Aos residentes do Hospital Presbiteriano-Shadyside da



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O permanente vestígio da dor
Todos podemos compreender isso por experiência própria porque, de fato, a maioria de nós já passou pelo que podem ser chamados de traumas “com t minúsculo”, para contrapô-los aos traumas “com T maiúsculo” das experiências que põem a vida em risco, geralmente associadas ao diagnóstico de PTSD. Talvez tenhamos sido humilhados no ensino fundamental, ru­demente rejeitados por uma namorada ou namorado, ou come­tido um sério erro em nossa vida profissional, talvez perdido o emprego abruptamente. Pode até ter sido um divórcio difícil que nos deixou com uma cicatriz emocional. Indubitavelmente pensamos muito a respeito disso quando estamos sós, quando recebemos muitos conselhos de amigos e da família, lemos ar­tigos de revistas sobre esse tipo de situação e como responder a ela, talvez até tenhamos lido livros de auto-ajuda. De todas essas fontes, aprendemos, muito bem, inclusive, como pensar sobre a situação, e sabemos como deveríamos nos sentir a res­peito dela. No entanto, geralmente é neste pé que deixamos as coisas: com sentimentos que ficaram para trás e permanecem ancorados no passado mesmo depois de a nossa compreensão racional (cognitiva) ter mudado.

O homem que teve um acidente de carro continua a se sen­tir desconfortável e tenso quando dirige na auto-estrada, mes­mo que saiba muito bem que o acidente não foi por sua culpa e que ele já dirige há anos pela mesma via sem ter havido ne­nhum problema. A mulher que foi sexualmente violentada con­tinua a se sentir congelada quando tenta se aproximar fisica­mente do homem que ama, a despeito de saber de seu afeto por ele e do desejo que tem por essa intimidade. E como se as redes neurais que representam todas as cognições apropriadas não tivessem se unido com as redes neurais no cérebro emocional, que continua a codificar as emoções dolorosas.3

Em um laboratório da Universidade de Nova York, um pes­quisador nascido na Louisiana conseguir elucidar um pouco mais como esses vestígios emocionais são organizados no cérebro. Quando criança, Joseph LeDoux, Ph.D., observava seu pai, um açougueiro, abrindo o cérebro de bois. Até hoje ele é fascinado pela estrutura desse órgão. Após anos estudando a diferença en­tre as partes esquerda e direita do cérebro, o dr. LeDoux queria compreender como os cérebros emocional e cognitivo se relacio­navam. Foi um dos primeiros pesquisadores a demonstrar que reações de medo não são codificadas no neocórtex. Ele descobriu que quando o animal aprende a ter medo de alguma coisa, o tra­ço da memória é formado diretamente no cérebro emocional.4

Nesses estudos, ratos são colocados em uma gaiola com piso eletrificado. Quando uma campainha toca, recebem pe­quenos choques pelas patas. Após alguns toques de campainha e choques, os ratos rapidamente aprendem a congelar de medo quando a ouvem soar. Se o experimento pára durante algum tempo, a resposta de medo dos animais persiste, até meses de­pois, quando ouvem a campainha (ou qualquer outro som se­melhante). Todavia, é possível fazer “terapia” com esses ratos, ao tocar a campainha repetidamente e não lhes dar choques. A “terapia por exposição”, um tipo de terapia behaviorista, é co­nhecida por “eliminar” a resposta que temos. Após uma expo­sição suficiente desse tipo, é como se os ratos aprendessem que não precisam mais temê-la, uma vez que não mais prenun­cia o início do choque elétrico. Mesmo quando ela dispara, os animais apenas continuam suas atividades rotineiras. Essa des­coberta, um dos mais antigos resultados da literatura behavio­rista clássica, é conhecida desde a época de Pavlov como “ex­tinção” da resposta do medo por “exposição”.5 Para todos os efeitos práticos, parece que o vestígio da resposta de medo foi apagado do cérebro emocional dos ratos. Porém, a realidade é bem diferente.

