Casa dos mortos



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seguir riada; quem acredita em for‡ados? O maior manda contra ela.

procurar os insfigadores, e se estivermos enfre eles, sera - Enfrefanfo, disse eu

dirigindo-me embara‡ado a M-cki

sobre nos que ha de recair a culpa. Lembre-se do que nos fora esfes, todos estão 1a.

trouxe para ca. Eles serao apenas fustigados, mas n¢s - Sim. mas que temos n¢s com isso? rosnou 13

seremos levados a julgamento. "Oito olhos" nos odeia e - Arriscariamos muito mais que

eles, indo para Ia-, e

ficara satisfeito se nos desgra‡ar. Seremos a sua justifica- com que fim? Je hais ces

brigands (3), ajuntou M-cki em

‡ão. frances. Vocˆ acha que a reivindica‡ão deles dar6 em alguma

- E os "colegas" serão os primeiros a nos enfregar de cousa? Vão se complicar - e so

o que lucrarão.

pes e mãos atados, acrescentou M-cki, quando enframos na -  verdade, disso não vai

sair nada de bom, apoiou

cozinha. um dos outros for‡ados, um velho de genio azedo e teimoso.

- Claro, não terão do nem piedade, confirmou T-ski. 1, Almazov, que fambem esfava

entre nos, apressou-se em

Alem dos nobres, uns trinta presos se haviam refugiado concordar veementemente.

nas cozinhas: uns, covardes demais para queixas, outros, con- - ! Uns cinquen+a pelo

menos irão as varas, decla-

vencidos da inutilidade da medida. Esfava 16 Mim M¡mitch, rou.

inimigo figadal de qualquer manifesta‡ão confraria ... boa - Esfa . ai o maior!

grifou alguem, e todos se precipita-

ordem e a disciplina; esperava sem dizer palavra, numa calma ~i 1 1 ram para as janelas.

absolufa, +3o pouco o preocupava o desenlace do caso O maior acorria, furioso,

desesperado, rubro, com os

convicfo do triunfo inevifavel da ordem e da auforidade1'~, '¢culos na cara. Sem uma palavra, porem decidido, avan‡ou

Com a cabe‡a baixa e muito inquieto, Isai Fomi+ch escutavaperto dos homens enfileirados. Nesses casos sua bravu

com avidez medrosa as nossas conversas. Todos os rLisficos,~-¡ra era real, e não lhe faltava presen‡a de espirifo. Alias,

polacos haviam considerado bom agruparem-se -em `forricestava quase sempre embriagado. Af‚ mesmo o seu gorro

dos seus fidalgos. Alguns for‡ados russos, fimidos, - gentesebento, com barra alaranjada, e as dragonas de prata tinham #

ap tica, silenciosa, deprimida, que não ousava fornar parfe em (3) "QdeiQ estes briguentosi" (N de R. Q)

nada, - esperavam com angustia Q resultado da reclama‡ão. #

354


DOSTOIEVSKI

naquele instante qualquer cousa de sinistro. Seguia-o O

furrie! Dia+lov, personagem extremamente importante, que

dirigia tudo no presidio, e tinha mai¡s influencia que o vo-

prio maior. Era um velhaco mas sem maldades, e os for‡a-

dos sentiam-se satisfeitos com ele. Afras de Diaflov vinha

o nosso sargento, que decerfo levara uma boa ensaboadela,

e esperava outra, dez vezes pior. Tres ou quatros soldados

os seguiam. Os presos, que estavam de cabe‡a descoberta

desde o momento em que haviam mandado chamar o maior,

endirei+aram-se rapidamenfe, enrijaram-se nas pernas, depois

se imobilizaram, aguardando a primeira palavra, ou melhor,

o primeiro grifo do chefe.

Não tiveram que -esperar muito: j ... segunda s¡laba o

maior berriava como um possesso; sibilava, f5o grande era

o seu furor. Da janela, podiamos vˆ-lo correr ao longo da

fila, afirar-se para a frente, interrogar. Es+avamos entretanto

afastados demais para lhe entender as perguntas, bem como

as replicas dos for‡ados. Escu+avamos-lhe apenas o grifar,

com voz estridente:

- Uma rebelião! ... As varas! ... os cabe‡as! Tu que

6s cabe‡a disso, fui uivou, afirando-se a um homem.

