Vii. Reconhecimento imune de epitopos de Nef, na forma de Opri-nef-6xHis



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VII. Reconhecimento imune de epitopos de Nef, na forma de OprI-Nef-6xHis

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VII. Reconhecimento Imune De Epitopos Da Proteína Nef, Na Forma De Proteína De Fusão OprI-Nef-6xHis, Por Anticorpos Naturais Anti-Nef De Indivíduos Infectados Pelo Vih



  1. Materiais e métodos





    1. Materiais




      1. Soros

Para a realização deste trabalho, foi seleccionada aleatoriamente uma colecção de 150 soros de indivíduos seropositivos para o VIH (VIH-1, VIH-2 ou duplos seropositivos) armazenados na seroteca da Unidade de Ensino e Investigação (UEI) de Virologia do Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT). Estes soros, com origem no Laboratório de Patologia Clínica do Hospital Dr. Fernando da Fonseca (Amadora), tinham sido previamente estudados em outras linhas de investigação a decorrer na UEI de Virologia, no âmbito de um protocolo de colaboração existente entre as duas instituições supracitadas. A recolha de dados epidemiológicos básicos (sexo, idade e nacionalidade) dos indivíduos intervenientes, bem como uma caracterização laboratorial e clínica sumária (via de transmissão mais plausível, contagem de linfocitos T CD4+, determinação de carga viral e classificação do estádio clínico da doença, de acordo com critérios da O.M.S.), foram efectuadas pela equipa do Hospital Dr. Fernando da Fonseca, enquanto que a determinação do genótipo das estirpes de VIH-1 (para o gene env) presentes em cada soro foi realizada pela equipa da UEI de Virologia do IHMT, tendo as metodologias utilizadas e os resultados obtidos sido objecto de publicação (Esteves et al., 2002, 2003). No âmbito de um outro protocolo de colaboração, em curso, entre a UEI de Virologia do IHMT e o Laboratório de Virologia do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA), encontra-se presentemente a ser determinado, pelos Doutores Elizabeth Pádua (INSA) e Ricardo Parreira (IHMT), o genótipo da estirpe viral infectante na região genómica do gene nef, para uma parte dos soros incluídos neste estudo. As metodologias utilizadas neste caso são basicamente as mesmas que as descritas em Esteves et al. (2002, 2003), com alterações de pormenor. Antes de serem testados por ELISA, todos os soros incluídos no presente trabalho foram inactivados a 56ºC, durante 30 minutos.





      1. Materiais para ELISA

As experiências de imunodetecção por ELISA foram realizadas em placas de microtitulação de polistireno, de 96 poços com fundo em U (NUNC Immuno-Plates MaxiSorp, NUNC, Dinamarca). A selecção deste tipo específico de placas de microtitulação foi efectuada pelo motivo explicitado no capítulo anterior, isto é, uma elevada afinidade para moléculas com domínios mistos hidrofóbicos e hidrofílicos, sendo este o caso da proteína de fusão OprI-Nef-6xHis, utilizada como antigénio de revestimento. O substrato utilizado para a revelação dos imunocomplexos com a peroxidase de rábano picante foi, tal como nas experiências descritas no capítulo anterior, o sistema de substrato líquido de 3,3’,5’,5-tetrametilbenzidina com peróxido de hidrogénio (TMB/H2O2) da Sigma (E.U.A.).





      1. Antigénio e anticorpo secundário (conjugado) para ELISA

O antigénio utilizado para o revestimento de placas de microtitulação utilizadas durante as experiências de ELISA foi a proteína de fusão OprI-Nef-6xHis, cuja expressão em E. coli JM109 e purificação foi descrita anteriormente (ver capítulo V). Para a determinação por ELISA dos títulos relativos de anticorpos anti-Nef da classe IgG nos soros humanos em estudo foi utilizado como anticorpo secundário uma fracção de IgG de antissoro de coelho anti-IgG humana (molécula completa) conjugada com peroxidase de rábano picante (Sigma, E.U.A.).