O dr. LeDoux e outros cientistas que trabalharam com ele, tais como Greg Quirk, Ph.D., agora na Faculdade de Medicina Ponce, descobriram que o vestígio no cérebro emocional jamais desaparece totalmente. Os ratos se comportam “como se” não tivessem mais medo apenas se o córtex pré-frontal estiver blo­queando ativamente a resposta automática do cérebro emocio­nal. Assim que o controle do neocórtex enfraquece, o medo res­surge, mesmo depois da “terapia”.6 O dr. LeDoux também fala da “indelebilidade” das memórias emocionais.7 A “terapia de exposição” com a qual os ratos demonstram se dar bem inicial­mente parece deixar a resposta de temor do cérebro emocional intocada, pronta para ser reativada. Extrapolando para os pa­cientes humanos, esses resultados em animais nos ajudam a compreender como as cicatrizes no cérebro emocional podem permanecer durante décadas, prontas e esperando para se ma­nifestar de novo.

Conheci Paulina quando ela tinha sessenta anos. Estava pro­curando ajuda porque se sentia irracionalmente desconfortável na presença de seu novo chefe. Duas semanas mais tarde, quando ele se postou atrás dela no escritório, Paulina começou a suar incontrolavelmente e não foi capaz de continuar sua conversa telefônica com um importante cliente. Dez anos antes havia perdido um emprego devido a um problema semelhante. Ago­ra estava determinada a fazer alguma coisa a respeito.

Logo descobri que seu pai, alcoólatra e violento, a espanca­ra diversas vezes quando era criança. Pedi que descrevesse uma das piores cenas. Ela me contou como, quando tinha cinco anos, seu pai tinha chegado em casa com um carro novo e parecia estar de bom humor. Paulina quis se aproveitar disso para se aproximar dele. Quando ele entrou em casa, ela achou que, para fazê-lo feliz, poderia deixar o carro brilhando ainda mais, la- vando-o. Encontrou um balde e uma esponja e começou a lavar o carro com todo o entusiasmo que uma garotinha que quer agradar o pai é capaz de ter. Infelizmente não notou que havia areia no fundo do balde e que ela havia grudado na esponja. Quando o pai saiu para ver o carro, percebeu que ele fora risca­do de ponta a ponta, dos dois lados. Foi tomado de uma tre­menda fúria que pareceu completamente incompreensível para a garotinha. Apavorada com o que ele pudesse fazer, Paulina correu para o quarto, no andar superior, e se escondeu debaixo da cama. Pensar naquela memória trouxe-lhe de volta a ima­gem que parecia ter sido imprimida em seu cérebro tão clara­mente quanto um quadro: os pés de seu pai vindo em sua dire­ção enquanto ela se aninhava debaixo da cama, o mais próximo possível da parede, como um pequeno animal.

Junto com esse quadro, a emoção daquele momento volta­va com toda a força. Na minha frente, 55 anos depois, pude ver o rosto de Paulina deformado pelo medo. Sua respiração estava agitada, todos os músculos pareciam tensos, e lembro-me de ter tido medo de que ela sofresse um ataque cardíaco em meu consultório. Cinqüenta e cinco anos depois, todo o seu cérebro, todo o seu corpo ficaram possuídos pelo medo, pela cicatriz deixada por aquele evento.

Depois que os ratos aprendem a temer a campainha que os avisa do choque, eles congelam quando qualquer campainha toca, qualquer um cujo som pareça com o som original.8 No caso de Paulina, bastava seu chefe parecer, ainda que vagamente, com seu pai para torná-la extremamente desconfortável, mes­mo décadas depois.