Não se ouviu a resposta. Mas ao cabo dum momenfo

vimos um for‡ado deixar a fileira e sair para o corpo da guar-

da. Um instante ap6s um outro o seguiu, depois um fer-

ceiro.


- Todos a julgamento!. . . Eu ... e que esf6 havendo

na cozinha? silvou ele, avistando-nos a+rav6s das janelas aber-

+as. Todos aqui! Tragam-me todos!

O furriei Dia+lov veio ate a cozinha. Alguns dos nossos

lhe declararam que não tinham queixa nenhuma a formular.

Ele se afasfou imediatamente, afim de dar parte ao maior.

- Ah, esses não +em nada que clizer! comentou o chefe,

em voz baixa, evidentemente satisfeito. Não faz mal, todos

aqu¡!

N6s saimos. Vi que senfiamos alguma vergonha aõ



faze-lo, pois esfavamos todos de cabe‡a baixa. #

11

~I



1

of

i



RECORDA€õES DA CASA DOS MORTOS

Prokofievi lolkine e tu, Almazov.

357

. . por aqui, por



aqu,, reur¡am-sei ordenou o nosso tirano em voz arquejante

m s abrandada, fitando-nos com ternura. M-cki, tu fam-

bem. Anda, toma nota dos nomes, Diailovi Toma no+a ia

dos nomes dos individuos satisfeitos, e os nomes dos descon-

fenfes, todos os nomes, a+‚ o ultimo, e me da a lista. . .

Vou lev61os foclos a conselho de guerra, ... Vou mostrar do

que sou capaz, seus cr pulas!...

A lista produziu o seu efeito.

- N6s esfamos safisfei+os! grifou um dos descon+enfes,

21 mas em voz sombria e incerta.

Ah, ah! satisfeito! Quem mais esfa sa+isfeifo?

estiver satisfeito que avancei

Satisfeito, safisfei+o! bradaram algumas vozes.

Satisfeitos? Quer dizer que foram a‡ulados por

alguem? quer dizer que +em entre si cabe‡as, rebeldes?

Pior para eles!

- 'Senhor, que significa isso! exclamou uma voz, no

dos homens.

- Quem grifou, quem foi? rugiu o maior, precipifan-

do-se par

a o lado de onde saira a voz. Fosfe tu que grifaste,

~I Resforguiev? Para o corpo da guarda]

Rasforguiev, um mo‡o gorducho, saiu da fila e entrou

lentamente no corpo da guarda. Não fora ele que grifara,

1 ~ mas como o maior o havia designado, não ousou confradi-

Es+So rebentando de gordos, por isso reclamaml

,;,,-,urrou "Oito olhos", erguendo-se nos facões das botas.

~"Olhem esse focinho roli‡o! não se lhe d a volta em fres

Hei de apanha-los todos! Saiam os que estão safis-

foitos!


Satisfeitos, Excelencia, articularam -algumas dezenas

·e vozes surdas. O resto manteve um silencio obstinado.

~~I Todavia o maior nada mais desejava. O que melhor lhe con-

~ vinha era liquidar esse negocio o mais rapidamente possivel. #

i DOSTOIEVSKI

1 ora todos estão satisfei+osi disse ele as pres-

c Claro

ue o sabia. A culpa e dos cabe‡as - - .



~,s de motim entre eleS, conflinuou, d*¡rigindo-se

que descobri-los todosi E agora ...

Tambor. foca!

agora es-~ .,, hora do trabalho!

s. Tristemente,

a

Ele proprio assistiu ‚ forma‡ão dos grupo



-em silencio, os for‡ados partiram para o trabalho, felizes pelo

menos em fugir ao olhar +errivel do chefe. Depois da partida

dos pelotões, o maior se dirigiu vagarosamente para o corpo

da guarda onde tornou suas medidas contra os "cabe€as",

medidas alias não muito crueis. Contaram mais +arde que

um deles, que pediu perdão, foi desculpado imediatamente.

O maior, ou tinha pressa, ou não se sentia muito seguro.

Quem sabe não estava corri medo? Urna reivi 1 ndica‡ão e

sempre cousa espinhosa. A falar verd . ade. a queixa dos for

‡ados não poderia equivaler a uma reivindica‡ão, porque fora

dirigida não a administra‡ão superior mas ao proprio major.

