Guia para um seqüestro


Fernando e Estevão celebram no Rio de Janeiro



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Fernando e Estevão celebram no Rio de Janeiro

Fernando chamou seu sócio e amigo.


Temos um jogo de pôquer hoje. Você quer jogar?
Estevão, que se preparava para ir dar uns tiros no clube de campo, respondeu ao amigo:
Hoje estou com o bolso cheio. A que horas e onde é o jogo?
Fernando, que já se encontrava no Rio de Janeiro há mais de três dias, sugeriu:
No Restaurante Lagostinha, Barra da Tijuca – Rio de Janeiro – 21 horas.
Estevão, desempacotando suas armas, respondeu:
OK! estarei lá.
Fernando, como sempre, madrugava nos seus encontros, principalmente quando ia a restaurantes ou a outros lugares parecidos. Não se incomodava se ia encontrar alguém ou não. O importante para ele era satisfazer aquele desejo e poder de controlar tudo e todos ao seu redor, pelo menos, por alguns instantes.

Quando Estevão entrou no badalado Lagostinha, Fernando já tinha feito o levantamento completo do local, inclusive das imediações do restaurante.


Estevão, ao entrar, na área reservada para não fumantes, inalou, fundo, o cheiro apetitoso dos frutos do mar que fugiam da cozinha para os salões do restaurante. Estevão, sentando-se, parabenizou Fernando pela escolha do local do encontro.
Fernando concordou, comentando que a ocasião era especial e que isso merecia um local exclusivo.
Estevão deu os parabéns, pela segunda vez, a Fernando pelo brilhante début do MBN na sede da VÊNUS.
Quis saber como a diretoria atual do movimento se comportou com a estreia política no mundo da mídia e, principalmente, se estavam contentes com o dinheiro em caixa para ir tocando legalmente o Movimento.
Eufóricos, diria eu, respondeu Fernando.
Já estão em processo adiantado para abrirem escritórios em Brasília, Rio de Janeiro, Recife e Minas Gerais. Logo começarão o trabalho de filiação de novos membros e multiplicação do potencial político.
Quando entrarem os recursos do segundo abordado, a diretoria do Movimento abrirá outros escritórios representativos no Norte e Sul do país. No momento em que repassarmos a contribuição do quinto abordado, o Movimento terá escritórios representativos em todo os estados da União. Daí, então, é só escolhermos os candidatos. E por falar em candidato, gostei muito do discurso, improvisado, do milionário herdeiro da VÊNUS.
O garçom, vestido a rigor, interrompeu a reunião para anotar o pedido para aquela mesa, reservada, em lugar privativo da sala de não fumantes. Anotou uma entrada de caranguejos do Alaska e frutos do mar à moda Lagostinha, para dois. Uma jarra de suco de acerola, gelado, sem açúcar. Os dois amigos já saboreavam um Scotch Buchanan’s 18 anos, para celebrar o primeiro sucesso completo do MBN.

E você Estevão? O que me conta da colaboração, integral, da Irene, no Clube, e como anda o novo hóspede desprovido de seu bug, eletrônico?


Ah!...Irene! Irene! Está difícil, para mim, falar sobre ela agora.
Vou, tentar, ser mais específico e objetivo possível para descrever o que se passou no Clube e as conclusões que, ainda, não estão definidas sobre a sua colaboração repentina após um período de não cooperação.
Primeiro, como eu já lhe mencionei no almoço passado, em São Paulo, Irene se decidira a colaborar. Creio que a virada aconteceu quando ela ficou com medo da pressão exercida sobre ela, com Gilda praticando tiro ao alvo em uma foto inversa, tamanho pôster, de seu filho Antônio. A ordem foi minha, com intenção de amolecer sua resistência inicial.
Três dias depois, Irene começou a colaborar sem restrições.
Segundo, Irene realizou que, para sair do Clube, teria que obedecer nossas ordens, à nossa maneira, e então começou a colaborar. Coloque-se aí que ela também se deu conta, que o rabo dela e o da VÊNUS estavam presos conosco, independente do dinheiro a ser doado.

Terceiro, fingiu estar apaixonada por mim, colaborando da melhor forma possível conosco, para se ver livre logo e depois dar o troco.


Ah! Ah! Ah! Fernando! caiu em uma risada, franca e sincera, desafiando Estevão, imediatamente, com uma nova aposta, de que ele seria convidado para ser um dos padrinhos dos noivos. Apostou, ainda, que o resultado era uma combinação dos três fatores, e o que mais pesou, na decisão de Irene, foi o rabão preso da VÊNUS.
Como você é meu amigo, eu não quero ofendê-lo em qualificar o tamanho da rabo dela, por isso o da VÊNUS.
Tem mais! Eu lhe falei, um tempo atrás, que os tapas, mordidas e os coices eram uma declaração de amor, ao bonitão ex-Ás de Ouro da FAB.
Essas meninas, do interior, criadas em fazendas, educadas na capital e donas de milhões, são um perigo para nós, no limite de nossa liberdade. Começam nos dando tapas e terminam no altar nos segurando pelo cabresto.
Fernando ria sem parar, enquanto Estevão, sem graça, esperava o surto das gargalhadas extasiantes de Fernando chegarem ao fim.
OK! OK! Fernando, você tem um ponto ou dois ganhos, mas o pior é que eu, realmente, me apaixonei pela nossa hóspede. Não posso dizer que é perdidamente, pois ainda não sinto falta da minha cabeça. Tanto é que estou aqui e vou ir até o fim com o nosso plano. Depois disso, se ela quiser, poderemos subir as escadas...
Esta aposta, já ganhei! falou Fernando, rindo mais ainda, enquanto levantava-se para fazer um discurso privado ao amigo.
Vou ser o padrinho! Se você não me convidar, não serei aquele, covarde, que nunca se levanta, na Igreja, quando o Padre pergunta: Se há alguém aqui contra a união dessas duas almas, que se manifeste agora, ou cale-se para sempre.
Lá eu serei um herói, o mais corajoso dos brasileiros vivos. Levantarei do banco de madeira, da mais famosa casamenteira de São Paulo para falar a verdade, nada mais do que a verdade. Em frente de todos, na Igreja Nossa Senhora do Brasil.
Jurarei que você é um caçador de viuvinhas milionárias. Jurarei que fui eu quem lhe apresentei tão rica e bonita oportunidade. Jurarei que não estou levando os meus vinte ou trinta por cento de comissão, a qual todo e bom corretor brasileiro tem o direito, quando apresenta um bom negócio. Jurarei que você a ama. Jurarei que você é um desequilibrado, devido aos mais de 3.000 saltos de pára-quedas, onde, nas descidas, todas computadas, perdera suficiente oxigênio para alimentar o Hospital das Clínicas, inteirinho, com o precioso ar da vida. Jurarei que graças a você o Brasil terá um novo futuro. Um futuro em branco, azul, amarelo e verde. Jurarei que cada vez que você entrar com outra VÊNUS, de branco, nas Igrejas do Brasil, me levantarei para dizer a verdade, nada mais do que a verdade...
Estevão, interrompendo o inflamado discurso, disse que Irene tinha uma irmã, mais velha, e quem sabe o herói, corajoso, estaria interessado em ser seu concunhado. Isso arranjado estaria paga a comissão pretendida.
Riram, riram e riram mais, como todos os brasileiros que riem de tudo e de todos, até da desgraça alheia. O garçom reapareceu com o prato boreal de causar muita inveja aos siris enlameados da baixada santista. A perna do crustáceo alaskiano, da mesma cor de um redneck, era tão longa que ultrapassava a bandeja, larga, de inox.
Devoravam a entrada, rapidamente, enquanto na cozinha o chefe colocava vinho branco, importado, na frigideira que marinava aquela mistura apetitosa de frutos do mar, a qual tornou o Lagostinha um dos restaurantes mais famosos e caros do Rio de Janeiro.
Alimentado, Estevão continuou a reportar as atividades do Clube Merlin no que dizia respeito ao segundo abordado.
Comentou com Fernando que o Senhor D. Filho andava muito assustado e passava a maior parte do dia de joelhos, rezando ou confessando. D. Filho confidenciara a Irene que tinha medo de ser executado.
Aposto que ele gravará sua mensagem em menos tempo do que Irene levou para gravar a dela.
Eu apostei que vou ser padrinho. Não aposto mais nada hoje!
Sei até quantos gatos estão comendo peixe, nos latões de lixo, atrás do restaurante. Mas o que eu quero mesmo é ser padrinho de casamento. A última vez que entrei em uma igreja foi para prender um padre comunista. Agora que vivemos em uma sociedade justa e democratizada quero ser padrinho de casamento. Quem sabe quando lá estiver aproveito e confesso meus pecados...
OK! OK! Está apostado, concordou Estevão.
Reportando a seguir que em uma semana mudaria os soldados da Célula A para Porto Alegre, Furlan, Rambo e Rubio já estavam nas imediações do cenário, finalizando os últimos detalhes da missão denominada MATE QUENTE, tratando dos detalhes da abordagem do terceiro nome da lista mencionado no Estudo.
O homem, um dos mais ricos do sul do Brasil, estava planejando passar três dias em Punta Del Este, no Uruguai.
Fernando, ao se despedir de Estevão, perguntou como ele queria receber o resto da sua parte, proveniente das contribuições da VÊNUS. E que estava prontinho para coletar os velhos dólares do Senhor D. Filho.
Estevão, sorrindo, respondeu que poderia ser igual ao da primeira vez.
Metade lá fora e a outra, cash, de preferência em São Paulo.

