Revisão e Editoração Eletrônica João Carlos de Pinho



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Bem que ela gostaria de encontrar a paz e esquecer sua frustração. A vida estava indo embora e arrastando tudo em que ela acreditara. As ilu­sões estavam ruindo e Maria Alice sentia que nada iria sobrar em que pu­desse agarrar-se.

Daniel afastara-se, Lanira qualquer dia iria casar-se. O que lhe resta­ria? O marido infiel, desonesto, ambicioso e fútil? De repente sentiu-se eno­jada da situação falsa em que vivia. Como levar adiante sua vida vazia?

Algumas lágrimas afluíram e ela as deixou cair. Tinha que fazer algu­ma coisa. Era uma mulher forte e determinada. Não podia aceitar a des­truição de tudo sem lutar. Mas o que fazer? Como seguir adiante? Onde encontrar de novo a paz do coração e a motivação para prosseguir?
Capítulo 21
Antônio chegou em casa no fim da tarde. Maria Alice ainda estava na penumbra da sala de estar pensando.

A carta anônima que recebera dois dias atrás tivera o dom de colo­cá-la frente a frente com uma realidade que ela fingia ignorar. Depois que Lanira saiu com Alberto, ela se sentara ali e toda a sua vida, como num filme, passou diante de seus olhos.

Lembrou a jovem bonita, cheia de vontade de viver, os primeiros anos de casamento, as primeiras desilusões, a certeza de que seu dever era preservar a família acima de tudo, até dos próprios sentimentos.

Cedo descobriu que naquela sociedade a ingenuidade pagava um preço alto, que muitas pessoas, atrás do verniz da educação, eram capa­zes de trair, que a ambição, o jogo de interesses falavam mais alto do que a amizade.

Maria Alice começou a perceber como fora pouco a pouco modifi-cando-se, entrando no jogo da maioria, valorizando as aparências. De tan­to sufocar seus sentimentos, de tanto colocar em primeiro plano os con­ceitos da maioria, acabara por tornar-se um autômato, sem vontade pró­pria, sem prazer, sem entusiasmo.

Quando Antônio entrou, vendo-a na penumbra em silêncio, não se conteve:

— Maria Alice! Você está bem?

Ela se levantou, acendeu o abajur e respondeu:

— Estou. E você?

Ele fez um ar de cansaço:

— Mais ou menos. Essas viagens me cansam. Ter que discutir exaus­tivamente, trabalhar nos fins de semana, é muito cansativo!

— Por que não deixa de viajar? — disse ela com voz calma.

— Por amor à causa. Tenho que trabalhar pelo nosso país. Para isso me elegeram.

Ela o olhou séria e respondeu:

— Comigo não precisa fingir. Não está precisando de meu voto. Antônio surpreendeu-se:

— O que houve? Aconteceu alguma coisa para você me tratar assim?

— Nada de novo. Tudo continua igual em minha vida, e sabe de uma coisa? Quem está cansada, muito cansada, sou eu.

— Como assim? Você ficou em casa descansando enquanto eu esta­va trabalhando. Do que se queixa?

Maria Alice não respondeu logo. Olhou-o séria, depois disse:

— De nada. Você não vai subir para descansar?

— É uma boa idéia. Vou tomar um banho e relaxar um pouco. Depois que ele subiu, Maria Alice sentou-se novamente no sofá. De

repente ela sentiu que ele sempre fora o mesmo. Durante todos aqueles anos de vida em comum ela tentara entrar no jogo dele, mascarando suas atitudes, dizendo a si mesma que o marido era um homem voltado ao bem do país, um homem ilustre, respeitado e de bem.

Agora, a máscara de seus olhos caíra. Não só pela traição de seus sen­timentos de mulher, trocando-a pela secretária, mas muito mais pela trai­ção aos ideais que ele sempre pregara em suas campanhas e nunca cum­prira nem cumpriria.

Percebeu que imaginara estar se casando com um homem nobre, cheio de sentimentos elevados, e unira-se a um egoísta, mentiroso e apro­veitador do dinheiro público.

A constatação dessa verdade chocou-a. Maria Alice sentiu brotar dentro dela o desejo real de fazer alguma coisa boa na vida. Não podia con­tinuar sentindo-se inútil, sem objetivos.

