E. P. Sanders Tudo o que se pode, corrigir histórico, saber sobre Jesus



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CAPA

A Verdadeira História de Jesus

E. P. Sanders
Tudo o que se pode, corrigir histórico, saber sobre Jesus

Noticias editorial


PAGINAÇÃO: Rodapé e nº de páginas 366

Esta obra foi digitalizada e corrigida pelo Serviço de Leitura Especial da Biblioteca Municipal de Viana do Castelo. Destina-se unicamente a pessoas com necessidades especiais e não tem fins comerciais.

Contactos do Serviço de Leitura Especial:

Tel.: 258 840 010

e-mail: leituraespecial@cm-viana-castelo.pt
BADANA DA CAPA

JESUS CRISTO. Está na base da maior religião mundial: dois mil milhões de seres humanos reclama-se hoje da fé nele e dizem-se cristãos. A sua figura foi de tal modo determinante que a Historia se divide em antes e depois de Cristo. Durante dois mil anos, em seu nome ergueu-se o que se chama a Igreja, construíram-se catedrais e hospícios, proclamou-se a dignidade infinita de ser Homem e também se instruiu a Inquisição, veio ao mundo amor e sofrimento. Ninguém tem dúvidas de que sem ele a Historia seria diferente.

No entanto, viveu num canto remoto do Imperio Romano, a sua intervenção pública pode não ter chegado aos dois anos, foi condenado à cruz – a execução própria dos escravos -, como blasfemo religioso e subversivo social e politico. Aparentemente, deveria ter sido o fim. O que se passou para que, precisamente após a sua morte, tivesse começado um movimento que transformou o mundo?

O seu enigma para nós é o da passagem do Jesus da história ao Cristo da fé, de tal modo que o seu nome agora é Jesus Cristo. Assim, a pergunta decisiva é esta: o que se pode saber hoje com rigor histórico sobre Jesus, o Cristo, independentemente da fé? Precisamente a esta pergunta responde esta obra modelar, saudada entusiasticamente pela crítica especializada, que sublinha dois aspetos essenciais: justamente o rigor e a acessibilidade.

Anselmo Borges

CONTRA CAPA

Para crentes e não crentes (numa época que discute o “Código da Vinci”, o sentido da violência e da paz e a responsabilidade das confissões religiosas nestes domínios) é fundamental entender as convicções dos que “fizeram grupo” com jesus Cristo, o significado de milagres e exorcismos, o âmbito de projetos de mudança da história pessoal e coletiva e o alcance de um “Reino de Deus”.

Que parentesco há entre o sentido e a salvação?

A complacência, a tolerância, a predileção pelos marginais, os conflitos e os equívocos do tempo, a Paixão e a Ressureição são marcos de uma trajetória. O saber (prefigurado por abundantes hipóteses de leitura) convoca à sensibilidade e à alteração de critérios de viver.

Com minucia de interprete e transparência de Mestre, o Prof. E. P. Saunders tenta reconstituir a fisionomia histórica de Jesus através da fidelidade às fontes, à releitura das comunidades nascentes e aos contextos de uma Pessoa. É uma delícia cultural a travessia de muitas das suas páginas!

D. Januário Torgal Ferreira, Bispo das Forças Armadas e de Segurança

«Um feito memorável.»

Professor Jaroslov Pelikan, Universidade de Yale

« é, hoje, o maior especialista americano na investigação sobre a vida de Jesus… Espero que esta obra (…) constitua um antidoto saudável contra algumas teses extravagantes sobre o jesus histórico que tem aparecido recentemente.»

Professor John B. Meier, Universidade Católica

«Soberbo… A Verdadeira Historia de Jesus destaca-se pela sua clareza e equilíbrio, o seu senso comum e, acima de tudo, pela sua honestidade.»

Professor Wayne A. Meeks, Universidade de Yale

«Um estudo não dogmático e não religioso sobre a verdade acerca da vida e percurso de Jesus, desenvolvido por um dos maiores especialistas.»