      1. Meio de crescimento, tampões e outras soluções

O crescimento da estirpe E. coli JM109 transformada com pVUB3, necessária para a preparação de lisados bacterianos a utilizar na adsorção dos soros humanos, foi realizado em meio mínimo M9 (Miller, 1972) suplementado segundo J. Cote-Sierra (comunicação pessoal), cuja descrição se encontra na secção 1.1.2.1. do capítulo IV. O revestimento das placas de microtitulação para a realização das experiências de ELISA foi efectuado, como citado anteriormente, com a proteína de fusão OprI-Nef-6xHis, numa solução de PBS, pH 7,25, cuja composição foi descrita na secção 1.1.5. do capítulo IV. Como nas experiências descritas no capítulo anterior, o mesmo tampão foi utilizado para preparar as soluções de lavagem PBS, pH 7,25 com Tween 20 a 0,1% (v/v) e de bloqueio PBS, pH 7,25 com BSA (fracção V) a 1% (p/v). A paragem da reacção de coloração, no final das experiências de ELISA, foi realizada com uma solução de H2SO4 0,5 M.





    1. Métodos




      1. Preparação de material e soluções

A preparação do material de laboratório, meio de crescimento bacteriano, tampões e outras soluções utilizados nesta parte dos trabalhos práticos foi realizada de acordo com as especificações técnicas descritas na secção 1.2.1. do capítulo III.





      1. Preparação de lisados de cultura induzida de E. coli JM109 pVUB3 para adsorção de anticorpos anti-E. coli e anti-OprI em soros de indivíduos seropositivos para o VIH

Inocularam-se 15 ml de meio mínimo M9CAA suplementado, com ampicilina a 100 g/ml, com E. coli JM109 transformada com pVUB3 e incubou-se a cultura durante a noite, a 37ºC, com agitação vigorosa (N=275 rpm). Na manhã seguinte, a cultura densa foi diluída 1:20 para um volume final de 200 ml, no mesmo meio, pré-aquecido a 37ºC, deixando-se o crescimento prosseguir, nas mesmas condições experimentais, até se atingir uma D.O.600 aproximada de 0,6-0,7. Procedeu-se então à indução da expressão da lipoproteína OprI, pela adição de IPTG para uma concentração final de 0,1 mM. Após 2 horas de crescimento (tempo de indução), as células foram sedimentadas por centrifugação a 5000 g, durante 10 minutos, a 4ºC, sendo depois lavadas uma vez com tampão PBS, pH 7,2. Foram então ressuspendidas em 10 ml do mesmo tampão e transferidas para tubos de polipropileno de 15 ml, ao qual foram adicionados a enzima lisozima e o inibidor de proteases PMSF, para uma concentração final de 1 mg/ml e de 1 mM, respectivamente. Prosseguiu-se então para a lise das células por congelação (em azoto líquido) e descongelação (num banho a 37ºC) alternadas, um número de vezes suficiente para que a suspensão celular ficasse translúcida e viscosa. A fim de reduzir a viscosidade devida à presença do ADN genómico intacto, procedeu-se à sua destruição física por submissão da suspensão à emissão pulsada de ultra-sons (sonicação efectuada com os parâmetros duty cycle 50% e output control 4, num Ultrasonic Homogenizer 4710, Cole Parmer, E.U.A.). A suspensão, colocada no gelo, foi submetida a 6 ciclos de sonicação de 20 segundos de duração cada, alternados com intervalos da mesma duração, até se atingir uma viscosidade semelhante à da água. A seguir, os restos celulares foram sedimentados por centrifugação a 12000 g, durante 10 minutos, a 4C, tendo-se recolhido o sobrenadante, contendo a lipoproteína OprI, que foi dividido em alíquotas de 0,2 ml e armazenado a –20ºC, até utilização.





      1. Adsorção de anticorpos anti-E. coli e anti-OprI em soros de indivíduos seropositivos para o VIH

Para efectuar a adsorção de anticorpos anti-E. coli e anti-OprI em soros de indivíduos seropositivos para o VIH foi utilizado um lisado bacteriano de uma cultura induzida de E. coli JM109 pVUB3 preparado como descrito na secção anterior. Inicialmente, os soros eram diluídos 1:10 em tampão de bloqueio para ELISA (ver secção 1.1.4.). A dois volumes do soro diluído era adicionado um volume do lisado bacteriano preparado anteriormente (e.g. 1 l de soro + 9 l de tampão de bloqueio + 5 l de lisado bacteriano), procedendo-se à homogeneização da mistura. Esta era incubada a 4ºC, pelo menos durante uma noite, após o que era clarificada por centrifugação a 12000 g, durante 15 minutos, a 4ºC. Recolhia-se o sobrenadante (cerca de 15 l de soro diluído e adsorvido), ao qual eram adicionados 85 l de tampão de bloqueio (diluição final do soro de 1:100), prosseguindo-se finalmente para a determinação por ELISA dos títulos relativos de anticorpos naturais anti-Nef da classe IgG.