D. Filho grava duas mensagens

Yves chegou cedo ao Clube Merlin. Seu coração batia desanimado sem a presença de Irene no local. Confessara à Gilda que ainda bem que, logo, o local seria descartado e não precisaria mais relembrar, em loco, de Irene. Gilda que viera recebê-lo no portão do Clube lhe desejou sorte com sua livre presa.


Na sede do Clube, convidou D. Filho para tomarem o café da manhã juntos. Este, aparentemente, mais aclimatado ao Clube respondeu que seria um prazer.
Enquanto esperavam as panquecas, pedidas por D. Filho, Yves perguntou se ele já estava pronto para gravar a mensagem.
Sim! Respondeu D. filho, comentando que, de fato, perdera a conta de quantos milhões havia no cofre escondido e que nos últimos dias tinha feito uma retrospectiva de seus atos e estava pronto para repartir os dólares do Cofre. Confessou ainda que, honestamente, não sabia exatamente, porque guardava tanto dinheiro escondido. Vício com certeza! Exclamou melancólico o ex Alvarento.
OK!OK! Concordou Yves, entusiasmado com a decisão acertada do novo hóspede do clube. Depois do café vamos filmar, aqui mesmo, no terraço. O dia está bonito e não precisaremos da luz artificial.
A primeira mensagem

Bom dia Glorinha.
Em primeiro lugar quero que saiba que estou bem e entre amigos. Minha saúde está ótima e estou tomando meus remédios, exatamente como mandou o médico. Espero que tudo esteja bem na Incorporadora e construtora. Estou contando com você para ir tocando os negócios até o meu retorno.
Aqui, onde estou, o trabalho é pouco. Para não ficar enferrujado, realizei alguns negócios e vou precisar de sua ajuda e a da minha filha, Maria.
Quero que você telefone, hoje, para ela e peça para vir até o meu escritório, amanhã, ao meio dia, para uma reunião de negócios.
Mariazinha deverá vir acompanhada de seu advogado. Não quero seu ex-marido por perto. Peça a ela, por favor, para trazer o envelope, marrom, lacrado, estampado com o número dois (2) que está na cômoda onde a mãe dela guarda suas jóias.
A pauta da reunião será explicada na mensagem gravada, que você receberá amanhã. Nessa importantíssima reunião, não está autorizada a entrada ou escuta de nenhuma outra pessoa, a não ser você, Maria e seu advogado. Estão proibidos de assistirem a reunião os nossos advogados e o pessoal da minha segurança. E, nem pensar na polícia ou na minha seguradora anti-seqüestro. Quero esse pessoal longe de mim e das minhas coisas.
Depois eu lhe explico pessoalmente a razão disso tudo.
Um abraço do D. Filho e até breve.

Após declamar, naturalmente, o script do MBN, a imagem mostra D. Filho tomando seu suco de maracujá, sentado em um terraço, ensolarado, cheio de plantas. A câmara dá um zoom no Senhor D. Filho, que no momento, pega um jornal para ler. O zoom da câmera termina focalizando a data de um dos Jornais de maior circulação no estado de São Paulo – Domingo 30 de Novembro de 2003.


A Senhora Glória da Assunção Pires, Glorinha, vice-presidente do maior grupo construtor e incorporador de São Paulo acabara de ver, a mensagem, na TV-DVD Panasonic, de seu presidente e amante.
Ela e dois diretores do departamento jurídico, os mais confiáveis do Senhor D. Filho assistiram, pelo menos, três vezes ao DVD no salão de reuniões na sede do grupo incorporador e construtor.
Ficaram todos intrigados por não terem recebido nenhum pedido de dinheiro em troca da liberdade de D. Filho, seqüestrado violentamente, há quase três semanas, enquanto jantava em um dos restaurantes mais caros dos Jardins.
Dr. Murilo, diretor jurídico do grupo, fez algumas perguntas a Glorinha.
Primeira: se os seqüestradores tinham telefonado exigindo alguma quantia e como foi enviado o DVD.
Segunda: se ela sabia o que continha nesse envelope referido pelo Presidente.
Terceira: queria saber se Glorinha tinha alguma idéia porque o departamento dele estava sendo descartado da reunião de amanhã.

Glorinha, demonstrando curiosidade, respondeu ao Dr. Murilo que ninguém chamou pedindo algum dinheiro pelo resgate e que a seguradora, com autorização dela, colocou uma escuta no telefone da Diretoria e na residência do Presidente. O envelope marrom, endereçado a ela, contendo o DVD foi entregue pelos serviços de moto-boy. Não tinha menor idéia sobre o conteúdo do envelope marrom, lacrado, na residência do Presidente. Tampouco sabia porque o Presidente excluíra ele e os outros diretores da reunião de amanhã. Mas, que ela, como vice-presidente, iria acatar as ordens do Presidente tal como ele pedira.


– Lembrem-se que Mariazinha é a filha, única, e herdeira legal de D. Filho.
Dr. Sergio, segundo em comando, no departamento jurídico sugeriu chamar o pessoal da seguradora para dar uma olhada na autenticidade do DVD e fazer uma checagem se o mesmo fora montado ou não.
Glorinha contestou a sugestão contra-argumentando que D. Filho já deixara claro para não envolver a seguradora no caso. Sugeriu esperar até amanhã para verem o resultado da reunião com Mariazinha e seu advogado. Depois disso decidiriam falar, ou não, com a seguradora e com o Delegado que investigava o seqüestro.
A segunda e última mensagem de D.Filho

Bom dia Maria, Bom dia Glorinha, Bom dia Dr. Reynaldo.
Como vocês podem notar eu estou bem e em poucos dias estarei de volta às minha atividades.
Hoje é um dia muito importante nas nossas vidas e quero deixar claro que o que vou pedir a vocês é de todo coração.
Glorinha, o advogado da Mariazinha, Dr. Reynaldo, vai lhe apresentar uma procuração, passada em cartório, ontem, por mim, a qual dá a Maria todos e quaisquer poderes para me representar perante todas as empresas do nosso grupo incorporador e construtor. Vocês duas, juntas, estão com poderes ilimitados para ir tocando os negócios e, principalmente, realizar algumas tarefas que pedirei agora.
Como eu nunca confiei, totalmente, em ninguém, inclusive, em você Glorinha, nesse momento gostaria de corrigir alguns dos meus erros.
Glorinha, caso você tenha tentado abrir o meu cofre, do meu banheiro, na minha ausência, deve ter percebido que a chave não funcionou. Quero que saiba que a chave que deixei junto com os números do segredo para abrir o cofre é falsa.
O Cofre tem somente duas chaves. Uma delas está comigo e a outra deve estar, agora, em poder de Mariazinha que a encontrou no envelope lacrado na minha casa.
De hoje em diante, Mariazinha ficará responsável pelo cofre até o meu retorno. Favor inutilizar a chave falsa.
O Dr. Reynaldo tem uma lista de Organizações não Governamentais, as quais deverão receber algumas doações, em dinheiro, em nome do nosso grupo incorporador e construtor.
Glorinha, quero que você e Maria comandem essas doações e contratem uma assessoria de imprensa. A melhor que vocês acharem, para divulgar as doações. Essas doações serão deduzidas do imposto de renda devido ou a pagar do nosso grupo. O diretor financeiro, Dr. Mário, deverá organizar os devidos recibos e outros documentos necessários. Dr. Reynaldo, também, tem as minhas instruções, por escrito, e as entregará a vocês, orientando como proceder com a entrega dos prêmios para as referidas ONGs.
Peço a vocês duas para abrirem o meu cofre, na frente, do Dr. Reynaldo e dividirem os dólares que tenho lá, economizados para momentos iguais a este, da seguinte forma:
Primeiro, do total geral contado, entregar 60% para o Dr. Reynaldo pagar um compromisso que aqui assumi.
Segundo, Mariazinha levará consigo e investirá, como ela quiser, para ela e os meus netos 20% do total.
Terceiro, A doação para as ONGs será dividida em partes iguais do total de 15%.