Pensamentos contraditórios passavam por sua cabeça, deixando-a confusa e inquieta. Sentia que precisava reagir para não mergulhar ainda mais na depressão e na tristeza. Mas o que fazer?

Atirar a carta anônima na frente do marido não iria resolver nada. Ele negaria e ela não estava disposta a suportar sua suposta indignação. Repugnava-a essa hipocrisia. De repente decidiu. Apanhou o telefone e discou para Daniel. Ele atendeu:

— Como vai, mãe?

— Bem. Lanira me contou que vocês estão vencendo. Fiquei mui­to feliz. Parabéns.

— Obrigado. Você está bem? Sua voz está diferente. Aconteceu al­guma coisa?

— O de sempre. Minha vida está muito sem graça. Mas não foi para isso que liguei. Lanira me disse que vocês têm ido a casa de Josefa. Lani­ra teceu muitos elogios. Minha irmã sempre foi uma pessoa estranha. La­nira não estará enganada?

— Não, mãe. Tia Josefa tem sido para nós uma orientadora maravi­lhosa. Tem nos ajudado muito com seus conhecimentos espirituais. Você não tem motivos para se preocupar. Aliás, você deveria ir vê-la. Tenho cer­teza de que lhe faria muito bem.

— Se você diz, eu acredito.

Eles continuaram conversando alguns minutos, e quando Maria Ali­ce desligou, tomou uma decisão. No dia seguinte ligaria para Josefa e, se ela permitisse, iria visitá-la. Precisava falar com alguém sobre seus proble­mas. Começava a pensar que ela seria a pessoa certa.


Lanira entrou no carro de Alberto dizendo alegre:

— Parece que estamos chegando ao final do trabalho.

— E. Quando tudo acabar não saberei o que fazer com meu tempo. Durante anos não tive outra preocupação.

Ela sorriu e respondeu:

— Tenho certeza de que encontrará milhões de coisas. Tudo está a seu favor.

— Agradeço a Deus todos os dias ter permitido retomar o fio de mi­nha vida. Eu sabia que você estava preocupada com Gabriel, mas ainda assim resolvi telefonar-lhe.

— Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Gabriel é meu ami­go e está sofrendo muito com toda essa história.

— Fiquei com medo que ele fosse mais do que um amigo. Notei o modo como ele olha para você.

— Chamou-me para falar sobre esse assunto?

— Não propriamente. Na verdade, senti-me muito só. Minha vitó­ria fez-me compreender que ela nunca trará de volta tudo quanto perdi.

— O passado acabou e não tem remédio. Seria melhor que não dei­xasse essas mágoas diminuírem a alegria de sua conquista. Pelo que sei, está colocando tudo em seus devidos lugares. Sua persistência acabou por re­velar os crimes contra as pessoas de sua família e os culpados. Sei que não é muito. Você preferia que eles estivessem vivos. Mas não teve escolha.

— Não tive mesmo. Estou me sentindo sozinho, mas não pretendo mergulhar na tristeza nem me revoltar. O que eu desejo é encontrar uma forma de reagir, de me entusiasmar, seguir para a frente, fazer alguma coi­sa boa que justifique essa vitória que a vida está me dando. Sei que ela tem um preço. Pelo que conheço da espiritualidade, o que nos aconteceu teve um motivo justo.

— É muito nobre de sua parte reconhecer isso.

— Não se pode negar a verdade. Se nós não tivéssemos que passar por todas essas terríveis experiências, certamente teríamos sido poupa­dos. Sei que Deus não erra nem castiga. Apenas ensina o que precisamos aprender.

— Pensar assim ajuda bastante.

— Alivia. Mas reconheço que apesar disso a mágoa ainda me depri­me. Há momentos em que me sinto muito só, sem rumo, como se hou­vesse perdido a motivação de tocar a vida para a frente. Parece um para­doxo, mas é difícil explicar.

— Não é, não. Dá para entender. Durante tanto tempo você colo­cou todas as suas energias na conquista desse objetivo. Deixou tudo de lado. Agora que o está alcançando, percebe que todas as outras necessidades de seu espírito ficaram abandonadas. Isso vai passar. Tenho certeza de que logo você retomará sua vida normal e tudo estará resolvido.

— Tem razão. Desde que voltei ao Brasil deixei de lado todo senti­mento pessoal para me dedicar inteiramente à realização desse objetivo. Não fiz amigos, não tive lazer nem namoradas. Não queria que nada me desviasse. Sabia que precisava de toda a minha energia para vencer.

