Um amor conquistado Sinopse



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O narcisismo
O narcisismo vem, felizmente, contrabalançar a tendência masoquista. Ele se liga à fase infantil da formação do ego, durante a qual a libido toma o ego por objeto, isto é, quando a criança se ama a si mesma. Progressivamente, esse amor por si mesma se transforma, na menina, em desejo de ser amada. Para compreender a intensidade particular do narcisismo feminino, é preciso lembrar que ele tem uma função duplamente compensatória. De um lado, compensa a humilhação de sua inferioridade genital.28 De outro, limita sua tendência masoquista, que a leva a fins perigosos para o seu ego. Graças ao narcisismo, o ego se defende e reforça sua segurança, intensificando o seu amor por si mesmo. Pois uma mulher normal não pode prescindir da tendência masoquista. Esta é necessária para a superação das principais etapas de sua vida: o ato sexual, o parto, a maternidade, etapas da reprodução estreitamente ligadas ao sofrimento.

Essa teoria do masoquismo feminino serve de justificativa a posteriori para a aceitação de todas as dores e todos os sacrifícios. Se a mulher é naturalmente feita para sofrer e, ademais, gosta desse sofrimento, não há mais razão para constrangimento a esse respeito. Teoria que é, neste aspecto, bem mais perigosa do que a teologia judaico-cristã. Esta diz que a mulher deve sofrer para expiar o pecado original. A maldição tinha uma razão moral, e a dor física era o preço a pagar por seu erro. Pelo menos não se lhe pedia que gostasse disso.



Nota de rodapé:

28 Essa hipótese explicaria também porque a maternidade reduziria a tendência narcísica. Sentido-se aliviada, pela posse do filho, da sua inferioridade anterior, a mulher pode então consagrar ao filho sua capacidade de amar.

Fim da nota de rodapé.

307


Na teoria freudiana, a maldição é biológica: uma insuficiência de órgão, a falta de pênis, é a causa de sua infelicidade. Mas Freud ou H. Deutsch parecem dizer: "Vejam como a natureza faz bem as coisas, ela deu à mulher a possibilidade de encontrar o prazer na dor!" A mulher normal gosta de sofrer. Aquela que não gosta e se revolta contra sua condição não tem outras soluções que cair na homossexualidade ou na neurose. Eis, portanto, o círculo bem fechado: recusando-se a assumir sua verdadeira natureza, masoquista, a mulher se tornará realmente infeliz! Durante mais de trinta anos, não se soube o que responder a isso...
A BOA MÃE
Com essa imagem da mulher normal, era fácil deduzir em seguida a da boa mãe. H. Deutsch a define como "a mulher feminina" constituída pela interação harmoniosa das tendências narcísicas e a aptidão masoquista a suportar o sofrimento. O desejo narcísico de ser amada metamorfoseia-se na mulher maternal por uma transferência do ego para o filho, que é apenas o substituto do ego. Quanto aos componentes masoquistas do espírito materno, eles se manifestam principalmente na aptidão da mãe ao sacrifício de si,29 na sua aquiescência ao sofrimento para o bem de seu filho, finalmente, no abandono da dependência deste, quando a hora de sua libertação é chegada.

A aptidão da mãe a aceitar o sofrimento é compensada pelas "alegrias da maternidade", que freiam suas tendências masoquistas espontâneas. Mas desgraçadas as que ignoram essas tendências, pois "cada vez que o masoquismo feminino, com sua aptidão ativo-maternal ao sacrifício, não atua, a alma da mulher pode ser vítima de um masoquismo mais cruel, proveniente do sentimento de culpa".30



Notas de rodapé:

29 Mas, ao inverso da mulher feminina não mãe, sem exigir nenhuma contrapartida do objeto amado.

30 Psychologie des femmes, II, p. 45.

Fim das notas de rodapé.