E provável que as cicatrizes de nosso cérebro emocional per­maneçam prontas para se expressar quando o cérebro cognitivo e o poder da razão baixam sua guarda: quando ingerimos bebidas alcoólicas, por exemplo, ou quando usamos drogas que alteram o estado da mente, quando estamos excessivamente cansados, ou distraídos demais por outras preocupações para manter controle sobre o nosso temor límbico. Essas condições demons­tram uma verdadeira “desconexão” entre o cérebro emocional e o cérebro cognitivo depois que eventos traumáticos deixaram uma cicatriz profunda: as duas partes do cérebro estão puxando em direções diferentes, e não tentando descobrir um jeito de integrar o passado e o presente em um padrão harmonioso.
Os movimentos dos olhos dos sonhos
Os psiquiatras conhecem esta “desconexão” da PTSD. Eles acham que a desconexão entre os pensamentos pertinentes e as sobras das emoções inapropriadas deixadas pelo trauma é precisamente o que torna o tratamento difícil. Sabem que ape­nas ficar falando sobre o trauma costuma gerar fracassos em produzir a conexão necessária entre a antiga memória emocio­nal e uma visão mais pertinente ancorada no presente. Com efeito, sabem que tão-só lembrar o trauma parece fazer as pes­soas se sentirem pior.

Os psiquiatras também sabem que a medicação só tem efi­cácia limitada. No início dos anos 90, uma crítica sobre trata­mentos para a desordem por stress pós-traumático, publicada no prestigioso Journal of the American Medicai Association, con­cluiu que não havia tratamentos realmente eficazes para esses casos, somente intervenções com benefícios limitados.9 Em face da minha experiência com pacientes, estava bem consciente do fato. Como meus colegas, tinha lutado para ajudar vítimas de trauma emocional durante anos, obtendo somente sucesso li­mitado, até que um dia vi uma fita de vídeo extraordinária.

Francine Shapiro, Ph.D., pesquisadora sênior do Instituto para Pesquisa Mental de Paio Alto, descobridora da Dessensibi­lização e Reprocessamento pelo Movimento Ocular (EMDR), estava apresentando seu método em uma reunião de medicina behaviorista a que eu estava assistindo. Eu tinha ouvido falar no EMDR e estava extremamente cético a respeito da possibili­dade de, ao fazer as pessoas moverem os olhos de um lado para o outro, imitando os movimentos oculares rápidos que ocorrem durante os sonhos, poder fazer alguma coisa para ajudar a curar o trauma. Entretanto, um dos casos chamou a minha atenção.

Foi diagnosticado que Maggie, uma mulher com pouco mais de sessenta anos, tinha um câncer agressivo na garganta. Seu médico dissera que ela tinha seis meses de vida e que morreria de morte lenta e sofrida. Seu marido de 72 anos era viúvo e a primeira esposa, destino fatal, havia morrido de câncer tam­bém. Quando Maggie lhe contou o veredicto do médico, Henry se sentiu de tal maneira indefeso que lhe disse que não tinha como passar por tudo isso de novo. E, então, ele a deixou.

Maggie ficou em estado de choque e profundamente deprimida. Comprou uma arma com a intenção de se matar. Sabendo disso, amigos convenceram Henry a voltar e a ficar com ela. Todavia, Maggie ficara tão traumatizada com o aban­dono que não conseguia mais dormir, tinha pesadelos recor­rentes em que ele a deixava, e não pôde tolerar se separar dele mesmo para ir ao supermercado. Tendo ouvido falar de um es- tudo para ajudar pessoas a se recuperar de traumas, ela partici­pou de um dos primeiros estudos de controle de EMDR.

De início, Maggie mal podia evocar a imagem de Henry dan­do ré enquanto saía de casa, no dia em que a abandonou. Ela quase sufocava de medo. Então, com a ajuda de uma terapeuta amorosa e atenciosa, foi capaz de se permitir evocar as mais poderosas imagens de Henry a deixando enquanto seguia a mão da terapeuta, movendo-se de lá para cá na frente de seus olhos. Falar sobre sua dor custou-lhe um esforço imenso, claro, e a memória parecia estar impressa basicamente em todo o seu corpo. Ela se queixava não apenas do trauma, mas de medo dos “pulos de seu coração" e de dor “no corpo todo”. De repente, após outra sessão de movimentos oculares, o rosto de Maggie mudou completamente. Ela tinha uma expressão de surpresa no rosto e disse: “Sumiu!”. “E como se eu estivesse no trem”, ela recorda. “Você olha algo que parece estar ali durante um instante, e depois aquilo some; está no passado e há outra coi­sa que você está olhando. Belo ou doloroso, está no passado. Você não pode recapturar isso.”

