Sumário prólogo capítulo



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CAPÍTULO 4 6
Leonardo encontrava-se, de novo, em uma situação incômoda, ou melhor, angustiante. Cláudia arrastava-se, seguindo na frente, e Salvador vinha atrás dele, o que tornou ainda mais aguda sua particular sensação de claustrofobia, já que era semelhante a estar encerrado dentro de um caixão mortuário. Não quis pensar nisso, naquele momento, e concentrou sua atenção na intensa dor que o atormentava, subindo a partir dos joelhos.

Às vezes, devido à inclinação, lhe custava muito esforço levantar as pernas e acabava se machucando nas tábuas de madeira encravadas no solo do canal. Tinha certeza de que sua pele estava cheia de escoriações, uma vez que o tecido das calças estava esfolado. Então, esqueceu-se da dor física para se fixar novamente na psicológica, uma vez que as paredes do túnel se estreitavam como um funil, como na cripta murciana da capela dos Vélez. Os últimos nove metros pareciam intermináveis. Nem havia chegado, ainda, e já desejava escapar daquela ratoeira decrépita que fedia a excrementos.

Estava prestes a render-se quando viu que Cláudia podia se erguer, até ficar em pé. As lanternas iluminaram as paredes rochosas de uma sala retangular, completamente vazia, cujo teto era possível tocar com as mãos, com os braços estendidos para cima. Diante deles, no outro extremo, abriu-se um canal estreito, como aquele por onde eles tinham vindo. Também viam um poço, de uns dois metros de largura, por três de profundidade, perfurado no solo. Riera lhe disse que era a Câmara do Caos.

—Pode-se saber para que descemos aqui, se não há nada de interesse? — perguntou, nervoso, e o eco de sua voz vibrou na sala.

—Fique tranqüilo... — aconselhou Cláudia. — O ritual de iniciação é um ato de fé... — então, ao perceber um certo ceticismo no rosto dele, sua companheira acrescentou, pragmática — ... foi o que me disseram.

—Não há melhor forma de definir isso — afirmou Salvador Riera, iluminando ao seu redor com a lanterna. — Aqui começa a purificação da alma, neste lugar tão terrível que representa o inferno, onde ingressaremos até chegar à Luz.

—Pois eu acho que deveríamos sair daqui o quanto antes... — disse Cárdenas, que, realmente, estava se sentindo mal. — Esta câmara dá calafrios.

—Tente não pensar nisso... — Cláudia se aproximou, para acariciar as bochechas dele. — Todos os que percorreram este caminho regressaram sãos e salvos!

Seu tio deixou escapar uma gargalhada.

—E o que é isso, agora? — perguntou a jovem, com ligeira tensão, voltando o rosto para ele.

—Acontece que não é certo o que você acabou de dizer. Alguns jamais chegaram a terminar o percurso iniciático. É um detalhe que Balkis omitiu, com receio de que não seguissem adiante.

—Você conseguiu? Chegou até a Arca?

—Sim, em companhia de Séphora.

—E o que houve, depois? — aquilo era novidade para Cláudia, por isso insistia.

—Não pude finalizar o processo de iniciação por culpa de minha ignorância, e por isso não permaneci no Egito, como era minha intenção. Não consegui resolver corretamente a adivinhação do

Trono, mesmo que tivesse sentado nele com Séphora. Por isso, em vez de me tornar Guardião, fui designado para ocupar o cargo de Mestre, o homem sobre quem recai a obrigação de preservar o segredo da loja, mesmo à custa de manchar suas mãos de sangue. Creio que fui castigado por meu orgulho. Em seguida, houve uma segunda tentativa, mas dessa vez com Khalib encarnando o papel de Hiram... E ele conseguiu superar o desafio com êxito. Claro, ele sempre professou a filosofia sufi e isso foi uma vantagem para ele.

—Espere! Volte atrás — Leonardo deu uns passos, aproximando-se de Salvador. — Você reconheceu, agora pouco, que nem todos chegaram à Sala do Trono. O que acontecerá se fracassarmos?