Lanira sorriu e tornou:

— Olhando para você, tenho certeza de que fará muito sucesso nes­te Rio de Janeiro. Basta querer. Quando comprar um palacete, roupas da moda, freqüentar alguns clubes, logo haverá muitas mulheres à sua volta e amigos a escolher.

Ele parou o carro. Haviam chegado ao restaurante. Depois que se sentaram à mesa e que fizeram o pedido foi que ele retomou o assunto:

— O que você disse é verdade. E é o que mais me atemoriza.

— Por quê ?

— De pessoas interesseiras e falsas quero distância. Se quer saber, pen­so que continuarei a ser um bicho do mato em meu canto.

— Assim não conseguirá se relacionar bem. Também não gosto de certas pessoas nem de suas futilidades. Mas generalizar é perigoso. Há pes­soas boas, honestas, sinceras, com as quais vale a pena conviver. Basta sa­ber escolher.

— Eu sei. Daniel, Rubinho e você. Os dois como advogados têm sido mais formais. Mas quando tudo acabar, serei feliz se me aceitarem como amigo. Quanto a você, confesso que sinto mais afinidade. Você é uma pessoa verdadeira. Diz o que pensa. Não tem aqueles pequenos artifícios que a maioria das mulheres usam. Eu aprecio isso.

O garçom trouxe a comida e ficaram silenciosos por alguns minutos. Depois Alberto tornou:

— Você está apaixonada por Gabriel? Lanira fitou-o séria:

— Por que pergunta?

Ele pousou o talher sobre o prato e olhando-a nos olhos respondeu:

— Porque não posso esquecer aquela noite. O gosto daquele bei­jo ainda está me queimando os lábios. Sinto por você grande atração e, não posso negar, muito ciúme de Gabriel. Quero saber se ainda te­nho chance.

— Entre mim e Gabriel não existe nenhum compromisso. Não nego que gosto dele. Mas ainda não sei até que ponto.

Uma sombra de tristeza passou pelo rosto de Alberto.

— Acho que cheguei tarde demais. Ele já se declarou?

— Já. Pediu-me em casamento. Mas recusei.

— Então...

— Ainda não estou preparada para casar. Tenho idéias próprias so­bre a vida familiar. Não sou uma mulher conformada como tantas outras. Quero ser feliz, levar a vida como eu gosto, fazer o que eu acho bom e éti­co sem me importar com as aparências. Em sociedade isso é difícil. De­pois, só me casarei quando tiver certeza de meus sentimentos. O amor, a sinceridade são muito importantes para mim.

— Você sabe o que quer, o que é raro nas garotas de hoje.

— A maioria tem a cabeça cheia de ilusões que aprendeu em socie­dade. Esperam o príncipe encantado e acordam frustradas e infelizes. De­pois levam o casamento para a frente com receio de confessar o próprio fracasso. Não quero ser assim.

— Você nunca será. Tem idéias próprias. Nesse caso...

— O quê?

— Ainda não estou de todo fora do páreo. Vamos brindar a isso — disse ele sorrindo e levantando o copo de vinho.

Quando os copos se tocaram, Lanira não se conteve:

— Você deveria sorrir mais. Toda a sua fisionomia muda quando você sorri.

— Vou tentar.

Depois do brinde, Alberto não tocou mais no assunto. Começou a talar sobre a Inglaterra, que tinha como sua segunda pátria, e Lanira in­teressou-se vivamente.

Alberto era muito observador e excelente narrador. Descreveu len­das e costumes e até algumas aventuras de juventude. O tempo passou com rapidez, e quando Lanira olhou o relógio, passava das três. Assustou-se.

— Preciso ir.

— Já? Está tão bom aqui.

— É verdade. Nem senti o tempo passar. Quero saber se a polícia des­cobriu alguma coisa dos fugitivos. Você não tem que trabalhar?

— Hoje é feriado em nossa empresa. Estão comemorando o aniver­sário de fundação. Há até um jantar logo mais à noite.

— Você vai?

— Só se você me acompanhar.

— Obrigada, mas não posso.

Ele pagou a conta e saíram. No carro, Alberto tornou:

— Eu vou passar no escritório de Daniel para ver como estão as coi­sas. Vamos?