308


Mais uma vez, a infelicidade espreita aquelas que não querem sofrer. Mas essas mulheres não deveriam ser senão exceções infelizes, visto que H. Deutsch afirma a existência de um instinto materno, cujas formas primitivas teriam sido químicas e biológicas. Rendamos homenagem à sabedoria da natureza, que agiu de modo que o amor da mulher pelo filho fosse "normalmente maior do que seu amor por si mesma".31

Com base nessas considerações, podemos proceder à descrição das atitudes e da vivência da boa mãe, aquela que o psicanalista-pediatra Winnicott qualificava de "normalmente devotada".32 A primeira condição de uma boa maternagem reside na capacidade de adaptação às necessidades do filho, isto é, no prolongamento no plano psicológico, durante várias semanas após o seu nascimento, da relação biológica intra-uterina.33 Winnicott consagrou um artigo à descrição desse sentimento, "a preocupação materna primária",34 que surge com a gravidez e dura algumas semanas após o parto. Ele poria a mãe num estado de retraimento e de dissociação próximo do estado esquizóide. Mas esse sentimento de hipersensibilidade materna é uma doença boa, que permite à "mãe normal" adaptar-se às primeiras necessidades do filho com delicadeza e sensibilidade. A mãe "normalmente devotada" define-se portanto, em primeiro lugar, pela sua capacidade de se preocupar com o filho, excluindo qualquer outro interesse. É porque ela pode se colocar no lugar de seu bebê que este se desenvolve harmoniosamente, sem ser demasiado perturbado por privações de todo gênero.



Notas de rodapé:

31 Ibid., p. 43.

32 D.W. Winnicott, L'enfant et sa famille, Payot, p. 11.

33 H. Deutsch (op. cit., p. 231) descreve essa espécie de simbiose entre a mãe e o filho como "um cordão umbilical psíquico", vínculo emocional que substitui o cordão umbilical fisiológico tão logo ele é cortado.

34 Artigo publicado em 1956, in De Ia pêdiatrie à la psychanalyse, Payot, p. 168.

Fim das notas de rodapé.

309


Se ela não consegue fazê-lo,35 suas carências provocam fases de reações aos choques que interrompem o bom desenvolvimento da criança. Na pior das hipóteses, esse tipo de mãe "pode estar na origem de uma criança autista".36

Sabemos que, várias vezes, Freud se eximiu de dar conselhos aos pais, argumentando que toda educação resultava num fracasso. Depois da guerra, vários de seus discípulos esqueceram a advertência, passando do descritivo ao normativo. Houve psicanalistas que se tornaram célebres traçando o retrato da boa mãe e dando conselhos às mulheres em livros escritos especialmente para elas, ou nos veículos de comunicação de grande difusão.37 O sucesso desses primeiros vulgarizadores da psicanálise atestou ao mesmo tempo a desorientação dessas mães e a crença num ideal, que desmentem ambos a idéia de uma atitude materna instintivamente boa. Todos os gestos da mãe foram objeto de recomendações.


O aleitamento
O aleitamento ao seio é a primeira prova de amor da mãe pelo filho, pois engendra grandes sentimentos de prazer, físicos e espirituais. O aleitamento mais satisfatório, segundo Winni-cott, é o qualificado de "natural", dado quando a criança o deseja. "Essa é a base." Enquanto o bebê não encontra um ritmo regular, o método mais rápido para evitar-lhe o sofrimento é que "a mãe o alimente quando ele quiser, durante um novo período, voltando a horas regulares que lhe convenham quando o bebê se torna capaz de suportar isso".38

Notas de rodapé:

35 Winnicott, op. cit., p. 171: "Para uma mulher que faz uma forte identificação masculina, essa parte de sua função materna pode ser especialmente difícil de realizar, pois o desejo reprimido do pênis deixa pouco espaço para a preocupação materna primária."

36 Id. Ibid., p. 171.

37 Ver principalmente os doutores Spock, Dolto na France-Inter, e Winnicott na BBC.

38 Winnicott, Venfant et sa famille, p. 33.

Fim das notas de rodapé.