—Vai dar tudo certo, não se preocupe — Sholomo lhe deu as costas, indo até uma pequena abertura, do outro lado da câmara.

Muito contrariado, Leonardo foi atrás dele.

—Espere um momento! — exigiu, acremente e o segurou pelo ombro. — Você ainda não respondeu à minha pergunta.

Riera voltou-se para encará-lo. Estava enfurecido. Mas logo se tranqüilizou ao perceber que Cláudia também esperava uma resposta.

—Antes que vocês cheguem ao Trono, vão se deparar com uma encruzilhada da qual dependerão suas vidas — advertiu-os, com seriedade. — No corredor de quatro portas, inscrita em uma das paredes, encontrarão uma adivinhação de vital importância: o mistério da Sabedoria. Utilize o latim para solucionar o enigma e reorganize o anagrama. E você, pequena... — olhou para Cláudia, com decisão. — Lembre-se daquela história que uma vez lhe contei, menina, uma que falava de um indivíduo que construiu um jardim privado e deu a ele o nome de Parque do Portão de Rocha. Será de grande ajuda para você.

Sem esperar resposta, Salvador lhes fez um sinal para que entrassem no estreito corredor.

—Mas tio... ouvi dizer que esse túnel termina alguns metros mais adiante — disse Cláudia, ao descobrir que aquele era o caminho que deveriam percorrer para alcançar seu objetivo.

—A pedra que bloqueia a passagem é, na realidade, basculante. Estará aberta quando chegarem — informou-lhes. — A partir dali, cabe a vocês encontrar o Salão do Trono.

—Essa sim que é boa! Não pensa em vir conosco? — Leonardo se sentiu traído ao perceber que ele os abandonava à própria sorte.

—Balkis me disse para esperar aqui — foi sua única e seca resposta.

—Esperar o quê? — perguntou Cláudia, tão irritada como seu companheiro.

—A chegada dos intrusos... — ele apontou para a boca do túnel descendente por onde haviam descido. Dela surgia um facho difuso de luz, que ia crescendo aos poucos.

—Não há tempo a perder — continuou. — Estarão aqui em questão de minutos.


Cristina foi a primeira a alcançar a Câmara do Caos, e sua impressão era a de haver desembarcado em sua própria tumba. Diante de seus olhos, viu uma sala de paredes mofadas, cujo teto formava um retângulo perfeito. Alguns segundos foram suficientes para que a percorresse visualmente na sua totalidade. Foi quando o viu, em pé junto a um vão que havia do outro lado, como se se tratasse de um espectro em um mausoléu de pedra. Ficou olhando para ele fixamente, sem saber o que fazer ou dizer.

A entrada de Lilith, conseguiu devolver-lhe a mobilidade, de maneira que se postou de um lado, evitando qualquer contato com a jovem.

—Olhe só quem temos aqui! É meu velho amigo Sholomo! — exclamou Lilith, ao reconhecer Riera. — Pelo que vejo, nossos caminhos voltam a se cruzar.

Ela apontou a arma para ele, na tentativa de evitar surpresas desagradáveis. Salvador levantou ligeiramente os braços, dando a entender, com o gesto, que não ocultava nada em suas mãos, apenas segurava a lanterna.

—Tenho de dizer, entretanto, que não é nenhum prazer voltar a vê-lo... — esboçou um sorriso forçado. — Jamais acreditei que você pudesse conseguir isso.

—Como pode ver... sou implacável.

—Você deve ser a doutora Hiepes, suponho... — o arquiteto olhou para Cristina com curiosidade. — Gostaria de saber qual é sua posição.

Ela refletiu, antes de responder. Na realidade, não estava em nenhum dos dois bandos. Era uma terceira pessoa na discórdia.

—Neste momento, minha posição é tão vulnerável como a sua — foi sincera, ao manifestar essa conclusão. — No entanto, espero ter a sorte de contemplar a Arca da Aliança antes de morrer.

—Creio que não será possível — sentenciou Riera. — Nenhum sacrílego a verá. Jamais!