Professor Paul Johnson, “Sunday Times”

BADANA DA CONTRA CAPA

Depois de dois bacharelatos no Texas, o seu estado natal, E. P. Sanders prosseguiu os estudos universitários em Gottingen, Jerusalém, Oxford e Nova Iorque, que culminaram num doutoramento em Teologia pelo Union Theological Seminary. Em 1984, tornou-se professor de Exegese na Universidade de Oxford. Seis anos mais tarde mudou-se para a Universidade de Ciências da Religião. Foi professor no Trinity College, de Dublin, e na Universidade de Cambridge.

O seu campo de estudo centra-se no judaísmo e cristianismo no mundo greco-romano. Paul and Palestinian Judaism (1977) ganhou vários prémios nacionais. Jesus and Judaism (1985) recebeu o Premio Grawemeeyer de Religião e foi escolhida pelo Dunday Correspondent como uma das obras de referência da historia religiosa publicada nos anos 80. Escreveu igualmente The Tendencies of the Synoptic (1969), Paul, the Law and the Jewish People (1983), Studyng the Synoptic Gospels, com Margarete Davies (1989), Jewish from Jesus to the Mishnah (1990), Paul: Past Master (1991) e Judaism: Pratice and Belief 63 BDE – 66 CE (1992).

Recentemente, E. P. Sanders recebeu novos Títulos: coutor em Letras pela Universidade de Oxford e doutor honoris causa em Teologia pela Universidade de Helsínquia. É membro da Academia Britânica.

A chave hermeutica de Jesus do Prof. E. P. Sanders reside no tema da «restauração escatológica». Como ninguém, Sanders conhece profundamente a cultura teológico-literária judaica da escatologia e conclui que o Deus da Aliança com o seu povo de Israel consuma em Jesus essa mesma aliança da restauração escatológica.

Pe. Carreira das Neves Professor da Universidade Católica Portuguesa
ISBN 972-46-1529-4

(Edição original: ISBN 0-14-014499-4)

© E. P. Sanders, 1993

Direitos reservados

EDITORIAL NOTICIAS

Rua Bento de Jesus Caraça, 17

1495-686 Cruz Quebrada

E-mail: geral@editorial.noticias.pt

Internet:www.editorialnoticias.pt

JRPENTRETENIMENTO

Título original: The Historical Figure of Jesus

Tradução: Teresa Martinho Toldy

Marian Toldy

Revisão: Domingas Cruz

Capa: Maria Manuel Seixas

Edição: OI 04 0057

I .ª edição: Setembro de 2004

Depósito legal n.º 216622/04

Pré-impressão, impressão e acabamento:

Multitipo - Artes Gráficas, Lda.


BIOGRAFIAS
A VERDADEIRA HISTÓRIA DE JESUS
Nesta coleção:

JOÃO PAULO Il - A VIDA DE KAROL WOJTYLA Tad Szule

YITZHAK RABIN - MISSÃO INACABADA

The Jerusalém Report

EMÍDIO GUERREIRO - UMA VIDA PELA LIBERDADE

A. Encarnação Viegas

ALINA - MEMÓRIAS DA FILHA DE FIDEL CASTRO

Alina Fernández

POR TIMOR - BIOGRAFIA DE D. XIMENES BELO

Arnold S. Kohen

LULA - DO AGRESTE AO PLANALTO

João Nascimento

A VERDADEIRA HISTÓRIA DE JESUS

E. P. Sanders


A VERDADEIRA HISTORIA DE JESUS

Tradução

Teresa Martinho Toldy

Marian Toldy

notícias editorial
Abreviaturas

Antig. Josefo, Antiguidades Judaicas, citado de acordo com a edição inglesa: Jewish Antiquities, in Work, ed. e trad. H. St. J. Thackeray, Ralph Marcus, Allen Wikgren e Louis Feldman, Loeb Classical Library, 10 vols., Londres e Cambridge MA 1926-1965

a.e.c. antes da época cristã (= a. C.)

e.c. época cristã (= d. C.)