Lanira pensou um pouco e respondeu:

— Está bem. Também quero saber se há alguma novidade. Vendo-os entrar juntos, Daniel olhou-os pensativo, mas cumprimen­tou-os com naturalidade.

— Alguma novidade dos fugitivos? — indagou Lanira com interesse.

— Nada ainda. Parece que derreteram. Ninguém consegue descobrir para onde foram.

O telefone tocou e Daniel atendeu:

— Jonas? Alguma novidade?

— Prendemos o falsário e o interrogamos. A princípio negou, mas por fim deu o nome que colocou no passaporte de José Luís e esposa. Dois homens estão checando as empresas aéreas. Logo saberemos para onde foram.

— Devem estar fora do país.

— Não estou certo. Além do passaporte, o falsário forneceu outros documentos,que só servem para ser utilizados aqui.

— Quer dizer que eles ainda podem estar aqui.

— A meu ver é uma possibilidade remota. Ele estava com muito medo. Sabe que, pela extensão de seus crimes, se for preso nunca mais sai­rá. Deve ter desejado ir para bem longe.

— E o mais provável. O que pretende fazer agora?

— Se os nomes que temos estiverem em alguma lista de embarque, imediatamente comunicaremos à polícia internacional. Não descansarei enquanto não pusermos as mãos nesse criminoso.

— Avise-me se tiver alguma outra notícia.

Daniel desligou e contou a eles como estavam as investigações. De­pois que ele finalizou, Lanira disse:

— Vou telefonar a Gabriel para dar as notícias.

— Ele já me ligou hoje. Perguntou se você estava aqui.

— Vou à sua sala falar com ele.

Ela saiu e Daniel percebeu a inquietação de Alberto e perguntou:

— Está preocupado com alguma coisa?

— Estou. Sempre fico quando Lanira fala com Gabriel.

Daniel olhou-o sério. Já havia notado que os olhos dele brilhavam quando se fixavam em Lanira. Não se sentia muito à vontade ao lado dele e não gostaria que ele namorasse sua irmã. Não se conteve:

— Está interessado nela?

Alberto sustentou o olhar e respondeu:

— Muito. Se ela me quiser, ficarei muito feliz.

— Ela é muito jovem para um compromisso.

— Nem tanto. Meu interesse por ela desagrada-o?

A atitude franca de Alberto desconcertou-o, e ele respondeu:

— Não se trata disso. Não nego que sinto certo ciúme de minha irmã.

— Estou sendo sincero. Lanira voltou e eles se calaram.

— Laura não está bem e Gabriel está inquieto, nervoso. Fica o tem­po todo ao lado do telefone. Acho que nem dorme direito. Atende ao pri­meiro toque. Vou tomar um táxi e ir até lá.

— Eu levo você — disse Alberto.

— Não se incomode.

Ele iria insistir, mas Daniel interveio:

— Deixe-a ir. Quando ela decide, nunca volta atrás. Prefiro que vá comigo até a delegacia. Temos que falar com Eleutéria. O delegado tem um plano em mente e precisa de você.

Alberto fez um gesto de impotência:

— Se é assim, eu me rendo.

— Já vou indo. Obrigada pelo almoço. Se tiverem alguma notícia, liguem para lá.

Daniel prometeu e ela saiu, deixando no ar o leve aroma de seu perfume.

Ao chegar na delegacia, Daniel viu-se logo cercado por vários jorna­listas. Todos queriam saber detalhes das investigações em andamento, en­volvendo o desaparecimento do Dr. José Luís e esposa.

Daniel pediu-lhes paciência, dizendo que a polícia ainda precisava man­ter sigilo para não atrapalhar as investigações. Prometeu dar-lhes esses detalhes assim que pudesse.

O seqüestro de Alberto, que se intitulava ser Marcelo, o dono legí­timo daquela fortuna, a prisão do mordomo de José Luís, a presença da ama do menino na delegacia sendo interrogada e principalmente o desapare­cimento do médico indicavam que ele era culpado.

As informações vazaram e tomaram vulto na imprensa, tendo alguns jornais mais sensacionalistas publicado manchetes chamativas e dramá­ticas. Tiraram várias fotos de Alberto e de Daniel quando os viram.

Entraram na delegacia e procuraram o delegado. Depois dos cumpri­mentos, Daniel considerou:

— Os jornalistas estão ávidos de notícias. Acha que podemos falar?

