Natureza é um termo simples demais para dar conta da imensa diversidade
geográfica de formas de vida e da complexidade infinita dos ecossistemas
interligados. No esquema ampliado das coisas, o desaparecimento de uma
zona úmida aqui, de uma espécie local ali e de um determinado habitat
em
algum outro lugar podem parecer triviais, bem como inevitáveis, dados os
imperativos do crescimento populacional humano, sem dizer a continuidade
acumulada do capital [...]
. Mas é justamente a agregação de tais mudanças de
pequena escala que pode produzir problemas macroecológicos, como o
desmatamento, a perda de habitats
e da biodiversidade, a desertificação e a
poluição oceânica.
A construção da relação com a natureza como inerentemente dialética indica
uma série de possíveis transformações nos comportamentos humanos bem
como um processo de evolução natural, incluindo a produção humana da
própria natureza, que torna essa relação dinâmica e perpetuamente aberta. [...]
Quem teria pensado que a refrigeração, que tem salvado tantas vidas e fez a
urbanização em grande escala possível mediante a preservação da qualidade
dos alimentos, acabaria por produzir o buraco de ozônio por causa dos
clorofluorcarbonos utilizados para a refrigeração; que o DDT ficaria tão
disperso ao longo da cadeia alimentar a tal ponto de levar à morte pinguins da
Antártida; ou que o amianto e as tintas à base de chumbo teriam efeitos
terríveis na saúde das populações humanas muitas décadas após seu primeiro
uso? Há muito se compreendeu (desde os gregos antigos, pelo menos) que as
consequências ambientais não intencionais das atividades humanas podem ser
extensas e que, sabe-se desde os tempos antigos, a mera habilidade de usar o
fogo ou deixar livres carneiros e cabras no campo, para não falar da vasta
gama de efeitos mais contemporâneos de magia química sobre a toxicidade
dos ecossistemas, podem resultar em formas extensivas de modificação
ambiental, de tal forma que nada do que hoje chamamos de natureza é
desprovida de influência humana.
HARVEY, David. O enigma do capital: e as crises do capitalismo. São Paulo:
Boitempo, 2011. p. 67-68.
· A proposição do geógrafo britânico David Harvey (1935-) nos instiga a pensar
que as consequências da ação humana sobre o ambiente não são apenas
extensas e profundas, mas também desigualmente distribuídas social e
geograficamente. Discuta com a turma sobre como pensamos a natureza e de
que maneiras interferimos nela atualmente.
Fim do complemento.
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