310


O que Winnicott esquece de dizer, é que tal aleitamento sem regras nem horas fixas pode durar vários meses. Como um desmame progressivo não está previsto para antes de cerca de nove meses, não podemos deixar de pensar, com preocupação, em todas as mulheres que voltam ao trabalho logo depois do p..arto. E como essas afirmações foram feitas pelas antenas da BBC, podemos imaginar o sentimento de culpa experimentado pelas ouvintes que não se reconheciam nesse retrato da boa mãe.39 Ora, essa imagem era a mais comumente conservada pelo conjunto dos grandes psicanalistas do após-guerra. Hélène Deutsch,40 mas também Mélanie Klein, exaltaram o aleitamento natural e o devotamento materno. A tal ponto que a segunda julgou-se no direito de afirmar que se "a experiência mostra que crianças que não foram amamentadas no seio se desenvolvem com freqüência muito bem (...) na psicanálise sempre se descobrirá, entre as pessoas que foram criadas assim, um desejo profundo do seio que nunca foi satisfeito... Podemos dizer que, de um modo ou de outro, seu desenvolvimento teria sido diferente e melhor se tivesse sido beneficiado por um aleitamento bem-sucedido. Por outro lado, minha experiência me faz concluir que as crianças cujo desenvolvimento apresenta problemas, embora tenham sido amamentadas ao seio, estariam ainda pior sem isso".41 Palavras cruéis para todas aquelas, numerosas após a guerra, que não amamentavam os filhos ao seio. Palavras ainda menos contestadas na medida em que o prestígio da psicanálise estava em seu apogeu e em que ninguém pensou em exigir provas de Mélanie Klein.

39 Id. Ibid., p. 93.

40 Op. cit., II, p. 248.

41 Texto citado em Uamour et la haine, Payot, p. 78-79 (nota 1) (grifos nossos).

311


O devotamento... ainda
A mãe "normalmente devotada" mostrou-se ser a mãe "não apressada",42 atenta a todas as necessidades do filho, aquela que dele se ocupa inteiramente. A mãe "normalmente" devotada é portanto, na realidade, a mãe "absolutamente" devotada. E nem esse devotamento é suficiente à boa maternagem. Para que a relação entre a mãe e o filho seja realmente bem-sucedida, é indispensável que ela encontre prazer nela. Sem o que "tudo é morto, sem utilidade e mecânico".43 É por isso que Winnicott exorta as mães a se alegrarem com sua situação. "Começamos agora a compreender até que ponto o recém-nascido tem necessidade absoluta do amor de sua mãe. A saúde do adulto forma-se durante toda a infância, mas as funções dessa saúde, são as mães que as estabelecem durante as primeiras semanas e os primeiros meses da existência de seu filho.. Alegrem-se de que tal importância lhes seja concedida. Alegrem-se de deixar a outros o cuidado de conduzir o mundo, enquanto põem no mundo um novo membro da sociedade.. Alegrem-se com as preocupações que lhes traz o bebê,44 cujo choro e os gritos o impedem de aceitar o leite que desejam dispensar com generosidade. Alegrem-se com todos os tipos de sentimentos femininos que não podem sequer começar a explicar a um homem.. Além disso, o prazer que podem obter desse trabalho que suja, que os cuidados com o bebê constituem, tem para ele uma importância vital."45

Para justificar os sacrifícios exigidos à mãe, Winnicott acrescenta: "Sabe ela que quando age dessa maneira estabelece os fundamentos da saúde mental de seu filho — e que este não pode chegar à integridade dessa saúde mental se não tiver tido, no início, exatamente esse tipo de experiência, que tanto lhe custa proporcionar?"46



Notas de rodapé:

42 Winnicott, op. cit., p. 46.

43 Winnicott, op. cit., p. 25.

44 Os mesmos argumentos dos moralistas do século XVIII.

45 Winnicott, op. cit., p. 25 (grifo nosso).

46 Id. Ibid., p. 142.

Fim das notas de rodapé:

312


Será possível dizer melhor a imensa responsabilidade que pesa sobre a mãe? E como não observar a perfeita continuidade que une esse discurso aos discursos do século XVIII? Com Winnicott e seus seguidores, chegamos ao auge das responsabilidades maternas, e, em contrapartida, também a um sentimento difuso de culpa. Pois, à menor dificuldade psicológica da criança, como poderia uma mãe deixar de se sentir responsável e portanto culpada? Terá ela jamais dado o bastante de si mesma? Terá encontrado sempre prazer na dedicação à criança? Numa palavra, terá sido suficientemente masoquista, como toda mulher normal deve ser? E outras tantas perguntas que ela não pode deixar de se fazer, se for leitora das revistas femininas e ouvir rádio.
A mãe mâ
A representação negativa da mãe má reforçou o sentimento de culpa das mulheres. Hélène Deutsch lembra as "aberrações" a que pode dar lugar o relaxamento dos impulsos maternos instintivos: "como esse sistema que consiste em se desfazer da criança durante o seu primeiro ano de vida, confian-do-a a uma ama-de-leite mercenária (costume adotado pelas classes médias da França durante dois séculos)... ou aquele, quase igualmente lamentável, de proteger os seios da mãe contratando uma ama-de-leite, ou dando à criança um aleitamento artificial.. ".47 Winnicott vai mais longe, lembrando a cegueira daqueles que negam a importância da mãe no início da vida da criança, e afirmam que uma boa ama poderá desempenhar o seu papel. "Encontramos até mães (não neste país, espero!) a quem se diz que devem maternar seu bebê, o que representa a mais completa negação do fato de que a..maternagem' decorre naturalmente do fato de ser mãe."48