—Diz isso porque não me conhece — acrescentou Lilith. — Muito bem! Basta de palavrório. Diga-me onde estão Leo e os outros. E não me diga que está sozinho, porque nós estamos seguindo vocês desde o Museu Arqueológico.

As pupilas de Salvador brilharam com especial intensidade na obscuridade da sala. De certo modo era uma provocação, um desafio à morte, mas não se importava. Conhecia de antemão seu destino.

Esse foi um dos sacrifícios exigidos por Balkis: lavar sua consciência fazendo justiça. Tinha de pagar pelos erros cometidos.

—Não tenho medo de você — disse-lhe, sério. — Sei que mais cedo ou mais tarde você sentirá necessidade de me tirar da frente.

—Com certeza — admitiu a jovem alemã. — Jamais poderia perdoar o que você fez à Frida.

—Não foi culpa minha, senão de sua curiosidade e ambição, Lilith. Você sabia que a loja não permite intromissão de ninguém alheio à irmandade. Qualquer um que indague sobre os segredos da câmara se calará para sempre... Por acaso não se lembra da máxima de advertência?

—Você está louco — murmurou Lilith, colocando a pistola a poucos centímetros da cabeça de Riera.

O arquiteto agüentou a provocação com extraordinário sangue-frio.

—Você tem duas opções — disse-lhe, glacial. — Uma, vingar a perda de sua amiga e regressar por onde veio; a outra é acabar comigo e seguir em frente. Se escolher a primeira, pensarei que é inteligente. Caso se incline pela segunda, pode ter certeza de que, antes da noite acabar, nossas almas arderão juntas no inferno.

—Que assim seja!

Sem pensar, a alemã apertou o gatilho e o eco do disparo ressoou pela câmara, reiterada e estrepitosamente. O corpo sem vida de Salvador caiu ao solo, em um derradeiro ato de inutilidade. Tinha sido vítima de sua própria sentença. Lilith virou o rosto na direção de Cristina, que descobriu, ao ver naquele olhar, algo que até aquele momento não sabia: a garota era uma psicopata compulsiva, com clara tendência ao sadismo.

—Odeio as fanfarronadas — afirmou, sarcasticamente, e começou a rir.


Aquilo confirmou a teoria mais sinistra da criptógrafa. Tal como lhes prometera Salvador Riera, a parede do fundo do canal era uma porta basculante de pedra e estava entreaberta. Cláudia, sempre em primeiro lugar, a empurrou suavemente com a mão. Surpreendeu-se ao observar que ela girou com muita facilidade e também com o fato de que nenhum arqueólogo tenha suspeitado da existência daquela galeria, que continuava adiante, por vários metros, sob a Grande Pirâmide.

Ambos seguiram adiante por um corredor bem amplo, pelo qual podiam caminhar totalmente eretos. Em alguns dos arcos que as paredes formavam, descobriram uma série de petróglifos de natureza proto-histórica que foram incapazes de reconhecer. Não se pareciam em nada com a escrita hierática do Antigo Egito nem com nenhuma outra conhecida. Eram, sim, ideogramas cabalísticos sem sentido. Vários deles lhes recordavam os caracteres do alfabeto hebreu.

—É a escrita original — afirmou Cláudia, ao observar como seu companheiro as observava com atenção. — Segundo meu tio, foi diretamente revelada aos homens pelos anjos. Os antigos habitantes de Enoque a chamavam de arsigot, ou, o que é a mesma coisa, o idioma artístico de Deus. Séculos mais tarde, os templários batizariam os conhecimentos adquiridos, graças à sabedoria da Arca, com o nome de arte gótica.

Nada mais causava surpresa ao bibliotecário da Hiperión. Então, lembrou-se da disparatada comparação da Viúva aos pés de Quéops.

—Balkis me contou uma história estranha a respeito de uma incrível catedral enterrada sob o deserto... — confessou, com voz rouca. — Você sabe algo a respeito?