Toda a sua linguagem corporal tinha mudado. Ela parecia recomposta, embora ainda um pouco confusa. Com a série se­guinte de movimentos oculares, Maggie começou a sorrir. A terapeuta parou o movimento dos olhos e lhe perguntou o que tinha vindo à sua mente. “Eu me vi em pé na entrada de casa olhando Henry saindo de carro e pensei: ‘Se ele não consegue lidar com isso, problema dele, não meu'. Eu estava acenando para ele e dizendo: Adeus, Henry, adeus’. Você pode imaginar uma coisa dessas? 'Adeus, Henry, adeus...’”

Conforme a sessão continuava, com mais uma série breve de movimentos oculares, Maggie começou a falar espontaneamen­te, ou “associando livremente”, sobre a cena de seu leito de mor­te. Ela podia ver seus amigos lá e sabia que jamais estaria sozi­nha. No final da série seguinte de movimentos oculares, em vez de medo seu rosto mostrava uma nova expressão de resolução. Bateu com a mão no colo e disse: “E sabe de uma coisa? Eu vou morrer com dignidade!”. Todo o tratamento durara apenas quin­ze minutos, e a terapeuta não tinha dito mais do que dez frases.

O cientista em mim ficou murmurando: “Trata-se só de um paciente... talvez ela seja particularmente sugestionável... tal­vez não passe de um efeito placebo”. Entretanto, se de fato fos­se um efeito placebo, decidi que queria aprender como induzir efeitos placebo como aquele em meus pacientes. Eu jamais vira nada parecido.

O que finalmente me convenceu foi um estudo com oiten­ta pacientes com traumas emocionais que foram tratados com EMDR publicado em uma das revistas de psicologia clínica mais exigentes, Journal of Counsulting and Clinicai Psychology. Nes­se estudo, 80% dos pacientes sentiram recuperação de suas síndromes traumáticas depois de três sessões de noventa mi­nutos.10 Esse índice de recuperação é comparável ao dos anti­bióticos no caso de pneumonia.11 Não conheço nenhum trata­mento em psiquiatria, incluindo a mais potente das medicações, que tenha algum dia alcançado resultados dessa magnitude em três semanas.

Claro, fiquei preocupado com a idéia de que resultados al­cançados tão rapidamente pudessem não durar muito. Toda­via, o mesmo grupo de pacientes foi analisado durante quinze meses e descobriu-se que eles desfrutavam daquele benefício quinze meses após o tratamento. Com tais dados, achei que seria pouco consciencioso de minha parte não aprender EMDR e verificar por mim mesmo.
Mecanismos de cura pessoal no cérebro
O EMDR começa com a idéia de um “sistema de adaptação de informação e processamento” que está em nosso sistema nervoso para nos ajudar a amadurecer psicologicamente. O con­ceito é simples: todos nós passamos por traumas “com t mi­núsculo” durante a vida. No entanto, normalmente não desen- volvemos PTSD. Digamos, por exemplo, que você sofreu um acidente de bicicleta: estava andando em uma pista ao longo de vários carros estacionados e alguém, de repente, abriu uma porta bem quando você passava. Tarde demais para brecar. Além dos hematomas físicos inevitáveis, você poderá ficar com algu­mas equimoses emocionais.

Durante algumas horas, ou dias, seu corpo talvez trema, você talvez pense sobre o acidente nas horas mais inesperadas, fale disso com freqüência, sonhe com isso à noite. No dia se­guinte, pode ser que fique nervoso ao pensar em pegar a bici­cleta de novo e, se o fizer, vai se perceber atento aos carros estacionados. Entretanto, após algum tempo, não muito depois de seus hematomas físicos terem sumido, vai se descobrir an­dando de bicicleta novamente. Você vai prestar mais atenção nos carros estacionados e talvez tenha aprendido a andar a uma distância segura deles. Em essência, já terá “digerido” o evento doloroso. E muito parecido com o sistema digestivo, que extrai do alimento o que é útil e necessário para o corpo e rejeita o resto; seu sistema nervoso tiraria a informação útil - a “lição” - e descartaria as emoções, pensamentos e ações que não fossem mais necessários depois de o evento ter sido superado.12