Quarto, os 5% restantes, do total, gostaria que você Glorinha aceitasse como um presente meu que há muito tempo merecido está.
Em hipótese nenhuma, o Dr. Reynaldo poderá ler ou copiar qualquer documento que esteja dentro do cofre.
Não quero que os outros diretores, de nosso grupo, saibam, de uma maneira ou outra, sobre a divisão aqui estabelecida. Vamos manter o segredo entre nós da presidência, vice-presidência e a família. Entendido? Quando da minha volta, ao escritório, eu explicarei aos demais diretores que Mariazinha agora tem todos os poderes e estará trabalhando conosco na Empresa.
Glorinha e Mariazinha! Eu já ia esquecendo de lhes pedir um outro favor.
Quero que vocês comprem uma passagem, de 1ª classe, de ida e volta para Nova York em nome da Sra. Eva Moraes Atílio. Façam uma reserva de um mês no Waldorf Astória Hotel, em Nova York para ela. Comprem, para a Senhora Eva, a quantia de cinqüenta mil dólares em travelers cheks para suas despesas de viagem. Diga a ela que é o presente de natal que nunca lhe dei.

Até breve e tenho certeza absoluta que vocês obedecerão as minhas ordens como pedidas. Est[a bem?
Um abraço para vocês duas.
Mariazinha! cuide bem de sua mãe. Se vocês tiverem dificuldades em encontrar a Sra. Eva, a minha esposa tem o endereço dela.
Até breve!

Os três se entreolham, desconfiados. Glorinha foi a primeira a sair atirando, dizendo que nunca passara pela sua cabeça a vontade de abrir um cofre que não lhe pertencia. A idéia de ela ficar sabendo onde ficava a combinação dos números e a chave, que agora se sabia que era falsa, foi do próprio D. Filho.


Eu nem sabia que tinha dólares lá dentro. Todo esse tempo imaginava que fossem só os documentos das empresas.
Maria comentou que a culpa não era dela e que esse era o estilo de seu pai. Não confiava em ninguém, como ele mesmo disse.
Dr. Reynaldo, para divergir a atenção das duas, sugeriu reprisar o DVD para tirar uma dúvida de um dos pedidos que não ficou muito claro em sua mente.
Glorinha concordou e imediatamente apertou o sinal de replay no aparelho de DVD, enquanto pegava um lápis e papel da mesa de reunião para anotar as porcentagens ordenadas por D. Filho.

Após verem novamente D. Filho na TV, Glorinha e Maria pediram ao advogado que evidenciasse os itens mencionados na mensagem.


Dr. Reynaldo dependurou sua bengala na guarda de uma das poltronas e tirou da pasta um envelope com duas cópias originais de uma procuração, entregando uma cópia a cada uma das senhoras presentes. Logo a seguir, entregou a cada uma delas, uma lista das ONGs contempladas para receberem a generosa doação e uma metodologia escrita, à mão, pelo próprio D.Filho com instruções de como, exatamente, queria que as ONGs e a imprensa fosse notificada da doação e o local programado para o evento.
Nenhuma das duas procuradoras de D.Filho notaram a marca d’água do Royal Straight Flush, de naipe de ouro, nas páginas que indicavam as ONGs ganhadoras dos prêmios D. Filho e das instruções escritas de próprio punho pelo empresário filantrópico.
Glorinha, que nada podia fazer ante as evidências apresentadas, e super curiosa para ver quantos dólares havia naquele cofre, que ela não conseguira abrir com aquela maldita chave falsa, sugeriu que fossem até o escritório de D. Filho para verem o esconderijo. Pediu, pelo interfone, para a secretária de D. Filho, Sra. Matilde, que abrisse o escritório do Presidente, lhe apresentou Maria, filha de D. Filho. Explicou à secretária que a Senhora Maria, daquele momento em diante estaria usando o escritório do pai e ficaria no lugar do Presidente até a sua volta.
Maria agradeceu à Matilde e pediu que ela se retirasse, pois os três iriam continuar a reunião no escritório do Presidente. Glorinha pediu para colocar todas as chamadas e compromissos em espera até o próximo dia e chaveou a porta do escritório do Presidente por dentro.
Glorinha os conduziu até o banheiro privado de D.Filho para ver onde era escondida a chave falsa do cofre. Seguindo Glorinha no amplo escritório, Maria e Dr. Reynaldo, foram até o enorme e completo banheiro onde ela puxou, com força, a peça de metal dourada da tampa do porta papel-higiênico. O porta papel-higiênico se soltou da parede com papel higiênico e tudo, onde na cavidade da parede de tijolo estava, em um envelope de plástico, a chave e a combinação do tesouro.
Mariazinha pediu a chave e perguntou onde ficava o cofre.
Glorinha entrou no enorme box de vidro do chuveiro e, com um aperto em uma torneira falsa, a parede do banheiro correu para um outro lado, desaparecendo prédio adentro.
O suntuoso BERNARDINI, pintado de verde claro, estava lá à espera de alguém que conseguisse abri-lo com a combinação certa e a chave autêntica. Caso contrário, ele não cederia, facilmente, às marteladas furos de brocas ou a um corte de três mil graus do oxy-acetileno.
Mariazinha e Glorinha, suadas, com a emoção de abrirem aquela fortaleza de dois metros de altura por um e cinqüenta de largura, tentaram primeiro ver se a chave falsa funcionava. Pediu à Glorinha para ler o número da combinação.
Glorinha que já havia memorizado os números, após o seqüestro do seu Presidente, rodou o botão para o zero, parando completamente; em seguida, deu três voltas para esquerda e parou no número 7; voltou para à direita duas vezes e parou o número 9; deu outra volta para à direita e parou no número 3; voltou para esquerda parando no número 5. Pediu para Mariazinha tentar a chave falsa. Essa colocou a chave falsa e girou para direita. Nada aconteceu. Girou para a esquerda. Nada!
Dr. Reynaldo que a tudo assistia recomendou para que Mariazinha não forçasse a chave. Esta poderia quebrar dentro da fechadura. Sugeriu que seria melhor usar a chave verdadeira. Se a combinação que Glorinha usou com esperteza fosse a certa, a outra chave deveria abrir a porta sem forçá-la.
Mariazinha experimentou sua chave Bernardini, virando-a para a direita. A fechadura obedeceu e pediu mais uma volta. Mariazinha deu mais uma volta e escutou um barulho de desbloqueio que veio de dentro do cofre. Pegou a maçaneta grande e torceu para a esquerda e a porta cedeu facilmente. Foi preciso as duas puxarem, com muita força, para abrirem os duzentos quilos, só de porta, da legalmente violada fortaleza de D. Filho.

Ácaros se divertem com os milhões de D.Filho

A primeira coisa que apareceu foi uma cortina improvisada com uma toalha de banho grande que foi logo puxada por Mariazinha e jogada em um canto do banheiro.