Nem por isso, contudo, deixava de ser desagradavel, devido ...

unanimidade dos descontentes. Era preciso pois abafar a

cousa a qualquer pre‡o. Depressa soltaram os cabe‡as.

Logo a comida foi melhorada, - infelizmente por muito pouco

tempo! Nos dias seguintes o maior veio com mais frequen

cia inspecionar o presidio, e +ambem mais frequentemente

encontrou desordens a reprimir. Nosso sargento ia e vinha,

preocupado, desorientado, como se persistisse no seu estu

por. Quanto aos for‡ados, custaram a se aquietar: entre

tanto, a agita‡ão silenciosa deles não se parecia.com a dos

primeiros dias: mas o seu silencio não +raia menos inquieta‡ão

e embara‡o. Alguns se mantinham de cabe‡a baixa. Alguns

resmungavam e aludiam involunfariamen+e ao caso. A maio

ria zombava amargamente uns dos outros, como para se pu

nirem do motim.

- Toma, mano velho, +orna, come] debochava por

exemplo um deles.

- Quem semeia ventos colhe ~empes+ades!

i

RECORDA€õES DA CASA DOS MORTOS



359

- Onde esta o rafo que amarrava o chocalho no rabo #

do gato? insinuava um terceiro.

- N¢s ca somos convencidos a poder de vara - todo

o mundo sabe disso. Foi sorte que ele não nos mandasse

a‡oitar a todos!

- Se a gente soubesse as cousas adiantado, falaria

menos e se portaria melhor! observou um outro, não sem aze-

dume.

Queres dar alguma li‡ão? Olha o professor!



Isso mesmo, quero te dar uma li‡ão!

Antes disso, podes me dizer de onde vens?

Posso te dizer que eu, eu sou um homem, e tu o que

7

es.



- Um osso de cachorro, e o que es!

- Osso de cachorro es fui

- Basta, basta, ia berraram demais! grifavam vozes de

todos os lados, acalmando os rixenfos.

No mesmo dia da queixa, ao voltar do trabalho, encon-

frei Pefrov por fras das casernas. Ele ia me procurava.

Aproximando-se de mim, resmungou duas ou fres exclama‡ões

incompreensiveis, depois calou-se com ar embara‡ado, e

Os-se a caminhar ao meu lado, maquinalmenfe. Todo o caso

ainda me pesava com for‡a sobre o cora‡ão, e parecia-me

que Pefrov me poderia dar certas explica‡ões.

- Confa, Petrov, voces não estão com raiva de n¢s?

- Raiva de quem? perguntou ele como se acordasse de

S£bito.


- Voces, de+en+os, de n¢s, os nobres!

- E por que lhes haveriamos de querer mal?

Porque não os acompanhamos na queixa!

E por que nos haviam de acompanhar? replicou es-

fQr‡ando-se por entender-me. Vocˆs comem separado!

- Ora ora! Ha muitos de voces que comem separado

e que, entretanto, se amotinaram. E n¢s deveriamos fam-

bem ... por companheirismo ... #

360

e

DOSTOIEVSKI



- Ora! Como e que vocˆs poderiam ser nossos compa-

nheiros? indagou Pefrov muitissimo surpreso.

E'e de-c¡d*

Afirei-lhe um rapido o!~,ar. E- ;darnenfe não me

compreendia, não ia ate onde eu queria chegar. Em com-

pensa‡ã'o, eu o compreendia perfeitamenfe. Pela primeira

vez, uma id‚ia -que me perseguia ha muito, sem,conseguir

tomar corpo, se precisava no meu pensamento. Weirei-me

duma coisa da qual ate então tivera apenas uma intui‡ão con-

fusa; compreendi que jamais os for‡ados me considerariam

um companheiro, mesmo que eu passasse ali o resto da vida,

mesmo que pertencesse a se‡ão especial. A expressão que

se pintou no rosto de Pe+rov, quando ele me disse: "Como

e que vocˆs poderiam ser nossos com pa nhei ros? ", essa expres-

são me ficou gravada na lembran‡a. Havia nela +ão franca

ingenuidade, tão singela surpresa, que perguntei a mim mesmo

se não dissimulava a ironia, o odio, o escarneo. Mas não: -

eu não era companheiro deles, e nada mais! "Seque +eu

caminho que eu sigo o meu; trata dos teus negocios que eu

trato dos meus."