      1. Determinação por ELISA dos títulos relativos de anticorpos anti-Nef da classe IgG em soros humanos

O protocolo utilizado para a quantificação relativa por ELISA dos anticorpos naturais anti-Nef da classe IgG em soros de indivíduos seropositivos para o VIH é basicamente o mesmo que o descrito na secção 1.2.5. do capítulo anterior, sendo aquele, por sua vez, baseado no protocolo de Mills (1996). De realçar que o antigénio de revestimento (a proteína de fusão OprI-Nef-6xHis diluída em PBS, pH 7,25) foi utilizado também numa concentração final de 4 g/ml, tendo sido este valor determinado, como explicitado antes, especificamente para o tipo de placas de microtitulação utilizadas. Os soros estudados foram testados na diluição de 1:100 em tampão de bloqueio (diluição seleccionada após testes prévios efectuados com três diluições diferentes, 1:100, 1:500 e 1:1000), sendo esta a utilizada também para os controlos positivo e negativo da experiência. Como controlo positivo foi utilizado um soro de origem comercial contendo anticorpos anti-VIH-1 (controlo positivo do kit de Western blotting New LAV BLOT I, Bio-Rad, França) e como controlo negativo foi utilizada uma mistura de soros humanos previamente testados no laboratório por métodos padrão de imunodiagnóstico (ELISA ELAVIA Mixt, Diagnostics Pasteur, França) e considerados negativos para a presença de anticorpos anti-VIH. Quer o controlo positivo, quer o controlo negativo, foram também submetidos a uma adsorção prévia com o lisado da cultura de E. coli JM109 expressando a lipoproteína OprI, nas mesmas condições experimentais que os soros em estudo. Em todas as experiências de ELISA efectuadas foi também testado, como controlo negativo adicional, o lisado utilizado anteriormente para a adsorção dos soros, de modo a descartar eventuais resultados falsos positivos resultantes de reacções imunológicas cruzadas com componentes celulares bacterianos presentes no próprio lisado. As diluições de todos os controlos, tal como no caso dos soros em estudo, foram efectuadas em tampão de bloqueio. Um dos poços da placa de microtitulação, contendo somente o tampão de bloqueio, serviria como “branco” durante a fase de leitura da absorvância a 450 nm. Os títulos relativos de anticorpos anti-Nef da classe IgG foram definidos como uma razão directa entre os valores de absorvância obtidos para cada soro e os referentes ao controlo negativo, tendo sido considerados positivos os soros com títulos relativos de valor igual ou superior a 2,5. Todos os soros que, numa primeira determinação, apresentaram valores de título relativo compreendidos entre 2,0 e 3,0 foram retestados, pelo menos, uma vez.





      1. Análise estatística

A análise estatística referente aos dados epidemiológicos básicos dos indivíduos cujos soros foram estudados neste trabalho foi efectuada recorrendo ao cálculo de parâmetros de tendência central e de dispersão (média e desvio padrão) e a uma análise de distribuição. Dependendo das circunstâncias, o estudo do grau de associação entre as diferentes variáveis consideradas foi realizado recorrendo ao teste estatístico de 2, aplicando-se, quando necessário, a correcção de continuidade de Yates, ou ao teste exacto de Fisher bilateral. A comparação de médias de títulos relativos de anticorpos anti-Nef entre os diferentes grupos de análise considerados foi realizada com recurso ao teste t de Student. Todos os testes estatísticos foram realizados recorrendo aos utensílios disponíveis na página de Internet http://www.physics.csbsju.edu/stats/ e para todos eles foi considerado um nível de significância de 5%.



  1. Resultados e discussão

Com o objectivo de se estudar o grau de reconhecimento imune de epitopos da proteína Nef, prototípica do subtipo B do VIH-1, na forma de proteína de fusão com a lipoproteína OprI, por anticorpos naturais anti-Nef, foi seleccionado um painel de soros de indivíduos seropositivos para o VIH (VIH-1, VIH-2 ou duplos seropositivos). Esse painel era constituído por 150 soros da seroteca da Unidade de Ensino e Investigação (UEI) de Virologia do Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT), seleccionados de um modo aleatório. Estes soros, bem caracterizados do ponto de vista epidemiológico e laboratorial, tinham origem no Laboratório de Patologia Clínica do Hospital Dr. Fernando da Fonseca (Amadora), havendo sido previamente utilizados no âmbito de outros projectos de investigação conjuntos na área da infecção pelo VIH (Esteves et al., 2002, 2003). Devido às características epidemiológicas da população servida por aquele estabelecimento hospitalar, o grupo de soros testado neste trabalho era proveniente de uma população heterogénea, composta basicamente por cidadãos portugueses caucasianos e por imigrantes de raça negra originários dos países africanos de língua oficial portuguesa.



