Silvia Maria de Araújo · Maria Aparecida Bridi · Benilde Lenzi Motim


Em que consiste um fenômeno de intolerância religiosa? 2



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1. Em que consiste um fenômeno de intolerância religiosa?

2. Como esse fato narrado na notícia acima fere a Constituição Federal da República Federativa do Brasil e a Declaração Universal dos Direitos Humanos?

3. Em sua opinião, por que isso ocorre no Brasil?

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O fenômeno religioso

A religião é uma das dimensões da cultura e serve ao indivíduo e à coletividade como fonte de concepções sobre o mundo. Estão em sua base a vontade de crer das pessoas e a construção de uma manifestação coletiva com base nessa crença. Segundo o antropólogo norte-americano Clifford Geertz (1926- -2006), a religião é um sistema de símbolos que provocam motivações fortes e duradouras nos indivíduos. Esse sistema pode ser estudado pelos cientistas sociais, que, pesquisando o significado de atos, rituais e valores religiosos, podem então buscar compreender o papel da religião na vida das pessoas.

A religião é também uma instituição social: existe ao longo da história e nas mais diversas sociedades, e exerce um padrão de controle social e uma programação da conduta individual. Dessa forma, ela apresenta características próprias das instituições sociais: é coercitiva, é exterior aos indivíduos, possui objetividade e historicidade.

A dimensão ética da religião é também objeto de estudo das Ciências Sociais, por suas consequências no comportamento das pessoas. Como demonstrou o sociólogo alemão Max Weber (1864-1920), a conduta das pessoas tende a se orientar por pontos em comum entre seus ideais religiosos e as atividades práticas que exercem, como aquelas tomadas na esfera econômica - é o que ele chama de afinidades eletivas. Ou seja, as diferentes religiões também favorecem diferentes comportamentos individuais e desenvolvimentos sociais.

A religião é um dos principais objetos de estudo das Ciências Sociais. É um fenômeno social, ainda que trate da ligação do indivíduo com o sagrado.

Autores da Sociologia e da Antropologia atribuíram diferentes razões para a formação das religiões: a vontade humana de explicar questões como a origem do Universo, o mistério da vida e da morte; a relação entre indivíduo e natureza; a possibilidade de transcendência; a constituição da matéria e do espírito; as dimensões do natural e do sobrenatural.

De acordo com o sociólogo francês Jean Baechler (1937-), o fenômeno religioso incentiva o indivíduo a procurar superar sua condição humana a fim de se abrir a algo que o supera e, ao mesmo tempo, o engloba. Esse "algo" pode ser imanente, ou seja, pode se manifestar concretamente, à vista de todos; ou então transcendente, ou seja, pode ocorrer em um plano que não é o concreto. Ao mesmo tempo, os seres humanos produzem ritos, crenças, costumes, regras de conduta orientados pela religião - as chamadas produções sociais da religião. É por meio delas que muitos indivíduos procuram a harmonia de sua existência.

Ainda segundo Baechler, o fenômeno religioso implica a ação de atores sociais, como os produtores, os gestores e os fiéis. Os responsáveis pela produção do conjunto de crenças religiosas são personagens místicos, como Jesus Cristo, Maomé, Buda, os primeiros antepassados, para citar exemplos do cristianismo, do islamismo, do budismo e de muitas religiões indígenas. Já os gestores (lideranças e dirigentes religiosos) organizam, por meio das práticas religiosas, a difusão da fé entre aqueles que buscam contato com a esfera divina. Os sociólogos Peter Berger (1929-) e Thomas Luckmann (1927-2016) definem o processo de institucionalização social como a repetição de uma ação definindo um padrão



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LEGENDA: Representação do profeta Maomé, fundador do islamismo, em ilustração turca do século XVI.

FONTE: Bildarchiv Steffens/The Bridgeman Art Library/Keystone Brasil

LEGENDA: Detalhe de Cristo na cruz (c. 1632), do pintor espanhol Diego Velázquez.