HJP Emil Schürer, History of the Jewish People in the Age qf Jesus Christ, revisto e editado por Geza Vermes, Fergus Millar e Martin Goodman, oS vols. em 4 partes, Edimburgo, 1973--1987

J&J E. P. Sanders, Jesus and Judaism, Londres e Filadélfia, 1985

JLJM E. P. Sanders, Jewish Law from Jesus to the Mishnah: Five Studies, Londres e Filadélfia, 1990

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NRSV New Revised Standard Version ofthe Bible



P&B E. P. Sanders, Judaism: Practice and Belief 63 BCE - 66 CE, Londres e Filadélfia, 1992

RSV Revised Standard Version of the Bible

SSG E. P. Sanders e Margaret Davies, Studying the Synoptic Gospels, Londres e Filadélfia, 1989

Guerra Josefo, A Guerra Judaica, citado de acordo com a edição inglesa: The Jewish War, in Works (edição já mencionada)

/ / paralelo a (Mt 9, 14-17 / / Mc 2, 18-22 significa que as passagens são paralelas uma à outra)
Tabela cronológica

597 a.e.c. - Nabucodonosor da Babilónia conquista Jerusalém; os líderes judaicos são levados para o exílio na Babilónia

559-332 - Palestina sob o domínio persa

538 - início do regresso a Jerusalém

520-515 - reconstrução do Templo

333-332 - Alexandre Magno conquista a Palestina

cerca de 300-198 - Palestina sob Ptolomeu do Egipto

198-142 - Palestina sob Selêucidas da Síria

175-164 - Antíoco IV (Epífanes), rei da Síria

167 - profanação do Templo; início da revolta dos Asmoneus (Macabeus)

166-142 - os Asmoneus lutam pela autonomia total

142-137 - período dos Asmoneus

63 - Pompeu conquista a Judeia

63-40 - Hircano II, sumo sacerdote e etnarca

40-37 - Antígono, sumo sacerdote e rei

37-4 - Herodes Magno, rei

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31 - batalha de Actium: Octaviano (mais tarde, intitulado Augusto) torna-se imperador romano



4 a.e.c. - 6 e.c. - Arquelau etnarca, administrador da Judeia

4 a.e.c. - 39 e.c. - Antipas tetrarca, administrador da Galileia e da Pereia

cerca de 4 a.e.c. - nascimento de Jesus de Nazaré

6-41 e.c. - Judeia governada por prefeitos romanos

14 - Tibério sucede a Augusto como imperador

cerca de 18-36 - José Caifás, sumo sacerdote dos judeus

26-36 - Pôncio Pilatos, prefeito da Judeia

cerca de 30 - morte de Jesus

37 - Gaio (Calígula) sucede a Tibério como imperador

41 - Cláudio sucede a Gaio

41-44 - Agripa I, rei, governa sobre o anterior reino de Herodes

44-66 - Judeia, Samaria e uma parte da Galileia governada por procuradores romanos

48-66 - Agripa II recebe uma parte do reino do seu pai revolta dos judeus contra Roma

66-74 – revolta doa judeus contra Roma

70 - queda de Jerusalém, destruição do Templo

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Prefácio

A maioria dos investigadores que escrevem sobre o mundo da Antiguidade sente-se obrigada a avisar os seus leitores de que o nosso conhecimento do objeto, na melhor das hipóteses, é incompleto e de que raramente se chega a uma certeza. Um livro sobre um judeu do século I, que viveu numa parte bastante insignificante do Império Romano, deve ser prefaciado por este aviso. O que sabemos acerca de Jesus provém de livros que foram escritos algumas décadas após a sua morte, provavelmente, por pessoas que não faziam parte do círculo daqueles que o seguiram em vida. Estes citam-no na língua grega, que não era a sua primeira língua, e, de qualquer modo, as disparidades existentes entre as nossas fontes demonstram que o estado de conservação das suas palavras e dos seus atos não é perfeito. Possuímos poucas informações sobre ele, para além das obras escritas com intenção laudatória. Atualmente, não estamos bem documentados sobre regiões tão longínquas como a Palestina e os autores das nossas fontes também não o estavam. Não possuíam arquivos ou registos oficiais de qualquer espécie. Nem sequer tinham acesso a mapas. Estas limitações, normais na Antiguidade, resultam num elevado nível de insegurança.

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Reconhecendo estas e muitas outras dificuldades, os exegetas do Novo Testamento passaram várias décadas - entre 1910 e 1970 - a afirmar que não sabemos nada, ou praticamente nada, sobre o Jesus histórico. O exagero provoca reação e, nas últimas décadas, a nossa confiança em nós mesmos aumentou, aliás, a tal ponto que a literatura exegética recente inclui aquilo que eu considero serem afirmações precipitadas e infundadas sobre Jesus - hipóteses sem provas que as sustentem.