Do total de 150 soros testados, 147 (98,0%) estavam bem caracterizados do ponto de vista epidemiológico. Desses, 63 eram provenientes de indivíduos do sexo feminino (42,9%) e 84 de indivíduos do sexo masculino (57,1%). A idade média dos indivíduos era de 35,3  11,16 anos, com um máximo de 73 e um mínimo de 16 anos (a idade era desconhecida para um dos indivíduos). Em termos de nacionalidade, 62,3% dos indivíduos eram portugueses, enquanto que 36,3% da amostra populacional era originária dos cinco países africanos de língua oficial portuguesa: Cabo Verde (14,4%), Angola (10,3%), Guiné-Bissau (8,9%), Moçambique (2,0%) e S. Tomé e Príncipe (0,7%). A amostra seleccionada compreendia ainda dois indivíduos (1,4%) com uma nacionalidade diferente, um brasileiro e um espanhol. Em termos raciais, a distribuição encontrada sobrepõe-se fundamentalmente à origem geográfica dos indivíduos, com 63,0% de caucasianos e 37,0% de indivíduos de raça negra. Em relação à via de transmissão mais plausível para a infecção pelo VIH, 64 indivíduos (49,6%) reportaram a via parentérica e 65 (50,4%) a via sexual. À excepção de um único caso, associado a transfusão sanguínea, a transmissão parentérica estava intimamente relacionada com a utilização de drogas por via intravenosa. Para 18 indivíduos, a via mais provável de transmissão era desconhecida. Estes dados epidemiológicos aqui apresentados, bem como dados de natureza laboratorial (tipo de VIH infectante, contagem de células CD4+, carga viral, genótipo do vírus infectante) e clínica (estádio da infecção), e ainda os resultados obtidos para cada soro no que se refere ao título relativo de anticorpos anti-Nef da classe IgG pesquisado neste trabalho, são apresentados em anexo (ver Anexo II). Aí, pode ser verificado que 141 (94,0%) dos soros estudados eram imunorreactivos para o VIH-1, 7 (4,7%) para o VIH-2 e 2 (1,3%) eram duplos reactivos. Por outro lado, pode ainda constatar-se que a amostra de soros seleccionada tem a sua origem num grupo de indivíduos caracterizado clinicamente por um espectro alargado em termos de estádio evolutivo da infecção. Assim, e de acordo com os critérios estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde, 78 (60,9%) indivíduos foram classificados como portadores assintomáticos, 29 (22,7%) como portadores sintomáticos, enquanto que 21 (16,4%) se encontravam já na fase de SIDA. Para 19 indivíduos da amostra, não eram conhecidos quaisquer dados relativos a esta variável. Finalmente, num trabalho anteriormente desenvolvido na UEI de Virologia, mencionado previamente, e cujos resultados foram publicados (Esteves et al., 2002), tinha sido efectuada a genotipagem para a região do gene env de 125 das 143 estirpes do VIH-1 desta amostra (87,4%), tendo sido encontrada uma elevada diversidade genética, reflectida na presença dos subtipos virais A (em 20 estirpes virais), B (68), C (1), D (3), F (6), G (26) e J (1). A maioria das estirpes (54,4%) foi classificada no subtipo viral B, o mais prevalente na Europa, América do Norte e Austrália. De realçar, no entanto, o valor muito elevado (45,6%) de estirpes não-B presentes nesta amostra, sendo este grupo constituído fundamentalmente por vírus dos subtipos G (20,8% do total) e A (16,0% do total). Esta enorme diversidade genética viral reflectirá a entrada em Portugal de estirpes virais prevalentes nos países de origem da população imigrante proveniente da África sub-Sahariana, região geográfica do mundo onde os subtipos não-B do VIH-1 são dominantes. Em relação à genotipagem da região genómica viral correspondente ao gene nef, referida anteriormente, esse trabalho encontra-se ainda em curso. Das estirpes virais de VIH-1 incluídas neste estudo, apenas 12 (8,4%) foram genotipadas para nef (ver resultados obtidos no Anexo II). Apesar do número reduzido de amostras estudadas, foram já detectadas, no entanto, 3 estirpes virais recombinantes env/nef, o que corresponde a ¼ do total da amostra estudada. Devido à fase preliminar em que se encontra presentemente este trabalho, todas as análises efectuadas posteriormente relacionadas com o genótipo viral serão apenas relativas ao subtipo determinado para o gene env. Reconhece-se, no entanto, alguma limitação ao poder dos resultados dessas análises, dada a relativamente elevada probabilidade de discordância entre os genótipos determinados para os genes env e nef.