Notas de rodapé:

47 H. Deutsch, op. cit., II, p. 9-10.

48 Winnicott, op. cit., p. 206 (grifo nosso).

Fim das notas de rodapé.

313


Quis-se, portanto, ignorar que nem todas as mulheres são espontaneamente maternais. Postulando que a maternidade engendra naturalmente o amor e o devotamento à criança, era-se obrigado a considerar as "aberrações" como exceções patológicas à norma.

Hélène Deutsch voltou-se para o caso da mãe má e procurou explicar seu comportamento invertendo as características da boa mãe. Partindo da idéia de que "a expressão mais elevada do amor materno só é atingida quando todos os desejos masculinos (desejo de pênis) foram abandonados ou sublimados", ela deduz que as mulheres que ainda sentiam esses desejos experimentavam conflitos interiores pouco propícios à boa maternagem. Como o amor materno só se desenvolve a expen-sas do amor- de si, ele empobrece forçosamente o ego da mãe. Ora, em certas mães, o ego luta para se expressar e se satisfazer, e essa tendência "egoísta" entra em conflito com aquela que visa à conservação do cordão umbilical com a criança. Mais suas tendências viris permanecem vivas, mais resolutamente o seu ego poderá rejeitar as tarefas da maternidade.49

H. Deutsch observa que o aleitamento artificial, em moda depois da guerra, representava uma contemporização, visando a conciliar os interesses pessoais da mulher e os da mãe. Mas acrescentou, muito justamente, que esse meio-termo acentuou o conflito. Isso porque, de um lado, ofereciam-se às mulheres oportunidades cada vez maiores de desenvolver seu ego fora da função reprodutiva, ao mesmo tempo em que se exaltava cada vez mais a ideologia da maternidade ativa.'
A NECESSÁRIA DISTINÇÃO DOS PAPÉIS
O mal-estar de certas mulheres foi tornado ainda mais agudo pela teoria psicanalítica da distinção necessária entre os papéis materno e paterno.

Nota de rodapé:

49 Quanto maiores forem as suas ambições pessoais (assimiladas a desejos viris), menos ela parece apta a cumprir seus deveres de boa mãe.

Fim da nota de rodapé.

314


Enquanto um número crescente de mulheres buscava desenvolver igualmente todos os aspectos de sua personalidade, entre eles os tradicionalmente classificados de ativos e viris, enquanto elas reclamavam a divisão das tarefas com os homens, a psicanálise nunca deixou de afirmar a heterogeneidade das funções paterna e materna. Nesse ponto específico, o essencial de suas proposições não variou muito desde a sua origem,mesmo que aqui e ali observemos modificações de vocabulário. Aos olhos de Freud e de seus sucessores, a mãe simboliza antes de tudo o amor e a ternura, e o pai, a lei e a autoridade. Mas, se não se cessou de falar sobre o devo-tamento materno, pouco se mencionou o papel cotidiano do pai. Era uma verdade inconteste que a mãe desempenhava o papel essencial junto ao filho durante os primeiros meses, ou até durante os primeiros anos de sua vida.
A função paterna
Em suas conferências na BBC, Winnicott, procurando definir o "bom pai" do bebê, expôs a mais tradicional concepção da paternidade. Eis as oito idéias principais que demarcam suas palavras:
A mãe é responsável pela boa paternidade do marido.
Ela aparece como a intermediária necessária entre ele e o filho. "Depende da mãe que o pai venha ou não a conhecer o seu bebê."50 Cabe-lhe "mandar o pai e o filho passearem juntos, de vez em quando.."." E Winnicott conclui: "Não depende da mãe que o relacionamento entre eles seja rico.. mas depende dela tornar esse relacionamento possível, não perturbá-lo ou estragá-lo."52

Notas de rodapé:

50 Winnicott, op. cit., p. 117.

51 Id. Ibid., p. 123.

52 Id. Ibid., p. 124.

Fim das notas de rodapé.