Realmente, a cena depois disso se tornou cinematográfica. As duas procuradoras de D. Filho, parecendo pedreiros desconstruindo uma parede, de tijolos à vista, começaram a tirar, aos montes, os pacotes com notas de cem dólares empilhados, arquitetonicamente, até o teto do cofre.
Do lado esquerdo, em duas prateleiras de aço, havia vários envelopes e algumas caixinhas de metais. Nenhuma das procuradoras deu importância ao conteúdo restante do cofre. Estavam determinadas em tirar aqueles tijolos de dinheiro que começaram a empilhar, no solo do vasto banheiro, para, depois então, dividirem a massa.
O trabalho de tirar todos os pacotes de dólares do cofre não demorou muito e o Dr. Reynaldo teve que dar algumas dicas para as procuradoras, na hora em que começaram a contar o dinheiro.
Ele lhes disse que, aparentemente, o dinheiro estava separado em maços de mil dólares e juntados em pacotes de dez mil. Um ou outro pacote estaria arrumado de diferente forma e ele iria ajudá-las a separar esses pacotes irregulares dos uniformes.
Sugeriu a elas só para contarem as cabeças dos maços e a quantia de pacotes. Providenciou uma folha de papel para Mariazinha e ele. Glorinha já tinha suas anotações.
Após três horas de contabilidade e muita saliva nos dedos, chegaram a um total aproximado de US$16.580.000,00 (dezesseis milhões, quinhentos e oitenta mil dólares). Mariazinha, tonta, de tanto espirrar o rico ácaro impregnado nas notas de cem dólares e de contar sua riqueza, repentina e independente, sugeriu um descanso de 15 minutos para tomarem água e usarem o banheiro feminino. Depois fariam uma rápida conferência nos pacotes amontoados por todo o banheiro. Glorinha concordou com a sugestão e convidaram Dr. Reynaldo a se retirar, juntamente, com elas para o breve descanso. As duas não deixariam aquele advogado, manco, misterioso, sozinho com os seus dólares.
Mariazinha fechou o banheiro e a porta do escritório de seu pai com a chave. Todos os três beneficiários se dirigiram, novamente, para o salão de reuniões, no outro lado do corredor. No caminho, por trás das divisórias, onde se via uma dezena de burocratas trabalhando, ninguém se atreveu a fofocar sobre o tema da reunião, muito menos querer saber sobre o que estavam discutindo, ora na sala de reunião, ora no escritório do Presidente. Alguns dos funcionários, com bastante tempo de casa, reconheceram a filha de D. Filho, agora mais velha.
As procuradoras de D. Filho tomaram suco de maracujá gelado e foram para os banheiros. Dr. Reynaldo aproveitou e ligou para o seu motorista de taxi que o aguardava e lhe disse que ele e seu ajudante poderiam subir às dezoito horas com duas sacolas, vazias, número três. Seu nome estaria na lista dos autorizados a entrarem no andar da Presidência.
Recuperadas e de mãos lavadas de todo aquele cheiro de dinheiro embolorado, as procuradoras estavam ansiosas para voltarem ao caixa forte.
Na passarela do corredor entre o salão de reuniões e a sala do Presidente, outra vez foram observados pelos funcionários que nunca poderiam imaginar que a poucos metros de seus cubículos de trabalho estava uma montanha de dólares envelhecidos, mas que com um pouco de pano úmido e um bom secador de cabelos as milhares faces de Mister Benjamim Franklin voltariam a sorrir, de cara limpa.
Acostumada a trabalhar dez horas por dia por um minguado salário, Glorinha refizera os cálculos de seu presente uma dezena de vezes enquanto tirava aquele cheiro de dinheiro velho de suas mãos. Sua parte seria mais ou menos de US$ 829.000,00 (oitocentos e vinte nove mil dólares). Trabalhava com D. Filho havia sete anos anos e a única coisa que conseguira comprar com seu salário fora um apartamento de dois quartos, em Pinheiros, e um carro novo a cada três anos. Devia a metade de seu apartamento para o Banco, mas o carro já estava quitado. Enquanto esperava Mariazinha abrir a porta do escritório do Presidente, pensara que já era tempo de receber o bônus que D. Filho sempre prometia dar-lhe um dia.
Mariazinha também era rápida no gatilho e já sabia exatamente quanto seria a sua parte. Agradecia a Deus por ter sido aproximada de tão competente e inteligente advogado que só falava com ela, pessoalmente, proibindo-a de falar ao telefone sobre duas reuniões que tiveram na semana passada. Torcia para que, na recontagem dos pacotes, aumentasse, mais ainda, o dinheiro nunca usado.
Voltaram ao banheiro milionário e desta vez, somente, contaram os pacotes já separados de dez mil.
Em uma hora de recontagem, foram unânimes em totalizar US$ 40.000,00 (quarenta mil dólares) a mais no tesouro de D. Filho.
Dr. Reynaldo ajudou as duas procuradoras a repartirem os dólares e sugeriu que a parte que iria ser doada às ONGs deveria ser trocada em reais para não terem problemas com o fisco.
Separou os US$ 2.493.000,00 (dois milhões quatrocentos e noventa e três mil dólares) para a execução de projetos das ONGs premiadas. Em seguida separou a parte dos 60% pedida por D. Filho para saudar seus compromissos e colocou em um lado separado no banheiro que cheirava a ricos fungos.
Pediu a Glorinha que autorizasse seus dois estagiários a subirem para lhe dar uma mão com tão importante e pesada tarefa.
Mariazinha pediu também a Glorinha para providenciar dois sacos de plástico de lixo, não transparente, para levar, naquele dia mesmo, sua parte.
Enquanto Glorinha procurava alguém do setor de limpeza para trazer meia dúzia de sacos de plástico pretos, interfonou para a segurança da portaria, liberando a subida de dois estagiários do escritório do Dr. Reynaldo. O advogado sugeriu, em voz baixa, para Mariazinha que os documentos do cofre poderiam garantir, se ela assim quisesse, até a cadeira de presidente do Grupo. Seria interessante que ela, em outra ocasião, sem comentar com Glorinha, antes do regresso do Pai, levasse para um lugar seguro os documentos. Agradeceu Mariazinha por ter trazido a chave verdadeira do Cofre e a alertou, mais uma vez, que os telefones dela, de sua mãe e da empresa estavam grampeados. Após a entrega dos prêmios às ONGs, o seu pai seria libertado imediatamente e ele mesmo negociaria com a seguradora e a polícia. Tudo daria certo no fim. Até os seguranças baleados receberiam um bônus especial em dinheiro.

A volta ao poder

Irene recebeu seu filho com muita emoção e aos prantos.
Estava acomodada, na suíte presidencial, no Maksoud Plaza Hotel. Fora reconhecida pelo gerente de plantão, quando entrara no lobby do hotel, com sua pequena valise de mão. O esperto gerente a convidou para esperar suas visitas na suíte. Cortesia da casa, oferecera ele, orgulhoso de receber, em seu hotel, uma das mulheres mais ricas do país, sem reserva prévia e vestida casualmente. No lobby do hotel, pelo menos duas revistas a tinham na capa como a nova benemérita dos projetos sociais do Brasil.
Antônio, também, muito emocionado não largava sua mãe dos fortes abraços e beijos que ela lhe dava sem parar. Dr. Moisés e Júlio assistiam emocionados ao encontro materno. Júlio não resistiu e, aos soluços, quase levou consigo o valioso e inteligente advogado aos prantos.
Ali ficaram se olhando, todos cheios de lágrimas, cheios de alegria, cheios de alívio. Até que Irene desabafou comentando que não comentaria, no momento, sobre o seu seqüestro. Somente mencionou que fora muito bem tratada e queria ir para casa celebrar, a sós, com seu filho o retorno de sua longa viagem.
Todos, emocionados, concordaram com a idéia. Irene teve que ir ao banheiro, antes de sair, para retocar sua maquiagem borrada pelas lágrimas dela e de Antônio. Enquanto isso, Antônio perguntava, em voz baixa, o que eles acharam de sua mãe ter sido entregue em um outro lugar não combinado.
Dr. Moisés respondeu rapidamente que fazia parte do jogo.
Nós pagamos o que eles pediram, e como eles ainda tinham Irene nas mãos, resolveram entregar em um lugar neutro e seguro.
O jogo acabou! Agora vamos tomar mais cuidado, e quando a Doutora Irene se recuperar, decidiremos como agir. Vamos todos para a casa descansar e celebrar um final feliz...
Irene saiu do elevador panorâmico, abraçada com o filho e logo foi cercada por oito seguranças que a aguardavam no lobby do hotel. Ela avistou o gerente do Maksoud e lhe deu um sinal para que se aproximasse. Apresentou o filho, Antônio, agradeceu pela gentileza prestada. Antônio lhe passou o seu cartão de visita da VÊNUS e saiu, de mãos dadas, com sua mãe em direção à porta.
Entraram em um blindado, importado, com dois seguranças e foram para a casa, seguindo outro blindado e seguidos por mais um, lotado de seguranças. Irene, emocionada, não notou a ausência do Careca.
Sua mãe e sua irmã a esperavam ansiosamente na mansão do Morumbi. As duas sabiam o tempo todo do seqüestro de Irene, mas, em nenhum momento, comentaram fora do círculo da família o ocorrido. Sofreram juntas, caladas, o retorno de Irene. Para aqueles que perguntavam de Irene, a resposta era a mesma que a imprensa paulista havia publicado.
A festa dos quatro durou até as três da manhã e Irene não deixou ninguém ir embora para suas casas. Todos dormiram na residência de Irene. Nina, assustada e feliz, com o regresso da patroa, providenciara os drinks e enquanto arrumava a cama para os hóspedes familiares pensava se a cadela daquele policial, amigo, teve alguma coisa a ver com o retorno da Doutora.
Irene, que agora se encontrava livre e em seu território, amargava, silenciosamente, as saudades de Yves, sozinha, em seu vasto quarto. Não dormira o resto da madrugada, sabia que não queria esquecer aquele homem que acendera nela, novamente, a vontade de amar e ser amada.
Passou dois dias em casa se aclimatando e pensando em como encarar sua família, particularmente seu filho e seus dois diretores que tanto a ajudaram a resolver um capítulo emocionante e dramático de sua vida. Resolveu seguir o conselho de Yves e não abrir o jogo com ninguém, sobre a sua nova paixão, até que ela decidisse o que realmente queria da vida.
Antônio mudara-se temporariamente de volta para sua antiga suíte na casa de sua mãe, colocando-a a par dos negócios da VÊNUS.
Irene convidou a namorada de Antônio para um jantar a três e se sentiu renovada com o romance dos dois jovens. Aproveitou a oportunidade para dizer que voltaria ao trabalho no outro dia de manhã. Antônio quis lhe sugerir mais tempo para ela descansar, mas, no meio do conselho, mudou de idéia quando sua mãe pediu para ele indicar onde ele via cansaço nela.
Na quarta feira, cedinho, ligou para a Limoeiro e acordou o Dr. Marcílio para saber se seu novo cavalo chegara bem de viagem. O veterinário, ainda com voz de dorminhoco e surpreso com a voz da patroa, respondeu que o cavalo estava bem e foi colocado em uma baia especial para quarentena. Hoje, ele iria fazer todos os testes de prevenção veterinários para depois estabelecer o estábulo permanente.
Irene, rindo, disse que o cavalo estava muito bem de saúde e que ela já conhecia seus hábitos, mas se ele quisesse fazer uns testes e se estes não fossem machucar seu cavalo que poderia fazê-los.
Caso contrário, deixe Copper do jeito como ele chegou. Está bem?
A Doutora é quem manda, concordou o veterinário, perguntando a seguir onde ela tinha conseguido o campeão americano.
Que história de campeão é essa? perguntou Irene, intrigada.
Dr. Marcilio imediatamente se deu conta que a Doutora não tinha visto os papéis do cavalo.