Em termos de trabalhos práticos, uma vez que o antigénio de revestimento das placas de microtitulação a utilizar nas experiências de ELISA foi a proteína de fusão OprI-Nef-6xHis expressada e purificada a partir de E. coli JM109 em fases precedentes deste trabalho, tornou-se necessário proceder à pré-adsorção dos soros a testar. Essa pré-adsorção foi realizada com um lisado bacteriano de uma cultura de E. coli JM109 transformada com pVUB3, expressando a lipoproteína OprI de Pseudomonas aeruginosa, e tinha como objectivo efectuar a neutralização de potenciais anticorpos anti-E. coli e anti-OprI presentes nos soros e que poderiam ser responsáveis por eventuais resultados falsos positivos. Após a realização da pré-adsorção dos soros e subsequente revestimento das placas de microtitulação de polistireno com a proteína de fusão, procedeu-se finalmente à determinação por ELISA dos títulos relativos de anticorpos anti-Nef da classe IgG nos soros de indivíduos seropositivos para o VIH descritos previamente. O objectivo principal desta série de experiências, tal como já enunciado, consistia na avaliação do grau de reconhecimento imune de epitopos de Nef, na forma de proteína de fusão com OprI, por parte de anticorpos humanos anti-Nef, presentes em indivíduos naturalmente infectados com diferentes tipos e subtipos de VIH. Na análise dos resultados obtidos, e após a realização de uma pesquisa bibliográfica, considerou-se positivo (i.e. presença de anticorpos anti-Nef) qualquer título relativo igual ou superior a 2,5, o que constitui um critério de positividade relativamente conservador. Os títulos relativos obtidos para os 150 soros estudados estão compreendidos entre 0,94 e 16,91, com um valor médio de 4,71  2,926. No total, 116 amostras (77,3%) foram consideradas positivas, o que significa que em mais de ¾ dos soros houve reconhecimento imune de epitopos da proteína Nef, presentes na proteína de fusão imobilizada, por anticorpos anti-Nef produzidos em resposta à infecção natural pelo VIH. Este valor está de acordo com dados apresentados na literatura para a detecção de anticorpos anti-Nef em indivíduos infectados pelo VIH-1. De facto, estudos diversos provam que a proteína Nef é imunogénica e que cerca de 70% das pessoas infectadas com VIH-1 apresentam anticorpos anti-Nef (Sabatier et al., 1989; Cheingsong-Popov et al., 1990; Chen et al., 1999). Em relação à distribuição dos casos positivos por tipo de vírus, 110/141 (78,0%) das amostras VIH-1+, 4/7 (57,1%) das amostras VIH-2+ e 2/2 (100%) das amostras duplas reactivas foram consideradas positivas. O primeiro grupo compreendia vírus de todos os genótipos anteriormente descritos, à excepção do único representante do subtipo C, que foi considerado negativo. No grupo dos subtipos de env mais representados no painel de soros estudados, 79,4% das amostras com vírus do subtipo B foram positivas para a presença de anticorpos naturais anti-Nef, enquanto que esse valor foi de 76,9 e de 70,0%, para as amostras provenientes de indivíduos infectados com VIH-1 dos subtipos G e A, respectivamente. No seu conjunto, 73,7% das amostras contendo vírus de subtipos não-B foram consideradas positivas. À primeira vista, o grau de reconhecimento imune de epitopos de Nef, prototípicos do genótipo viral B, presentes na proteína de fusão parece ser independente, pelo menos, do genótipo (env) do VIH-1. De modo a confirmar a veracidade destas observações, prosseguiu-se então para a realização de uma análise estatística detalhada dos resultados obtidos, estudando-se também a eventual associação da positividade com outras variáveis.