Com efeito, pensei que depois da queixa eles se puses-

sem todos a nos mortificar, a nos +ornar a vida impossivel.

Não houve, porem, a minima injuria, a men , or censura. nenhu-

ma animosidade especial. Continuaram a nos debicar de

bom humor, quando se apresentava ocasião. Não guardaram

rancor nem aos que se mantiveram afastados, nem aos que

em primeiro lugar se haviam proclamado satisfeitos. Nin-

quem mesmo deu palavra a tal respeito.

E era principalmente esse silencio que me deixava afonifo.

-11


Vill

Comoanheiros

nfre os companheiros. os que a principio mais, me atraiam

ram, e claro os meus iguais, - os nobres. Porem,

enfre, os frˆs representantes da nobreza russa que se

pntravam no presidio, - Akim Mimitch, o espião A. e o

, condenado como parricida, - travei amizade apenas

1 1 1 Akim Akimifch. A falar franco, s¢ o procurava em deses-

de causa, nos momentos mais angustiosos de fedio;

1 do supunha não me poder entender com ninguem mais.

, Ö, nos capitulos anteriores, dividir os for‡ados em cate-

C14 . #


s, mas, ao recordar-me de Akim Akimi+ch, creio dever

cenfar uma categoria, a qual, alias, ele preenchera sozi-

‚ a dos for‡ados indiferentes, aqueles aos quais pouco

. rfa viver em liberdade ou no presidio. Essa especie de

furas não poderia existir entre nos, senao na qualidade #

exce‡ão. Akirn Mimitch. pois, c onstituia ele s¢ a e De€aIO:

sfalara-se no presidio como se devesse passar ali da, a

istencia. Tudo que o cercava, o colchão, o travessei :), os

ensilios, estava solida e cuidadosamente arrumado, para

mpre; nada sugeria uma vida provisoria, de acampamento.

kim Mimitch deveria passar ainda muitos anos no presidio,

berfa‡ão. Entre+anW,

as creio que nunca sonhou com a li

e se acomodara a realidade, era menos por bom cora‡ao

por esp¡rito de disciplina, - o que para ele dava no

mo. Esse bom sujeito m'e amparou, de inicio: encheu-me

e conselhos, prestou-me grandes servi‡os, mas algumas ~

es, confesso-o,.me provocava um aborrecimento profundo:

agravava, com a sua presen‡a, a minha desmedida fendencia

para a angustia, essa mesma angustia que procurava esquo-

er, quando dele me aproximava. Havia momentos em quo-eu

tinha sede de ouvir palavras vivas, mesmo rudes, -mesmo

impacientes, mesmo duras-. poderiamos desabafar juntos

sobre a desgra‡a do nosso destino*, ele, porem,- calava-se e

faz¡a-s.e indiferente, ou então narrava minuciosamente a re-

vista militar que tinha sido feita no ano tal, citava os

nomes e o sobrenome do chefe de divisão, narrava a safisfa-

‡ão ou o descontentamento testemunhado por esse perso-

nagem, discriminava as confinencias +rõcadas. Tudo isso em

voz igual, mon6+ona, como agua que escorre gota a gota.

Animava-se so um pouquinho mais quando me contava que,

em retribui‡ão ao papel por ele desempenhado em não sei que

acontecimento, no Caucaso, juigaram-no digno de receber a

condecora‡ão de Santa Ana. Nesse minuto, sua voz se +or--

nava extraordinariamente grave e seria: baixava-a uma oitava,

e assumia um ar misterioso para dizer: "Santa Ana". Então,

durante pelo menos +res minutos, guardava severo silencio.

Durante o primeiro ano passei por instantes absurdos em que,

d‡ chofre, eu odiava quase, e sem o menor motivo, o coitado

Akim Akin---ii+ch: e, en+3o, amaldi‡oava em silencio a ma sorte

que nos fizera dormir vizinhos, na mesma tarimba. Passada

uma hora, envergonhava-me dessa irri+a‡ão. Alias, so a

DOSTOIEVSKI

DOS MORTOS

RECORDA€OES DA CASA

363


sofri no. primeiro ano. Depois acos+umei-me ao genio de

Akim Akimi+ch e deixei de sofrer dos antigos acessos de

loucura. Acho que nunca brigamos abertamente.