Continuando a conversa, perguntou se ela tinha lido as revistas que publicaram reportagens sobre Copper, anteriormente chamado de Fast Sagittarius. O cavalo, desde os dois anos de idade, tinha ganho todos os concursos de que participara.
Aqui na fazenda temos em duas de suas revistas a foto dele na capa. No ano passado, foi o campeão nacional americano.
Irene, irradiando alegria, pediu para o Dr. Marcílio formatar um dossiê completo sobre o Cavalo e mandar, naquele dia mesmo, para São Paulo via SEDEX antes das dez horas. Caso não desse tempo, ela mandaria um avião buscar o dossiê.
Use a Internet e vá na origem do Cavalo, parece-me que o nome da antiga proprietária é a Sra. Thora, do Colorado. Tenho quase que certeza que foi ela quem exportou Copper para o Brasil.
Mãe e filho saíram escoltados para o trabalho. No caminho Irene perguntou ao filho por onde andava o Careca e quem era o novo diretor da segurança da VÊNUS.
Antônio respondeu que o Careca tinha se demitido, mas o Dr. Moisés preferiu dispensá-lo, com salário integral, até que ela voltasse. Quanto ao novo diretor da segurança, veio muito bem recomendado e foi escolhido entre cinco candidatos, é um ex-oficial da FAB.
Irene, receosa, em aprofundar mais o assunto, perguntou como estava as posições do Banco em relação ao dólar...
Assim que chegaram no moderno edifício envidraçado na sede da VÊNUS, Irene notou a mudança no procedimento da segurança na empresa. Animada, subiu no elevador privado da diretoria acompanhada de seu filho e dois seguranças.
Irene foi direto para sua sala e sentou-se, novamente, em seu trono. De lá, avistava o Rio dos Despejos, a engarrafada Marginal Pinheiros, os bairros do Real Parque, Morumbi e a favela Paraisópolis. Um pouco mais à direita, o Palácio do Governo.
Dr. Moisés e Júlio a esperavam no salão de reuniões. As secretárias, nervosas, aparentavam uma sobrecarga de trabalho, caminhando rápido, com salto altos, de um lado para outro.
Irene agradeceu aos dois diretores pela ajuda, altamente profissional, e pediu para que se sentassem. Antônio acomodou-se ao lado direito de sua mãe e os outros dois no lado oposto da mesa de granito pérola, vindo do nordeste.
Dr. Moisés lhe passou um relatório, minucioso, de todas as atividades do Grupo, desde a sua partida inesperada da Limoeiro, em 7 de setembro de 2003, até a última sexta-feira, 28 de novembro de 2003.
O Sr. Júlio lhe passou, também, o seu relatório financeiro e, em uma pasta à parte, a contabilidade, intrigante, dos vinte milhões de dólares gastos com seu seqüestro.
Antônio assistia, em silêncio, a explanação dos dois diretores e quando Irene se deu por satisfeita, pedindo até o próximo dia para digerir os dois relatórios, Antônio perguntou qual seria a linha de ação com respeito aos seqüestradores, negociadores da RELEASE e a polícia.
Irene, aparentemente, sem demonstrar nenhum nervosismo respondeu que, por enquanto, iriam agir como se nada tivesse acontecido.

Paguem os negociadores e cancelem o contrato. Quanto à polícia não vamos incomodá-la com outro B.O. de um seqüestro já resolvido e, com respeito ao nosso dinheiro, no ano que vem, vamos recuperá-lo trabalhando com mais cuidado.


Dr. Moisés, sorrindo, acolheu, prontamente a sábia decisão de sua presidente. Ao mesmo tempo imaginava como teriam sido as negociações e chantagens que Irene teve que resolver sozinha em seu cativeiro.
Passou para a quarta pauta da reunião que tratava da nova imagem da Senhora Irene Lafayete Fontoura perante a sociedade brasileira. Havia uma pilha de jornais, revistas e vídeos das reportagens que veicularam a entrega das doações milionárias às ONGs eleitas pela VÊNUS, como exemplo de instituições que se dedicavam a desenvolver projetos visando a melhoria de vida do povo brasileiro. Havia, também, centenas de telegramas e e-mails de políticos, empresários e autoridades paranabenizando-a pela nobre iniciativa. Uma fila enorme de repórteres esperavam seu regresso do exterior para entrevistá-la.
Irene, orgulhosa, agradeceu ao Dr. Moisés e ao Júlio, novamente, pela colaboração e dedicação ao Grupo, acenando com um aumento em seus bônus anuais.
Antônio apresentou a quinta pauta da reunião, colocando na mesa, em frente de sua mãe, o dossiê do novo Diretor de Segurança Institucional, comentando que ela teria a última palavra sobre a contratação, definitiva, ou não do novo diretor.
Irene, apreensiva, abriu uma pasta azul do departamento de R.H. e começa a ler as informações sobre seu novo diretor.
Major Francisco do Nascimento – 58 anos – aposentado da Força Aérea Brasileira – FAB. Casado, pai de três filhos e avô de 4 netos.
Recomendações foram dadas pela Presidência da República, FAB, Ministério da Defesa e duas multinacionais nas quais deu assessoria na área de segurança até ser contratado pela VÊNUS.
Especialista na área de segurança eletrônica, espionagem industrial, proteção a militares de alta patente e, ultimamente, a presidentes de multinacionais. Estagiou na Inglaterra, USA e Espanha. Falava fluentemente inglês e espanhol.
Irene, aliviada ao ver a foto do Major, pediu para ter uma reunião a sós com o Major Francisco, assim que terminassem a pauta do dia.