—O mesmo que você, mas não creio que seja exata...— negou com a cabeça e acrescentou, com um meio-sorriso: — ...está mais para uma lenda que circula entre os membros veteranos da loja.

Continuavam seguindo pelo corredor. Leonardo não conseguia parar de pensar em uma idéia que lhe surgira desde que enterrava os dois pequenos monólitos na areia, um pensamento diretamente relacionado à construção das catedrais e seus arquétipos.

—Não acredita que possa ser verdade? — ele perguntou, de novo. Cláudia olhou para ele, desconcertada.

—Você se refere às colunas de Tubalcaim e do Santuário da Sabedoria?

—Isso mesmo! — respondeu, rápido. — Acabo de perceber que existe uma relação entre o relato de Balkis e os modelos seguidos pelos construtores de templos.

A jovem franziu a testa.

—Não consigo entender...

—Acontece que a maioria dos pórticos, desde a Grécia Antiga, segue o mesmo padrão — explicou-lhe, de maneira didática. — Sobre o umbral de entrada há um triângulo apoiado nas bases horizontais, sustentadas por várias colunas. Atualmente podem ser admirados nas edificações mais emblemáticas do mundo, do Vaticano à Casa Branca, passando pelo Partenon, de Atenas. É como se na memória coletiva dos arquitetos, passados e presentes, sobrevivesse a idéia de um templo original cuja estrutura seguisse a mesma diretriz... — mordeu a língua, por um instante, para continuar, enfático. — E o que você me diz das torres do campanário das catedrais? Por acaso não se assemelham aos obeliscos do Antigo Egito?

Cláudia teve de admitir que existia um certo paralelismo entre as linhas arquitetônicas daqueles edifícios e a descrição que conhecia do Templo de Enoque.

—É possível... — disse, finalmente, sem dar grande importância a isso. Hesitante, arqueou as sobrancelhas.

—Sem dúvida que sim! — reafirmou Leonardo. — Essas construções são um tributo às ciências do passado, que tornaram possível o milagre de Gizé.

—Se você continuar pensando nisso vai perder a concentração — ela o preveniu, inclinando a cabeça. — O melhor que pode fazer, agora, é recolher-se ao silêncio. Deixe que sua mente descanse... Detenha o pensamento, as reflexões internas.

—Foi isso que lhe ensinaram?

—É o mais aconselhável... — acrescentou, sucinta.

Pouco depois chegaram a uma sala retangular, de uns cinqüenta metros quadrados. À direita e à esquerda havia aberturas para dois corredores nos muros laterais. Ao aproximar-se, para averiguar, perceberam que em ambos havia degraus de pedra que desciam, perdendo-se na escuridão. Iluminaram seu interior com as lanternas. Vários metros abaixo aparecia uma trajetória semicircular, como se fosse uma escada em caracol.

Cláudia chamou a atenção de seu companheiro.

—Venha ver isso! — fez um gesto para que chegasse perto da parede frontal. — Existe algo escrito aqui.

O bibliotecário movimentou o foco de sua lanterna até o ponto assinalado por Cláudia. Leu um estranho verso, gravado na pedra:

"Animal, plantam, petram sum; tibi meae alae tutelam daraverunt”.

—O que significa? — ele perguntou.

—"Sou animal, vegetal e mineral; e sob minhas asas encontrarás proteção". É o código de entrada — ela respondeu, em tom confidencial. — Teremos de resolver a adivinhação da Sabedoria para saber qual o caminho a seguir.

—Suponho que deram a você algum tipo de referência ou instruções... — Cárdenas esperava que sua parceira lhe dissesse algo mais concreto.

A sobrinha de Riera, porém, apenas encolheu os ombros, negando repetidas vezes com a cabeça.

—Estamos ferrados! — exclamou Leonardo, ao descobrir que sua namorada sabia tanto quanto ele.