315


A presença paterna não pode ser senão episódica.
"Há razões de todos os tipos pelas quais é difícil que um pai participe da educação de seus filhos. Pode acontecer, em primeiro lugar, que ele raramente esteja em casa quando o bebê está acordado. Muito freqüentemente, porém, mesmo quando está em casa,..a mãe tem alguma dificuldade em saber quando recorrer ao marido e quando desejar afastá-lo'."53 Para apoiar a autoridade da mãe, "o pai não precisa estar todo o tempo presente, mas ele se deve mostrar com a freqüência suficiente para que o filho experimente o sentimento de que ele é real e está vivo".54 Winnicott admite a idéia de que certos pais não se interessam nunca pelo seu bebê.55 A contingência do amor paterno é claramente reforçada pela seguinte reflexão: "não obstante, se o pai está presente e deseja conhecer seu filho, a criança tem sorte..."..
Os pais não podem substituir as mães.
"Não se pode afirmar a conveniência de o pai aparecer cedo em cena em todos os casos.. Certos maridos experimentam o sentimento de que seriam melhores mães do que sua mulher, e podem se mostrar muito aborrecidos.. Pode haver também pais que seriam realmente melhores mães do que a sua mulher. Apesar disso, eles não podem ser mães."57 Winnicott não justifica esta última afirmativa, porque não é preciso dizer que o homem não tem seios e que o aleitamento artificial não pode substituir a amamentação natural...
O bebê prefere a mãe.
"O bebê conhece em primeiro lugar a sua mãe. Cedo ou tarde, algumas de suas qualidades são reconhecidas pelo bebê, e algumas delas estão sempre associadas à mãe:

Notas de rodapé:

53. Ibid., p. 117.

54 Id. Ibid., p. 119.

55 Id. Ibid., p. 117-118.

56 Id. Ibid., p. 120 (grifo nosso).

57 Id. Ibid., p. 118 (grifo nosso).

Fim das notas de rodapé.

316


a doçura, o carinho.. De tempo em tempo, a criança odiará alguém e se o pai não estiver lá para lhe dizer onde se fixar, ela detestará a mãe, o que engendrará nela a confusão porque, fundamentalmente, é a mãe que ela mais ama."58

Por que "fundamentalmente"? Não será, sobretudo, porque a conhece em primeiro lugar? ....,


O pai é o escoadouro do ódio da criança.
"É muito mais fácil que os filhos tenham pai e mãe. Um deles pode continuar a ser sentido como objeto de amor enquanto o outro é detestado; isso tem, em si, uma influência equili-bradora."59 Em virtude da proposição precedente, é o pai que poderá ser detestado sem grandes danos...

A primeira virtude positiva do pai: permitir à esposa ser "boa mãe". "O pai é necessário à casa para ajudar a mãe a se sentir bem de corpo e feliz de espírito."60

O pai encarna, aos olhos do filho, a lei, o vigor, o ideal e o mundo exterior, enquanto a mãe simboliza a casa.. e a família. "Como todos sabem, papai vai de manhã para o trabalho enquanto mamãe cuida da casa e das crianças. O trabalho de casa é algo que as crianças conhecem facilmente, pois é sempre realizado à sua volta. O trabalho do pai, para não falarmos de suas outras atividades, quando não trabalha, amplia a visão que a criança tem do mundo."61

Winnicott não pode imaginar que um pai descasque legumes enquanto a mãe vai para o escritório ou para a oficina!



Notas de rodapé:

58Id. Ibid., p. 118 e 120 (grifo nosso).

59 Id. Ibid., p. 120.

60 Ibid., p. 119.

61 Id. Ibid., p. 121.

Fim das notas de rodapé.

317


Pois todas as suas proposições baseiam-se numa distinção radical de papéis, fundamentada ela mesma na necessidade do aleitamento materno, que o pai não pode proporcionar ao bebê. Também neste caso, a diferença anatômica (é a mãe quem tem..) justifica a diferença entre o destino materno e o paterno.

