. Países@. Disponível em: . Acessos em: 2 mar. 2016.
De Portugal para o mundo
Já a vista, pouco e pouco, se desterra
Daqueles pátrios montes, que ficavam;
Ficava o caro Tejo e a fresca serra
De Sintra, e nela os olhos se alongavam;
Ficava-nos também na amada terra
O coração, que as mágoas lá deixavam;
E, já depois que toda se escondeu,
Não vimos mais, enfim, que mar e céu.
CAMÕES, Luís Vaz de. Os lusíadas. In: Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1998. p. 115. (Fragmento).
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Foram interesses comerciais que levaram os navegadores portugueses a procurar um caminho marítimo para as Índias em busca de especiarias. Quando as primeiras caravelas portuguesas começaram a desbravar o mar-oceano, teve início a viagem da língua portuguesa pelos diferentes continentes.
Entre os séculos XV e XVI, enquanto Portugal criava o primeiro império comercial europeu, o português se espalhou por vários territórios da África e da Ásia. Na América, desembarcou no Brasil, onde é hoje falado por mais de 204 milhões de pessoas.
Nos diferentes territórios onde se estabeleceu como língua oficial, o português sofreu influência das línguas locais, enriquecendo seu vocabulário com termos como jangada, de origem malaia, e chá, de origem chinesa. Além disso, as várias situações de contato linguístico fizeram com que a língua falada em diferentes regiões adquirisse diferentes características referentes à pronúncia e à organização sintática.
CORBIS/LATINSTOCK
DÉBORA SANTOS DA COSTA
Crioulos: os muitos “filhos” do português
Durante o processo de conquista e colonização dos territórios na África e na Ásia, os portugueses entraram em contato com um grande número de comunidades. A necessidade de estabelecer uma comunicação eficiente fez surgir uma série de línguas “mistas”, também chamadas de crioulos.
Os crioulos nascem do contato entre um idioma europeu e determinada língua nativa, conservando características das duas línguas de que se originam. Inicialmente surgidas para permitir o contato entre diferentes povos, essas línguas mistas acabam por se tornar crioulos quando passam a ser a língua materna falada pelas novas gerações.
Na Ásia, surgiram crioulos de base portuguesa na Malásia (Málaca e Kuala Lumpur), em Cingapura e em algumas ilhas da Indonésia (Java, Flores, Ternate, Ambom e Timor).
• Língua oficial × língua falada
Em Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, embora o português seja a língua oficial, são os crioulos de base portuguesa as línguas faladas pela população em situações de uso cotidiano.
De modo geral, o que se observa nesses países é que o português é utilizado nos documentos oficiais e administrativos.
Em Cabo Verde, por exemplo, os meios de comunicação (rádios e televisões) e as escolas também fazem uso da língua oficial. Na Guiné-Bissau, o contexto de uso é ainda mais restrito: somente na zona comercial conhecida como Praça (correspondente à zona central da capital, Bissau) a comunicação é feita em português.
Em São Tomé e Príncipe, o uso da língua oficial está associado à condição sociocultural: o português é falado pela população culta, pela classe média e pelos donos de propriedades.
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A diva dos pés descalços
Nascida em Mindelo (27 de agosto de 1941), na ilha de San Vicente, Cesária Évora é a mais conhecida cantora de Cabo Verde. Tornou famosa a morna, gênero musical derivado do fado português, cantado em crioulo cabo-verdiano, que fala da longa história de isolamento e sofrimento do povo local. Cesária ficou conhecida como a “diva dos pés descalços”, por apresentar-se sem sapatos em solidariedade aos sem-teto e às mulheres e crianças pobres de seu país. Em 2004, a cantora ganhou o prêmio Grammy de melhor álbum de world music contemporânea. Faleceu em 17 de dezembro de 2011, na sua cidade natal. Veja a seguir a letra de uma das belas mornas cantadas por Cesária Évora e conheça um pouco o crioulo cabo-verdiano de base portuguesa.
JEWEL SAMAD/AFP
Cesária Évora, EuA, 2008.