Em primeiro lugar, foram construídas tabelas de contingência do tipo r x 2 para o estudo do grau de associação entre a presença de anticorpos anti-Nef e as categorias descriminadas das seguintes variáveis: a) tipo de vírus infectante (VIH-1, VIH-2 e VIH-1/VIH-2); b) genótipo viral (para o gene env), no caso dos infectados por VIH-1 (subtipos B e não-B); c) estádio clínico do indivíduo infectado (portador assintomático, portador sintomático e fase de SIDA); d) contagem de linfocitos T CD4+ ( 200 CD4+/mm3 de sangue, de 200 a 500 CD4+/mm3 de sangue e > 500 CD4+/mm3 de sangue); e) carga viral ( 1000 cópias virais/mm3 de sangue, de 1000 a 10000 cópias virais/mm3 de sangue, de 10000 a 50000 cópias virais/mm3 de sangue e > 50000 cópias virais/mm3 de sangue). Assumindo como verdadeira uma hipótese de independência, os resultados dos testes estatísticos efectuados, expressos na Tabela 3, permitiram concluir da inexistência de qualquer associação significativa entre a detecção de anticorpos anti-Nef nos soros estudados e cada uma das categorias das variáveis consideradas.



Tabela 3. Resultados dos testes estatísticos efectuados, após construção de tabelas de contingência do tipo r x 2, para o estudo do grau de associação entre a presença de anticorpos anti-Nef e as diferentes categorias das variáveis assinaladas. Na tabela encontram-se descriminados os testes realizados em cada caso (Fisher = teste exacto de Fisher bilateral; 2 = teste de 2; 2Y = teste de 2 com correcção de continuidade de Yates), bem como os valores de probabilidade (p) encontrados, assumindo como verdadeira uma hipótese de não associação ou independência.


vs.

Anticorpos anti-Nef

Teste estatístico

p

Tipo de vírus

Fisher

0,424

Genótipo viral (env)

do VIH-1


2Y

0,587

Estádio clínico

2

0,488

Contagem CD4+

2

0,233

Carga viral

2

0,343

Uma abordagem analítica adicional consistiu na comparação, pelo teste t de Student, das médias dos títulos relativos de anticorpos anti-Nef referentes a diferentes subgrupos de soros estudados. Assim, para as variáveis “genótipo viral (para o gene env), no caso dos infectados por VIH-1”, “estádio clínico”, “contagem de linfocitos T CD4+” e “carga viral” foram consideradas as categorias descritas no parágrafo anterior, sendo calculados, para cada uma delas, os respectivos valores médios de título relativo de anticorpos anti-Nef. Para cada uma das variáveis consideradas, esses valores médios foram comparados estatisticamente dois a dois e os valores de probabilidade (p) obtidos, assumindo uma hipótese nula de igualdade, são apresentados na Tabela 4. Após a



Tabela 4. Resultados da comparação estatística entre as médias de títulos relativos de anticorpos anti-Nef obtidas para as diferentes categorias consideradas de cada uma das variáveis constantes na tabela. Essa comparação foi realizada recorrendo ao teste t de Student, assumindo a normalidade das respectivas distribuições. Na tabela encontram-se descriminados os valores de p obtidos para cada teste, estando assinalados a negrito os valores considerados significativos (PA=portador assintomático; PS=portador sintomático).


Variável

Categorias comparadas

p

Genótipo viral (env)

do VIH-1


B vs. não-B

0,78

Estádio clínico

PA vs. PS

0,81

PA vs. SIDA

0,77

PS vs. SIDA

0,69

Contagem CD4+

(nº céls./mm3 de sangue)



200 vs. 200-500

0,12

 200 vs. >500

0,39

200-500 vs. >500

0,62

Carga viral

(cópias virais/mm3 de sangue)