Então, aproximou-se de uma das entradas do subterrâneo. Levado pela intuição, olhou para cima, esperando encontrar algum sinal ou objeto, como acontecera na surpreendente cripta da catedral de Múrcia. Ali não havia nenhum sino, mas sim novas inscrições lavradas na pedra. Sobre o arco de entrada havia os símbolos planetários do Sol e de Vênus, com seus nomes escritos embaixo, em latim:"SOLIS-VENUS".

—Você notou? — inquiriu, pensativo. Depois, mostrou as marcas lavradas, com a luz da lanterna.

Cláudia inclinou o rosto, na tentativa de observar para compreender aquilo. E, em seguida, aproximou-se do corredor que havia justamente ali ao lado, jogando um facho de luz em direção à parte mais alta do frontispício. Viu outros dois petróglifos com suas respectivas epígrafes, nesse caso as da Lua e da Terra.

—É incrível... — sussurrou, antes de se virar.

Avançou com determinação até a parede frontal, voltando a iluminar as áreas superiores dos arcos. Ali estavam Mercúrio e Júpiter em uma; Marte e Saturno, em outra; eram os astros conhecidos na Idade Média, bem como os símbolos primordiais usados pelos antigos alquimistas.

—Aposto o que você quiser que estas inscrições escondem a resposta à adivinhação... — afirmou, com seriedade, para em seguida olhar Cárdenas, em busca de apoio.

—Deveríamos começar a estudá-los... não lhe parece? — ele propôs. Naquele instante, escutaram o eco distante de um disparo. Cláudia empalideceu, tão logo percebeu a detonação.

—Titio! — gritou, angustiada, indo até o túnel, em um ato de desespero, na tentativa de ajudá-lo.

Leonardo a segurou pelo antebraço, a tempo e com firmeza.

—É inútil. Você já não pode fazer mais nada por ele.

—Não sabemos se está morto! — respondeu, histérica, obcecada em sua determinação de ir à procura dele. — Pode estar ferido! É possível até que tenha sido um disparo de advertência!

—Ouça... — disse a ela, com suavidade. — Se regressarmos, nós obrigarão a conduzi-los até a Arca. Salvador sabia e por isso permaneceu ali, sacrificando-se enquanto cumprimos o que foi pactuado... — e, então, acrescentou com repentina veemência: — Somos sua única esperança! O segredo da câmara depende da deci¬são que tomarmos.

Cláudia se surpreendeu com o fato de que seu namorado e companheiro tivesse mudado de opinião. Achava que ele não se importava com os assuntos da loja, mas estava enganada, e isso fez com que raciocinasse a tempo. Leonardo tinha razão: deveriam encontrar a Sala do Trono antes que fosse tarde demais.

—O que você acha que devemos fazer? — perguntou, abatida.

—Diga você, desta vez... — estalou a língua, antes de continuar. — Riera disse algo a respeito de uma história que lhe contou há alguns anos e que tinha a ver com o fato de que nós nos encontraríamos. Você, e não eu, é que realmente deve conduzir esta aventura insólita em que estamos metidos até o último fio dos cabelos.

—É verdade... eu tinha esquecido.

—E então... pode me dizer do que se trata?

—De um lituano, chamado Leeds Kalnin, que viveu nos Estados Unidos entre os anos vinte e quarenta. Meu tio me contou a história várias vezes. Pelo visto, aquele homem, sem a ajuda de ninguém, esculpiu e movimentou mais de mil toneladas de pedra. Com o passar dos anos, criou um jardim de extraordinária beleza, ao qual deu o nome de "O Parque do Portão de Rocha".

—Por favor, me diga que é uma pista confiável!

Cláudia suspirou e não soube o que lhe dizer. A história do velho Kalnin não deixava de ser surpreendente, mas nada além disso. Se aquela era a única ajuda que iriam receber, estavam realmente perdidos.

—A verdade é que não sei... — respondeu com deprimente sinceridade.

—Está bem... comecemos de novo — propôs Leonardo, tratando de conservar a calma. —Vamos fazer o que Salvador nos recomendou. Usaremos o latim para a resposta e reorganizaremos o anagrama.