Considero o estudo dos Evangelhos um trabalho extremamente difícil. Compreendo os exegetas que desistiram de recolher muitos dados empíricos úteis sobre Jesus. Penso, contudo, também que o trabalho compensa tanto quanto é de esperar quando se trata de investigação da história da Antiguidade.

Este livro apresenta as dificuldades e os resultados bastante modestos, que considero simultaneamente fundamentais e relativamente seguros - bastante seguros, tendo em conta os nossos restantes conhecimentos da Palestina antiga, em geral, e das figuras religiosas do judaísmo, em particular. Sabemos muito sobre Jesus, muito mais do que sobre João Baptista, sobre Teudas, sobre Judas, o Galileu, ou sobre qualquer outra das figuras cujos nomes conhecemos e que são, mais ou menos, da mesma época e região.

Enquanto escrevia, apercebi-me de que as páginas com o material de introdução se estavam a amontoar. Apesar da minha intenção de as reduzir, elas aumentavam continuamente de rascunho para rascunho. Continuo a pensar que seria desejável que o leitor pudesse chegar mais rapidamente ao cerne da questão, mas julgo que os capítulos introdutórios são necessários. Os conhecimentos dos Evangelhos continuam a estar muito difundidos, mesmo nos nossos tempos secularizados, mas a compreensão dos problemas críticos que estes colocam é mais rara. Detesto dizer que existe uma dificuldade sem explicar de que dificuldade se trata: é a isto que se deve uma grande parte do material. Também descrevi mais pormenorizadamente do que é habitual o cenário político e religioso no qual decorreu a vida de Jesus, porque é muito frequente estes aspetos serem mal apresentados nos livros sobre Jesus, quer sejam da autoria de amadores, quer sejam de profissionais.

Fiz, no entanto, algumas economias, sobretudo nas indicações bibliográficas. Evito tanto debates com outros especialistas como notas bibliográficas, remetendo para as minhas obras anteriores, nas quais discuti mais pormenorizadamente tanto as fontes primárias como a

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literatura secundária. Esforcei-me igualmente por limitar ao mínimo a discussão de termos e expressões estrangeiras.



As citações bíblicas, regra geral, seguem a Revised Standard Version, que eu continuo a considerar a tradução inglesa mais satisfatória, embora tenha usado ocasionalmente a Neto Revised Standard Version. Por vezes, modifiquei a tradução, em ordem a ser mais fiel ao fraseado do texto grego.

Rebecca Gray leu e comentou dois rascunhos do livro, pelo que lhe estou muito grato. Agradeço igualmente a Frank Crouch, que elaborou um índice das passagens bíblicas, e a Marlena Dare, que o datilografou. Gostaria de agradecer também a Peter Carson e Miranda McAllister, da Penguin Books, pelos conselhos muitíssimo úteis e pela grande paciência, assim como a Donna Poppy, pelo seu trabalho minucioso sobre o texto dactilografado.

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1. Introdução

Numa manhã primaveril, por volta do ano 30 da era cristã, as autoridades romanas executaram três homens na Judeia. Dois eram salteadores - homens que deviam ter sido ladrões ou bandidos, cujo único interesse era o seu próprio proveito, mas que também podiam ter sido insurretos cujo banditismo tinha um objetivo político. O terceiro foi executado como um outro tipo de criminoso político. Não tinha roubado, pilhado, assassinado, nem sequer acumulado armas. Foi condenado, no entanto, com base na acusação de ter afirmado que era «rei dos judeus» - um título político. Aqueles que assistiam - entre os quais se encontravam algumas das mulheres que tinham seguido o terceiro homem - pensavam, certamente, que as suas esperanças de uma «insurreição» bem sucedida tinham sido destruídas e que o mundo quase não daria pelo que tinha acontecido naquela manhã de Primavera. De facto, durante algum tempo - tal como demonstram os vestígios literários da elite do Império Romano -, o mundo quase não registou este acontecimento. É evidente que o terceiro homem, Jesus de Nazaré, acabou por se tornar uma das figuras mais importantes da história da Humanidade. A nossa tarefa consiste em compreender quem foi e o que fez este homem.