Lendo os textos de Winnicott, logo nos persuadimos da menor importância do pai na vida da criança; sobretudo quando ele conclui que a única coisa que se pode exigir do pai, com proveito, é "estar vivo e continuar vivo durante os primeiros anos dos filhos".62 Não se pode dizer que seja uma exigência exorbitante!


O pai simbólico
Mais recentemente, alguns psicanalistas repensaram a questão do pai, dissociando o pai simbólico do pai em carne e osso. Quer se trate de J. Lacan ou de F. Dolto, cada um restituiu, à sua-maneira, uma importância "fundamental" àquele que se tendera a minimizar nestes últimos decênios. Observou-se que mesmo que sua função estivesse reduzida, sua função simbólica não era menos essencial.

O pai continua sendo, em primeiro lugar, o transmissor da filiação nominal.63 É graças ao seu patronímico que a criança se pode inserir no grupo social e tentar resolver a angustiante questão das origens. Além disso, Jacques Lacan insistiu longamente na importância do "nome-do-pai", significante que vem representar, no inconsciente da criança, o pai simbólico, apoio da lei. Ora, nenhum humano pode prescindir desse elemento fundador da ordem simbólica sem graves danos. Quando o nome-do-pai é excluído, a psicose se desencadeia na criança, que não consegue se erigir em sujeito: sujeito do discurso e sujeito social.



Notas de rodapé:

62 Id. Ibid., p. 121.

63 Em nossas sociedades patrilineares.

Fim das notas de rodapé.

318


Para compreender toda a importância do pai, símbolo da lei e da interdição (e prioritariamente da proibição do incesto), é preciso lembrar que a díade originária mãe/filho pode se tornar patogênica, passado um certo período. Pois, se a relação de dependência absoluta da mãe é uma necessidade biológica no início da vida do bebê, seu prolongamento indevido é um obstáculo ao desenvolvimento da criança. Com efeito, saciando as necessidades de seu bebê, a mãe entra com ele numa relação de desejo e a criança busca satisfazer esse desejo inconsciente da sua mãe. Se, por alguma razão, a mãe superou mal, quando criança, a fase pré-edipiana, ela pode ter tendência a considerar seu filho como um substituto sexual, ou "seu objeto fantasmático". Com isso, ela impede o seu desenvolvimento, que deve necessariamente passar pela fase edipiana. A criança, presa no mundo materno, não consegue mais sair dessa relação sufocante, devoradora, e tomar consciência de si mesma como sujeito sexuado e independente. Se o desejo incestuoso não encontra nenhuma lei que se lhe oponha, a angústia domina a criança, que não encontra seu lugar no mundo.

Quer a mãe seja patogênica ou não, o pai deve interferir, quando chega o momento, no par mãe/filho. É ele quem os deve separar e substituir a díade original pela relação triangular que é a única propriamente humana. Por sua presença, freqüentemente mais simbólica do que efetiva, ele deve fazer compreender à criança que a mãe lhe é proibida porque pertence a um outro, e que, para superar a angústia de castração, ela deve se resignar à renúncia do desejo incestuoso. É só quando interioriza a lei paterna que a criança pode ter um "eu" autônomo e se experimentar como um sujeito independente, capaz de enfrentar o mundo exterior.

A importância atribuída ao pai simbólico é tamanha que com demasiada freqüência se esquece de evocar concretamente o pai em carne e osso. Pierre David lembra a intriga edificante de uma comédia de sucesso, Les enfants d'Edouard. O autor, M.G. Sauvajon, mostrava uma brilhante literata, mãe de três

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filhos, em cujo salão o retrato de Edouard, o pai desaparecido, ocupava o lugar de honra. Logo filhos e espectadores ficarão sabendo que o querido Edouard jamais existira, não passando de um mito criado pela mãe para esconder o fato de que cada um de seus filhos tinha um pai diferente. Como o observa o doutor David, a mãe conseguiu educar os filhos fazendo ocupar o lugar do pai real, não só um personagem fictício, mas uma imagem de pai (a foto). Pierre David comenta: "Evidentemente, trata-se de uma peça de teatro! Mas, na realidade contemporânea, quantas famílias só resistem porque, numa ou em várias gerações, mulheres se revezam para apoiar uma linhagem de homens que já não se sustem senão sobre um nome, uma fachada, aparências?64
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