— Eles ficam por aqui à cata de novidades. Não nos foi possível es­conder mais. Creio que a esta altura podemos contar a verdade — respon­deu o delegado. — A confissão de Bóris é prova suficiente.

— Acha mesmo que eles mataram meus pais e meu avô? — inda­gou Alberto.

— Acho. Mesmo levando em consideração que Bóris não merece confiança, acredito que disse a verdade. A lógica nos conduz a isso. De que valeria afastar apenas você se o dinheiro estava nas mãos da família? Quando José Luís fez esse plano, já tinha planejado acabar com os ou­tros também.

Alberto suspirou e ficou pensativo. Foi Daniel quem tornou:

— É difícil acreditar que alguém possa ser tão frio a ponto de exter­minar pessoas de sua família por causa de dinheiro.

— Eu não me surpreendo. Nesta delegacia tenho visto cada coisa que há muito fez-me duvidar da bondade humana. Esse é mais um caso de crueldade entre os muitos a que tenho assistido.

— Mesmo eu, depois do que fizeram comigo, nunca imaginei que eles houvessem cometido esses crimes. Como eles morreram todos em pouco tempo, confesso que algumas vezes essa idéia passou por minha cabeça, mas ao mesmo tempo achei impossível. É triste ter que reconhecer que essa tra­gédia aconteceu com meus familiares. Sinto-me só. Apesar de ganhar essa causa que era toda a minha expectativa, a sensação de perda é muito viva dentro de mim.

— Posso compreender — tornou Marques. — Mas por outro lado, se você não tivesse levado à frente suas pesquisas, nunca os teríamos desmascarado. Eles continuariam usufruindo do nome, do dinheiro e do po­der que desfrutavam.

— Deus poupou sua vida para que pudesse cumprir essa missão — disse Daniel, e os outros dois olharam-no admirados.

Marques considerou:

— Algumas pessoas acreditam em crime perfeito. Muitos deles a po­lícia nunca consegue desvendar, permanecem ocultos das leis dos homens. Mas sabem duma coisa? Eu também creio que Deus tem lá sua maneira de fazer justiça.

Alberto baixou a cabeça pensativo. Sabia que, se descobrira muitas coisas, fora com a ajuda do espírito de seu avô. Esperava que ele também o ajudasse a continuar quando tudo isso terminasse.

— Pedi que viessem aqui — continuou Marques — porque quero que Alberto converse com Eleutéria. Você consegue lembrar-se de alguma coisa daquele tempo?

— Lembro de alguns rostos, algumas coisas daquele tempo, mas de­talhes, não.

— Vamos até lá e ver o que acontece.

O delegado conduziu-os até a sala onde a ama estava detida. O ma­rido e o advogado estavam com ela. O delegado entrou e disse:

— Tem uma pessoa que deseja vê-la.

Ela levantou a cabeça e os olhos dela se encontraram com os de Al­berto, que estava ao lado do delegado. Seu rosto empalideceu, ela come­çou a tremer e não conseguiu articular palavra.

Alberto aproximou-se dela olhando-a nos olhos e dizendo:

— Como vai, Teia?

Ela cambaleou e segurou-se na cadeira. Seu advogado fê-la sentar-se.

— Quem é você? O que está acontecendo aqui? — indagou ele.

— Ela sabe quem eu sou. Reconheceu-me, apesar de fazer muitos anos que não nos vemos. A última vez eu tinha quatro anos, não é, Teia? Não era assim que eu a chamava?

— Eu... — gaguejou ela — não sei... Não quero vê-lo. Vá embora.

— Como pode fazer isso comigo? Não percebe o mal que fez aos meus e a mim?

Ela levantou as mãos como querendo afastá-lo de sua frente e gritou:

— Não quero. Vá embora. Você está morto. Alberico garantiu que você tinha morrido. Aquele maldito.

— Cale-se. Não diga mais nada — interveio o marido, assustado.

— Não precisa responder nada — atalhou o advogado dela.

— Você está obstruindo a justiça — tornou o delegado. — Saiba que tudo quanto ela disse foi gravado. Ela tem o direito de confessar. Ela aca­bou de reconhecer esse jovem como sendo Marcelo, o menino cuja for­tuna ela ajudou a usurpar.