Estevão ganha outra aposta, mas paga o jantar


O Major Francisco do Nascimento entrou no suntuoso escritório da presidente do Grupo VÊNUS e foi recebido por Irene com um sorriso estampado no rosto.
O major, acostumado, com altas patentes, se sentiu à vontade para sua primeira entrevista com a presidente. O salário era o dobro do que ganhava nas multinacionais e o escritório da VÊNUS ficava a cinco quarteirões de seu apartamento.
Com o dossiê do Major Francisco na sua frente, Irene perguntou se ele poderia ser mais específico quanto a sua resposta, no formulário do RH, sobre como ele ficara sabendo da posição aberta na VÊNUS.
Na resposta, o Senhor disse FAB, comentou Irene, olhando nos olhos de Francisco.
O Major, corrigindo sua resposta, respondeu prontamente que fora, indiretamente, através da FAB, ou seja, um ex-colega de Asas do tempo em que trabalhavam juntos no serviço de inteligência da FAB.
Eu poderia saber o nome de seu ex-colega de Asas? perguntou Irene.
Eu vou responder a sua pergunta por dois motivos, respondeu o Major com a voz firme. Primeiro, é um direito seu, e, principalmente, porque trata-se de sua própria segurança. Segundo, a pessoa que me recomendou, autorizou-me a mencionar seu nome, uma vez que ele previu que a Senhora poderia questionar a minha escalada até aqui. Não sei se a Senhora o conhece pessoalmente, ou não, mas ele geralmente não detalha as razões de seus pedidos.
Essa pessoa é o Coronel Aviador Estevão Montes do Amaral.
O Coronel pediu baixa da FAB em 1999. De vez em quando jantamos juntos e colocamos os assuntos em dia. No mês passado, preocupado, com sua inadequada segurança, ele me recomendou a posição sem garantias de que eu conseguiria ou não o emprego que eu não estava procurando.
O Major Francisco continuou a explicação à sua Presidente, dizendo que no mundo dos serviços de Inteligência, sejam eles militares ou civis, a comunidade faz favores uns aos outros.
Estou aqui pagando um favor que devia ao colega e, sem dúvida, atraído pelo dobro do meu salário de onde estou de saída.
O meu dever, de agora em diante, é protegê-la a todo e qualquer custo e essa proteção obviamente se estende ao seu filho, a familiares e às empresas. Enquanto esperava pelo seu retorno já fiz uma varredura completa nos telefones da VÊNUS e das suas residências. Achamos um grampo em duas linhas da VÊNUS e em uma linha telefônica da sua residência, no Morumbi. Já trocamos os números e é melhor daqui para a frente, para falar com a família, usar os celulares. Use os telefones convencionais só para negócios comerciais.
A presidente agradeceu ao Major pela sinceridade e objetividade de sua resposta dizendo que estava pronta para receber as novas instruções sobre a sua segurança e a de seu filho.
Em outra ocasião gostaria de saber mais sobre o novo sistema de segurança a ser implantado nas empresas do Grupo.
Os dois selam o contrato com um aperto de mão e antes de o Major se retirar, Irene perguntou se ele também praticava o pára-quedismo.
Francisco que não esperava pela pergunta, respondeu que fez uns cem saltos em toda sua carreira na aeronáutica. Nada que se comparasse a Estevão, o Ás de Ouro da FAB.
Irene, trêmula, acompanhou o Major até a porta. Não tinha mais dúvidas de que Yves era o mesmo Ás de Ouro da FAB ou o Coronel Estevão Montes do Amaral.
Irene com as recentes notícias sobre Fast Sagittarius e Estevão, não resistiu a tanta emoção e decidiu chamar seu Ás no celular especial, recebido de presente, em sua viagem de ambulância pelo interior paulista e ruas da Capital.
O telefone celular internacional de Estevão tocou três vezes até que foi atendido.
Irene perguntou:
Poderia falar com o Ás de Ouro, por favor?
Estevão respondeu:
Quem gostaria?
Irene, emocionada, respondeu rindo e chorando:
É a lady Amazonas.
O Ás de Ouro, confidente, começou a falar sobre o que estava pensando.
OK! OK! Lady Amazonas eu estava justamente pensando em você nesse momento. Gostaria de lhe comunicar que ganhei uma aposta recentemente, e estou de partida para Paris. Você gostaria de me encontrar lá? Pelo que entendi eu pagarei o jantar....
Lady Amazonas lembrou-se da aposta sobre o D. Filho e respondeu rindo, enquanto chorava.
Que dia e onde é o encontro?
O Ás de Ouro respondeu:
De 14 a 21 de dezembro, no Four Seasons Hotel George V, ao meio dia. Se você concordar eu faço as reservas.
Lady Amazonas falou, sem os soluços:
Estão confirmados a data e o local. Até lá, meu querido Ás.
Estevão, sorrindo, desligou o celular e voltou a se concentrar no ESTUDO, em que finalizava os últimos detalhes da missão MATE QUENTE.
Irene, ainda emocionada, desligou o celular e chamou Antônio no interfone convidando-o para almoçar juntos e saber o que ele gostaria de planejar para o Natal.

Dois áses se encontram

Eles se conheceram em 1983, em Langley, Estado da Virgínia nos Estados Unidos. Ambos participavam de um treinamento de seis meses sobre Inteligência e Contra Inteligência na sede da CIA – Central Inteligência Americana. O treinamento fazia parte de um convênio assinado previamente entre os governos do Brasil e dos Estados Unidos.



Fernando Costa de Mauá

Nasceu no Rio de Janeiro em 1953. Seu pai foi engenheiro civil do Exército e foi para a Reserva com a patente de General.


Fernando cresceu em destacamentos e vilas militares pelo Brasil afora. Como nunca residiu por longo período de tempo em lugares fixos, seus amigos de infância e adolescência foram temporários.
Aos 15 anos, foi para o Colégio Militar e de lá, com as melhores notas da turma, colocou-se em primeiro lugar na admissão para a Academia Militar de Agulhas Negras, onde, brilhantemente, após sua graduação, seguiu recebendo promoções até chegar a patente de Tenente Coronel.
Sua carreira no exército se concentrou na área da Inteligência.
A mando do Exército, esteve em Israel, Inglaterra e nos Estados Unidos aprendendo e aperfeiçoando seus treinamentos em espionagem e contra-espionagem, Contra Terrorismo, Combate à Guerrilha Urbana e Rural.
No Brasil, foi o criador de um método denominado Técnicas de Sobrevivência na Selva, o qual o Exército brasileiro exportou para o exterior. Reestruturou e modernizou, secretamente, o serviço de inteligência do Exército antes de pedir baixa, voluntária, em julho de 1999.
Sua última tarefa no serviço secreto do Exército foi fazer um levantamento dos grupos que reivindicam terras e moradias, organizações estudantis, sindicatos, alguns partidos políticos de esquerda, centro e de direita, e, para seu próprio benefício, levantou a vida dos empresários mais ricos do Brasil, entre eles políticos corruptos e corruptores.
Fernando usou, como cobaias, esses setores da sociedade para treinar seu pessoal da Inteligência.
Seus amigos de fardas se surpreenderam com a notícia repentina de que ele, Fernando, estava saindo do Exército. Era difícil acreditar que deixava uma brilhante carreira inacabada.
Para os poucos que se atreveram a perguntar o motivo da baixa voluntária, Fernando respondeu:
- Meu Pai e eu já contribuímos bastante para a Instituição. No momento não acho espaço para crescer. Não me refiro chegar até General, isso seria até fácil. Mas não é o que quero. Para fazer o que eu quero tenho que sair do Exército e lá fora estarei livre para agir à minha maneira.

Estevão Montes do Amaral

Nasceu em Campo Grande, Estado do Mato Grosso em 1954. Filho de fazendeiro. Passara sua infância na fazenda de seus avós onde estudou seus primeiros livros. Sua mãe lecionava na escolinha da fazenda para ficar mais tempo com o filho. Estevão teve uma infância sadia, alegre, com muito estudo e atividades ligadas ao cotidiano do interior, lidando com gado, cavalos e colheita de café.


Em seu aniversário de sete anos, seu padrinho, Arlindo, lhe dera de presente o primeiro avião. Um brinquedo de madeira envernizada, com asas, que guarda até hoje entre os troféus que recebera ao longo de sua carreira. Desde esse dia, Estevão, nunca mais parou de pensar em aviões.
Sua visão de 20 x 20, perfeita para quem quisesse seguir a carreira de piloto civil ou militar. Aos 16 anos, iniciou o seu curso para piloto privado no aero-clube local. De lá para a Academia da Força Aérea Brasileira, em Pirassununga, no Estado de São Paulo, foi um pulo rápido e ambicioso para um caipira do interior.
Apreendeu inglês e francês com facilidade, apesar de preferir o inglês como idioma. Sua carreira na Força Aérea Brasileira não tinha limites.
Iniciou seu treinamento na Força Aérea Brasileira – FAB, voando o Uirapurú (aeronave triciclo, de treinamento fabricada pela Neiva), apesar de ter iniciado sua carreira anteriormente com o CAP-4 (aeronave convencional, fabricada pela Companhia Aérea Paulista).
Teve uma rápida passagem de treinamento pelo AT-6 (aeronave de treinamento americana incorporada à FAB após a II guerra mundial).
Mais tarde teve, também, oportunidade de, como piloto de caça, voar o Xavante e o F 15.