Sem perder mais tempo, tirou o caderninho de anotações do bolso da calça e começou a escrever os nomes dos planetas em uma folha de papel, tal como estavam inscritos:
MERCURIUS-IUPPITER

SOLIS-VENUS

MARTIS-SATURNI

LUNA-TERRA


—Deveríamos trocar as letras para ver se formam uma palavra ou frase coerente... — apresentou a ela essa proposta, sobre a qual havia refletido muito. — Seu tio nos indicou o caminho que deveríamos seguir. Decifrar o enigma só depende de nós.

—Temos pouco tempo — ela recordou, em tom desanimado. — É possível que tenham descoberto o corredor secreto.

Ao dizer isso, ela se referia a Lilith e companhia.

—Muito bem! Então, mãos à obra.

Mal acabou de dizer, Cárdenas voltou a escrever os nomes dos astros em outra folha de papel. Assim, poderiam fazer tentativas separadamente, cada um por si. Passados alguns tensos minutos e apesar do intenso esforço mental que faziam para combinar as palavras, perceberam que era impossível chegar a uma resposta. A pressão a que estavam sendo submetidos paralisava seus pensamentos, pois sabiam que de um momento para o outro poderiam entrar na sala e assassiná-los impunemente. A impotência bloqueava sua capacidade de reflexão e os impedia de pensar com clareza.

—Sou animal, vegetal e mineral; sob minhas asas encontrarás proteção — Leonardo murmurava em voz baixa, procurando encontrar a solução na própria charada.

A jovem, por sua vez, descobriu um detalhe que não se enquadrava: Saturno estava escrito errado. Não era Saturni, mas sim Saturnus. Pensava dizer isso ao companheiro quando recordou determinada parte da história do lituano, sobre a qual havia passado por alto, e tratava-se precisamente da que tinha a ver com os planetas. Parece que existia um lugar, no tal Parque do Portão da Rocha, denominado "O Salão do Trono", ladeado pelas esculturas simbólicas de Marte e Saturno. Seria uma coincidência sem maior importância ou, talvez, uma resposta à adivinhação?

—Leo, vamos nos concentrar em Marte e Saturno. Tenho um pressentimento... — disse Cláudia, com voz trêmula, embargada pela emoção da descoberta.

Começaram com a palavra MARTIS, a qual desmembraram em letras independentes, fazendo-as girar de um lado para outro, trocando-as como se fossem peças de um quebra-cabeças. E foi aí que conseguiram ordenar a primeira parte do anagrama: MARTIS se converteu em MATRIS, ou seja, Mãe.

—Deus do céu! Conseguimos! — exclamou o bibliotecário, eufórico, mas com as mãos suadas pela tensão interior. — Já podemos ir embora. Se o fizermos antes que eles cheguem, teremos três chances, em quatro de que se enganem de caminho ao seguir-nos.

—Você não tem curiosidade de saber qual é a resposta final à adivinhação? — ela perguntou, arisca. — Pense na possibilidade de que venhamos a precisar disso no futuro.

—Não há necessidade, eu já sei... — pegou sua mão e a conduziu, com suavidade, obrigando-a a seguir até a entrada onde havia os sinais de Marte e Saturno sobre o arco. Vou lhe contar no caminho.

Cláudia se deixou levar pela exaltação do companheiro, descendo pelos degraus de pedra o mais rápido que pôde. Depois de girar várias vezes pela galeria descendente e de assegurar que não era possível ouvir as vozes de seus perseguidores nem vislumbrar a luz de suas lanternas, sentiu necessidade de lhe perguntar:

—E então, de uma vez por todas, você quer me dizer qual é a resposta à charada? — ela parou e fez uma expressão grave, explícita pelo franzir do espaço entre as sobrancelhas.

Leonardo saboreou com deleite seu momento de glória.

—Pense um pouco... — disse, auto-suficiente. — Ela é animal, vegetal e mineral, e sob suas asas buscamos proteção... — limpou a voz. — Ela cuida de nós, nos alimenta e nos dá a vida, como uma mãe. Portanto, MARTIS SATURNI não é outra coisa senão MATRIS NATURIS, ou seja, a Mãe da Natureza... a mais bela analogia da Sabedoria, de todas que já ouvi!