— Ela está emocionalmente abalada. Nunca esteve detida em uma de­legacia. Aliás, aqui está havendo um abuso. Ela foi detida indevidamente.

— Há um mandato judicial. Ela não compareceu para depor. Ela está detida para isso.

— Nesse caso, não tem que dizer nada nem falar com ninguém. Ape­nas apresentar-se ao juiz.

— Eu quis falar com ela — declarou Alberto. — Queria ver se po­dia reconhecê-la. Não só a reconheci como ela também me identificou. Agora terá que contar direitinho todos os detalhes de como eles mataram toda a minha família.

Eleutéria olhou-o assustada:

— Eu não sei. Juro que não sabia que eles iam fazer isso.

— Mas concordou que Alberico acabasse com o menino. Não é ver­dade? — disse o delegado olhando-a nos olhos.

— Deixem-me em paz. Não vou dizer mais nada.

Marques ficou calado alguns segundos, depois disse com voz calma:

— Estamos todos aqui agora. A vítima, a culpada e os advogados. Va­mos aproveitar este momento e tentar esclarecer melhor esse caso. Se ela confessar tudo e facilitar a ação da justiça, isso será levado em considera­ção. Sua pena pode ser aliviada. Como advogado dela, você sabe que não tem outro caminho. As provas são muito convincentes, e negar é impos­sível. Portanto, o melhor que tem a fazer é aconselhar sua cliente a con­tar toda a verdade e assumir sua parte da responsabilidade.

Eleutéria olhou para seu advogado, que considerou:

— Vocês me contaram uma história dizendo que eram inocentes. Es­tou vendo que não disseram a verdade. O delegado está certo. E melhor contar tudo. Eu prometo fazer o que puder para ajudá-la.

Eleutéria caiu em pranto e cobriu o rosto com as mãos.

— Eu não queria fazer isso. Eles me obrigaram. Parecia coisa simples, fácil. Eles fizeram tudo, trouxeram o corpo. Eu só consenti e simulei o aci­dente. Não fiz por mal.

Alberto sentiu o estômago enjoar e saiu da sala. Daniel conversou com o advogado dela, que pedia que concordassem em libertá-la até o julga­mento. Como ela era primária, eles concordariam desde que ela assinas­se uma confissão completa.

Maria Alice ligou para Josefa, que a atendeu prontamente. Depois dos cumprimentos, ela tornou:

— Lanira e Daniel me contaram que têm estado em sua casa. Estou precisando muito conversar com você. Poderia me receber?

— Claro. Minha casa está sempre aberta para você. Quer vir tomar chá comigo esta tarde?

— Hoje? Havia pensado em ir amanhã.

— Você tem algum compromisso hoje?

— Não.


— Então venha. Estarei esperando.

Ela desligou e olhou o relógio. Passava um pouco das duas, tinha tempo. Antônio desceu as escadas. Tinha tomado banho e recendia a lavanda. Estava muito bem vestido. Vendo-a, disse apressado:

— Que vida a minha. Não posso descansar em casa nunca.

— Vai sair?

— Telefonaram-me do escritório. Tenho que ir até lá. Há um assun­to inadiável a resolver.

Maria Alice não respondeu. As palavras da carta anônima vieram-lhe à mente e ela sentiu um aperto no coração. Precisava fazer alguma coi­sa para não explodir. Sentia que não podia mais agüentar aquela situação.

Ele saiu e ela mandou o chofer tirar o carro, arrumou-se e foi a casa de Josefa. Sentia o peito oprimido, muita tristeza e certo constrangimen­to. Como seria recebida? Depois do que ela fizera, Josefa tinha todo o di­reito de tratá-la com frieza. Se isso acontecesse, voltaria para casa sem lhe dizer o motivo que a levara até lá.

Josefa recebeu-a com carinho. Abraçou-a como se sempre estivessem estado juntas, e essa atitude inesperada provocou forte emoção em Maria Alice. Acanhada, esforçou-se por controlar-se.

Sentadas no aconchego da sala, tendo à frente uma xícara de chá e alguns biscoitinhos delicados, Josefa confidenciou:

— Estou muito contente que tenha vindo ver-me. É minha única irmã e sempre admirei-a.

— Bondade sua. Reconheço que tenho sido preconceituosa com você, por causa da religião. Daniel e Lanira me contaram que têm vindo aqui e você os tem ajudado.


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