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Não vou tentar explicar por que razão este homem tem sido tão importante ao longo dos séculos subsequentes à sua morte. Isto é uma outra questão que exige o estudo da evolução da teologia cristã nos séculos posteriores à execução de Jesus, sobretudo nos quatro séculos que se lhe seguiram. Jesus tornou-se o centro de uma nova religião e transformou-se numa figura teológica: não só o fundador histórico de um movimento religioso, mas alguém cuja personalidade e obra constituíram tema do pensamento filosófico e teológico. Durante quase dois mil anos, a maioria dos cristãos considerou os ensinamentos de Jesus e as suas outras atividades na Palestina como algo menos importante do que a sua relação com Deus Pai e do que o significado que Deus atribuiu à sua vida e, sobretudo, à sua morte: a sua morte constituiu um sacrifício pelos pecados do mundo inteiro.



Direi um pouco mais sobre o Cristo dos credos cristãos no capítulo x: aqui, gostaria apenas de explicar que este livro constitui uma teologia. Não discutirei aqui nem o que Deus realizou através da vida e morte de Jesus, nem a forma como Jesus participa ou não na Divindade. Abordarei Jesus como um ser humano, que viveu numa determinada época e num determinado local, e procurarei provas e apresentarei explicações - tal como qualquer historiador que escreve

sobre uma figura histórica.

É óbvio que a teologia desempenhará um papel importante nesta obra num outro sentido. Tanto Jesus como os seus seguidores tinham ideias teológicas. Aqueles que transmitiram e desenvolveram as tradições sobre Jesus, assim como os autores dos Evangelhos, atribuíram-lhe um papel importante na sua compreensão da ação divina no mundo. Mencionarei, por vezes, a teologia dos primeiros cristãos, porque é importante fazê-lo para analisar o que eles escreveram sobre Jesus, e abordarei mais pormenorizadamente a teologia do próprio Jesus, porque isto constitui uma parte essencial da pessoa que ele foi. No entanto, não tentarei harmonizar estas doutrinas teológicas com os dogmas cristãos posteriores. Creio que existe uma continuidade entre aquilo que o próprio Jesus pensava e aquilo que os seus discípulos pensaram depois da sua morte, assim como entre aquilo que estes pensavam e aquilo em que os cristãos dos séculos posteriores acreditavam. Mas também houve alterações e evoluções. Não seguiremos esta história interessante para além da data do último Evangelho, isto é, cerca do ano 80.

A teologia do próprio Jesus e as teologias dos seus primeiros seguidores constituem questões históricas, que devem ser exploradas da

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mesma maneira como se investiga o que Jefferson pensava sobre a liberdade, o que Churchill pensava sobre o movimento operário e sobre as greves de 1910 e de 1911 ou o que Alexandre Magno pensava sobre a reunião dos Gregos e dos Persas num só Império, bem como o que pensavam os seus contemporâneos sobre estes grandes homens.



Visto que alguns leitores não estarão habituados a explorar historicamente a vida e o pensamento de Jesus, gostaria de perspetivar o presente trabalho dizendo algumas palavras sobre os outros temas históricos que acabei de mencionar. Eles envolvem graus de dificuldade distintos e requerem a utilização de vários tipos de material. O pensamento de Jefferson sobre a liberdade e o governo representa um tema vasto, que exige um estudo minucioso, mas cujas fontes são excelentes, devido, em parte, à vasta correspondência de Jefferson, a qual foi conservada cuidadosamente.' As medidas que Churchill tomou a respeito da greve dos mineiros, em 1910, e de uma greve dos caminhos de ferro, em 1911, e, sobretudo, as ordens que deu à polícia e ao exército quanto à utilização da força foram bastante discutidas na imprensa da época; além disso, desenvolveram-se opiniões populares que perduraram até aos dias de hoje, embora sejam, frequentemente, incorretas. O historiador tem de examinar cuidadosamente os vários relatos, incluindo os boatos e as bisbilhotices, para determinar com precisão aquilo que Churchill fez e pensou sobre questões que excitaram tão fortemente os ânimos. Segundo parece, uma investigação exaustiva de todos os documentos; tanto públicos quanto privados, ilibam-no, em grande parte, das acusações que lhe são feitas." A questão de saber o que Alexandre Magno pensava sobre as suas conquistas sem precedentes é uma questão por esclarecer, à qual não se pode responder inequivocamente com base nas provas existentes. Sabemos que conquistou o Império persa, que casou com uma princesa persa e que

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ordenou a alguns dos seus oficiais que casassem com mulheres da nobreza persa. Mas não podemos saber o que ele pensava exatamente. Podemos concluir, genericamente, que o seu objetivo era estabelecer uma espécie de união ou harmonia entre os seus oficiais macedónios e a nobreza persa, mas não podemos dizer com precisão o que ele pretendia.