Em 1990, foi para Brasília onde começou a trabalhar na área da Inteligência da FAB. Foi um dos primeiros a reclamar que os vôos civis e militares no norte do Brasil estavam completamente desprotegidos. Sugeriu a instalação de radares em pontos estratégicos da Amazônia.


Sua idéia serviu, mais tarde, para outras patentes desenharem o projeto SIVAM.
Para eliminar a dependência do Brasil com os franceses, na área de infra-estrutura aeronáutica e do lobby brasiliense daqueles que os apoiavam no Brasil, trabalhou secretamente para que uma companhia norte-americana, ganhasse a concorrência para as instalações do SIVAM na Amazônia.
Em maio de1999, após a morte de seu pai, subitamente pediu baixa da FAB para surpresa de seus superiores e dos poucos amigos de asas.
Estevão, após sua saída abrupta da FAB, viajou para os Estados Unidos, onde visitou shows aéreos e exposições de armamentos. Esteve em Los Angeles onde pilotou alguns jatos de propriedade dos Warbirds. Esteve em cinco diferentes locais para saltos de pára-quedas sendo o último em De Land, capital mundial do pára-quedismo, no Estado da Flórida onde fez uma reciclagem técnica sobre novos equipamentos e saltos.
Antes de regressar ao Brasil, visitou alguns conhecidos dos velhos tempos que conhecera quando estagiou na CIA.
Chegando ao Brasil, estabeleceu-se em São Paulo onde começou sua própria companhia de taxi aéreo. Nos fins de semana, anonimamente, praticava um ou outro de seus esportes favoritos, pára-quedismo e tiro ao alvo.
Os seus negócios com a companhia de taxi aéreo corriam razoavelmente bem. A atenção era redobrada em épocas eleitorais quando seus aviões não paravam nos hangares. Não era nada fácil receber dos políticos que contratavam seus serviços. Após as eleições, aqueles que ganhavam, pagavam com benesses; já os perdedores, poucos parcelavam o que podiam pagar e o resto dava o balão.


O convite

Era um domingo de fim de mês. Estevão dispensara seu caseiro e estava só em casa, aproveitando a chuva para lavar o canil de suas quatro Pit Bulls e uma Rott Bull (mestiça de Rottweiller com Pit Bull). No momento, as cinco cadelas eram a família de Estevão.


Ginger, músculos e corpo perfeito, cor de mel, era comparada com um cavalo quarto de milha.
Mask, branca com uma mancha negra em um dos olhos. A mais feroz e esperta da casa. Assassina convicta de outros cães que não fossem de sua raça ou família. Atacava seres humanos não reconhecidos, também.
Jaguá e Pantera, filhas de Ginger com Beethoven. Estavam com um ano e meio, seguindo a trilha da mãe.
Spanky, a mestiça brazina escura que durante à noite se tornava invisível. Treinada para defender a casa de qualquer estranho, a qualquer custo.
Depois de várias tentativas com raças diferentes de cães para guarda, Estevão se decidiu pela raça Pit Bull. Para obter melhores resultados com a segurança e limpeza da casa, só criava fêmeas.
Havia uma frente fria em todo o Estado de São Paulo e os locais para salto de pára-quedas, com certeza, estariam fechados. Poderia ter ido praticar tiro ao alvo, mas resolveu se auto-escalar para passar o dia em casa.
Ficou surpreso quando a campainha do portão tocou. Não esperava ninguém. Foi até a cozinha e olhou em um dos monitores que controlava o portão da rua.
Alguém do lado de fora, na calçada, usava um guarda-chuva, óculos escuros, boné americano e uma sacola na mão. Impossível de ser reconhecido pela câmera fixada no canto do muro alto, do lado direito do portão. Esta câmera transmitia a imagem da frente da casa, na calçada e parte da rua. Fernando comandou um zoom em outra câmara colorida LG que ficava do lado esquerdo do portão, mas a única coisa que conseguiu ver em seu monitor foi um guarda-chuva molhado cobrindo o rosto e ombros de quem tocara a campainha.
Estevão ligou o interfone e perguntou quem era.
Aqui é o Verde Oliva, que também pediu a conta recentemente.
Estevão se surpreendeu, com alegria, quando reconheceu a voz vinda pelo interfone. Respondeu que já iria abrir o portão, mas antes tinha que prender seus animais.
Ao abrir o portão do muro alto, Estevão saudou Fernando dizendo que não fora ao salto de pára-quedas por causa do mau tempo, mas que a chuva lhe trouxera uma ótima surpresa.
Fernando respondeu que com chuva era mais fácil encontrar as pessoas em casa, principalmente quando o caseiro estava de folga.

Como é que você sabe? perguntou Estevão.


Não sabia. Deduzi quando você teve que prender os Pits e veio abrir o portão, respondeu Fernando.
Os dois se encaminharam para a sala de estar e Estevão lhe perguntou porque ele não tinha telefonado antes, para avisar que viria.
Fernando não lhe respondeu. Tirou de uma sacola de nylon duas caixas que entregou a Estevão dizendo?
São dois presentes para você. Quando nos encontrarmos no futuro, ligarei antes.
Estevão abriu as caixas e notou em que em uma delas havia um telefone Celular Motorola, pequeno, de dobrar. Na outra caixa havia outro telefone um pouco maior com uma antena que saía em ângulo do lado do aparelho.
Para que isso? Perguntou.
Bem! depois que eu relatar o motivo da minha visita aqui, sem aviso prévio, e se você aceitar o convite que vim lhe fazer, você terá que começar a usar esses aparelhos para nossa própria segurança.
O Motorola é um-pré pago comprado em nome de um Acerola no Rio de Janeiro e o outro é um Celular Internacional via satélite, registrado no Chile, em nome de outro Acerola. As contas são debitadas automaticamente em bancos nos nomes dos Acerolas.
O truque, no futuro, é não usar o telefone pré-pago nas imediações de sua residência ou escritório. Caso haja uma investigação por qualquer motivo, as companhias de telefone identificam as antenas que transmitem ou recebem as chamadas. E da antena para a sua casa é um pulinho, explicou Fernando.
Já sei disso, falou Estevão, apontando um Nokia desligado em um móvel da sala dizendo a Fernando que aquele tinha as mesmas manhas do Motorola e que era só para receber e chamar, longe de casa.
Continuou explicando que, de vez em quando, tinha que chamar algumas namoradas comprometidas com outros, além dele. Uma delas é a ex-esposa de um investigador da Policia Federal.
Esse pessoal, como você bem sabe, é viciado em grampos telefônicos.
Na maioria das vezes, só ligava o celular em shopping centers ou a caminho do trabalho para chamar ou ler os recados da caixa postal.
Vejamos! continuou falando Estevão, olhando nos olhos do amigo. Estou recebendo a ilustre visita de um recém-ex-militar da inteligência que não gosta de anunciar seus planos dominicais por telefone convencional. Ganho de presente mais dois telefones celulares novos.
A visita é para me fazer um convite...
OK! OK! Sou todo ouvidos, vamos ouvir o misterioso convite.
É uma história parecida com a sua no que se diz respeito à minha baixa voluntária do Exército, continuou Fernando.
No fundo, dentro de nós, somos bastante parecidos. Temos os mesmos ideais políticos, gostamos de viver bem, somos da mesma idade, sabemos muito sobre poucos e poderemos ensinar a outros o que sabemos.
Vejo com clareza e objetividade que fora das Forças Armadas poderemos criar e fazer coisas que não poderíamos nem pensar antes, se estivéssemos ainda nos quartéis.
Acho que descobri uma fórmula para aproveitar nossas experiências militares de uma maneira prática, objetiva e bastante compensadora, tanto no sentido financeiro como no sentido idealístico.
OK! Já estou quase que convencido, comentou Estevão.
Fernando continuou:
Vamos criar um movimento político novo. Não será, obviamente, de esquerda e nem tampouco muito à direita. No primeiro instante, o movimento será clandestino e armado. Depois o movimento evoluirá e terá força e rumo próprio. Poderíamos chamá-lo de MOVIMENTO BRASILEIRO NACIONALISTA, o MBN. Ou, mais tarde, de PBN ou simplesmente PB. Até lá, os mais fervorosos afiliados conseguirão uma denominação mais do que apropriada.
Nós, obviamente, ficaremos com a parte militar do Movimento. Não vamos participar, oficialmente, do MBN. Já tenho os Acerolas que farão isso. Você, se quiser, pode indicar alguns também.
Eu e você conhecemos pessoas e poderíamos recrutar outras para formar e treinar as células iniciais do movimento. Para começar, eu comando duas, e você, duas. Elas serão bem pagas, com contas e nomes falsos no Brasil e no exterior. Obviamente, como você bem sabe, elas não vão se conhecer entre si. Depois essas células vão se multiplicar até que o movimento esteja bem estruturado, com capital e representatividade em todos os estados da União. Isso feito, os membros das células se afiliarão ao partido, até lá, legalizado, que se engajará democraticamente no sistema eleitoral colocando seus constituintes no poder.
Estevão interrompeu Fernando para fazer um comentário.
É exatamente o que esquerda fez, no Brasil, para chegar até onde está agora. Eventualmente, ou quem sabe, nas próximas eleições conquistem o Planalto de uma vez por todas. Agora que saíram da clandestinidade e substituíram suas armas por ternos e gravatas Giorgio Armani. Inteligentemente, começaram a usar os microfones e a TV para entrarem em nossas casas com suas barbas, já, grisalhas. Mas o objetivo continua o mesmo dos anos 60.
O topo do poder.
Concordo com você, disse Fernando. Mas nas décadas de 60, 70 e 80, em nome da democracia, eles, também, começaram, na clandestinidade e fizeram até alguns seqüestros. Mais tarde, com a abertura política e o fim da guerra fria, a esquerda e a imprensa conseguiram minar a resistência dos militares e ganharam a simpatia do povo no grito, nas ruas e na TV, ou pelo microfone como você bem colocou.