103 vs. 103-104

0,02

103 vs. 104-5x104

0,24

103 vs. >5x104

0,75

103-104 vs. 104-5x104

0,10

103-104 vs. >5x104

0,02

104-5x104 vs. >5x104

0,33


interpretação desses resultados, pode concluir-se que em apenas duas comparações, efectuadas entre categorias da variável “carga viral”, foi encontrada uma diferença significativa entre as médias de título relativo de anticorpos anti-Nef. Em todas as restantes comparações efectuadas não houve a detecção de diferenças significativas (Tabela 4), pelo que os valores de título relativo médio de anticorpos anti-Nef nesses casos poderão ser considerados estatisticamente iguais. De modo a facilitar a interpretação dos resultados obtidos para a variável em consideração (“carga viral”), é apresentada uma representação gráfica, sob a forma de gráfico de barras, dos títulos relativos médios de anticorpos anti-Nef para as quatro categorias consideradas (Fig. 27). Esse valor é de 5,82 para a segunda categoria (carga viral compreendida entre 103 a 104 cópias virais/mm3 de sangue), sendo significativamente superior aos valores obtidos para a primeira (carga viral 103 cópias virais/mm3 de sangue) e quarta (carga viral >5x104 cópias virais/mm3 de sangue) categorias estudadas, valores esses que são de 3,87 e 4,06, respectivamente. O título relativo médio de anticorpos anti-Nef para a categoria de carga viral compreendida entre 104 e 5x104 cópias virais/mm3 de sangue é de 4,67, não sendo este significativamente diferente de nenhum dos outros três valores. Uma hipótese explicativa para os resultados obtidos pode radicar na compreensão do ciclo natural da infecção pelo VIH-1, considerando que todos os indivíduos cujos soros foram estudados não tinham, à data da colheita de sangue, iniciado qualquer esquema terapêutico anti-retroviral. É provável que indivíduos com uma carga viral reduzida se encontrem ainda nos estádios iniciais da infecção pelo VIH-1 e que, nessas circunstâncias, o nível sérico de anticorpos específicos anti-Nef seja ainda relativamente baixo, mesmo considerando que estes são detectados logo nas primeiras fases do decurso da infecção, podendo, ocasionalmente, preceder mesmo o aparecimento de anticorpos contra as proteínas estruturais do vírus (Ranki et al, 1987; Ameisen et al., 1989). Em indivíduos não submetidos a qualquer tipo de terapêutica, um aumento da taxa de replicação viral conduz, necessariamente, ao aumento do número de viriões circulantes no sangue periférico, o que se traduz, obviamente, em valores mais elevados de carga viral. Estas fases intermédias de progressão da infecção são normalmente acompanhadas pela abundante produção de anticorpos específicos contra diversas proteínas virais, entre as quais a proteína Nef, altamente imunogénica (Chen et al., 1999), pelo que os respectivos títulos têm tendência a aumentar ao longo do tempo. No entanto, nas fases tardias da história natural da infecção, próximo da, ou mesmo já na fase de SIDA, os valores muito elevados de carga viral são normalmente acompanhados por um decréscimo dos parâmetros relativos aos mecanismos de resposta imune, quer de natureza celular, quer de natureza humoral. Desta forma, assiste-se, frequentemente, nesta fase final da progressão da infecção, a um decréscimo dos títulos de anticorpos anti-VIH circulantes, o que poderá explicar os resultados obtidos neste trabalho em relação à detecção de anticorpos anti-Nef (Fig. 27). De realçar, no entanto, que a interpretação apresentada é puramente especulativa,




Figura 27. Títulos relativos médios, e respectivos desvios padrão, de anticorpos anti-Nef em soros de indivíduos infectados com o VIH. A semi-quantificação dos anticorpos foi realizada por ELISA, utilizando-se a proteína de fusão OprI-Nef-6xHis como antigénio de revestimento, e os resultados obtidos encontram-se estratificados pelas quatro categorias consideradas da variável “carga viral” (medida em cópias virais/mm3 de sangue).

uma vez que as categorias formadas para cada variável estudada não são, de modo algum, homogéneas, estando em jogo um número considerável de “factores de confusão” (e.g. base genética dos indivíduos, genótipos virais, sensibilidade e especificidade dos testes laboratoriais utilizados, especificamente, para a quantificação da carga viral e para a detecção de anticorpos anti-Nef, etc.).




  1. Conclusões

Na fase final deste projecto de investigação, procedeu-se à montagem de um teste imunoenzimático (ELISA) com o objectivo de avaliar o grau de reconhecimento imune de epitopos de uma proteína Nef, prototípica do subtipo B do VIH-1, na forma de proteína de fusão com a lipoproteína OprI da membrana externa de Pseudomonas aeruginosa, por anticorpos naturais humanos anti-Nef da classe IgG. Para tal, foi escolhido aleatoriamente um painel de 150 soros de indivíduos seropositivos para o VIH (94,0% VIH-1, 4,7% VIH-2 e 1,3% duplos seropositivos), anteriormente estudados no âmbito de um projecto de caracterização genética das estirpes de VIH-1 circulantes em Portugal (Esteves et al., 2002). Os resultados obtidos nesse projecto, compreendendo a genotipagem do gene env de 87,4% das 143 estirpes do VIH-1 incluídas nesta amostra, demonstraram a existência de uma elevada diversidade genética viral, reflectida na presença dos subtipos virais A, B, C, D, F, G e J, sendo que a maioria das estirpes (54,4%) foi classificada no subtipo viral B. Esta enorme diversidade genética viral reflecte certamente a entrada em Portugal de estirpes virais circulantes nos países de origem da população imigrante de origem africana.

