História Universal da Destruição dos Livros Das Tábuas Sumérias à Guerra do Iraque Fernando Báez



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[...] Percorri o mercado, o alho e a cebola

E o antro de incensos e perfumes

E onde estão as vendas de livros [...].
O erudito Pólux chamou de bibliotheekai essas vendas de livros. Os copistas gregos, quase sempre escravos, não tinham, como no Egito, prerrogativas. Eram, de qualquer maneira, trabalhadores indispensáveis: seu método de escrita, às vezes não muito fiel aos manuscritos, consistia em escrever com um instrumento de cana afiado na ponta, chamado cálamo, e uma tinta obtida da mistura de cola com fuligem. No início, escrevia-se o texto sem divisões, sem pontuação e sem minúsculas. Redigia-se em colunas. A coluna de um texto em prosa podia abarcar oito centímetros e, no gênero poético, a métrica estabelecia a largura do texto. Com sorte, o copista conseguia de uma a quatro dracmas para livros comuns e, quando era um trabalho excepcional, o pagamento podia salvar sua vida da pobreza. Um livro se considerava publicado se fosse lido em público por um criado, chamado leitor, ou pelo próprio autor. Uma vez terminada a leitura pública, os ouvintes podiam fazer perguntas.

Na Grécia foram editados livros com ilustrações. O primeiro de que temos notícia foi o de Anaxágoras: Anaxágoras foi o primeiro a publicar um livro com desenhos. Havia também edições de grande beleza. A Vida guerreira, à diferença dos três catálogos conservados dos títulos das obras de Aristóteles, incluiu uma edição luxuosa da Ilíada para Alexandre Magno, que poderia ter sido a mesma levada pelo conquistador em suas viagens, numa caixa cheia de enfeites procedente do botim do persa Dario. Plutarco disse que Aristóteles foi o autor dessa edição da Ilíada, que se perdeu ou foi enterrada com seu dono, o que vem a ser a mesma coisa, porque a tumba de Alexandre Magno nunca apareceu.


III
É difícil separar o perdido do destruído na história dos livros, porque em certas ocasiões as obras se perderam devido à sua destruição ou foram destruídas porque simplesmente desapareceram. Em todo o caso, os textos já não existem e, salvo o milagre de um achado numa tumba ou depósito, há poucas probabilidades de recuperar centenas de milhares de escritos desaparecidos na antigüidade.

Basta assinalar que, das 120 obras incluídas no catálogo do prestigioso Sófocles, hoje só existem sete em estado integral e centenas de fragmentos. Safo de Lesbos, a grande poetisa, deixou uma obra reunida em nove livros, mas hoje só temos duas odes quase completas e meros fragmentos. Os cinco livros de Corina de Tanagra, a segunda poetisa relevante da poesia grega, competidora de certames em que venceu Píndaro, hoje estão reduzidos a um grupo de fragmentos incoerentes. Das 82 tragédias de Eurípedes só temos 18, um drama de Sátiros e abundantes citações.

O horror é ainda maior. Todos os pré-socráticos e todos os sofistas estão em fragmentos. Sempre será surpreendente que não tenhamos conservado Sobre o não ser ou Sobre a natureza de Górgias de Leontini, onde provou que nada existe.

A perda de textos se estende a todos os períodos da literatura, ciência e filosofia da Grécia. Citado por Platão, admirado por Sócrates, Agaton de Atenas, poeta trágico, escreveu obras de uma perfeição quase compulsiva, que não existem mais, salvo em forma de débeis fragmentos. Os Partenion, coleção de poemas em seis livros, escritos por Alcmano de Sardes, perderam-se. Um encantador texto seu - número 40 da antologia de Page -, muitas vezes citado, exprime: "Conheço o canto de todos os pássaros.

Um caso particularmente delicado é o de Aristófanes de Atenas,'" o comediógrafo. De quarenta comédias autênticas apenas sobreviveram 11, mais uns mil fragmentos preservados graças a papiros descobertos e citações de lexicógrafos. Não é insólito? Perderam-se as 101 comédias de Difilo de Sínope, as cem comédias de Eubulo de Atenas e as 250 comédias de Alexis de Turi.

Todos os escritos dos cínicos, pirrônicos, céticos e estóicos se reduziram a uma miscelânea fragmentária. Tampouco teve sorte Zenão de Cício, que escreveu uma República que era mais lida do que a de Platão. Dos mais de quinhentos livros de Crisipo de Solos, só há fragmentos.

Como se não bastasse, desapareceram os trinta livros das Memórias do historiador Arato de Sicião, talvez o inventário de detalhes mais extravagantes sobre o mundo antigo. Nada lemos - a não ser uns minúsculos segmentos - dos 9.500 versos escritos por Aretino de Mileto. Pelo menos 13 livros de Píndaro se perderam.

Das quinhentas tragédias de Prátinas de Fliunte, só existem fragmentos. As 250 tragédias de Astidamas se perderam. Isso sem falar do prestigioso Aristarco de Samos, astrônomo e matemático que mediu a Terra e escreveu dezenas de tratados sobre diversos tópicos, hoje inexistentes. Pode parecer incrível, mas há mais de cem livros perdidos de Plutarco de Queronea. Segundo o Catálogo de Lamprias, de 227 obras em 278 rolos, só se conservam 83 obras em 87 rolos.

De Espeusipo de Atenas, que revelou os segredos de seu tio e mestre Platão, não sobrou um só livro completo. O reconhecido Duris de Samos, favorito do público culto da Grécia, reduziu-se a um monte de parágrafos e frases soltas. Os 47 livros das Memórias históricas de Estrabão de Amasia, autor da Geografia, perderam-se totalmente. É uma verdadeira lástima que se tenham perdido os escritos de Beroso de Belos. Hoje restam apenas epítomes e fragmentos de sua monumental História da Babilônia (escrita cerca de 280 a.C., em três livros divididos em três períodos).

Esta lista, como o leitor pode presumir, é extensa (compilei três tomos de duas mil páginas cada um), esmagadora, opressiva. O número de obras que perdemos em acidentes, desastres, queimas ou por indiferença é incalculável.




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