Em plena democracia, até hoje, culpam, a ditadura pelos maus que afligem o Brasil, do Arroio ao Chuí, não contabilizando que já estão em plena democracia, quase que o mesmo período que o governo militar ficou no poder. Naquela época, pelo menos, existiu planejamento para o desenvolvimento.
Até os políticos que nasceram e cresceram à sombra dos militares, hoje posicionados entre a direita e a canhota, também culpam os militares angariando votos dos eleitores amnésticos.
O poder é ascendente e só levará a um lugar, onde tanto a direita como a esquerda querem permanecer.
O topo do Planalto... Brasília.
A minha previsão é de que quando a esquerda ganhar totalmente Brasília, pela TV, sem dar um tiro sequer, usando a arma mais poderosa do novo milênio, o microfone, eles ficarão embriagados pela altura nunca alcançada e logo ficarão sem o oxigênio necessário para permanecer no topo.
O oxigênio poderá faltar, na hora em que os brasileiros começarem a perceber que a esquerda, que antes andava de Lada, passou a dirigir BMWs, usar celulares digitais fosforescentes, ternos Giorgio Armani e sorrir de aparelhos nos dentes, igual às recentes estrelas do futebol brasileiro. Nessa hora, realizarão que o povão continua tão pobre quanto antes ou até mais.
Nesse momento nós estaremos prontos para entrar em ação e logo, o mesmo povo, alegre, desprovido de memória e sedento de novos mocinhos na TV, apoiará uma opção nova no cenário político brasileiro.

Apoiará o MBN na TV.
Por outro lado, o MBN não precisará da ajuda dos militares para chegar ao topo, e a esquerda terá dificuldades em ter a ajuda que precisará deles para nos combater.
Hoje, a esquerda está se movendo para a direita, e a direita para não despencar do topo vai para a esquerda. O truque, então, é usarmos os mesmos meios, iniciais, que a esquerda usou para se estruturar politicamente. Aproveitar, também, as técnicas militares que aprendemos nesses últimos anos de quartéis. Copiar o know how metodológico dos recentes evangelistas para arrebanhar novos seguidores, que por sinal, é muito melhor do que a da Igreja Católica que, no momento, perde o mercado. Não esqueçamos que em 64 a Igreja apoiou os militares, mas depois virou a casaca. E, para finalizar, negociar com os maiores empresários do Brasil e prometer a eles o mesmo ovo de ouro que tanto a Direita e a Esquerda prometem.
Nós não vamos fundar mais uma religião. O Brasil já está cheio delas e tampouco vamos sair por aí distribuindo livrinhos colorado do Mao ou os dos intelectuais Marx e Lennin. A Esquerda, também, já fez isso, muito menos vamos levar mais outro General para a presidência em cima de um tanque de guerra. Esse filme nós já assistimos. E só vai ter reprise quando o Tio Sam autorizar.
Hoje o Planeta, em fase de globalização, é outro, e existem meios mais fáceis para arrebanhar simpatizantes para uma causa política, principalmente quando os governantes e as classes dominantes não conseguem realizar o sonho de um povo que, no momento, sobrevive de forró, futebol, carnaval e cachaça.
O que salva ainda os brasileiros é que, por enquanto, somos considerados o último povo alegre do Planeta. Essa situação nos coloca em primeiro lugar na fila dos esperançados, e, para que essa alegria restante não morra de vez, precisamos criar um novo remédio.
O MBN poderá ser essa injeção animadora para os brasileiros que também sonham com emprego, dólar, carros importados, saúde, educação, saneamento básico, aposentadoria digna, Nike, Mac Donalds, entre outros vários delírios de primeiro mundo que prometeremos incorporar na dieta dos viciados em comer forró, futebol, carnaval e cachaça.
A minha ambição não é o topo, mas confesso que gostaria de iniciar um movimento político, novo, que chegue até lá um dia e, obviamente, ser muito bem pago pelos meus serviços.
Se começarmos a agir agora, em três anos o Movimento estará dando seus primeiros resultados políticos e econômicos.
Herdei um milhão de dólares em cash de uns colombianos que prendemos em Tabatinga. A quantia era o triplo disso, mas, como bom dominicano, reparti o bolo com as demais autoridades locais, para fins sociais. A minha parte quero investir no MBN.
Já sei quem tem o resto dos recursos.

O que você acha? perguntou Fernando a Estevão.
Bom! Você me fez um tipo de proposta para parceria que não se responde mais tarde. Você já sabia que eu diria um sim quanto ao idealismo.
Eu, também, tenho algumas economias escondidas e posso usar a companhia de taxi como contribuição inicial ao Movimento.
Como a parte financeira não ficou bem clara, terei que fazer duas ou três perguntas, OK? falou Estevão.
Manda! disse Fernando.
Primeiro. No que se diz respeito ao topo, também não tenho intenções nenhuma de ficar no Planalto. Como é sabido, já andei por lá trabalhando, mas o clima é muito seco para minha pele.
Quando faço vôo de grande altitude, o ar, também seca a minha pele. Entre o Planalto e voar, prefiro o último.
Segundo. Quanto tempo ficaremos engajados no Movimento e quanto será a minha parte? E para ser honesto, não entendi a parte dos Acerolas, perguntou Estevão.
Ah! Você, sempre objetivo. Por isso, disse-lhe que nossos pensamentos são iguais, comentou Fernando.
Pelos planos que elaborei eu diria que precisaríamos de dois a três anos para recrutar, armar, treinar e acomodar as quatro células iniciais. Com elas preparadas, partiríamos para a ação, imediatamente, e dentro de mais dois anos, no máximo até 2004, viriam suficientes recursos para nos pagarem e continuarem se multiplicando em direção ao topo.
Meus planos são para sairmos fora mais ou menos nesse período com aproximadamente trinta milhões de dólares, cash, cada um. Não é uma quantia astronômica, mas seria uma aposentadoria bem merecida, sem levar em conta que, durante os quatro ou cinco anos desse engajamento, estaríamos em pleno êxtase, fazendo aquilo que mais gostamos. Creio que isso, também, vale alguns milhões de dólares.
Para terminar, quero lhe explicar que o Acerola é um Super Laranja. Criei dúzias deles espalhados pelo Brasil e pelo Exterior.
Recentemente, cientistas descobriram que para encontrar a mesma quantia de vitamina C, achada em um copo de suco de acerola, são necessários sete copos de suco de laranja.

Quando começaremos? perguntou Estevão.


AUTOR: Fernandez

OBRA REGISTRADA: GUIA PARA UM SEQÜESTRO


REGISTRO Nº 289.223
PROTOCOLO 2003SP-4065 EM 30-05-2003
REGISTRADO EM 5/06/2003, NO LIVRO 523, FOLHA 383
ROMANCE – Publicado em ingles nos USA em 2014



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