Flor di nha esperança
Se m’sabia
K’gente novo ta morrê
M’ka tava ama
Ninguém
Ness mundo
Ess morna
E sonho d’nha esperança
Ki ja confessam
Qu’ma bo amor
Era falso, ô flor
Na dispidida
Bo tchora tcheu
M’magoa
M’tchora também
Flor da minha esperança
Se eu soubesse
Que os jovens também morriam
Eu não teria amado
Ninguém
Nesse mundo
Essa morna
É o sonho da minha esperança
Que me revelou
Que seu amor
Era falso, ó flor
Na hora da despedida
Você chorou muito
Eu fiquei tão triste
Que chorei também
ÉVORA, Cesária. Flor da minha esperança. Tradução livre. Disponível em: . Acesso em: 2 mar. 2016.
EXPOSE/SHUTTERSTOCK
KANUS/ULLSTEIN BILD/GETTY IMAGES
Unidade e diversidade da língua portuguesa
Presente em diferentes países e continentes, a língua portuguesa apresenta uma enorme diversidade em termos da maneira como é utilizada em diferentes regiões e por diferentes grupos sociais. Há variações em termos fonológicos, morfossintáticos e lexicais. Apesar das muitas diferenças, os vários povos que falam português percebem-se como falantes de uma mesma língua.
Essa visão define tais países como “irmãos” linguísticos, membros da comunidade dos lusofalantes, e lhes dá identidade cultural. Por esse motivo, vários encontros mundiais têm sido promovidos pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa — CPLP (constituída por Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste) para estreitar os laços culturais e garantir a preservação da identidade linguística de seus membros.
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BIBLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL
ARQUIVO NACIONAL DA TORRE DO TOMBO, PORTUGAL
Timor Leste: um país reaprende a falar português
JACK MALIPAN TRAVEL PHOTOGRAPHY/ALAMY/LATINSTOCK
Praia em Dili, capital do Timor Leste, 2012.
Colônia portuguesa até 1975, quando foi invadido pela Indonésia, o Timor Leste reconquistou sua independência em 1999 por meio de um referendo popular organizado pela ONU. Uma das decisões tomadas no mesmo referendo foi a de banir a língua dos invasores e estabelecer o português e o tétum como línguas oficiais. Hoje, o português é falado por pouco mais de 20% dos timorenses. Professores de Portugal e do Brasil foram enviados ao Timor, em 2002, para auxiliar a população a reaprender uma das línguas que definem sua identidade cultural.
Para navegar
Muitas outras informações úteis sobre a formação da língua portuguesa e sua presença em diferentes países do mundo podem ser encontradas nos sites abaixo.
http://www.museudalinguaportuguesa.org.br
Portal do Museu da Língua Portuguesa, inaugurado na Estação da Luz (São Paulo, SP) em 2006. Além de trazer vários textos que explicam a história da formação do português e que discutem as diferenças entre a língua falada e a língua escrita, o portal também conta com um glossário de definições e termos técnicos.
http://www.instituto-camoes.pt/cvc/hlp/index.html
Parte do site do Instituto Camões é dedicada à apresentação da história da língua portuguesa. Há textos informativos sobre os diferentes crioulos de base portuguesa falados na África e na Ásia, bem como discussões sobre os diferentes dialetos utilizados em Portugal e no Brasil.
http://iilp.cplp.org/
Site do Instituto Internacional da Língua Portuguesa, criado em 1989, quando os países de expressão portuguesa se reuniram, em São Luís do Maranhão, para pensar as bases de uma comunidade lusófona. Traz links interessantes para o Vocabulário Ortográfico Comum (VOC), com os vocabulários de cada um dos países da CPLP, e também para a revista Platô.
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Capítulo 19 A estrutura das palavras
As palavras e sua estrutura
Leia atentamente a charge abaixo para responder às questões de 1 a 3.
Dalcio
© DALCIO/CORREIO POPULAR
DALCIO. Correio Popular. Campinas: 30 jun. 2012.
1. O sentido da charge é construído pela oposição de dois termos. Quais são eles? Explique o sentido de cada um.
2. O que está sendo criticado pelo autor da charge?
3. A crítica é construída pela mudança do significado de uma palavra obtida por uma pequena alteração de sua forma. Como essa alteração modifica o sentido dessa palavra?
> Escreva no caderno alguns exemplos de palavras que tiveram seu sentido original modificado pelo mesmo processo.
Na charge de Dalcio, o efeito de sentido é obtido por meio de um jogo de palavras que consiste no acréscimo de um elemento capaz de modificar o sentido do termo original.
Para nós, falantes, as palavras são unidades linguísticas muito importantes, pois traduzem as significações básicas a partir das quais construímos o sentido dos textos.