Alem desses trˆs russos,' tive como companheiros de

infortunio mais oito fidalgos - todos polacos. Travei rela- #

-‡ões muito agradaveis com alguns deles, mas não com todos.

Os melhores eram doentios, exigentes, impacientes ao mais

alto grau. Com dois desses acabei rompendo definitivamente

rela‡ões. Trˆs, apenas, eram realmente pessoas de instru‡ão:

B-ski, M-cki e o velho J-ki, outrora professor de ma+ernafica,

¢timo velho, muito original e muito pouco inteligente, ape-

sar. do seu saber. M-cki e B-ski eram inteiramente diversos

um do outro. Com M-cki eu me entendi logo de inicio, e

nunca trocamos uma palavra mais aspera; estimava-o muito,

mas quanto a lhe querer bem, a me afei‡oar a ele, disso nunca

fui capaz. Profundamente azedo e desconfiado, ele conser-

vava contudo um grande dominio sobre si proprio. Esse

controle proposi+al, - talvez excessivamente proposital -

era justamente o que me desagradava: sentia-se que jamais,

por amor de ninquem, ele poria sua alma a nu. Entretanto,

talvez eu me engane, pois ele tinha uma natureza forte e

nobre ... Sua habilidade ex+raordinaria, talvez um pouco

iesuifica, sua reserva nas rela‡ões com os outros, +raiam um

profundo ceticismo. Todavia aquele c‚tico mantinha uma f‚

-em certas esperan‡as. Essa

,¡riaBalavel em certas convic‡ões,

, :'dualidade representava o seu tormento. Apesar do seu +ato,

~:,v¡via em guerra aberta com M-cki e T-ski. B-ski era doente.

-~predispos+o a fisica, irri+adi‡o, nervoso, porem, no fundo, ge-

11, Reroso e bom. Sua irritabilidade o +ornava, ...s vezes, tão

caprichoso quanto uma crian‡a. NSo me pude acostumar ao

seu genio, o afasfei-me de B-ski, sem contudo deixar de o

aprec .Com M-cki, jamais tive um rompimento as claras,

~1~ iar.


~1~ ~

irias não gostava dele. Por causa de B-ski afas+ei-me fam-

bem de T-ski, aquele rapaz de quem ia falei no capitulo pre-

dl

cedenfe, a prop6si~o da nossa queixa. isso me aborreceu #



364 DOSTOIEVSKI

muito, porque T-ski, embora de instru‡ão precaria, e~.i valen-

te, generoso, encantador. Adorava B-ski, venerava-o tanto,

que todos os que com ele rompiam, +ornavam-õr au+ornatica-

mente seus inimigos. Separou-se +ambem de M-cki, mas

dificilmente se resolveu a isso. Devo notar que todos aqueles

homens tinham o moral enfermo, o genio amargo, o tempera-

menfo sombrio. E isso se concebe: o presidio era para

eles mais penoso que para nos. Estavam muito longe da

patria, alguns haviam sido deportados por muito tempo, dez,

doze anos. E, cousa mais grave, vencidos por um preconceito

indesfrufivel, não viam nos for‡ados senão animais ferozes,

e não podiam nem lhes queriam reconhecer nenhum sinal de

humanidade. Cousa compreensivel fambem: o seu destino,

a for‡a das circunsfancias, os lavava por esse carninho; o

sofrimento os sufocava. Afaveis com os circassianos, os

tarfaros, com Isai Fomi+ch, fugiam com horror de todos os

clarriais de+en+os. SO o velho crente de Sfarodubov lhes

conquistara a estima. Entretanto, cousa nofavel, durante

todo o meu tempo de presidio, nunca nenhum dos outros

presos lhes censurou a origem, nem a religião, nem as convic-

‡ões, como o faz frequentemente o nosso povo nas suas rela-

‡ões com esfrangeiros. sobretudo com alemães, vitimas prin-

cipais de zombarias. Nossos for‡ados mostravam muito mais

respeito pelos polacos que por n¢s, russos; raramente lhes

atiravam remoques, cousa em que alias os polacos não se dig-

navam reparar.