FONTE: Museu do Prado, Madri, Espanha.

LEGENDA: Escultura representando o orixá Xangô, de Miguel Morais. Foto de 2013.

FONTE: Julian Kumar/Godong/Corbis/Latinstock

LEGENDA: Escultura paquistanesa representando Buda, do século IV.

FONTE: Museu de Lahore, Punjab, Índia//The Bridgeman Art Library/Kesytone Brasil

de conduta social aceito e legitimado coletivamente por determinado grupo. Nesse processo, os gestores lançam mão de práticas como crenças, gestos, formação de comunidades e regras de conduta.

Uma crença pode se cristalizar em mitos, dogmas ou construções teológicas. Frutos da imaginação e da criatividade humanas, os mitos estão presentes em todas as culturas e representam simbolicamente fenômenos humanos ou da natureza, como o mito da criação do mundo. Para muitos sociólogos e para a antropologia funcionalista, os mitos são alegorias que não só explicam problemas existenciais e sociais, mas também possuem uma função na organização da vida da comunidade.

Em uma religião, as crenças que assumem o caráter de verdades doutrinárias a serem aceitas sem discussão - por serem consideradas de origem divina - constituem dogmas. Já as construções teológicas são regras, procedimentos e interpretações elaboradas, no decorrer do tempo, por aqueles indivíduos reconhecidos como intermediários entre a divindade e o mundo profano. As bases de uma crença mobilizam as emoções e a sensibilidade dos fiéis, traduzindo-se em práticas religiosas, tais como celebrações, danças, transes, sacrifícios, ritos, orações, gestos sistematizados. As práticas religiosas, geralmente, são dirigidas a uma comunidade congregada por cerimônias, que marcam o tempo e o espaço com simbolismo próprio.



As religiões [...] propõem regras de vida sob a forma de obrigações e de proibições. [...] Algumas são pontuais ou referem-se às consequências diretas de uma determinada prescrição religiosa relativa a um determinado aspecto de uma dada sociedade. Se, por exemplo, o judaísmo e o islã proíbem o consumo de carne de porco, daí resulta que o porco está ausente das comunidades judaicas e muçulmanas. A partir do momento que o vinho é indispensável à celebração da missa, em virtude de um dogma central do cristianismo, a vinha é cultivada nos países cristãos. [...] podemos demonstrar, com base em documentos, que não há um único domínio da vida social que não tenha sido afetado, mais ou menos decisivamente, pela religião.

BAECHLER, Jean. Religião. In: BOUDON, Raymond (Org.). Tratado de Sociologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1995. p. 465.

O fenômeno religioso tem, portanto, muitas facetas, e é heterogêneo por se basear em diversas fontes e interesses relacionados à condição humana. As diferentes interpretações sobre as religiões destacam sua função moral e de consolidação de costumes e o caráter ideológico de suas ações, que procuram justificar uma ordem social como se ela fosse natural.

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Mesmo para os ateístas, ou seja, aqueles que não acreditam na existência de divindades, a religião é fonte de inspiração e de questionamentos. O filósofo suíço Alain de Botton (1969-) afirma que:

[...] É possível não sentir atração pela doutrina da Santíssima Trindade cristã [...] e, ainda assim, interessar-se pelas maneiras como as religiões fazem sermões, promovem a moralidade, engendram um espírito de comunidade, utilizam a arte e a arquitetura, inspiram viagens, exercitam as mentes e estimulam a gratidão pela beleza da primavera. [...]

BOTTON, Alain de. Religião para ateus. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2012.

FONTE: Elaborado com base em: CALDINI, Vera; ÍSOLA, Leda. Atlas geográfico Saraiva. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 180; LE ROBERT. Atlas Géopolitique et Culturel. Paris: Le Robert, 2003. p. 80; DE AGOSTINI. Atlante geografico metodico. Novara: De Agostini, 2011. p. E36. Créditos: Banco de imagens/Arquivo da editora


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