Esse processo de digestão psicológica é o que Freud descre­veu como “trabalho de luto” em sua tese clássica Luto e melan­colia. Após uma perda séria, ou qualquer importante desafio à nossa sobrevivência no mundo, nosso sistema nervoso fica tem­porariamente desorganizado e progressivamente encontra seu equilíbrio (sua “homeostase”, como os fisiologistas dizem). Em geral, ele até sai mais fortalecido desse processo, mais flexível, mais adaptado ao vasto leque de situações. Alguns psiquiatras já declararam, convincentemente, que é esse processo que nos ajuda a desenvolver mais resistência contra as adversidades.13 Freud estava escrevendo quando a era industrial se encontrava a todo vapor e ele se referia a esse fenômeno como “trabalho” de luto. O EMDR, desenvolvido durante a revolução da infor­mática e na era da neurociência, refere-se ao mecanismo de di- gestão que existe em nosso cérebro como o “sistema de adap­tação de informação e processamento”.

Em algumas circunstâncias, todavia, a capacidade de nosso sistema para se adaptar pode ser esmagada. E o que acontece quando o trauma é grande demais, como no caso de tortura, estupro ou perda de um filho (segundo minha experiência, a perda de um filho, ou mesmo a doença séria de um filho, pode se tornar uma das experiências mais dolorosas que alguém pode ter de suportar, e uma das de mais difícil recuperação). Uma segunda circunstância é quando um trauma - mesmo pequeno - acontece em uma hora em que estamos particularmente vulne­ráveis. Talvez esse evento tenha ocorrido na infância, quando somos fisicamente impotentes para nos defender e quando nos­so sistema nervoso ainda não está de todo desenvolvido. Ele pode também ocorrer quando adultos estão fragilizados, física e emocionalmente, por qualquer razão. Em um e outro casos - por trauma intenso ou com vítima fragilizada -, eventos adver­sos então se tornam “traumáticos”, no sentido exato do termo.

Vera, por exemplo, era uma enfermeira em consulta por cau­sa de um sentimento crônico de depressão e uma auto-imagem muito baixa. Ela se via como “gorda e feia” - “nojenta”, chegou a dizer ao passo que, objetivamente, era até atraente e seu peso estava bem dentro do razoável. Como era naturalmente engraçada e cativante, era evidente que sua auto-imagem esta­va muito distorcida. Enquanto a escutava, compreendi que essa imagem de seu corpo tinha deitado suas raízes alguns anos an­tes, durante os últimos meses de sua gravidez.

Vera lembrava-se com grande lucidez do dia em que estava brigando com o namorado, o pai de seu filho. Ela se queixava de que ele não passava mais tempo com ela. Ele dizia que esta­va “ocupado demais”, mas Vera sabia que ele estava mentindo e continuou a pressioná-lo. Finalmente o namorado cedeu e gritou que a “verdadeira” razão pela qual ele a estava evitando era esta: “Você está gorda demais; você é a coisa mais feia que já vi na vida!”.

Vera não pôde controlar as lágrimas. “Achei que tinha su­perado isso”, ela começou dizendo. Em outras circunstâncias, talvez tivesse sido capaz de se livrar do comentário do namo­rado com seu habitual bom humor. Talvez replicasse que ele não era nenhum Brad Pitt. Mas sua gravidez fora difícil; ela pa­rou de trabalhar no início da gestação e não tinha certeza de que seria capaz de achar um novo emprego quando fosse a hora de voltar ao trabalho. Temia que Jack pudesse deixá-la logo após o nascimento da criança, exatamente como seu pai fizera com sua mãe. Vera se sentiu impotente e vulnerável. A combinação era suficiente para que aquele comentário tóxico tomasse a di­mensão traumatizante que jamais deveria ter tomado.

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