Estas questões assemelham-se todas às questões sobre Jesus num aspeto fundamental: as personagens principais são figuras lendárias. As pessoas falavam sobre elas, transmitiam histórias sobre elas durante o tempo da sua própria vida e, com o passar dos anos, alguns aspec­ tos da vida destas figuras foram salientados, enquanto outros foram esquecidos. Quem faz investigação sobre Jefferson ou Churchill dispõe de fontes excelentes que lhe permitem ir para além das lendas e dos boatos. O biógrafo de Jefferson pode apoiar-se numa quantidade imensa de fontes, enquanto o biógrafo de Churchill fica quase imerso em documentação. Descobrir aquilo que Jesus pensava assemelha-se muito mais à investigação sobre o Alexandre histórico. Não se conservou nada que tenha sido escrito pelo próprio Jesus. Os documentos mais ou menos contemporâneos a ele, abstraindo os do Novo Testamento, não esclarecem realmente nada sobre a vida e a morte de Jesus, apesar de revelarem muito sobre o ambiente social e político. As fontes principais do nosso conhecimento do homem Jesus, os Evangelhos no Novo Testamento, têm, para o historiador, o defeito de terem sido escritas por pessoas cujo objetivo era exaltar o seu herói. Contudo, as fontes para Jesus são melhores do que aquelas que se debruçam sobre Alexandre. As biografias de Alexandre originais perderam-se todas e só as conhecemos porque foram utilizadas por autores mais recentes ­ muito mais recentes." As fontes primárias sobre Jesus foram redigidas numa fase mais próxima da época em que ele viveu e as pessoas que o tinham conhecido ainda estavam vivas. Este é um dos motivos para se dizer que sabemos mais sobre Jesus do que sobre Alexandre. Por um lado, Alexandre alterou tanto a situação política numa grande parte do mundo que os traços fundamentais da sua vida pública são, de facto, bastante conhecidos. Jesus não alterou a situação social, política e

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económica da Palestina. Mesmo assim - como veremos aprofundadamente mais adiante -, possuímos uma ideia bastante correta sobre o percurso da sua vida exterior e, sobretudo, sobre a sua vida pública. A superioridade das provas existentes sobre Jesus, em comparação com Alexandre, torna-se patente, quando perguntamos o que ele pensava. Os seus discípulos iniciaram um movimento que se baseava, em parte, naquilo que o próprio Jesus tinha pensado e feito. Se conseguirmos descobrir quais são as ideias que eles assumiram de Jesus, saberemos muito sobre o seu pensamento. O estudo minucioso dos Evangelhos permite distinguir frequentemente entre aquilo que se preservou das ideias do próprio Jesus e as opiniões dos seus discípulos, como veremos mais pormenorizadamente adiante. O facto de algumas das nossas fontes serem independentes entre si aumenta a nossa segurança. Em Paulo encontram-se indicações importantes sobre algumas das perspetivas e expectativas de Jesus e as cartas de Paulo foram escritas antes dos Evangelhos. Por outro lado, as suas cartas foram coligidas e publicadas depois de os Evangelhos terem sido redigidos; por conseguinte, Paulo não conhecia os Evangelhos e os autores dos Evangelhos não conheciam as epístolas de Paulo.

Mesmo assim, as nossas fontes deixam muito a desejar. Os Evangelhos transmitem palavras e atos de Jesus numa língua que não era a sua (ele ensinou em aramaico e os Evangelhos estão escritos em grego) e colocam cada peça de informação num cenário imaginado pelos seus discípulos, sendo que se trata habitualmente de discípulos que se encontravam a uma certa distância temporal em relação a ele. Mesmo que soubéssemos que estamos perante as suas próprias palavras, teríamos sempre de recear que ele tivesse sido citado fora de contexto.


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