Os títulos relativos de anticorpos anti-Nef da classe IgG obtidos para os 150 soros estudados tinham um valor médio de 4,71  2,926 e estavam compreendidos entre 0,94 e 16,91. No total, 77,3% das amostras foram consideradas positivas, o que significa que em mais de ¾ dos soros estudados houve reconhecimento imune de epitopos da proteína Nef na forma de proteína de fusão OprI-Nef-6xHis por anticorpos naturais anti-Nef produzidos em resposta à infecção pelo VIH. De realçar, o facto desta taxa de detecção de anticorpos anti-Nef ser semelhante à descrita na literatura para indivíduos infectados pelo VIH-1. Em relação à distribuição dos casos positivos por tipo de vírus, 78,0% das amostras VIH-1+, 57,1% das amostras VIH-2+ e as duas amostras duplas reactivas foram consideradas positivas, compreendendo o primeiro grupo vírus de basicamente todos os genótipos (env) anteriormente enumerados. Por outro lado, 79,4% das amostras com vírus do subtipo B foram positivas para a presença de anticorpos naturais anti-Nef, enquanto que esse valor foi de 73,7% para as amostras provenientes de indivíduos infectados com VIH-1 de subtipos não-B. Em resumo, o grau de reconhecimento imune de epitopos de Nef, prototípicos do subtipo viral B, presentes na proteína de fusão, parece ser independente do genótipo (env) do VIH-1. Já em relação ao tipo de vírus, conclusões definitivas não poderão ser retiradas a partir destes resultados, dado o reduzido número de amostras estudadas provenientes de indivíduos infectados com o VIH-2. Digno de nota, no entanto, que em mais de metade das amostras VIH-2+ estudadas foram detectados anticorpos anti-Nef por este teste imunoenzimático.

Os resultados dos testes estatísticos efectuados permitiram concluir da inexistência de uma associação significativa entre a presença de anticorpos anti-Nef nos soros estudados e as diversas categorias das variáveis consideradas (tipo de vírus, genótipo viral para o gene env no caso dos infectados por VIH-1, estádio clínico, contagem de linfocitos T CD4+ e carga viral). No entanto, diferenças significativas entre os valores médios de título relativo de anticorpos anti-Nef para algumas categorias da variável “carga viral” foram encontradas, reflectindo, provavelmente, a cinética de produção de anticorpos anti-Nef no decurso da história natural da infecção pelo vírus.



Como referido em capítulos anteriores, a proteína Nef é uma proteína de expressão precoce, sendo considerada como altamente imunogénica. Resultados de estudos diversos indicam que em cerca de 70% dos indivíduos infectados pelo VIH-1 são detectados anticorpos anti-Nef (Sabatier et al., 1989; Cheingsong-Popov et al., 1990; Chen et al., 1999). O facto de, neste trabalho, se terem detectado anticorpos naturais anti-Nef, recorrendo a um teste imunoenzimático com a proteína de fusão OprI-Nef-6xHis como antigénio, em 78% das amostras VIH-1+, indica que aquela construção proteica híbrida, embora purificada sob uma forma desnaturada, deverá manter, pelo menos, alguns epitopos de Nef num modo imunologicamente relevante. Este facto importante, a par dos outros resultados citados que parecem apontar para um reconhecimento imune alargado de epitopos da proteína Nef, na forma de OprI-Nef-6xHis, por anticorpos anti-Nef naturais contra VIH-1 de diferentes genótipos, e provavelmente mesmo contra VIH de diferentes tipos, leva a considerar a hipotética utilização desta proteína de fusão como um potencial imunogénio anti-VIH. Uma vez que a proteína Nef é expressada em quantidades elevadas logo após a entrada do vírus na célula hospedeira, a montagem de uma resposta imune precoce anti-Nef, desencadeada rapidamente pela existência de células imunes de memória, fruto de uma prévia vacinação, poderia prevenir as fases subsequentes do ciclo replicativo viral e, em última instância, a libertação de novas partículas virais infecciosas, contendo a infecção nas suas fases iniciais.




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