Te entrega, corisco!: Passes e linhas de fuga para um forró NÃo agenciado



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TE ENTREGA, CORISCO!: PASSES E LINHAS DE FUGA PARA UM FORRÓ NÃO AGENCIADO
O forró está na crista da onda da juventude surfista, ou melhor, de toda a classe média. Casas de show com nomes americanizados – The Ballroom, ATL Hall etc – abrigam “espetáculos” de bandas desprovidas de dendê, carne de sol, pirão de peixe com pimenta e tudo mais de arretado; não nos esqueçamos que um dos quiosques da Lagoa Rodrigo de Freitas tem esse nome, “Arretado”. Com uma fala mansa, trilhões de trios insanos e desenraizados de Sanas e de pés de serras colorem os finais de semana de toda a boemia da Zona Sul. Tal é a conjuntura da moda noturna - não só carioca, mas do Brasil. E tem mais: a temática do Nordeste espetáculo abraça a mídia – ou será ao contrário? – e em clima de oba-oba generalizado aparecem filmes como “Dois mil nordestes”, um pseudo documentário com um clima misto de clip MTV com Globo Repórter. Os passes da dança são rápidos, tanto quanto os cortes do filme em sua abordagem imediatista e cômica; não há vivência, contudo dizeres recortados freneticamente com uma peixeira eletrônica.

Essa vertente estética trabalha em cima da automatização da percepção, agradando aos gostos médios. Não se trata, amigo ouvinte/ internauta, de elitismo, da arte aristocrática para poucos. É de muita validade o crescente reconhecimento popular de medalhões como Zé Ramalho, Sá & Guarabyra – agora novamente com o companheiro Zé Rodrix –, Alceu Valença e Moraes Moreira. O que acontece – ou o que não acontece, neste caso – é que pensa-se na estética, na música, e não em seu objeto histórico. Que surjam novos músicos preocupados com a arte de seu povo; que partituras e escalas mixolídias desmascarem o sofrimento desse povo, que levem o artista até ele, bem de perto – longe de Ballrooms da vida; não sufoquemos investidas culturais aprioristicamente, pelo simples fato de brotarem do farto seio burguês. Parece-me que a indústria do entretenimento se apossou com unhas e dentes dessa genuína forma de expressão popular, aproveitando-se do fato de que o reagge – ritmo caribenho muito difundido em nossa juventude – tem estrutura rítmica muito próxima ao forró. Tal semelhança não constitui elogio algum, uma vez que os adeptos dogmáticos da tribo de Bob Marley não cessam de fumar maconha e ficam detidos nessa pretensa liberdade. Esse aspecto meramente hedonista foi transposto ao forró, como elemento dessa geração; passado Maio de 68 e o frison de "Eros e Civilização", de Marcuse, Foucault - em "História da Sexualidade" -, Deleuze e outros pensadores pós-estruturalistas encarregaram-se de denunciar o agenciamento de forças, realizado pelo lógica do poder hegemônico. O caráter libertário e revolucionário da trilogia "sexo, drogas e rock n' roll" foi rapidamente levado para as engrenagens do processo de reprodução do capital. O sistema conta com a rebeldia, e faz dela sua garota propaganda; a ele não interessa segregar, mas juntar forças de trabalho e evitar a qualquer custo a construção de linhas de fuga, de um espaço fora de suas ambições. Em outras palavras, o capital visa acabar com a diferença. É, meu povo, rapadura é doce, mas não é mole não, ou, como diria Godard, “a realidade é muito complexa”. O forró deve dobrar-se sobre si, constituir-se como "metamorfose ambulante", para que não seja rotulado de "sociedade alternativa".



Tanto no cinema quanto na música, temos bons exemplos de reunião entre formas estéticas e suas vivências. Os figurões anteriormente citados, por um lado, e Glauber Rocha e o cinema novo por outro, foram capazes de construir uma perfeita imagem - dialética estática, no sentido que atribuiu Walter Benjamin – de uma cultura antropofágica e independente de trajes mercantilistas. Tomemos como paradigma o último pranto do cangaceiro Corisco, interpretado por Othon Bastos no monumental “Deus e o Diabo na terra do sol”, de Glauber: “Mais forte são os poderes do povo!”. Quem sabe assim possamos acreditar que o sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão, pois Corisco não se entrega não, só se entrega pra morte, com parabelo na mão.
Chatê Blackmore de Éfeso,

Forrozeiro de ocasião e

Sociólogo de plantão
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