Mas voltemos a T-ski. Fora ele quem, por ocasião da sua

fransferencia para o nosso presidio, carregara nos bra‡os

durante quase toda a noite o seu amigo B-ski, de saude e cons-

fifui‡ão debeis, extenuado ao cabo de meia jornada. O

lugar para onde os deportaram fora a principio U-gorsk (1)

onde, segundo contavam, viviam bem, pelo menos muit¡ssimo

melhor que entre nos. Como, porem, tinham iniciado cor-

respondencia - ali s inocenfissima - com exilados de outra

(1) Sem d£vida o autor se refere a Ust-Kamenogorsk, na prov¡ncia de Semipa-

latinsk. (N. de H. M.)

RECORDA€õES DA CASA DOS MORTOS

365

cidade, as autoridades julgaram necessario transferir os frˆs



para a vigilancia direta do nosso comandante superior. A+6

a chegada deles, M-cki vivera s¢; quanto não devera ter so-

frido, durante esse primeiro ano de deporta‡ão!

Todos os nossos presos pol¡ticos eram jovens. Apenas

J-ki, aquele velho de quem ia falei, que vivia eternamente a

rezar, -chegava aos cinquenta anos. Esse homem, decerto #

hor¡radissimo, mostrava algumas singularidades. Seus compa-

nheiros B-ski e T-ski não o apreciavam; não lhe falavam quase

nunca, apodavam-no de teimoso e ferino. Não sei aM que

ponto tinham razão. Um presidio, como qualquer outro lugar

onde as pessoas estão reunidas ... for‡a, e não esponfanea-

mente, parece-me lugar adequado ao nascimento de questões

e odio; muitas causas para isso concorrem. Ali s, J-ki real-

mente era pessoa de esp¡rito obtuso, desagradavel; nenhum

dos companheiros com ele se entendia. Nunca brigamos,

porem nossas rela‡ões nunca foram ¡nfimas. Devia ser bom

matem tico. Lembro-me que um dia se esfor‡ou, na sua lingua

semi-russa, por me explicar um sistema asfron"mico de sua

inven‡ão. Disseram-me que outrora ele imprimira uma obra

sobre esse assunto, mas que todo o mundo cient¡fico o levara

na tro‡a. Talvez tivesse o juizo um pouco incerto. Passava

dias inteiros a orar, de joelhos, o que lhe conquistara o res-

peito de todo o presidio, respeito que conservou ate ...

morte, pois morreu no- nosso hospital, sob minhas vistas, ao

fim de tormentosa molesfia. Conquistara a venera‡ão dos

for‡ados logo no dia da sua chegada, devido a uma his-

foria que houve entre ele e "Oifo olhos". Durante a viagem

entre U-gorsk e nossa fortaleza, não haviam raspado a cabe‡a

nem a cara dos deporfados; a barba lhes crescera, e como

foram levados diretamente para o maior, este, ao vˆ-los, enfu-

receu-se ante aquela ignominiosa infra‡ão ... disciplina, da qual

entretanto eram todos inocentes.

- Olha essas caras! rugiu o chefe. Parecem vagabun-

dos, bandoleiros! #

866

DOSTOtEVSKI



Por essa ‚poca. J-ki ainda compreendia o isso muito."

mal, pensou que lhe perguntavam: "Quern sã voc...?" e

respondeu:

- Não s6mos vaga un os, somos deportados pol¡ticos.

- O que? Ainda vens com insolencia? berrou o maior.

Para o corpo da guarda! Cem vergastadas!

Fustigaram o velho. Ele se estirou sob as varas, mordeu,'

a mão, e recebeu o castigo sem um grito, sem ao menos se

mover. Nesse in+erim, B-ski e T-ski chegavam a caserna.

M-cki os esperava ... porta. Aperfou-os nos bra‡os, embora

jamais os houvesse visto. Revoltados com a recep‡ão do

major, eles lhe contaram o que acontecera a J-ki. Ou‡o

ainda M-cki a me narrar a his+oria: "Eu estava fora de mi,%-,

j não me continha mais, de tanta furia, tremia de febre. Fui

esperar J-ki a entrada; deveria voltar diretamente do corpo

da guarda, onde estava sendo fustigado. De repente, abri-

ram a porta. Sem olhar para ninguem, J-ki, descoberto, os

labios palidos e trˆmulos, passou diante dos presos que esta-'

vam no pafio e que 16 sabiam que se havia fustigado um

barine. Entrou na caserna, foi para o seu lugar, dep

.R&-

sem dizer palavra, ajoelhou-se e come‡ou a rezar. Os fdr‡ã-


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