Tome nota
Palavra é uma unidade linguística de som e significado que entra na composição dos enunciados da língua.
Embora vejamos a palavra como um todo, é possível reconhecer as unidades menores que entram na sua formação. Por isso, no caso da charge, atribuímos mudança de sentido à palavra quando se acrescenta ao substantivo gelo um elemento que o modifica (des-).
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Neste capítulo, vamos conhecer melhor como o sentido das palavras pode ser modificado pela alteração de sua estrutura interna.
No caso do exemplo, o prefixo des- atribui um sentido de negação ou falta ao radical.
Os elementos mórficos
Os falantes de qualquer língua conhecem e usam um número enorme de palavras ao longo de sua vida. Essas palavras constituem o léxico de cada falante, ou seja, o repertório total de palavras que ele conhece.
Algumas palavras fazem parte do léxico de todos os falantes, como pai, mãe, água, dia, medo, etc. Outras, no entanto, fazem parte do repertório de algumas pessoas apenas, pois se referem a objetos ou a conceitos que não estão presentes na vida de todos. Alguns exemplos: pipeta, sintagma, epistemologia, deflação, etc.
As palavras podem ser, na maioria das vezes, divididas em elementos menores, dotados de significação. Esses elementos são chamados de morfemas.
Tome nota
Morfemas são unidades mínimas de significação.
Observe os exemplos deste conjunto.
pedra, pedrinha, pedregulho, pedreiro, pedregoso
nado, nadamos, nadam, nadei, nadaram, nadaria, nadasse, nadar
O primeiro aspecto estrutural que chama a nossa atenção, nas palavras acima, é o fato de apresentarem algumas partes idênticas, portadoras de um significado básico: pedr e nad-. Essas partes que se repetem são os morfemas que recebem o nome de radicais.
pedr- é um radical de origem grega que significa “rochedo, rocha”;
nad- é um radical de origem latina que está associado à ideia de “flutuar, ser levado pela água”.
Agora, observe os exemplos do próximo conjunto de palavras.
descontrolar, desobrigar, desrespeitar, desfazer, desmentir
recentemente, calmamente, furiosamente, lentamente, rapidamente
Os morfemas des- e -mente foram acrescentados ao radical de diferentes palavras, modificando o sentido básico desse radical. Esses morfemas recebem o nome de afixos.
Tome nota
Afixos são os morfemas que, somados aos radicais, formam novas palavras. Quando acrescentados antes do radical são chamados de prefixos e, adicionados após o radical, de sufixos.
O prefixo des- atribui ao radical um sentido de negação ou falta. O sufixo -mente forma advérbios e acrescenta ao radical a ideia do modo como uma determinada ação ocorre.
Existem também palavras constituídas de um único morfema. Alguns exemplos são: feliz, mar, que, sempre, papel.
Tome nota
Os morfemas são classificados em lexicais e gramaticais.
Os morfemas lexicais fazem referência a seres ou conceitos da realidade objetiva ou subjetiva (Paulo, dia, ar), ou seja, possuem referentes extralinguísticos.
Os morfemas gramaticais têm uma significação interna ao sistema linguístico, porque atuam para estabelecer relações entre palavras ou para marcar categorias como gênero, número, modo, pessoa, etc.
Os diferentes tipos de morfema
Observe a separação dos elementos constitutivos da palavra felizes.
Radical (morfema lexical)
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Vogal de ligação
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Morfema de plural (morfema gramatical)
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feliz
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-e-
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-s
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Esses elementos têm características diferentes. O radical feliz é considerado uma forma livre, pois também pode ocorrer isoladamente, sem os demais morfemas. Esse radical serve de base para a formação de várias outras palavras da língua, como felic + -i- + -dade, felic + -itar, feliz + -mente.
Os outros elementos mórficos (a vogal de ligação -e- e o morfema de plural -s) são formas presas, porque nunca ocorrem isoladamente. Como sempre desempenham a mesma função morfológica, aparecem na constituição de várias outras palavras do português: audaz + -e- + -s, capaz + -e- + -s.
Elementos mórficos formadores das palavras
Quando várias palavras são formadas a partir de um mesmo radical, elas são chamadas de cognatas. É o que ocorre no caso dos exemplos abaixo.
casa, caseiro, casario, casal, casada
estudar, estudante, estúdio, estudioso
Entre os morfemas que formam as palavras, cumprem função diferente as desinências, as vogais temáticas, os afixos e as vogais e consoantes de ligação. A seguir conheceremos melhor cada um desses morfemas.