Quando as duas chegaram ao corredor das quatro portas, Cláudia e Leonardo já haviam desaparecido.

"Este lugar é extremamente inóspito, mas também maravilhosamente enigmático", pensou Cristina, ao avaliar a sala onde se encontravam.

Para Lilith, ao contrário, pouco importava a descoberta de novas galerias sob o planalto de Gizé. Preferiria, mesmo, ter se encontrado cara a cara com o bibliotecário e o resto dos maçons para lhes arrancar, depois de um brutal interrogatório, o caminho que teria de seguir para encontrar a Arca.

Agora em vez disso teria que enfrentar a decisão de escolher um dos corredores descendentes, com um detalhe: poderia se equivocar. Era um contratempo inquietante e que estava fora de seus planos. Em vez de inclinar-se por uma das quatro entradas, deixou que a especialista averiguasse qual poderia ser a mais correta.

—Você! — desafiou acremente Cristina, apontando a arma para sua cabeça. — Diga-me qual é o caminho que temos de seguir.

O rosto pálido e sardento da doutora se tornou ainda mais branco. Compreendeu que era sua vez. Tinha de jogar suas cartas muito bem, se não quisesse perder a vida na primeira tentativa.

—Se você me matar, nunca saberá — preveniu-a, com voz baixa. — Mas se tiver paciência, eu a levarei até o lugar onde se esconde a Arca.... — engoliu em seco, para continuar — ...consegue ver essas inscrições sobre as diversas entradas...? — foi mostrando uma a uma, com a lanterna. — Creio que fazem parte de um código secreto, que, por sua vez, está ligado a essa outra frase... iluminou o fundo da galeria, onde estavam inscritas umas palavras em latim.

—O que está escrito aí? — Lilith quis saber.

—"Sou animal, vegetal e mineral e sob minhas asas encontrarás proteção."

—E que diabos significa isso?

—Hummm, creio que já li essa frase antes... com certeza! — comentou, concentrada. — Talvez tenha sido em um velho livro de alquimia.

—É melhor que se lembre! — a assassina de aluguel começava a ficar nervosa.

—Espere, já sei! — eufórica, a criptógrafa estalou os dedos. — Nicolas Valois, um praticante de necromancia do Renascimento, falando sobre a pedra filosofal, disse: "Há uma pedra de grande virtude e é chamada de pedra e não é pedra, e é mineral, vegetal e animal."

—Continue... estou ouvindo.

Cristina se esqueceu de Lilith por um instante. Foi de um lado a outro da sala, iluminando e lendo, um por um, os nomes dos planetas inscritos nos umbrais de entrada. De vez em quando se detinha para refletir, mas só por uns segundos. Finalmente, aproximou-se do corredor cujos petróglifos pertenciam aos planetas Mercúrio e Júpiter.

—É este, tenho certeza! — Levantou o queixo, sem esconder seu orgulho, ao dirigir-se à fria ceifadora de vidas, pois precisava julgar por si mesma.

—Antes você tem de me explicar no que se baseou para fazer essa escolha. Não estou disposta a arriscar.

—O mercúrio, segundo os alquimistas medievais, é o principal ingrediente da pedra filosofal — disse, em tom contido. — E se é correto que os demais planetas também fazem parte do glossário alquímico, Mercúrio é o único que tem asas, embora seja nos pés. Portanto, a entrada de Mercúrio e Júpiter é a melhor opção... — mordiscou ligeiramente o lábio superior e perguntou — ...você não acha?

Lilith teve de aceitar essa reflexão, pois o detalhe das asas era decisivo. Rendeu-se diante da competência da criptografia. Seu talento era digno de admiração. Depois, deixando-se levar pela determinação de Cristina, fez um gesto indicando que ela deveria descer na frente. Não se tratava, porém, em absoluto, de um ato de deferência: continuava apontando a arma para a moça.


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