo de reprodução social pela via educacional está a
autoevasão da escola: muitos alunos deixam de frequentá-la, atribuindo a si
próprios a culpa pelo insucesso escolar e considerando-se incapazes de
acompanhar os estudos formais. Ivan Illich propõe, como solução, a
desescolarização, ou seja, a substituição da instituição escolar por uma teia de
aprendizagem formada por grupos, em que cada um ensinasse conforme suas
habilidades.
Por sua vez, o sociólogo francês Bernard Lahire (1963-) concluiu que o meio
social que cerca a criança tem influência decisiva em sua educação.
Analisando os resultados escolares de estudantes de baixa renda na França,
Lahire percebeu que o envolvimento da família e de outras pessoas com as
quais a criança e o jovem convivem serve de apoio para dar sentido à
experiência escolar. Esse autor considera que apenas investir em formação de
educadores e estrutura física das escolas não é suficiente para aproximar o
aluno da escola e possibilitar, por exemplo, a redução das desigualdades
sociais por meio da formação educacional.
FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora
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