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• Desinências
Algumas palavras da língua assumem uma forma diferente para indicar uma variação de gênero (masculino e feminino), número (singular e plural), modo, tempo e pessoa. Os elementos mórficos responsáveis pela marcação dessas variações são as desinências.
O estudo das desinências faz parte da chamada morfologia flexional.
Tome nota
As desinências são os sufixos que indicam as flexões das palavras variáveis.
As flexões podem ser de gênero e de número nos nomes (substantivos, adjetivos e pronomes), indicadas pelas desinências nominais, e de modo-tempo e número-pessoa nos verbos, indicadas pelas desinências verbais.
Desinências nominais: menina, meninas, cansada, cansadas, esta, estas.
Desinências verbais: namorar, namoramos, namorávamos, namorassem, namoraríamos.
• Vogal temática
Podemos observar, em nomes e verbos do português, a ocorrência de determinadas vogais que criam “famílias” de temas. São as vogais temáticas.
Não apresentam vogal temática as palavras que têm a última sílaba tônica, como sofá, café, cipó, amor, papel, feliz.
Tome nota
A vogal temática é uma vogal que se acrescenta a determinados radicais antes das desinências (sufixos flexionais). O conjunto formado por radical + vogal temática recebe o nome de tema. Os temas podem ser nominais e verbais.
Vogais temáticas nominais
Somadas aos radicais nominais (paroxítonos ou proparoxítonos), as vogais átonas finais (-a, -o e -e) atuam como vogais temáticas nominais e formam as classes de palavras de tema em -a (artist-a), -o (caval-o) e -e (inteligent-e).
As vogais temáticas nominais não indicam o gênero gramatical, porque podem ocorrer tanto em palavras de gênero masculino como de feminino: o artista, o poema, a virago, a corte.
A desinência nominal indicadora de gênero feminino (-a) é acrescentada aos temas nominais constituídos de radical + vogal temática -o: o menino (radical: menin-; vogal temática: -o) a menina (radical: menin-; desinência nominal de gênero feminino: -a).
Vogais temáticas verbais
Somadas aos radicais verbais, as vogais -a, -e, -i atuam como vogais temáticas verbais e definem as conjugações. Observe.
Primeira conjugação
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Segunda conjugação
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Terceira conjugação
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Vogal temática
-a
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am-a-r
am-a-va
am-a-rão
am-á-ssemos
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Vogal temática
-e
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com-e-r
com-e-rá
com-e-ssem
com-ê-ramos
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Vogal temática
-i
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fug-i-r
fug-i-rmos
fug-i-rem
fug-i-remos
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• Afixos
Os afixos, como vimos, são morfemas que atuam na formação de novas palavras. Seu estudo faz parte da chamada morfologia derivacional. Conheceremos agora os prefixos e os sufixos.
Prefixos
Os prefixos são afixos que se acrescentam antes do radical, modificando seu sentido básico. Veja.
impaciência, descompensar, contradizer, expor, opor, semicírculo
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Frank & Ernest
Bob Thaves
FRANK & ERNEST, BOB THAVES © 2014 THAVES/ DIST. BY UNIVERSAL UCLICK
THAVES, Bob. Frank & Ernest. O Estado de S. Paulo. São Paulo, 26 ago. 2014.
Na tira, observamos um senhor que conversa com um gerente de banco sobre um financiamento para a compra da casa própria. Da sua fala, podemos concluir que o valor a ser pago é alto, já que ele afirma: “Este financiamento da casa própria certamente me deixará ‘imóvel’!”. O termo imóvel é formado pelo acréscimo de um prefixo (in-) à palavra móvel.
O autor da tira faz um jogo de palavras para explorar dois sentidos diferentes do termo imóvel, que, como adjetivo, indica algo sem movimento; como substantivo derivado desse adjetivo, significa edificação, bem fixo (qualquer tipo de propriedade).
Sufixos
Os sufixos são afixos que se acrescentam depois do radical, modificando o seu sentido básico ou a classe gramatical a que pertence originalmente o radical.
Armandinho Alexandre Beck
© ALEXANDRE BECK
BECK, Alexandre. Armandinho. Disponível em:
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