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Boxe complementar:
Intelectuais leem o mundo social
Em 2012, o cientista político Emir Sader (1943-) afirmava que a crise geral do
capitalismo de 2008 voltava "como um bumerangue":
Ao salvar os bancos - ação que detonou a crise e foi o seu epicentro -, os
governos acreditavam que salvariam as economias e os países. [...] a crise
voltou como um bumerangue, tendo agora diretamente os governos como
epicentro, pressionados pelo sistema bancário e pelos organismos que
expressam seus interesses: FMI e Banco Central Europeu. Primeiro, em 2008,
faliram bancos e outras instituições financeiras; depois foram os países, tendo
a Grécia como caso paradigmático e que estende sua sombra sobre quase
todos os Estados da zona do euro. [...]
As respostas se deram no marco das políticas neoliberais dominantes,
combatendo centralmente os deficit públicos, e não os efeitos econômicos e
sociais dessas políticas: a recessão e o desemprego. [...]
LEGENDA: Jovens inspirados no movimento Occupy Wall Street, em Bolonha,
Itália, em 2011.
FONTE: Silvia Morara/Corbis/Latinstock
Se no primeiro ciclo da crise capitalista, em 2008, não houve grandes
mobilizações populares, em 2011, surgiram novos protagonistas, entre eles os
Indignados e os "ocupas". Os primeiros, nascidos na Espanha, onde tiveram
sua expressão mais significativa de protesto contra as elites políticas, o
esvaziamento da democracia liberal e a exportação da crise para o conjunto da
população. Os "ocupas", surgidos em Nova York, estenderam-se para dezenas
de cidades norte-americanas, além de Londres, e dirigiram-se mais
diretamente aos bancos, difundindo a versão da oposição entre o 1%
dominante e a grande maioria, os 99%. Ainda não são movimentos com grande
apoio popular, mas têm um peso simbólico importante, que pode funcionar
como uma chispa para estender a resistência aos ajustes neoliberais.
O movimento estudantil chileno conseguiu transformar suas reivindicações
específicas - luta contra a privatização da educação - num tema nacional [...] .
A Primavera Árabe trouxe um elemento novo à região: sua participação popular
estava como que congelada e, de repente, multidões ocuparam praças para
derrubar ditaduras. O movimento, iniciado em 2011, ainda deve ter longos
desdobramentos [...] os processos em países como a Tunísia e o Egito estão
longe de terminar.
SADER, Emir. Crise capitalista e novo cenário no Oriente Médio. In: HARVEY,
David et al. OCCUPY: movimentos de protesto que tomaram as ruas. São
Paulo: Boitempo; Carta Maior, 2012. p. 84-86.
· Com base nas informações do texto de Emir Sader, pesquisem matérias
publicadas na mídia impressa e na internet sobre os movimentos surgidos a
partir da crise de 2008. A partir das informações do texto e do material
pesquisado, em equipes, reflitam e discutam sobre as questões abaixo:
a) Como explicar tão distintas manifestações populares ocorridas em diversas
partes do mundo, seus reflexos e efeitos subsequentes? Há algo em comum
entre elas? Essas mobilizações podem ser caracterizadas como movimentos
sociais? Como analisá-las em conjunto com outros exemplos, incluindo no
Brasil, em 2013, expressando uma frustração política de diferentes matizes?
b) Compilem anotações de sua pesquisa e apresentem-nas para a turma.
Fim do complemento.
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Movimentos sociais na era da globalização
A intensificação, em escala mundial, das relações sociais na esfera político -
econômica tende a favorecer a disseminação de causas sociais, gerando
novos movimentos. Desse modo, acontecimentos locais - por exemplo, uma
manifestação grevista - podem ser modelados por eventos desencadeados a
milhares de quilômetros de distância.
Na era da globalização, a diversidade de movimentos sociais é enorme: há os
de gênero, os étnicos, os ecológicos, os que buscam suprir as necessidades
coletivas, entre outros. Nas últimas décadas, muitos deles se
institucionalizaram, entraram em crise, desapareceram ou se transformaram, e
um resultado disso é a proliferação das organizações não governamentais
(ONGs) nos anos 1990.
[AS ONGS] desenvolvem projetos com as populações demandatárias [isto é,
que necessitam] de bens e serviços, organizando-as em movimentos sociais.
Para entrar em operação, tais projetos necessitam de qualificação, avaliações
para que ganhem continuidade, etc. Ou seja, a ação coletiva de pressão e
reivindicação, antes presente na maioria dos movimentos sociais latino-
americanos, converteu-se nos anos [19] 90 em ações voltadas para a obtenção
de resultados, em projetos e parcerias que envolvem diferentes setores
públicos e privados. Para complicar o cenário, a globalização e as mudanças
na conjuntura política do Leste Europeu levaram a alterações nas políticas de
cooperação internacional. As agendas das instituições internacionais deixaram
de priorizar o desenvolvimento de projetos na América Latina - por
considerarem que a transição para a democracia já se completara - e mudaram
o sentido de seus programas. Estes devem demandar subsídios financeiros a
seus próprios governos e, fundamentalmente, gerar receitas próprias. [... ] Os
movimentos e as ONGs que sobreviveram se qualificaram para a nova
conjuntura em termos de infraestrutura e do uso de modernos meios de
comunicação, como a internet. A tecnologia chegou aos movimentos sociais e
a institucionalização de setores e áreas das demandas e lutas é uma
necessidade imperiosa para a sua sobrevivência.
GOHN, Maria da Glória. Teoria dos movimentos sociais: paradigmas clássicos
e contemporâneos. 3ª ed. São Paulo: Loyola, 2002. p. 17-18.
FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora
Os movimentos sociais defendem os direitos e a cidadania: revelam novos
valores, debatem questões como equidade e justiça social, propõem novas
relações entre o Estado e a sociedade civil, reconhecem diferenças e conflitos
inerentes à vida organizada em sociedade.
Com as transformações políticas, econômicas e sociais trazidas pela
globalização, uma parcela dos movimentos passou a lutar contra o
neoliberalismo. Movimentos globais de contestação questionam o
favorecimento do comércio em detrimento dos valores humanos e dos direitos
sociais, por aprofundar o quadro de exclusão social. Uma dessas ações que
adquiriram visibilidade, reunindo vários movimentos sociais, foi o Fórum Social
Mundial.
De caráter internacional, o Fórum Social Mundial se contrapôs às elites
econômicas internacionais que se reúnem todos os anos no Fórum Econômico
Mundial (FEM), em Davos, na Suíça, para discutir e tomar decisões sobre a
economia mundial. Enquanto o foco da reunião do grupo de países
desenvolvidos com maiores economias (G-8) e do FEM é o capital, a
otimização dos lucros e os mercados mundiais, o Fórum Social Mundial tem
por objetivo repensar o social e buscar alternativas para impedir e reverter a
degradação das condições de vida no mundo.
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Exemplos como esses se multiplicaram em ações coletivas de contestação e
se juntaram a manifestações localizadas, aproximando o local e o global.
Assim, os novos movimentos sociais constituíram encontros para discutir
questões como:
· O quê, como e para quem produzir?
· Que esforços científicos são válidos para atingir o desenvolvimento humano?
· É possível conseguir chegar a uma cidadania mundial?
· Que fundamentos poderiam constituir novas formas de poder?
LEGENDA: Marcha de abertura do Fórum Social Temático de Porto Alegre,
realizado em janeiro de 2013.
FONTE: Wilson Dias/Agência Brasil
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